O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

290 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

mente como sempre, com o seu nunca desmentido talento; voltou ao eterno problema do conflicto permanente da camara dos pares, dizendo que ella póde collocar-se em conflicto com a camara dos deputados. Se o conflicto é accidental, transitorio, está muito bem a disposição do projecto, as camaras reunem-se em congresso e votara o que têem a votar. Se suppomos que o conflicto é permanente entre as duas camaras...

N'esse caso direi eu: supponhâmos, que todos os poderes do estado enlouqueceram; supponhâmos, que um dos poderes do estado se revoltou contra os outros; é claro que são cousas que a lei não póde prever; as leis com toda a certeza não prevêem as rasões ou os factos, que dão socialmente o mesmo resultado que as revoluções.

Se a camara dos pares leva um dia o seu desvairamento, a ponto de querer impor-se a todos os mais poderes do estado, com toda a certeza que teremos chegado a uma situação excepcional, que não se póde resolver pelos meios constitucionaes, legaes e ordinarios. Esse ponto, parece-mo que nem agora, nem nunca, póde ser considerado nas leis de um paiz.

Disse mais s. exa. que as camaras, em geral, n'este paiz, representam a vontade do governo!

Parece-me que, se ha afirmação que deponha a favor do projecto que discutimos, a favor da instituição de um corpo politico permanente e vitalicio, é exactamente esta, das camaras representarem a vontade dos governos.

É preciso que junto d'essas corporações, que representam a vontade dos governos; e de governos, que infelizmente mudam muito, em poucos annos, o que não creio, soja de vantagem para a administração do paiz, é preciso digo, que ao lado de instituições tão instaveis, haja instituições, com alguma estabilidade. (Apoiados.)

Diz mais s. exa., que o projecto dá á camara dos pares um papel moderador, um simples papel de revisão; e com toda a certeza que, se assim é, o projecto lhe dá o melhor papel que lhe podia caber na administração publica de um paiz.

É necessario, é indispensavel, que as duas casas do parlamento não tenham o mesmo caracter, de outra fórma não se justifica a sua existencia.

Fazendo uma camara de pares, em que predomina o elemento electivo ao lado de uma outra, em que o elemento electivo é soberano, e quando de mais a mais se reconhece que as camaras electivas não representam senão a vontade do governo, vamos d'esse modo caír completamente na soberania da vontade do governo. Era o governo quem decidia, e nada mais.

E disse o illustre deputado que, sem querer discutir as vantagens da eleição, na verdade se inclinava a que as corporações politicas constituidas por eleição eram mais vantajosas para a administração publica.

N'esse ponto afasto-me inteiramente, não só das affirmações do illustre deputado, mas mesmo da doutrina, que em geral, hontem se sustentou n'esta casa.

Comprehendo e advogo a necessidade das instituições representativas; mas no que não posso concordar é que, para que as instituições representativas sejam vantajosas, a eleição seja necessaria. O que comprehendo muito bem, é a representação sem a eleição.

E pergunto, se uma camara de pares escolhida pelo poder moderador, tendo elle escolhido para essa camara, de entre os homons mais capazes do paiz, mais capazes politicamente, aquelles que revelarem maior valor social, não representa maior valor para o paiz do que uma camara tirada da eleição.

Eu pergunto se quando o paiz acclama Herculano o seu primeiro historiador ou João de Deus o mais popular dos seus poetas, foi para isso preciso uma eleição, e direi mais ainda, que a assembléa politica mais notavel do mundo politico, aquella cujas lições os politicos presentes, passados e futuros, todos consultaram sempre foi o senado romano. Nunca houve assembléa politica superior aquella; pois não era uma assembléa de eleição, era uma assembléa de nomeação e até mais ou menos hereditaria. Por consequencia, considero o governo do meu paiz como um governo democrata, e não julgo que de fórma nenhuma a democracia esteja offendida pelo facto de se constituir um corpo legislativo politico sem sor derivado da eleição.

Disse ainda o illustre deputado o sr. Marianno de Carvalho, que não comprehendia que a missão do chefe do estado nos governos representativos fosse aquella que em palavras vulgares se traduzia pela expressão popular: "o rei reina, mas não governa". Quer s. exa. que o poder moderador tenha attibuições e ellas se limitem o mais possivel? N'este ponto estamos de accordo, mas uma cousa é limitar essas attribuições, outra cousa é mantel-as com a latitude que rasoavelmente lhe convem.

Desde o momento em que o poder moderador tem responsabilidade na administração do estado, desde o momento em que elle tem direitos na administração do estado, bom é tambem que tenha attribuições. E partindo d'este principio, parece-me que nenhuma mais digna, nenhuma mais nobre lhe podia caber do que aquella de chamar para o seu conselho, chamar permanentemente para a administração do paiz os homens que por qualquer modo revelaram merecer esse logar.

É certo que o projecto que se discute limita a escolha do poder moderador, mas limita-a simplesmente até ao ponto em que não póde deixar de limitar; d'ahi por diante deixa-lhe toda a latitude, e convinha que lh'a deixasse, não só porque sendo uma camara da escolha do poder moderador seria desasisado procurar já prever todas as circumstancias em que essa escolha deveria exercer-se, o que quasi a reduzia ou annullava por completo, mas tambom porque as necessidades politicas que se dão na organisação do um corpo legislativo não se devem dar igualmente na constituição de um outro corpo legislativo que o illustre deputado reconhece ter uma feição differente, uma feição moderadora o de revisão.

Pergunta o illustre deputado porque é que sendo os pares vitalicios não são hereditarios? Não são hereditarios por mais de uma rasão; não são hereditarios, porque em primeiro logar ao paiz repugnava acceitar o principio da hereditariedade, e mostrou-o largamente emquanto a hereditariedade existiu na camara dos pares, e a opinião do paiz, parece-me, é alguma cousa a attender quando se faz uma lei. Alem de que a opinião do paiz era contraria á hereditariedade havia ainda outra circumstancia, e é que a instituição da camara dos pares com hereditariedade coexistiu com a instituição dos morgados.

Então a hereditariedade representava alguma cousa, correspondia a forças economicas poderosas da nação, tinha rasão de ser; mas hoje, que essas rasões desappareceram, hoje que se extinguiram os morgados, hoje que o codigo civil pulverisou todas as fortunas, nada mais facil do que um filho de par do reino se encontrar nas condições mais deploraveis para poder exercer o pariato. Ponho de parte todas as doutrinas mais ou menos scientificas que aqui se expozeram, que são muito captivantes, que é provavel que um filho de homem de estado seja outro homem de estado. Ha n'isso perigosas excepções e eu não quero embrenhar-me n'estas questões, não só pela minha incompetencia, mas porque isso nos levaria muito longe.

Disse ainda s. exa. que o artigo 3.° d'este projecto de lei tinha sido uma concessão feita ao jacobinismo, affirmação que já hontem tinha sido feita n'esta camara pelo sr. João Arroyo. Eu confesso, sr. presidente, que não sei bem o que seja jacobinismo. Se ser jacobino é, por exemplo, defender todas as liberdades, a liberdade do profissão, a liberdade de commercio, a liberdade industrial, em summa, todas as liberdades que constituem as regalias mais poderosas das conquistas modernas, eu sou jacobino. Do jacobinismo faz-se um titulo deprimente e pretende-se com-