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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso do sr. deputado Conde de Bertiandos, pronunciado na sessão de 11 de fevereiro, que devia ler-se a pag. 323, col. 2.ª, d'este Diario

O sr. Conde de Bertiandos: — Pedi a palavra, porque desejo fazer algumas considerações sobre a proposta que está em discussão. Mas essa proposta, filha da anterior, está com ella tão estreitamente ligada que me vejo obrigado a dizer algumas palavras a respeito da discussão ventilada na ultima sessão e tão intempestivamente abafada pela força numerica da maioria. Dir-se-ia, sr. presidente, mas não o digo eu que não quero offender ninguem, nem pretendo insinuar-me na consciencia de pessoa alguma, dir-se-ía que os auctores da actual proposta, depois de haverem concorrido para abafar tão intempestivamente, repito, a discussão de antehontem e depois de terem declarado com o seu voto final que aquella questão havia sido mal alevantada por parte da opposição, se tomaram de pejo e remorseados buscaram meio de abrir de novo os debates sobre as portarias illegaes. (Muitos apoiados.)

Seja porém como for, o que é verdade é que não posso apresentar as minhas considerações sobre a proposta que hoje se discute antes do fallar na proposta do sr. Boavida. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

Tencionava eu tomar a palavra na ultima sessão; talentos porém com que me não posso medir nem comparar haviam tratado o assumpto tão clara e tão brilhantemente que entendi nada ter n acrescentar.

Eu tinha a ingenuidade de suppor, sr. presidente, que embora fossem terminantes e claras as rasões adduzidas pelos meus illustrados collegas, ellas teriam comtudo replica da parte da maioria; essa occasião esperava eu para apresentar as minhas idéas e fundamentar o meu voto: a renovar argumentos tão admiravelmente expostos não me atrevia eu, senão a contrariar rasões que fossem apresentadas pelos oradores d'aquelle lado da camara, e que, por terem sido julgadas de somenos importancia, não houvessem sido prevenidas pelos que alevantaram a questão n'esta casa. De nenhum peso de certo seriam as minhas palavras, porque a voz que as havia de proferir é desacompanhada de talentos, desprevenida de sciencia, desauctorisada, porque era como hoje a primeira vez que entraria n'estes debates.

Mas, sr. presidente, eu julgava dever meu quando via tão gravemente offendidas as prerogativas do parlamento, usar da palavra o concorrer com os meus apoucadissimos recursos para repellir a affronta do poder executivo que veiu intrometter-se directamente na confecção das leis, fazendo baixar uma portaria que pretende revogar o que n'esta casa foi ha tres annos declarado lei do reino. (Muitos apoiados.),

Escusado fóra dize-lo, a maioria não adduziu rasões senão contrarias ao seu proposito, o eu declaro francamente que depois de ter ouvido o meu illustrado collega o sr. Camara Leme com cuja amisade muito me honro, mais firme fiquei na minha convicção. Todos ouviram as palavras de s. ex.ª, mas se ma é, permittido lerei o periodo de um jornal que é uma das poucas, embora fortes columnas que na imprensa sustentam a actual situação, onde me parece estarem muito bem compendiadas as rasões adduzidas por s. ex.ª

(Interrupção do sr. Camara Leme que não se ouviu.)

Eu não vou argumentar com o jornal, argumento com o sr. Camara Leme, mas se s. ex.ª entende que não foram estas as suas idéas póde dize-lo francamente, que eu estou prompto a questionar quaesquer rasões que se apresentem. Não tomo para base da minha discussão o que diz o jornal repito, seja-me porem concedido que use d'elle para soccorrer a memoria, e imagine-se que isto não é um jornal, mas apontamentos que eu podia ter tirado e que não tirei do discurse a que me estou referindo. (Apoiados.), Disse o sr. Camara Leme que a quantia depositada pelo fiador de que falla a portaria de 19 de janeiro de 1876 não era o preço da remissão, mas um meio de coacção, uma multa.

Disse-nos s. ex.ª e repetiu-nos que era esta a idéa do governo, e que nem podia ser outra: obrigar o fiador a procurar um substituto para o seu affiançado. Se o meu illustrado collega disse outra cousa, eu estou prompto a rectificar as minhas palavras e a acceitar para ponto de discussão outro qualquer argumento. Mas se foi isto o que disse, mas se é esta a defeza que se apregoa lá fóra, consintam-me que eu diga que se não póde deprehender esta doutrina da leitura da portaria de 19 de janeiro ultimo, a qual apresenta tres hypotheses distinctas para que o fiador se exonere da sua fiança.

Diz a portaria. (Leu.)

N'estes dois primeiros casos cumpre-se a lei, porque ou se apresenta o affiançado ou um substituto. Mas a portaria diz no fim. (Leu.)

Aqui é que está a illegalidade, é n'este ultimo caso. Ou a pagar a somma que for necessaria para contratar um substituto. O fiador não apresenta o affiançado, não se quer dar ao trabalho de apresentar substituto, paga a somma necessaria para que o estado contrate um soldado. Porque estas tres hypotheses ficam á escolha do fiador: apresentar o affiançado, substitui-lo, ou remi-lo.

Parece-me isto de primeira intuição.

Mas é isto, sr. presidente, o que não permitte a lei de 17 de abril de 1873, a qual no artigo 3.° acabou completamente com as remissões, admittindo apenas homem por homem, e não dinheiro por soldado. (Apoiados.)

A historia d'esta portaria de janeiro está ao alcance do todos. A lei de 4 de junho de 1859, no artigo 9.°, dizia o seguinte. (Leu.)

Esta era a doutrina da lei de 1859: só depois do mancebo recrutado ter assentado praça é que podia substituir-se. Veiu depois a lei de 17 de abril de 1873, que n'este ponto favoreceu o recrutado, consentindo-lhe que apresentasse substituto antes ou depois do alistamento; mas o sr. ministro do reino, em uma portaria no mesmo anno, ordenou o seguinte. (Leu.)

Por esta portaria concediam-se oito dias a todos os mancebos recrutados, para que antes do alistamento apresentassem substituto.

Eu não trato agora de saber se o sr. ministro do reino podia ou não favorecer os recrutas com os taes oito dias; concedo-lhe até esse direito, já que s. ex.ª tanto se vangloria com esse seu acto liberal. Creio até que s. ex.ª não viu n'essa occasião os inconvenientes que resultariam d'esse favor, o qual, afastando se da lei, a não contrariava comtudo abertamente. Mas esses inconvenientes appareceram, como s. ex.ª claramente mostra na portaria de 16 de janeiro. (Leu.)

Ora que culpa teria o paiz em que desse logar a abusos e fraudes o favor do sr. ministro do reino? Estivesse muito embora de pé a doutrina da portaria de 1873, em quanto se não mostrassem os inconvenientes a que esse favor dava logar; mas logo que se reconheceu que esse favor abria porta a abusos, o a fraudes, o que devia fazer o sr. ministro do reino? E clarissimo. Retirar a portaria de 1873, em vez de remediar os inconvenientes d'esse favor, já por si illegal, contrariando abertamente a lei do reino.

Não quero demorar-me n'esta questão, pois como já disse, e estimo ter occasião de repetir, ella foi habilmente tratada n'esta casa. Mas o que é verdade, sr. presidente, o que se não póde negar, é que a portaria de janeiro veiu renovar as remissões, introduzindo as fianças. (Muitos apoiados.) E não vejo que sobre isto possa haver a menor duvida.