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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

sêllo os titulos cujo desembolso é parcial, e aquelles cujo desembolso é total, mas se se estabelecesse na lei que o imposto recairia sobre o valor desembolsado, a disposição seria muitas vezes inexequivel e daria logar a muitas duvidas.

Quando os titulos não expressem se o desembolso é total ou parcial, deve presumir-se que é total e em tal caso o sêllo recáe sobre o unico valor, valor nominal, expressado no titulo.

Quando o titulo declare que o desembolso é ainda imcompleto, é claro que a cotação d'esse titulo nas bolsas ha de ser proporcionada ao valor do desembolso, e que e este valor o que verdadeiramente constitue a nominal do titulo.

Creio que mais nenhuma consideração apresentou o illustre deputado sobre o assumpto que se discute, e por isso termino aqui as minhas observações.

Discurso do sr. deputado Lopo Vaz, pronunciado na sessão de 16 de março, e que devia ler-se a pag. 648, col. 2.ª

O sr. Lopo Vaz: — Não sei qual foi o motivo que imperou no animo do sr. ministro da fazenda do governo transacto para estabelecer no § 3.º do artigo 2.° que se exceptuassem os inventarios; e se me for permittido apresentar uma reflexão direi, que parece que a idéa do governo foi applicar á nossa legislação esta parte do artigo 2.° da lei franceza com data de 30 de março de 1872, d'onde este artigo é litteralmente copiado e traduzido.

O facto é que, para bem atinarmos com os motivos d'esta disposição, teremos de estudar os motivos da lei franceza e não da proposta portugueza, e isto sem censura nem insinuação para ninguem.

Na nossa legislação, e sobretudo na nossa legislação financeira, nota-se um certo prurido de aproveitar ou copiar litteralmente as disposições das leis estrangeiras, sem se pensar sobre se por ventura são ou não applicaveis ao paiz e ao nosso estado de civilisação e desenvolvimento.

Propunha-se, por exemplo, na proposta do governo o imposto de sêllo sobre todos os cheques!

É outra copia da lei franceza, mas o auctor da proposta não tomou em consideração que em França os depositos á vista são quasi monopolisados por um só banco que domina em todo o paiz, o banco de França, que é um grande potentado, e que póde soffrer as contrariedades que d'esse imposto hajam de provir.

Os immensos recursos, de que dispõe pelo quantitativo extraordinario das suas transacções, podem fazer face a esse imposto, mas no nosso paiz onde ha a mais completa liberdade bancaria, onde os nossos estabelecimentos, por assim dizer, lutam com difficuldades para alargar as suas transacções, onde de mais a mais os depositos á vista estão muito pouco generalisados, o imposto sobre todos os cheques poderia causar graves transtornos.

É preciso que v. ex.ª note que em França a principal verba dos depositos á vista é a chamada depositos de desconto.

O commerciante vae ao banco descontar a sua letra e deposita no mesmo banco a importancia do desconto. Estes depositos ainda que á vista e sem vencimento de juro não são afugentados por um pequeno imposto sobre os cheques, porque o depositante para ter a certesa de ser considerado pelo banco na repartição do desconto não deixa de depositar á vista no mesmo banco as quantias adquiridas a troco dos effeitos descontados e portanto submette-se ao imposto sobre os cheques.

No nosso paiz, em que o principal quantitativo dos depositos á vista não é proveniente immediatamente de descontos de letras feitos nos bancos, se porventura lançassemos sobre todos os cheques algum imposto, a consequencia necessaria era que os depositos gratuitos fugiam d'esses bancos.

Eu não quero defender os interesses dos bancos; quero defender os interesses do paiz.

Pelo moderno; systema economico os bancos de circulação são os intermediarios entre o capital e o commercio e industria; e por consequencia os capitaes que fugirem dos bancos de circulação vão faltar ás transacções commerciaes, industriaes e agricolas.

Voltando, porém, ao assumpto a que se referiu o illustre deputado, o governo transacto não teve outro fundamento para estabelecer a excepção relativa aos inventarios na sua proposta de lei, senão o facto de ter encontrado exarada essa excepção na legislação franceza, é realmente não vejo grande difficuldade em se permittir que nos inventarios se descrevam os titulos não sellados, com tanto que as partilhas se não façam sem elles terem o séllo devido.

Não vejo inconveniente n'isso, mas é preciso que se diga tambem que não julgo necessaria tal disposição, em face da redacção do § unico do artigo 2.° do projecto em discussão, porque o cabeça do casal, que descreve os titulos, ou está na posso d'elles e facilmente os manda sellar, ou não está, e n'esse caso póde descrevel-os ainda que não estejam sellados.

O sr. Augusto Godinho: — Paga multa?

O Orador: — Paga multa quem os descreve sem os sellar, se por ventura é dono, possuidor ou detentor d'elles, mas não paga multa quem descreve titulos não sellados, de que não é dono, possuidor ou detentor.

É esta a modificação que se faz no projecto á disposição consignada na proposta do governo.

Segundo esta proposta, e portanto segundo a lei franceza, estão sujeitos a multa todos os que mencionarem em qualquer acto ou documento titulos que não estejam devidamente sellados, mas a commissão de fazenda entendeu que esta disposição era grave e inconveniente com tamanha latitude, e por isso propõe que só seja applicavel aos que forem donos, possuidores ou detentores dos titulos.

Emquanto á duvida a que o illustre deputado se referiu, que julga poder haver nas bolsas e mercados das nações estrangeiras em acceitarem os titulos d'essas nações que por ventura tenham algum pertence, ou indosso feito em Portugal, se por ventura não tiverem sido sellados, devo dizer que santa duvida seria essa. Oxalá que ella se dê, e que os governos e mercados estrangeiros nos ajudem d'essa fórma.

Nós desejâmos todos a execução das leis, e portanto se os governos e mercados estrangeiros se preoccuparem com a circumstancia, a que o illustre deputado se referiu, é um forte auxilio que nos dão.

Mas descance s. ex.ª, porque de certo se não preoceupam com tal assumpto.

Receia tambem s. ex.ª que em face da redacção do artigo 2.° § unico do projecto em discussão possa aventar-se duvida sobre se são ou não nullos todos os actos ou documentos em que se mencionem titulos estrangeiros não sellados.

É certo que o codigo civil estabelece o preceito de que os actos contrarios á lei expressa são nullos, salvo quando a lei disser o contrario, mas segundo as regras de hermeneutica juridica a lei especial prefere á geral, e por consequencia não é applicavel ás questões relativas a imposto do sêllo aquella disposição do codigo civil, porque ha lei especial e posterior sobre o assumpto, que é a lei de 2 de abril de 1873.

O artigo 9.° da lei de 2 de abril de 1873 sobre o sêllo diz o seguinte: «A pena de nulidade pela transgressão da lei e dos regulamentos que estabelecem o imposto do sêllo fica abolida.»

Já vê por consequencia o illustre deputado que, não estabelecendo nós a pena de nulidade, não podem em caso algum os tribunaes entender que, no caso dos titulos não

Sessão de 19 de março de 1878