O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

716 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

déficit, poz-lhe às costas o feixe de lenha com que Isaac havia de ser queimado no alto do monte.

O sr. presidente do conselho, espécie de Abrahão financeiro, tomando o déficit, menino Isaac de s. exa. porque elle é o filho dilecto do nobre presidente do conselho, tambem quiz sacrifical-o nas alturas do seu patriotismo, e poz-lhe às costas, a modo de feixe de lenha, um molho de fachinas mal ligado com o fraco cordel do seu relatorio, preparando-se para queimar, não o próprio deficit, mas a rasão, o bom senso e os mais caros interesses do paiz. (Riso.)

Porque ha uma differença entre Abrahão e o sr. Fontes: é que a lenha levada por Isaac ao cume do monte, levantou ao céu as chammas de um sacrifício propiciatório, agradável á divindade, emquanto o molho das fachinas do sr. Fontes, ou das propostas de fazenda, não accenderá o fogo que purifique as podridões do nosso organismo económico ou dissipe os negrumes do nosso estado financeiro, mas póde aumentar a chamma que devora toda a prosperidade do paiz.

Emfim, visto que o nobre presidente do conselho não nos quer dar nem um methodo de regeneração económica, nem ao menos um systema de reorganisação da fazenda publica, e apenas nos apresenta um molho de vergastas com que açouta o bom senso, fustiga a economia política o corre o perigo de rasgar a pelle ao povo, tomemos uma dessas vergastas, vejamos o que ella é, e para que serve.

Esta agora em discussão, é a primeira. De tal proposta bem disse o sr. Pinheiro Chagas, que constituo um imposto improductivo, estancando algumas das fontes da riqueza nacional, protegendo o contrabando e não dando ao thesouro nem a decima parte do rendimento que o sr. Fontes calcula.

Não discuto neste momento, porque não julgo necessario discutil-o agora, e não faltara occasião para o fazer, o pensamento de acabar por uma vez com o deficit, nem trato de outras propostas financeiras, de que o governo espera grandes redditos; não discuto tambem a diflerença entre despeza ordinaria e despeza extraordinaria, nem a que exista entre deficit ordinario e deficit extraordinario.

Digo apenas ao nobre presidente do conselho, que a concepção do sr. Barros Gomes e de outros ministros da fazenda, quando distinguiam as despezas ordinarias das despezas extraordinarias, era tão rasoavel, como não é racional a distincção que se faz agora entre despeza ordinaria e despeza extraordinaria, entre deficit ordinario e deficit extraordinario, quando se quer extinguir o desequilibrio entre ,a receita e a despeza do estado.

É bom distinguir a despeza ordinaria da despeza extraordinaria, e do deficit ordinário do déficit extraordinario, quando se trata de evidenciar ao paiz quanto elle gasta com as despezas ordinarias do serviço publico, e quanto com os melhoramentos de diversas ordens, quer productivos, quer não devidamente productivos.

É rasoavel dizer então quanto de déficit resulta de melhoramentos materiaes, e quanto provém das necessidades do serviço ordinario; mas quando se trata de extinguir o déficit, a distincção entre deficit ordinario e deficit extraordinário, não é aquella que póde vir da applicação que as despezas tinham, mas sim a que provém do tempo que as despezas podem durar.

Extraordinárias são as que se fazem um, dois annos, por excepção, e depois desapparecem do orçamento. Ordinárias são as que persistem por largo tempo. A applicação não determina o modo como umas e outras criam ou augmentam o deficit.

Ora, quando as chamadas despezas extraordinarias são d'aquellas que se reproduzem todos os annos, e podem repetir-se por longos annos, é absurdo suppor que ellas influam no deficit de modo diverso d'aquelle por que as ordinarias influem. Citarei alguns exemplos, para que esta doutrina fique bem clara.

Em quantos annos se calcula que estará construída toda a rede de estradas municipaes e districtaes do reino? Creio que o calculo mais optimista, a continuarmos no andamento em que vamos, não exige menos de trinta ou quarenta annos para essas obras se concluirem. Durante esses trinta ou quarenta annos havemos de ter inscripta no orçamento a verba de 320:000$000 réis destinados ao subsidio destas estradas. Logo essa verba influe no deficit do mesmo modo que qualquer das despezas denominadas ordinárias. Por consequência não é despeza que se possa classificar como despeza extraordinaria, quando se quer extinguir o deficit.

Outro exemplo.

O sr. presidente do conselho declara, que não calcula para a extincção do déficit aquella despeza extraordinária que resulta da construccão de estradas reaes.

Ora toda a gente vê que pelo caminho em que vamos, e o systema seguido com relação á construcção d'estas estradas, constitue um dos grandes desperdicios da administração publica. Estas estradas não estarão construídas em menos de vinte ou trinta annos; durante esses annos havemos de ter inscripta no orçamento a verba de réis 700.000$000, aggravando ordinariamente o deficit.

Uma simples consideração mostrará facilmente ao sr. presidente do conselho e á camara, quanto o raciocínio de s. exa. é, não quero dizer insensato, porque n3o desejo proferir palavra que fira qualquer pessoa, mas injustificavel.

Imagine o sr. presidente do conselho, que resolvia construir num anno todas as estradas reaes que faltam, e que para isso contrahia um empréstimo, amortisavel em vinte annos, que custava 700:000$000 réis de juro e amortisação por anno. Era ou não era esta verba de 700:000$000 réis uma despeza ordinaria? Era sem duvida.
Pois igualmente constitue despeza ordinária a verba consignada no orçamento para a construccão dessas estradas a retalho. Os effeitos sobre o déficit são os mesmos, e, portanto, a distincção feita no relatorio de fazenda é inadmissivel.

Também não quero n'este momento criticar minuciosamente, e não quererei nunca , afeiar ao sr. presidente do conselho os erros-as inexactidões, digo melhor, em que o seu relatório abunda.

Uma apenas lhe apontarei, não com espirito de aggressão politica, mas para que o sr. presidente do conselho se convença de que não bastam os mais altos dotes de espirito, o mais acrisolado patriotismo e a melhor vontade para forjar sobre o joelho trabalhos que exigem meditação e estudo. Grande é Deus, e levou sete dias a fazer o mundo.

Diz o sr. presidente do conselho, no principio do seu relatorio, estas palavras, e dil-as sobre um assumpto que tem intima relação com aquelle que estamos discutindo:
"No anno de 1872 tinha eu a honra de ser ministro da fazenda, e as leis de 14 de maio d'aquelle anno accusavam uma despeza de 22.468.000$000 réis, e uma receita, á parte as deducções, de 20.243:000$000 réis. Era o deficit, portanto, de 2.220:000$000 réis. Não se votaram então todos os impostos que eu propuz, e auctorisaram-se despezas com que o thesouro mal podia."
Não posso passar adiante sem notar á camara, que o sr. presidente do conselho deixou aqui na sombra factos muito importantes, e foi da mais assombrosa modéstia. Já ouvi dizer a s. exa., que acceitava todas as responsabilidades da sua administração, desde o dia em que entrou, e da administração anterior acceitava a responsabilidade moral, mas não a legal, nem a constitucional. Pareceu-me singular a doutrina, e agora vejo que s. exa. até se esquece da responsabilidade dos seus actos.

"Auctorisaram-se despezas com que o thesouro mal podia", allega elle, mas innocentemente esquece que deu o glorioso exemplo não fazer enormes despezas sem auctorisação nenhuma.

Em 1877 o sr. duque d'Avila quasi não teve tempo para