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12 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Não pode deixar de ser essa a justificação da sua these, porque, existindo a commissão ha dois meses, S. Exa. podia ter-se informado de qual tem sido nessa comnmissão o procedimento d'elle, orador, e então veria que, tendo o Sr. Affonso Costa feito na Camara um programma do que entendia que devia ser o inquerito sobre os adeantamentos, nessa mesma noite, na reunião da commissão, se verificou que tudo quanto S. Exa. queria que se fizesse se encontrava no questionario organizado pelo relator, assim como n'elle tambem se continha, com uma pequena modificação que depois se fez, o que o Sr. Antonio José de Almeida desejava.

O Sr. Brito Camacho é um homem de bem; pede, portanto, a S. Exa. que precise o motivo concreto que o levou a considerar menos idonea a situação delle, orador, nessa commissão, e diga se ao seu conhecimento chegou qualquer facto, discurso, palavra, gesto ou jogo physionomico que o levasse a suppor que elle, orador, tinha empenho em protelar os trabalhos da commissão ou impedir que viesse á superficie toda a realidade dos factos.

A S. Exa. pede tambem que lhe diga se, fora da sua qualidade de relator, tem conhecimento de algum facto em que elle, orador, antepusesse ao cumprimento dos seus deveres officiaes os interesses pessoaes.

Se o não fizer, se não citar facto algum concreto, fica sem justificação a falta de justiça com que S. Exa. o tratou.

Aguarda, as explicações leaes que, está certo, o Sr. Brito Camacho lhe vae dar, e desde já pede ao Sr. Presidente que lhe reserve a palavra para depois, porque este incidente carece de ter uma sancção.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Chamo a attenção do illustre Deputado.

Sem uma resolução da Camara, não posso alterar a ordem da inscrição, por isso tenho successivamente de ir dando a palavra aos oradores inscritos, se...

O Sr. Eduardo Burnay: - Eu não quero abusar da benevolencia da Camara...

Vozes: - Fale, fale.

O Sr. Presidente: - Se V. Exa. deseja que a ordem da inscrição seja alterada, de modo que possa dar a palavra ao Sr. Deputado Brito Camacho, digne-se V. Exa. mandar o requerimento para a mesa.

O Sr. Eduardo Burnay: - Eu desejava que S. Exa. falasse, mas não quero, de forma alguma, affrontar a regularidade dos trabalhos.

Vozes: - Fale, fale.

O Sr. Presidente: - Em vista da manifestação da Camara, tem a palavra o Sr. Brito Camacho.

O Sr. Brito Camacho: - Recorda-se decerto a Camara do modo como foi levantado este incidente.

Disse o Sr. Burnay que não tinha responsabilidade de não ter sido ouvida a leitura do seu officio, pedindo licença para se ausentar. Assim é, mas essa responsabilidade não cabe a elle, orador, nem aos outros Deputados que tambem a não ouviram porque todos sabem a maneira como é lido o expediente e como elle, na maioria dos casos, passa despercebido.

Foi por não o ter ouvido que o incidente não foi logo levantado e de o ter levantado no dia seguinte nos termos em que o fez não se encontra arrependido.

O Sr. Eduardo Burnay não é só relator da commissão de inquerito: é tambem administrador da Companhia dos Tabacos, interessado na venda dos tabacos, director de um jornal que faz a politica financeira de um banqueiro...

O Sr. Eduardo Burnay: - Observa que nunca fez politica financeira.

O Orador: - O que sabe é que esse jornal foi adquirido pelo Sr. Conde de Burnay e pelo Comptoir d'Escompte, e que depois, tendo esse Banco largado a sua parte, ficou pertencendo só ao Sr. Conde de Burnay, e que faz a sua politica financeira. Se o Sr. Eduardo Burnay fez ou não a politica financeira desse jornal não o pode dizer, porque os artigos não são assinados.

Fora das qualidades que apontou no Sr. Eduardo Blurnay, nada tem a dizer de S. Ex.a, porque quasi o não conhece.

Disse S. Exa. que este incidente devia ter sido levantado ha dois meses, quando foi escolhido para relator. Já num aparte que fez a S. Exa. lhe disse que, logo que teve conhecimento do facto, se indignou contra elle, por militarem em S. Exa. as qualidades que já referiu, e que se não tratou logo do caso na Camara, e no jornal de que é director, é porque esperava a opportunidade, que tinha a certeza de que havia de vir, provocada pelo relatorio, por qualquer membro da commissão ou pelo proprio orador.

S. Exa. arredou da discussão a questão pessoal e fez bem, porque isso o colfocou á vontade para lhe responder.

S. Exa. reputa inanes as razões por elle, orador, adduzidas, mas o seu ponto de vista é que é differente do d'elle, orador.

Elle, orador, não tem o habito de trazer para a Camara o que ouve na Sala dos Passos Perdidos ou em outra qualquer parte; mas o que pode garantir a S. Exa. é que a sua nomeação para relator não mereceu o applauso de ninguém, tanto mais que nessa occasião não faltou quem dissesse que S. Exa. se tinha empenhado em ser o relator da commissão.

Ser irmão de um banqueiro, redactor politico do jornal desse banqueiro, administrador da Companhia dos Tabacos, que está sempre em conflicto com o Estado, signatario da circular que ha pouco foi dirigida ás camaras municipaes, serão razões inanes, mas não tanto como a S. Exa. se afiguram.

Não quer fatigar a Camara fazendo o estudo detalhado do que tem sido a tragédia deste país desde que o Sr. Conde de Burnay começou a negociar com o Estado ou por conta do Estado.

Desde 1872-1873, em que se lançou um pequeno empréstimo nacional, o Sr. Conde de Burnay fez a sua ap-pariçao na scena financeira deste país. Appareceu depois na sociedade do Palacio Cristal do Porto, e como intermediario, entre Lisboa e Porto, de todos os emprestimos que se fizeram no país. Formou-se então, para combater o syndicato Burnay, o syndicato Santa Apolonia, que afinal veio a fazer o jogo d'aquelle. Torna a salientar-se em 1876 e de 1879 para cá pode dizer-se que não houve nenhum negocio de dinheiro, grande ou pequeno, em que elle não fosse interessado e o principal negociador.

Podem, dizer-lhe que todos os Estados teem um banqueiro. É certo; mas quando se fizer a historia a valer, documentada e sem paixão, das relações financeiras entre a casa Burnay e o Estado e entre a Casa Real e a casa Burnay, ver-se-ha que sempre essa casa legitimou os seus titulos de estrangeira pondo-se sempre ao lado dos banqueiros estrangeiros contra os interesses nacionaes, e como essas operações foram uma especie de coacção exercida em certos momentos sobre o Chefe do Estado.