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signatarios da representação, manifestações que não mereço, porque entendo que a maior recompensa que o homem publico póde ter é quando desempenha o seu dever, manifestando consideração por aquelles a que sempre respeita.

O sr. Ayres de Gouveia: — Mando para a mesa uns pareceres que me tinham sido distribuidos como membro da antiga commissão de fazenda, e como não tenho a honra de fazer parte da commissão que foi eleita este anno, peço que lhe sejam remettidos.

Aproveito a occasião para agradecer ao meu honrado collega, o sr. Faria Guimarães, as phrases que me dirigiu, não só benevolas, mas lisonjeiras.

ORDEM DO DIA

continuação da discussão do projecto de lei n.° 24

O sr. Ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello): — A situação é grave, não o podemos dissimular; é grave, porque o assumpto de que se trata é dos mais importantes que póde ser trazido á téla parlamentar; é grave, porque a opinião publica, mais ou menos, se preoccupa com o resultado das medidas que estão sujeitas á deliberação da camara. O governo, quando resolveu trazer ao seio da representação nacional as suas idéas formuladas em proposta de lei, para resolver quanto era possivel nas circumstancias actuaes a difficil questão de fazenda, não ignorava nem a importancia do assumpto, nem a impopularidade que elle traz constantemente, nem as resistencias que fez nascer, nem as difficuldades que se haviam de levantar diante dos passos dos ministros. Todos sabem que as medidas mais impopulares em qualquer paiz do mundo são as que tendem ao augmento do imposto, que o contribuinte paga para as despezas geraes da nação; todos sabem que não póde ser por gosto, prazer ou vaidade que um governo qualquer apresenta aos corpos legislativos as propostas que entende necessarias e indispensaveis para o melhoramento das finanças do paiz; todos sabem que ninguem vota por complacencia, por amor, ou por satisfação medidas d'esta ordem, que, embora tendam a melhorar sensivelmente as finanças do estado e as condições d'elle, afastam a popularidade de quem o vota, e incommodam o contribuinte que os detesta, geralmente fallando.

Mas acima de todas estas considerações actuou no espirito do governo um grande principio, mais alto que tudo quanto se póde apresentar — o da salvação publica, porque, no estado a que as cousas chegaram não se póde deixar de pôr ponto n'esta roda, que tem desandado de uma maneira altamente prejudicial para os interesses mais caros da nação, e constituirmo-nos de modo que possamos mostrar aos nacionaes e estranhos, que temos condições de nacionalidade, e de existencia politica; porque não a tem a nação que não póde pagar os seus encargos (muitos apoiados).

Nem estranho, nem censuro, nem me assoberbam as representações populares. Nasci com o sol da liberdade e creei-me ao seu bafejo. O seu ambiente não me suffoca, porque estou persuadido de que n'ella se firma a prosperidade do meu paiz e o futuro da humanidade (apoiados).

Desejo todas as manifestações, quero ouvir todos os alvitres, apresentem-se todas as idéas, suscitem-se todos os melhoramentos; mas, depois de tudo bem pesado, depois de tudo bem reflectido, depois de tudo bem considerado, aos corpos politicos que constituem o estado é que pertence a suprema missão de decidir a questão pelo lado mais favoravel ao paiz (muitos apoiados). Estes são os fundamentos em que assenta o systema liberal, esta é que é a liberdade que quero ver restabelecida no meu paiz, e pela qual hei de combater sempre, e por todos os modos, porque entendo que procedendo assim, não sómente cumpro o meu dever, mas satisfaço a uma conveniencia e a uma necessidade de primeira ordem da sociedade.

Não ignorava o governo que haviam de apparecer resistencias e difficuldades, mas confesso que as esperava ainda maiores, e para tudo estava preparado o nosso animo. A nossa resolução é inabalavel dentro dos limites estrictamente da constituição e das leis. Assim como o governo não consente que ninguem ultrapasse esses limites, tambem havemos, conscios do nosso dever, circunscrevermo-nos dentro das formulas e das prescripções que a constituição e as leis estabelecem (muitos apoiados).

O deficit que afflige o nosso paiz não é de hoje, nem de hontem, nem de ha poucos annos, é consequencia não de responsabilidades particulares de ninguem, mas das de muitos.

Não venho regatear a responsabilidade, não venho impô-la a nenhum dos meus antecessores, mas quero unicamente arredar de mim aquella que se me pretende impor injustamente, querendo-se fazer acreditar ao publico que o deficit que existe é proveniente dos actos d'esta administração (apoiados), é dos homens que se sentam n'estas cadeiras (muitos apoiados). Foram as necessidades, foram os acontecimentos, foram, se quizerem, os erros de muitos individuos que produziram o resultado em que estamos, e de que se não póde lançar a culpa a um só, como tendo creado as difficuldades com que actualmente se luta (muitos apoiados). E a nós o que nos cumpre é elevarmo-nos acima das paixões pequenas, que tratam unicamente de lançar aos outros a responsabilidade que de facto pertence a todos, e dizer a verdade ao paiz. Dizer ao paiz que se hoje é necessario prover aos 5.600:000$000 ou 6.000:000$000 réis de deficit, porque se não proveu o anno passado, porque se não proveu ha dois annos, porque se não proveu ha quatro; e, se daqui por diante elle se elevar de 6.000:000$000 a 8.000:000$000, 10.000:000$000 ou a 20.000:000$000 réis, ha um certo limite além do qual o paiz não póde pagar, porque seria necessario esgotar todas as forças vivas de actividade humana para habilitar o thesouro do estado a prover a taes encargos! Mas felizmente essa occasião ainda não chegou; comtudo a nossa situação obriga imperiosamente aos homens de coração, amantes da sua patria, a dizer-lhe a verdade, e que é preciso e indispensavel que pague, porque nos sentimentos do paiz está acima de tudo a dignidade d'elle e o seu decóro:

Quando se disser isto, não haverá amigos ou adversarios, porque é assim; é lastima que se faça politica de um assumpto que interessa tão immediatamente á mais importante das necessidades publicas.

Quando isto se disser, o povo ha de pagar, porque o povo é bom, e só momentaneamente póde ser arrastado pela politica; e quando entregue ao seu proprio e brioso sentimento, nunca desdiz do bom senso que se lhe deve suppor.

Não pareça isto um paradoxo, porque a paixão de momento póde arrastar o homem e transvia-lo do verdadeiro caminho; mas o bom senso que Deus lhe deu para extremar o bem do mal, cedo ou tarde se manifesta, e faz-lhe conhecer a justiça onde ella existe.

Temos um deficit de 6.000:000$000 ou 5.600:000$000 réis, quero dizer, quasi a quarta parte da nossa despeza, e superior ao que tem quasi todas as nações da Europa (apoiados); mesmo as mais infelizes, as mais attribuladas, e aquellas que têem estado em circumstancias extremamente difficeis. A propria Italia, que acaba de engrandecer-se, lutando com gravissimas difficuldades internas e externas, não tem um deficit igual ao nosso (apoiados).

Ainda ha pouco, na tribuna italiana dizia o ministro da fazenda, que o orçamento apresentava um deficit de 185.000:000, que corresponde a 18 por cento da sua despeza, e no nosso infelizmente corresponde a 24 e 25!

Quando se esta n'estas circumstancias; quando o paiz não é d'este governo, nem d'esta maioria, nem d'esta opposição, mas de todos nós (apoiados), parece-me que todos devemos fazer um pequeno sacrificio do nosso amor proprio, eu serei o primeiro a faze-lo, se preciso for, porque não tenho duvida em modificar as íeis que proponho em todos os pontos que se julgar rasoavel, porque entendo que é necessario aprofundarmos a ferida e applicar-lhe o remedio, e porque esse facto não importa salvar a actual situação, mas sim o paiz (apoiados).

E preciso pois que tenhamos a coragem civica para dizer a verdade ao paiz, e que façamos tudo quanto podermos para manter o seu decoro para com nacionaes e estrangeiros (apoiados).

Quando o ministro da fazenda, a que já me referi, dizia ao parlamento italiano que tinha 185.000:000 de deficit, acrescentava «se eu não reconhecesse as difficuldades porque têem luctado o meu paiz n'estes ultimos annos; se não visse que acabava de fazer uma guerra, na qual se consumiu mais de 350.000:000; se não soubesse que as difficuldades de toda a ordem que nos rodeiam impedem muitas vezes que se possa levar até ao heroismo a abnegação de si proprio, diria ao meu paiz: temos 185.000:000 de deficit, pagar mais 185.000:000 de impostos». Mas não o fez, e eu tambem o não faço nem o digo, porque não posso, nem devo dize-lo, e sobretudo porque não é preciso dize-lo, pois creia V. ex.ª que se o dissesse era porque tinha a convicção profunda de que isso era uma necessidade da minha patria. Tinha coragem de sobra, a coragem civica que nem todos têem, e que muitas vezes é mais difficil de encontrar do que a outra (apoiados); tinha a coragem civica de carregar com todas as impopularidades do mundo, e de dizer ao meu paiz—é necessario pagar mais, e pagar tanto quanto é o deficit. Felizmente não é preciso dize-lo; porque convem que não exageremos as necessidades até ao impossivel, até ao absurdo, até parecer que creámos difficuldades para as vencermos depois, porque isso é impolitico, inconveniente e improprio de homens serios, e que estão costumados a gerir as cousas publicas ha muitos annos (apoiados).

Mas o que digo eu agora que não tenha dito ha mais tempo, que não tenham dito todos os homens publicos que têem assento n'esta casa, todos aquelles que têem estado á frente dos negocios, e os que têem apoiado ou combatido era diversas occasiões? Digo que não se póde resolver, nem de uma só vez nem por uma só fórma, a questão de fazenda em Portugal. A questão de fazenda entre nós assumiu proporções taes, que não é possivel resolve-la de um dia para o outro sem pôr em sobresalto milhares de interesses e milhares de direitos, sem assoberbar o paiz com contribuições que elle de repente não póde supportar (apoiados).

Portanto, o que é necessario fazer é recorrer ao imposto, é fazer todas as economias compativeis com o serviço publico, e recorrer ainda ao credito por algum tempo ao credito, de que nos devemos ir desembaraçando successivamente, até collocarmos as finanças do paiz em circumstancias de não carecerem do seu auxilio regular e periodico (apoiados).

E sabe V. ex.ª a rasão por que Portugal se conserva, e graças a Deus que se conserva, apesar dos esforços que involuntariamente se fazem em sentido contrario — digo involuntariamente, porque não attribuo a ninguem que o tenha feito no intento de prejudicar os interesses do paiz dentro e fóra d'elle; sabe V. ex.ª a rasão porque o paiz se conserva com a importancia e credito que hoje tem, a rasão por que fóra do reino os nossos fundos estão a 42 ou 43, e dentro do reino a 46? E porque toda a gente tem o convencimento profundo de que o paiz tem uma materia collectavel muitissimo superior aos encargos que actualmente pesam sobre elle. Se não fosse este convencimento, se não fosse esta verdade que esta arreigada no espirito de todos, V. ex.ª e a camara sabem que nós, com 6.000:000$000 réis ou mais em aberto no orçamento da despeza, -não podiamos manter-nos na altura em que nos achâmos (apoiados). Este convencimento, esta verdade, que esta no espirito de todos, é que faz com que nos respeitem, conservando felizmente os fundos e o credito na altura em que estão em outras nações mais poderosas do que nós (apoiados).

Mas todas as nações recorrem aos meios que eu indiquei ha pouco? Creio que ainda se não descobriu meio ou expediente algum de resolver as difficuldades financeiras de um paiz, além d'estes que eu estou indicando á camara; e dar-me-ia por satisfeito e por feliz se porventura algum dos meus illustres collegas d'esta casa podesse sugerir-me um ou muitos alvitres que dessem em resultado uma situação menos penosa e uma solução menos dolorosa para quem a promove e para quem a supporta. Todas as nações obedecem ás indicações apontadas, todas recorrem ao imposto, todas recorrem ao credito, e todas recorrem dentro de certos limites ás economias [apoiados).

Porém eu chamo a attenção dos illustres deputados para o que se tem feito e esta fazendo em outras nações, que lutam com difficuldades similhantes ás nossas, e não receio a comparação entre as propostas que este governo tem apresentado ao parlamento e as que se têem feito lá fóra, quando em nome das economias se trata tambem de reduzir as despezas publicas.

A Italia, que esta a braços com grandes difficuldades, o que fez quando eu apresentei n'esta casa o relatorio com as propostas de lei de fazenda do ministerio a meu cargo? Apresentou, pela iniciativa do seu ministro da fazenda daquelle tempo, porque já não é hoje o mesmo que era então; apresentou, digo, propostas que, diga-se a verdade, por uma coincidencia muito excepcional eram, até certo ponto, quasi as mesmas, no fundo se entende, que eu tive a honra de apresentar ao parlamento.

Quero dizer, apresentou, e isto era na sessão de 15 ou de 16 de janeiro, uma reforma de pensões, como eu apresentei, apresentou um imposto de consumo; apresentou uma reforma do imposto do sêllo, como eu propuz; e fez, além d'isso, o que eu não faria nem proporia, indicou um imposto sobre as moagens que, segundo se entendeu, devia render pelo menos 35.000:000 francos.

N'esta parte estimo que as circumstancias fizessem com que nós nos podessemos afastar d'esta violencia, porque ninguem póde deixar de reconhecer que é um grande beneficio, feito á classe que mais soffre e que mais padece, alliviada do imposto sobre o genero mais indispensavel e mais geral para a vida, como é o pão (apoiados).

O sr. Carlos Bento: — Fez as propostas, mas o ministerio caiu.

O Orador: — Fez as propostas e o ministerio caiu, mas o illustre deputado sabe muito bem que elle não caiu em virtude da discussão d'estas propostas, que caiu principalmente em virtude da questão dos bens ecclesiasticos que levantou certas apprehensões, mas que não tem nada com este objecto.

O sr. Carlos Bento: — Eu tambem sei a historia. O Orador: — Isso de certo, e muito melhor do que eu; nem tenho pretensões de discutir historia com o illustre deputado.

De mais a mais ainda ha outra cousa. Não estou fazendo a apreciação da politica italiana; analysando-a, não o faço senão quanto me basta para a argumentação em defeza dos meus projectos. Não discuto se a Italia fez ou não fez bem em estabelecer um imposto de moagens, porque é um assumpto completamente estranho ao meu proposito; digo só, porque é da historia, que este imposto se propoz, e que não é a primeira vez que se propõe; quero dizer, os homens publicos dos diversos ministerios que se têem succedido n'aquelle paiz têem entendido que a necessidade publica é tão imperiosa, apesar de o ser muito menos do que entre nós, que é preciso chegar até ao pão do pobre.

Veja portanto a camara se tenho rasão de trazer isto como argumento, e não como defeza d'este imposto, porque o governo não só não propoz, mas fez mais do que isso, propoz que se acabasse com o imposto sobre o pão, que existe em mais de cincoenta concelhos do reino. Quando o governo faz isto, creio que póde fallar do imposto que se pretende estabelecer na Italia, sem se consubstanciar com as idéas que lá o determinam.

Mas para que me canso eu com os impostos? Os impostos não são combatidos. Veja a camara como os illustres deputados estão antecipadamente justificando a proposta do governo; porque, com rarissimas excepções, quasi que nem uma palavra se diz a respeito do projecto em discussão.

Falla-se na questão de fazenda, falla-se no preço por que o governo levantou fundos em Londres, falla se na violação da lei de 16 de junho de 1866, falla-se no orçamento, falla-se na receita, falla-se na despeza, falla-se nos quadros das repartições; falla-se em tudo, n'uma palavra, e só se não falla no projecto. Grande justificação e grande defeza lhe fazem os nobres deputados! (Apoiados.)

Se o não podem combater, não se levantem a desviar difficuldades e a tornear a posição. Dizem ao governo: «Faça economias, discuta o orçamento»; mas não dizem — este imposto é mau, é absurdo, e as bases em que elle esta indicado não são as convenientes. Não dizem isto; se fallam em impostos é só para dizer que preferem os directos aos indirectos, e a questão não se discute. Ninguem ainda discutiu o projecto, e estamos a fallar ha oito dias. Quer dizer, os illustres deputados guardam-se para fallar n'isso quando a discussão tiver acabado (apoiados). Grande justificação é esta, repito.

Não esperava isto; confesso ingenuamente á camara que me tinha prevenido para justificar a medida proposta, não para glorificar o imposto de consumo, porque não sympathiso com elle (apoiados), tambem não morro de amores por elle, nem por imposto nenhum, devo declara-lo. Concordo que o imposto de consumo, theoricamente considerado, tem difficuldades e inconvenientes que não se encontram no imposto directo. Mas devo dizer tambem á camara