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O sr. José de Moraes: — Pedi hontem a palavra, quando fallava o illustre deputado, o sr. Severo de Carvalho, porque desejava responder ás observações apresentadas por s. ex.ª

Disse hontem o sr. Severo de Carvalho que = eu pretendia fazer sabbatina constante, discutindo interpellações =; e quiz s. ex.ª estigmatisar o reparo por mim feito da não comparencia do sr. ministro da justiça antes da ordem do dia.

Eu não posso ter os srs. ministros em sabbatina constante, porque fallam mais alto do que eu, e o illustre deputado, que sinto não ver presente, as actas e o Diario de Lisboa, por onde se vê que o sr. ministro da justiça nunca esteve presente antes da ordem do dia.

O illustre deputado ha de permittir-me que lhe diga que não aceito os seus conselhos, nem os de pessoa alguma, indicando-me a maneira como me devo dirigir n'esta casa.

Estou no meu direito de fazer interpellações aos srs. ministros, sem receber censuras do sr. Severo de Carvalho. O illustre deputado póde n'esta casa guiar-se pela sua consciencia e pela sua intelligencia, mas a minha consciencia e a minha intelligencia, ainda que pequenas, dão-me direito a fazer o que entender, não recebendo reflexões de nenhum deputado, e muito menos do sr. Severo de Carvalho.

Disse e repito, tenho pena de que o sr. deputado não esteja presente, pois que mais algumas observações havia de apresentar.

Era melhor que o sr. Severo de Carvalho não viesse defender o sr. ministro da justiça, porque, se o não tivesse feito, não viria eu hoje dizer estas verdades amargas.

O sr. Fortunato de Mello: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara se consente que, de preferencia a qualquer outro parecer, se discuta na primeira parte da ordem do dia de hoje o parecer n.º 25. Este projecto acha-se já distribuido pela camara, e é de tanta utilidade que nenhum dos meus collegas se opporá a que se discuta desde já.

O sr. Presidente: — Mande o seu requerimento para a mesa.

O Orador: — Mas este negocio é urgente, e se mando para a mesa o requerimento por escripto não se vota hoje.

O sr. Quaresma: — Mando para a mesa duas representações, uma da camara municipal de Condeixa e a outra da de Soure, contra a execução do decreto dictatorial de 11 de abril de 1865 sobre cereaes.

Estas representações, e principalmente a da camara municipal de Soure, responde já a um relatorio em que o sr. ministro das obras publicas nos fallava n'esta casa muitas vezes. Quando algum dos nossos collegas exigia de s. ex.ª algumas explicações ácerca da execução d'aquelle decreto e das suas vantagens, s. ex.ª dizia nos sempre: «Espere a camara, porque ha de vir um relatorio da direcção geral de agricultura que responde a todas as explicações exigidas pelos illustres deputados.» (Vozes: — É verdade.)

Appareceu finalmente publicado o tão esperado relatorio, e a camara municipal de Soure já fez sobre elle considerações judiciosissimas, e não só por esta rasão, mas porque assignei já hoje uma nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas sobre este mesmo objecto, aguardo-me para n'essa occasião fazer algumas considerações sobre assumpto de tanta importancia.

No entanto não posso resistir á tentação de n'esta occasião dedicar alguns momentos a uma ligeira analyse, da doutrina d'aquelle documento, que se alguma cousa prova é contra a execução do decreto de 11 de abril de 1865 (apoiados).

Sr. presidente, respeito plenamente as intenções do sr. director geral da repartição agricola; prezo-me de ser seu intimo amigo, fui seu condiscipulo, tenho por elle a mais subida consideração, mas isto não impede que eu analyse os documentos que foram mandados para a camara pelo sr. ministro das obras publicas.

Eu não discuto o sr. Rodrigo de Moraes Soares, discuto um documento que o sr. ministro das obras publicas mandou á camara, e que foi publicado no Diario de Lisboa (apoiados).

Ha tres ou quatro principaes argumentos que o sr. director da repartição de agricultura apresenta no seu relatorio, e pelos quaes quer demonstrar que a execução do decreto de 11 de abril de 1865 é util. O primeiro é deduzido da estatistica.

Ora a estatistica pelo modo como ella é feita no nosso paiz póde servir até para demonstrar proposições diametralmente oppostas (apoiados).

Ninguem ha que ignore que as estatisticas officiaes não têem o valor que deviam ter, e realmente não têem nem o podem ter (apoiados); mas as estatisticas sobre cereaes ainda muito menos, porque estas fazem-se do seguinte modo. O administrador do concelho ou não consulta os proprietarios sobre a quantidade dos cereaes colhidos e faz um calculo arbitrario, e já se vê o valor que póde ter este calculo, ou os consulta, e elles não lhe dizem a verdade, porque têem receio do augmento da materia collectavel (apoiados) e por conseguinte do augmento das contribuições.

Portanto esta estatistica não serve de nada, e eu sempre citarei um facto que observei quando tive a honra de ser membro da junta geral do districto de Coimbra.

Tratando-se de saber qual era nos diversos concelhos do districto a producção da laranja em cada anno, achou-se no de Montemor o Velho, onde as laranjeiras São rarissimas, uma quantidade muito superior de milheiros de laranja ao de Coimbra, onde ha pomares por toda a parte; portanto já se vê que estatisticas como estas não servem para nada, mas muito menos para os cereaes (apoiados).

Assim mesmo das estatisticas officiaes deduz o relatorio que ha falta de cereaes só para Lisboa. E eu não tenho receio de asseverar que nos annos de colheita ordinaria, os cereaes não só chegam para todo o paiz mas até sobejam, e a prova está na exportação que d'elles se tem feito nalguns annos (muitos apoiados).

Sr. presidente, encontra-se no relatorio uma proposição que em verdade me surprehendeu! Julgava eu que as leis do Imperador sobre liberdade da terra, que a abolição dos dizimos, a extincção dos vinculos, as leis de desamortisação tinham concorrido muito efficazmente para o augmento da producção de cereaes; pois, sr. presidente, estava em erro, porque todas essas leis, todos esses beneficios redundaram quasi exclusivamente em favor da vinicultura, e a producção cerealifera pouco aproveitou! Parece-me, sr. presidente, que não era eu que estava em erro (apoiados); quem estava e está illudido é o auctor do relatorio. Todos sabem que o que tem progredido mais á sombra d'essas leis e providencias tem sido a cultura dos cereaes (muitos apoiados). Ainda ha mais, é que depois que appareceu o oidium tuckeri tem-se aproveitado o terreno de muitas vinhas para a cultura dos cereaes (apoiados).

O terceiro argumento é deduzido do menor preço dos cereaes nos paizes estrangeiros. É de espantosa força este argumento! Todos nós sabemos que as nações estrangeiras, e principalmente a França e a Inglaterra, estão muito mais adiantadas em meios de viação do que nós, e isto concorre sem duvida para a grande differença de preço dos generos (apoiados).

Sem attender a outras circumstancias, que ha muitas, basta esta do preço de transportes que em algumas provincias do nosso paiz é de 25 a 30 por cento, para que o nosso genero não possa competir com o estrangeiro (apoiados). Digo mais que, não obstante ser menor o preço dos cereaes estrangeiros, podem os productores tirar mais proveito do que nós com preço mais subido (apoiados). Parece-me que isto se comprehende muito facilmente. Boas vias de communicação, capitaes em abundancia, aperfeiçoamento nos processos agricolas, tudo isto póde concorrer para que o productor por um preço mais baixo aufira lucros muito mais consideraveis (apoiados). Diz-se mais, não ha quasi differença alguma nos preços no nosso paiz, comparando-se a epocha da prohibição com a actual. Parece-me que ha n'esta asseveração grande engano. O milho que n'aquella data se vendia a 400 réis e d'ahi para cima, está hoje a 300 e 320 réis, e não ha, quem o queira comprar...

Vozes: — É verdade.

O Orador: — De maneira que uma differença de 25 por cento no preço é uma cousa insignificante. Nas provincias do norte o milho está por um preço baratissimo, e não ha quem o queira (muitos apoiados). No trigo, ainda que a differença não seja tão sensivel, parece-me poder affirmar, sem receio de poder ser desmentido, que a differença é ainda de mais de 10 ou 15 por cento. E deve notar-se que os salarios dos operarios, longe de terem diminuido, têem augmentado. E d'este modo como póde o proprietario cultivar a terra? (Apoiados.) Se pensam que assim beneficiam o povo, enganam-se; se o proprietario não respeita bem o seu genero, não tem meios para dar que fazer ao operario, e este sem esses meios não podem comprar o pão nem barato nem caro (apoiados).

No relatorio confessa-se que o pão não está mais barato.

E para que quer o governo a maior quantidade de cereaes no paiz? Não será para que o pão seja mais barato? De certo que sim. Então se a admissão de cereaes não serve para que o povo coma o pão mais barato, que outra rasão póde justificar essa admissão? Não acho outra que não seja a de prejudicar o productor (muitos apoiados).

Diz-se porém com uma ingenuidade admiravel = não é mais barato, mas é melhor, e não é falsificado =. Emquanto á qualidade eu não vejo que ella seja melhor do que era antes do decreto de 11 de abril de 1865 (apoiados).

Pois quem é capaz de praticar a immoralidade da falsificação tem o preço dos cereaes n'alguma consideração? Quem falsifica é para tirar um lucro criminoso, e quem é capaz de praticar um crime, tanto o pratica n'uma como n'outra hypothese (apoiados).

É necessario que o governo se desengane que a agricultura é a primeira industria do paiz. Se a agricultura não merece protecção, nenhuma outra industria é digna d'ella.

Eu sou partidario da liberdade do commercio; sou um dos que mais a desejam, mas para tudo.

Pois então não se ha de proteger a agricultura, e ha de proteger-se a industria fabril? Pois o panno que o povo veste não é um objecto de primeira necessidade? Note-se, que o panno grosso que é aquelle de que o povo se veste, é o mais tributado, paga a insignificante quantia de 1$500 réis por kilogramma; o panno fino paga proporcionalmente muito menos. Paga mais o que é mais necessario para satisfazer uma das primeiras necessidades do povo (apoiados).

Quando no anno passado se tratou d'esta questão, o sr. ministro da fazenda de então disse = o governo quer esta lei, mas ha de acompanha-la de outras medidas, como é a reforma das pautas, a diminuição da protecção á industria fabril, etc. = Isto comprehendia-se, porque se a agricultura perdia por um lado, ganhava por outro.

Dizia-se mais = a diminuição dos direitos nas materias primas é já um grande beneficio para a agricultura, e ahi está já o banco hypothecario para fornecer os capitaes =.

Ora, sr. presidente, nem houve diminuição nos direitos das materias primas, nem o banco hypothecario deu ainda auxilio algum á agricultura, nem o póde dar d'aqui por diante, porque o juro é tão elevado, que não póde aproveitar ao cultivador (apoiados).

No entanto, para beneficio dos proprietarios e agricultores, publicou-se o decreto de 11 de abril de 1865!

Um illustre deputado, quando se discutiu na generalidade o projecto da desamortisação, de que nos temos occupado, propoz a creação de bancos agricolas, mas creiam que se não approva tão vantajosa proposta, porque o governo não quer; já o declarou um dos seus dignos membros.

O sr. José de Moraes: — E o governo é que manda?

O Orador: — O governo não manda, mas tem a influencia precisa para fazer approvar uma medida n'este ou n'aquelle sentido.

Note a camara que eu não quero fazer censura ao actual governo. Todos os governos fazem esforço para que sejam approvadas as suas medidas, conforme o intuito com que as conceberam.

Eu vejo os generos de primeira necessidade altamente tributados, entre outros o bacalhau e o assucar, por exemplo; e o assucar já vae chegando ás mais pequenas aldeias (apoiados).

Sr. presidente, por agora só me resta dizer que tomei hontem nota do que disse o sr. ministro da fazenda a respeito do projecto dos vinhos da Madeira.

Eu sou partidario da liberdade do commercio, disse s. ex.ª; mas é necessario attender aos preconceitos, aos habitos dos povos, e ás circumstancias especiaes do paiz e da localidade. Em occasião opportuna farei uso d'esta declaração.

Quando se tratar seriamente da questão dos cereaes farei mais algumas reflexões, e peço a v. ex.ª que consulte a camara, se consente que, não obstante o zêlo fiscal do meu amigo, o sr. José de Moraes, seja publicada no Diario de Lisboa a representação da camara municipal de Soure, porque é um documento importante, e em todas as questões de interesse publico, quanta mais publicidade, melhor.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Luiz Bivar: — Pedi a palavra com o fim de mandar para a mesa um requerimento, no qual Antonio Francisco da Ponte, ex-segundo sargento do regimento de artilheria n.º 4, e victima dos acontecimentos politicos de 1846, pede a sua reforma. Lamento que fosse concedido o beneficio que o requerente, obrigado pela impossibilidade em que se acha de continuar, em virtude dos seus padecimentos, a ganhar pelo trabalho os precisos meios de subsistencia, hoje reclama e implora a individuos que foram officiaes dos extinctos batalhões nacionaes, que não se lembravam, nem alguns precisavam do soldo que agora lhes dão; que depois se concedesse o mesmo beneficio aos primeiros sargentos que foram despedidos do serviço quando terminou a guerra civil de 1846, e que elle não se tornasse logo extensivo aos segundos sargentos e officiaes inferiores em identicas circumstancias e que deviam ser attendidos com preferencia.

Infelizmente, e seja isto dito sem animo de offender ninguem, os pequenos, senão são sempre esquecidos, são os ultimos lembrados. A justiça deve chegar a todos, e não é conveniente que ella seja só para os grandes.

A reforma concedida aos officiaes a que acabo de me referir, e depois aos primeiros sargentos, deve tornar-se extensiva aos officiaes inferiores, por isso que, como aquelles, serviram a junta do Porto e foram despedidos do serviço; e se a não queriam dar a estes, não a tivessem concedido aos primeiros. É n'estes termos que eu mando este requerimento para a mesa, entendendo que o requerente não pede favor, mas justiça e só justiça, pedindo a v. ex.ª que o faça remetter á respectiva commissão, que julgo ser a de guerra, embora seja ouvida tambem a de fazenda, esperando que ambas apresentem com toda a brevidade os seus pareceres.

Visto que me coube a palavra usarei d'ella ainda por um momento para fazer um humilde pedido á illustre commissão de pescarias, unindo os meus votos aos do meu illustre collega o sr. José de Moraes, mais de uma vez manifestados, para que a mesma commissão apresente com toda a brevidade o seu parecer sobre o projecto que lhe está distribuido e que diz respeito ao imposto sobre o pescado.

A sessão vae já adiantada, e eu sentirei muito que este projecto não seja discutido, porquanto se por elle, como tenho ouvido dizer, a illustre commissão tem em vista substituir o actual imposto pela contribuição industrial, eu acho que vem a ser da maior utilidade não só para a classe dos pescadores, que de certo, sempre exposta a grandes perigos, privações e miserias, é a mais infeliz e desvalida da sociedade, e deve merecer por isso toda a nossa attenção, mas tambem de muita utilidade para o estado, que vae por meio da contribuição industrial receber a importancia total do imposto, emquanto que actualmente a maior parte d'elle é absorvido pelo pagamento dos ordenados dos respectivos empregados.

Não tenho em vista irrogar a mais leve censura á illustre commissão. Sei que ella presta toda a sua attenção a este importante assumpto, e supponho mesmo que o seu parecer está unicamente dependente da conferencia que espera ter com o sr. ministro respectivo. Nem eu podia ter intenção de offender a illustre commissão, porquanto respeito os dignos cavalheiros que a compõem, e em cuja illustração e zêlo tenho a maior confiança. Mas representando eu um circulo, o qual comprehende algumas povoações que se occupam exclusivamente na pesca, não podia deixar de pedir á illustre commissão que apresentasse com toda a urgencia este parecer; e relevem-me os seus illustres membros o pedido que tomei a liberdade de lhes fazer, e que mais se desculpa pela convicção em que estou de que talvez venha a ser o referido projecto, se convertido em lei, o unico meio ou o modo mais facil e prompto de obstar e impedir a continuação de um grande abuso que eu deploro, mas infelizmente se está commettendo em varias repartições, e consiste em se exigir aos individuos que transportam a pescaria do porto em que ella entrou e pagou o imposto ao mercado, em que a tornam a vender, novo impos-