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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso do sr. deputado Carrilho, pronunciado na sessão de 8 de abril, e que devia ler-se a pag1. 870, col. 1.º

O sr. Carrilho: — Eu hontem não vim fazer optimismo financeiro; não pretendi senão responder, como devia, a algumas observações que os illustres deputados tinham feito sobre as difficuldades da fazenda publica, que na opinião de 8. ex.ªs continuam a produzir grandes embaraços á nossa administração o nos ameaçavam com um cataclysmo.

Eu não vim dizer que não tiníramos necessidade de crear mais receita; pelo contrario, mostrei que ha ainda um desequilibrio no orçamento do proximo anno economico, apesar das providencias que se têem votado e dos progressos que se lêem feito, desequilibrio que é de mais de 700:000$000 réis, o que para se fazer lace a esse desequilibrio que é necessario desapparecer do todo e por modo que na elasticidade dos tributos tenhamos, em harmonia com o desenvolvimento da riqueza publica, os novos recursos permanentes que o inevitavel augmento de encargos reclama. Mas d´esse estado, facilmente supportavel, para aquelle que as melancholicas palavras de alguns collegas desenham com menos exactidão, vae uma grande distancia.

Mas pergunto, depois do termos votado medidas importantissimas, como as mencionei, seria, agora occasião opportuna, para crearmos mais receita? Parece-me que não; quando, de mais a mais, no principio da proxima sessão podem ser apresentadas todas as providencias, que não só angmentem os rendimentos publicos, mas que modifiquem alguns dos impostos actuaes, o que tem muitos gravames, que não servem senão para vexar o contribuinte som darem resultado proficuo para o thesouro publico. E é principalmente a essas providencias de modificação e revisão dos impostos que se deve attender para organisarmos as nossas finanças. (Apoiados.)

Disse o illustre deputado, o sr. José Luciano, que lhe parecia que o imposto do sêllo não podia dar a somma em que eu o tinha computado, e referiu-se, pura e simplesmente, se não me engano, á proposição inicial apresentada pelo sr. Mello Gouveia.

Peço licença a s. ex.ª para lhe dizer, que o projecto apresentado pela commissão de fazenda não cobre a letra secca da proposta apresentada pelo ministerio transacto; portanto o projecto apresentado pela commissão, apoiado pelo actual governo e votado pela maioria da camara, não se parece, em nada, absolutamente, com a proposta do sr. Mello Gouveia.

Ha no projecto da commissão disposições que não estavam incluídas na proposta apresentada pelo governo transacto.

Ha alterações importantes que necessariamente trarão um augmento do receita com que então se não contava, o que o illustre deputado, o sr. Luciano, não avaliou. São as modificações feitas pela maneira que eu me referi.

Quanto ao projecto do tabaco, tambem esse é exclusivamente da commissão de fazenda, igualmente se não parece nada com a proposta, do sr. Mello Gouveia.

N'este projecto vê-se tambem que a commissão de fazenda, o governo e a maioria da camara, não cobriram a letra secca das propostas apresentadas pela situação transacta, (Apoiados.) pelo contrario differem de modo essencial das providencias imaginadas pelo ministerio demissionário. (Apoiados.)

Este projecto de lei, que tem por fim fazer cessar a concessão aos importadores ou despachantes do tabaco, para

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o desmancho, limpeza e beneficiações d'aquelle genero, dentro das alfandegas, dará juntamente com a pauta de valores um augmento de receita para o thesouro approximadamente na importancia de 120:000$000 réis.

D'aqui vem, portanto, um acrescimo apreciavel de receita.

Disse o sr. José Luciano que no orçamento to descrevia um deficit de 2.000:000$000 réis, quando no anno economico findo elle tinha sido não só esse, mas de mais de 6.000:000$000 réis, e não sabia como harmonisar as palavras do relator da commissão com estas duas verbas differentes.

S. ex.ª fez a sua observação em absoluto; não quiz dar-se ao trabalho de examinar as verbas que na conta das receitas e dos pagamentos concorreram para esse deficit no anno findo; se examinasse, veria com toda a lucidez do seu espirito esclarecido, que a rasão estava do meu lado.

Eu vou ler á camara essas verbas que concorreram para o deficit no anno economico findo.

Mas que pagámos nós n'esse anno do despezas que não estavam nem podiam estar incluiadas no orçamento ordinario? Pagámos: 1.° os adiantamentos do thesouro para as obras do caminho de ferro do Minho o Douro, que em 30 do junho de 1877 subiam a 903:000$000 réis. Esta despeza é extraordinaria, o não podia ter entrado no orçamento ordinario, e foi já no anno economico corrente reembolsada pelo producto da receita especial da 5.ª emissão, e portanto não póde ser levada á conta do deficit ordinario. (Apoiados.)

2.° A parte ainda não restituída em 30 de junho das sommas devidas ao banco de Portugal, pela renovação do contrato para o pagamento ás classes inactivas, na importancia de 758:000$000 réis, quando na despeza figurava toda a somma que haviamos restituído ao mesmo banco.

3.° Aos bancos lusitano e nacional ultramarino a liquidação dos creditos pelos adiantamentos feitos desde 1872 para os vencimentos das classes inactivas, cujos contratos foram rescindidos, a quantia de 781:000$000 réis.

Estas tres verbas que são pagamento de dividas dão já uma somma do 2.445:000$000 réis. Isto é, uma somma importantissima de pagamentos extraordinarios que não estavam nem podiam estar incluidos no orçamento da despeza ordinaria, e que portanto não vem n'aquelle anno economico encargo ordinario propriamente dito do thesouro.

Pagámos mais outras despezas, tambem sem receita propria, não incluídas no orçamento. E foram, por exemplo:

Para os caminhos de ferro do Algarve 76:573$165 réis; temos tambem despeza a maior com os novos navios de guerra 464:497$726 réis, e estas despezas já estavam feitas no anno findo, foram só legalisadas e oscripluradas no logar competente, passando da conta de operações de thesouraria, onde já figuravam, para encargos effectivos.

E não serão estas despezas extraordinarias? Creio que sim Doka da Horta, 176:279$369 réis; doka de Ponta Delgada 83:115$346 réis; pontes da alfandega, 201:835$347 réis; e note-se que estas obras têem imposto especial para custear os emprestimos que se levantassem para a sua feitura, emprestimos que o governo não chegou a levantar, porque não foram necessarios.

Despeza feita com a reparação dos estragos causados pelos temporaes de 1870, 75:136$492 réis. Esta despeza não será extraordinaria?

Temos tambem 607:421$007 réis de despeza do ministerio da marinha, legalisada pela lei de 12 de abril do 1876, e que representava os encargos desde 1870 do pessoal previsorio do arsenal, não incluídas no orçamento, inclusão já eífeetnada no orçamento anterior, e representando portanto encargo, não de um anno, mas de uns poucos de annos.

Gastou-se na compra de artilheria para municiar os novos navios de guerra 352:909$729 réis, legalisada apenas nas contas do anno findo, porque os pagamentos já eram uni facto em anteriores gerencias.

Temos tambem outra verba ainda mais importante de 694:176$230 réis, despeza feita com o exercito, alem das verbas orçamentaes, segundo as ordens visadas na direcção geral da thesouraria, incluindo n'esta verba parte do armamento para o exercito, custeada pela receita especial das leis do recrutamento, e parte da reserva que então estava em armas, alem do 5:000 e tantas praças de pret dos contingentes ordinarios que não estavam incluídas no orçamento e que faziam augmentar o encargo.

Emquanto aos encargos do anno futuro, provenientes de ser descripta a força publica no numero que ella tem realmente, a despeza já está auctorisada no orçamento ordinario para 1878-1879.

Aqui tem, pois, a camara como o deficit, deduzidos os 6.058:475$522 que sommam todas as verbas a que se refere o relatorio do sr. Mello Gouveia, ficava reduzido a uma proporção insignificante, o porque insignificante se póde chamar ao desequilibrio real do 1.064:838$326 réis n'aquelle anno.

Devemo-nos lembrar que foi esse periodo cheio de calamidades, e em que o rendimento dos impostos, em vez do crescer, como nos annos anteriores, diminuiu cerca do réis 800:000$000.

Os fados extraordinarios que se deram no anno passado fizeram com que o orçamento para 1878-1879 fosse tão tristonho, porque houve que fazer os calculos pelas medias dos ultimos tres annos, e só quem não examinar com alguma attenção as rasões legaes que motivaram este calculo pouco lisonjeiro, póde fazer apreciações tristes a respeito da fazenda publica; mas quem se der ao trabalho de estudar detidamente o assumpto como elle requer, verá que a questão da fazenda publica não é tão má como muitos imaginam, antes pelo contrario, com a prudencia e boa vontade de todos póde resolver-se imincdiatamente. (Apoiados.)

Disse o illustre deputado que nós devemos de juros réis 12.000:000$000 réis, e que pagámos tanto por elles como o correspondente a metade da nossa receita, e que não ha paiz algum em que isto aconteça.

Recordemo-nos de que nós temos feito grandes melhoramentos no paiz á custa exclusiva do credito e que não se pediu ao contribuinte a somma, correspondente aos juros das sommas que o thesouro adiantou.

Se o tivessemos feito, ver-se-ia que o nosso orçamento de receita estava largamente dotado. A terra bojo paga menos da quinta parte do que pagava, antes da revolução economica que nos trouxe a liberdade, o no em Ian to a base collectavel era então insignificante, comparada com a que existo actualmente. Então não se viam senão tributos e privilegios: hoje quasi que não existem nem uns nem outros. Não lamento o facto, congratulo-me com elle.

Dizer-se, porém, que nenhum paiz paga, do encargos de emprestimos quasi metade da rua receita ordinaria, é tambem um erro, permitta-se-me a classificação.

A receita, ordinaria da Italia, no orçamento do 1876 era de 1:240 milhões de francos ou liras, a despeza com juros da divida era, de 739 milhões, mais do metade.

A receita ordinaria da França no orçamento de 1877 era do 2:737 milhões de francos, a, despeza com juros subia a 1:170 milhões, proporção ainda inferior á nossa, apesar do peso dos tributos n'aquelle paiz.

Creio que bastam estes exemplos para destruir a asseveração errónea que fóra feita.

Disse se hontem, parece-me que foi o meu amigo o sr. visconde do Moreira de Rey, que tambem em parte alguma era á escripto no orçamento ordinario o producto da venda dos titulos do credito como receita propria do thesouro. Tambem não é exacto.

A propria, Franca apresenta isso no orçamento de 1877, e não é qualquer bagatella, é uma verba, de perto de 70 milhões de francos para a compra dos caminhos de ferro, e no orçamento de 1878 acontece o mesmo.

Aqui tem V. ex.ª como no proprio orçamento ordinario

Sessão de 15 de maio de 1878

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de um paiz citado como modelo está incluido como receita o producto da venda dos titulos da divida consolidada.

Em Portugal não se póde fazer isso, porque Portugal não está auctorisado a fazer cousa alguma d'estas (Apoiados.)

Apesar d'isso, apesar de haver ali realmente um deficit de 69 milhões, a França pedia novos creditos para a reconstrucção do seu material de guerra de 351.877:000 para o exercito de terra, e 34 milhões para a marinha.

E não se pedia a receita correspondente; não se perguntava ao governo d'aquelle paiz como haviam de ser pagos estes milhões, nem se a patria estava em perigo (Apoiados.)

O parlamento francez votava-os, porque a consciencia dos representantes do povo lhes dizia que eram necessarios. (Apoiados.) Não se faziam perguntas talvez importunas, como aqui.

E a França terá a estas horas talvez despendido fóra do orçamento, desde 1872, o melhor de dois milhares de milhões de francos. Tudo obtido por meio de credito, e quando foram auctorisadas essas despezas, ninguem, nem os mais apaixonados opposicionistas perguntou ao governo d'onde saíam os juros para pagar esses enormes encargos. (Apoiados.)

Repito, portanto, a situação financeira entre nós póde não ser altamente agradavel, mas não é assustadora. Era muito melhor que nós podessemos fazer todas estas despezas á custa dos recursos ordinarios, mas como não as podemos fazer, havemos de recorrer aquillo a que têem recorrido todas as nações.

A propria Inglaterra votou ultimamente 22.500:000$000 réis para varias despezas de guerra, e ninguem perguntou que receita nova se creou para fazer face ao encargo, o no emtanto eu tenho aqui a ultima conta financeira da Inglaterra, em que figuram na despeza total 4 milhões do resgate extraordinario das acções do canal de Suez, quando "na receita apparece a creação de perto de 6 milhões de divida fluctuante em bonds do thesouro, sem que ninguem n'aquelle paiz se lembrasse de dizer que em 1875-1876 o deficit da metropole britannica fóra de 6 milhões esterlinos.

E isto acontece n'aquelle paiz proverbial de abundancia de capitães e de riqueza, e onde o recurso ao imposto é facilimo, o que não acontece nos paizes latinos.

Isto fez-se na propria Inglaterra, no paiz do dinheiro!

Creio que tenho mostrado da melhor maneira que posso que nenhum receio póde causar o resultado d'este projecto, e muito mais se attendermos ás vantagens que d'elle hão de resultar. (Apoiados.)

Nós não podemos abandonar as nossas possessões sem grave prejuizo para o paiz. (Apoiados.)

Não podemos, portanto, deixar de ter navios para as defender, (Apoiados.) e não são os que se pedem demasiados.

Vozes: — Muito bem.

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