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SESSÃO DE 15 DE OUTUBRO DE 1890 1899

das Beiras, que levantaram no meu espirito as declarações agora feitas n'esta casa.

O discurso do nobre presidente do conselho lido perante a representação nacional, não nascido espontaneamente, mas pautado, reflectido e passado a escripto sobre o papel para que ficasse bem gravado na memoria de todos, representa todo o programma do novo governo para resolver a crise excepcional e duplamente difficil a que as situações transactas nos impelliram e arrastaram.

Estando n'este momento o paiz ancioso e o mundo civilisado attento á orientação e linha de conducta que o novo governo vae traçar para resolver os conflictos caseiros e externos que nos creára o ultimatum de 11 de janeiro, as declarações acabadas de fazer n'esta casa assumem um valor e um alcance excepcionaes, para que não inspirem e não provoquem um maduro exame e para que lhes seja permittida a incerteza e vacuidade que desde logo se lhes nota!...

O discurso lido por s. exa. revela por consequencia o plano premeditado do governo para resolver as crises em que nos debatemos e é por isso que vi com espanto e magua que n'elle se mantém o statu quo, que nos cerceia as liberdades publicas, que é tudo o que ha de peior; e que, estando para fechar se o parlamento, se mantém enigmatico sigilo sobre as medidas que vão ser adoptadas e que a salvação publica reclama promptamente, entregando-se assim a opinião desconfiada, legitimamente desconfiada, á elaboração de duvidas e de suspeitas, quando convinha que tudo ficasse aqui esclarecido!

É preciso que lá fora o paiz saiba que n'este subito accordo dos dois lados da camara sobre as anodinas declarações do governo, algumas vozes se levantaram da parte dos seus representantes a exigir do governo explicações que satisfaçam e serenem os animos tão justificadamente sobresaltados.

S. exa. os srs. ministros não só convergiram as suas attenções para as questões de fazenda, e internacional, com exclusão de outras não menos graves que molestam o paiz, mas restringindo-se áquelle dois pontos aliás erriçados de innumeras difficuldades e perigos, nada nos dizem do que vão e esperam fazer!

E é sob este vácuo e é debaixo d'estas incertezas e duvidas que se separam dos chamados representantes da nação!

Parece que os srs. ministros opinaram na sua alta sabedoria que o paiz está muito satisfeito com o que fizeram os seus antecessores em tudo o que não diz respeito á questão ingleza e á questão fazendaria; pois eu que afasto neste momento do meu espirito qualquer idéa partidaria, posso declarar-lhes solemnemente, como interprete da opinião e do sentir unanimes da patria, que urge reparar muito damno que lhe foi feito, reivindicar muitos direitos que foram violados, arrancar muitas barreiras que nos separam, extinguir muitos ódios que nos dividem.

É preciso reconhecer que o caminho percorrido desde 11 de janeiro foi errado, que o tempo foi perdido, e que a situação se acha agora muito peior, bem mais aggravada do que antes de 11 de janeiro! Pois o governo pretende accudir aos males que dilaceram a patria deixando enterrados nos corações todos estes espinhos que nos têem trazido febricitantes ?!...

Pensa o governo em resolver o grave problema com a Inglaterra dividindo-nos no interior com leis odiosas e de excepção e appellando para os favores e complacencias da bossa secular e implacavel inimiga?!!

Acha prudente e politico seguir na esteira do seu antecessor que nos assediou por todos os lados de perigos e vergonhas?!... Quer continuar a manter na desconfiança e na excitação de um povo desesperado esta infeliz nação que já não sabe onde encontrar os filhos de out'rora que lhe deram poderio e renome?!

Se o governo quer tranquillisar o paiz aponte um caminho seguro, traga-lhe uma solida garantia para o que lhe pormette, que não póde ser apenas a lealdade das suas consciencias, porque isso só por si não basta. O paiz precisa de garantias solidas para se tranquillisar e ninguem lh'o deve levar a mal.

A minha opinião, repito, é que o caminho percorrido desde 11 de janeiro foi errado, que o tempo foi perdido, e que o que se fez tem necessariamente de ser desmanchado.

Como quer, pois, o novo governo que o paiz se aquede com as suas declarações de todo o ponto insuficientes?!

O illustre ministro do reino, Candido de nome e Candido de alma, quer que saiamos tranquillos com as suas promessas; mas promessas já hoje não bastam, porque de ha muito sei o que são os programmas ministeriaes. Guardem para si as suas rectas intenções, em que acreditâmos, e dêem ao paiz as obras que d'ellas emanam e de que elle carece. Só isto nos póde satisfazer.

Caíu sobre este malfadado paiz como uma verdadeira calamidade publica o partido que a indignação popular expulsou das cadeiras do poder; deixou como legado á nova situação as malditas medidas por elle promulgadas, em virtude das quaes a liberdade foi coarctada.

Como quer o novo governo unir a familia portugueza para a grande lucta contra a Inglaterra, violando-nos as nossas mais caras liberdades, amordaçando a imprensa, dissolvendo as aggremiações populares, e tornando o direito de reunião e de protesto um verdadeiro ludibrio?!

Se mantem os decretos antigos, como das suas declarações se deduz, não tem o direito em fallar-nos em liberdade, e melhor fôra que nunca nas suas mãos caíssem os sellos do estado.

Se a sua confissão sincera no seu amor ás invocadas instituições liberaes os leva a antepor-se a esses malditos decretos, ainda assim o paiz não fica tranquillo nem satisfeito. Passariamos d'essa maneira a viver da graça regia e não como povo democrático e livre que só acata a justiça e só quer leis onde ella se revele e mantenha.

Prescindimos dos favores, e reclamâmos o que nos foi roubado. Exigimos em nome da justiça e da opinião revoltada que nos dêem ao menos as leis em que viviamos.

Queremos, por consequencia, que o ministerio assuma a responsabilidade indeclinavel de rasgar todos aquelles decretos nascidos da dictadura e voltar á lei antiga, mais sã e mais justa, a unica perante a qual nos poderemos por agora conciliar.

O statu que não é possivel mantel-o. Não busquem, pois, posições equivocas, soluções mysteriosas. Basta do que já está feito. Não confiem no inimigo, confiem em nós. (Riso.) Em nós sim, na patria. Mas quando fallo na patria vejo que mereço o escarneo dos senhores!

Repito, confiem em nós, no paiz, na patria, nos nossos direitos individuaes, na nossa solidaridade, nos nossos sacrificios, nas nossas abnegações, e absolutamente nada no nosso inimigo. Definamos a nossa situação claramente. Se dão mais um passo sem primeiro reformar o que fizeram os seus antecessores e sem restabelecer a liberdade e com ella a conciliação da familia portugueza, estão, como os seus antecessores, igualmente perdidos!

Mas, sr. presidente, o que mais aggrava a situação, já de si tão periclitante, do actual governo, é o erro de se separar n'este momento da representação nacional antes de definir a sua attitude perante a Gran-Bretanha e de obter o seu indispensavel apoio para arcar com as difficuldades que pretende vencer. Não se comprehende e muito menos se póde relevar um tamanho erro politico.

Se não confiam no parlamento, dissolvam-no e busquem outro melhor orientado no pensar e sentir da nação. Sem os representantes d'esta aqui reunidos é que não podem dar um passo que mereça confiança! Pensem bem n'isto.

O que vão fazer e o que esperam alcançar?

Em que factos positivos baseiam as suas esperanças?