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CAMARA DOS DIGNOS PARES

Em cumprimento da resolução tomada pela camara dos dignos pares do reino, publica-se o seguinte

Senhores. — As relações que, nas provincias ultramarinas, existiam entre os escravos e seus senhores, receberam nos annos de 1854, 1856 e 1858 grandes modificações, todas tendentes a melhorar a sorte dos escravos e a habilitar o governo a propôr ás côrtes, com a possivel brevidade, a completa abolição da escravidão em toda a monarchia.

Entre as medidas tomadas para este fim merecem ser mencionadas com especialidade as seguintes:

1.ª O decreto de 14 de dezembro de 1854, que ordenou o registo de todos os escravos;

2.ª A lei de 24 de julho de 1856, que determinou que fossem de condição livre todos os. filhos de mulheres escravas, nascidos depois da publicação da mesma lei;

3.ª O decreto de 29 de abril de 1858, que mandou que sejam de condição livre todos os individuos escravos existentes em territorio portuguez no dia em que se completarem vinte annos, contados da data do mesmo decreto.

Tambem cumpre lembrar aquellas que aboliram a escravidão na cidade de Macau, na ilha de S. Vicente de Cabo Verde, e em todo o territorio da provincia de Angola situado ao norte do rio Lifune, no qual existem as povoações e fortes do Ambriz, Bembe, S. Salvador do Congo e outros.

E tambem deve ser citado o decreto de 3 de novembro de 1856, que prohibiu a continuação do barbaro abuso, que existia em alguns dos districtos de Angola, de serem forçados os negros livres a prestarem aos commerciantes e a outros individuos o denominado serviço de carregadores.

Para se poder apreciar a importancia das disposições do decreto que estabelece o registo, bastará apontar as seguintes:

1.ª A que declarou livres todos os escravos pertencentes ao estado;

2.ª A que determinou que nenhum individuo possa ser considerado legalmente como escravo, sem que se prove que elle fôra registado dentro do praso marcado no mesmo decreto;

3.ª A que concedeu aos escravos o direito de obter a sua alforria, independentemente da vontade de seus senhores, comtanto que paguem a estes uma indemnisação fixada por arbitros;

4.ª A que tirou aos senhores o direito de infligir em seus escravos castigos corporaes;

5.ª A que lhes prohibiu separar, em caso de venda de escravos, as mulheres de seus maridos e os filhos menores de suas mães.

Quanto á lei que ordenou que todos os filhos de mulheres escravas nascessem de condição livre, o seu alcance é tal que pelo simples effeito d'esta disposição havia de acabar o estado de escravidão, ainda quando nenhuma outra medida fôsse tomada para esse fim.

E pelo que respeita ao decreto de 29 de abril de 1858, para se avaliar a sua importancia será sufficiente lembrar que elle fixou o dia 29 de abril de 1878 como o ultimo da existencia da escravidão em toda a monarchia.

Estas medidas, tomadas no curto espaço de quarenta mezes em favor da infeliz classe a que se referem, firam grandes passos dados no caminho que conduz ao fim que se tem tido em vista — a abolição da escravatura.

Cumpre pois que n'elle continuemos a progredir com prudencia igual aquella que até aqui tem sido empregada; o que podemos fazer prestando attenção, com espirito de equidade, aos interesses dos individuos que presentemente são escravos, aos interesses dos seus senhores e á utilidade do estado.

Parece-nos que se poderá obter este resultado se for approvada a proposta de lei que temos a honra de apresentar á camara, na qual se estabelece que o estado de escravidão ficará abolido em toda a monarchia desde a publicação da lei; que todos os individuos escravos passarão ao estado de libertos, no qual, e com as condições estabelecidas no decreto de 14 de dezembro de 1854, hão de permanecer até ao dia designado pelo decreto de 29 de abril de 1858 para a total extincção da escravidão em toda a monarchia.

Por esta fórma poderá Portugal conseguir a prompta extincção da escravidão em todas as suas colonias, sem que o systema de trabalho que ali está em pratica experimente alterações repentinas nas suas condições; prevenindo-se assim a eventualidade de occorrencias analogas ás que em colonias estrangeiras tiveram logar em seguimento á publicação do acto de completa e instantanea emancipação dos escravos; e tambem sem que o, thesouro nacional seja obrigado a despender, desde logo, as consideraveis quantias que, os senhores de escravas têem direito.

Pelo decreto de 29 de abril de 1858 os donos dos escravos que forem emancipados têem direito a indemnisações equivalentes ao valor d'estes, realisaveis no anno de 1878, isto é, d'aqui a pouco mais de onze annos. Esta disposição não, é alterada n'este projecto de lei, pois que no mesmo praso de tempo os senhores dos escravos, que passarão á condição de libertos, terão o mesmo direito ás indemnisações.