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Extracto da sessão de 21 de janeiro. Presidencia do Ex.mo Sr. José da Silva Carvalho,

Vice-Presidente. Secretarios os Sr.s V. de Benagazil,

V. de Gouvêa. (Assistiam os Srs. Ministro dos Negocios Estrangeiros, Ministro da Justiça, e Ministro da Marinha.)

Pelas duas horas e meia da tarde, estando presentes 34 D. Pares, declarou o Ex.mo Sr. Presidente aberta a Sessão. Leu-se a Acta da anterior, contra a qual não houve reclamação.

O Sr. V. de Gouvêa participou á Camara que o Sr. C. de Semodães não podia comparecer á Sessão por estar anojado pelo fallecimento de uma irmã.

Mandou-se desanojar pelo mesmo Sr. Secretario.

Primeira parte da ordem do dia.

Teve segunda leitura o seguinte requerimento: Para que a resolução tomada nesta Camara, na Sessão de 9 do corrente mez, seja devidamente executada, requeiro que se escreva novamente ao Ex.""' Ministro dos Negocios do Reino, exigindo de S. Ex.ª a prompta remessa dos traslados da Escriptura do arrendamento do Real Palacio e Quinta do Alfeite. Sala da Camara dos Pares, 20 de Janeiro de 1851.

O Sr. C. de Lavradio — Não lhe parece que possa haver duvida alguma sobre a intenção que teve quando fez este requerimento, e por isso entende que se o mesmo fosse rejeitado equivaleria a uma revogação da resolução que a Camara já tinha tomado mui solemnemente, pois foi quasi por unanimidade, acrescendo que se não se enganava estavam nessa occasião presentes tres Ministros da Corôa, e nenhum delles fez a menor observação, o que prova que não ha neste requerimento senão o desejo de sustentar quanto possa a dignidade da Camara, sem mistura alguma de capricho ou interesse pessoal; a qual lhe parece tanto mais necessario defender depois do officio que hontem se leu, e sobre o qual fez então algumas observações muito de passagem, e que hoje que o tem diante de si o obriga a entrar nestas explicações para ver se assim convence a Camara da necessidade em que está collocada do manter a sua primeira resolução, inutilisando assim a estrategia com que o Sr. Presidente do Conselho pretende eximir-se da responsabilidade que lhe pertence como Ministro da Corôa para a lançar sobre um cavalheiro mui respeitavel, e que, alem das relações intimas de sangue que a elle o prendem, tem outros meritos a seus olhos, mas com quem a Camara não tem nada, nem póde ter, porque a Camara não conhece mais funccionarios publicos do que os Ministros, o que é principio inconcusso, e que importa que se mantenha integro, mesmo no interesse das monarchias representativas.

(Entrou o Sr. Presidente do Conselho, e o Orador pediu ao Sr. Ministro da Justiça que informasse o sou collega do que elle tinha dito, fez uma breve pausa; e depois continuou o seu discurso.)

O N. Par reflecte que as resoluções que a Camara toma na esphera de suas attribuições constitucionaes, são ordens soberanas, ás quaes se deve inteira execução, caso em que se achava esta que ella tomou para que se lhe apresentasse a escriptura de arrendamento do Palacio e Quinta do Alfeite; apesar do que o Sr. Presidente do Conselho responde com um officio do Védor da Casa Real, de que a Camara não póde tomar conhecimento: porque lá está o artigo 105 da Carta (que leu), artigo santo, porque é para assim se explicar o escudo da monarchia representativa, ao mesmo tempo que absolutamente necessario para se conservar outro, o artigo 72 (que tambem leu) de que é o complemento: artigos que S. Ex. anão leu quando se dirigiu a esta Camara, e que cumpre que sejam plenamente observados, porque de o não serem, ai da monarchia constitucional! acabar-se ha esta, e havemos de passar necessariamente para a republica, ou para o absolutismo; alternativa por que não quer passar o D. Par, que é de coração sectario da monarchia representativa.

À Camara dos Pares, essencialmente conservadora, e defensora das prerogativas da Corôa, entende o illustre Orador que pertence pôr obstaculo a que se destrua, como por todos os meios se está querendo destruir, a monarchia constitucional, interpondo nesta occasião a sua opinião sobre o officio, que hontem foi á mesma dirigido, e que a nada menos tende do que a privar de sua inviolabilidade a mais Augusta Personagem deste Reino, a qual não póde ser nunca objecto de discussões, e sómente o da consideração e respeito de todos: demorar-se mais em provar essa necessidade seria fazer injuria á intelligencia da Camara, assim como á sua dedicação á Augusta Pessoa do Chefe do Estado; e como quer ser justo para com todos, não tem duvida em dizer que, quando o Sr. Presidente do Conselho assignou este officio, não considerou quão funestas podem vir a ser suas consequencias, pois S. Ex.ª quer, como elle D. Par, que persista a monarchia representativa.

Na qualidade de auctor do primeiro requerimento em que assentou a resolução da Camara, entende o N. Orador que lhe compete o dever de defender o acerto dessa resolução, o as intenções com que apresentou o requerimento: cumprindo o primeiro dever, observa que esta Camara tem o direito de iniciativa e o dever, commum com a outra, de examinar se a Carta e mais Leis do Estado são observadas; de regular a administração dos bens do Estado; de ver qual é a situação interna do paiz, e como são dirigidas as suas relações exteriores, e de tudo isto resulta o direito e o dever que tem de interpellar, ou pedir explicações verbaes, ou por escripto, aos Ministros da Corôa, e finalmente de exigir todos os documentos que directa ou indirectamente possam concorrer para o desempenho destas suas attribuições, o que impõe aos Srs. Ministros o dever de responderem teia restricção e cabalmente a essas exigencias, quando lhe são feitas pela Camara, e de. apresentar todos os documentos que a mesma reclamar; e não é irreflectidamente que assim se exprime porque, posto haja casos em que se daria grave inconveniente em apresentar certas informações, e fornecer alguns documentos, amainara é que em sua sabedoria peza e julga' os inconvenientes, ou vantagens, da producção desses documentos e informações; cumprindo unicamente ao Ministerio sob sua responsabilidade advertir da existencia desses inconvenientes, quando os haja: mas se apesar dessa advertencia, a Camara insistir, cessa o direito do Ministro para lhe ficar sómente o dever de cumprir as resoluções da Camara, porque estas em certos casos são soberanas, segundo as determinações da Carta Constitucional. A Camara portanto quando exigiu, quasi unanimemente e em presença dos Srs. Ministros, que se apresentasse este documento sem elles terem feito a menor observação, e só então era a occasião de a fazerem (Apoiados), usou de um direito incontestavel, a que o Ministerio devia obedecer: mas não o fez assim, e por isso á Camara o que resta é fazer cumprir a sua resolução.

Cumprindo o segundo dever, passou o N. Orador a narrar as circumstancias em que foi o seu primeiro requerimento, e os motivos porque. Espalhou-se um boato de que o Real Palacio do Alfeite, e terras adjacentes, que fazem parte da dotação da Corôa, tinham sido arrendadas por cem annos, o por vil preço (accrescentava-se), o que, como já disse, não acreditou por lhe parecer impossivel que se fizesse um acto daquella natureza; mas até se accrescentava que o Sr. C. de Thomar, a pessoa a favor de quem se tinha feito este arrendamento, já tinha tomado poise de tudo; e como elle Orador, na qualidade de Par do Reino, não o podia asseverar, posto que pelas circumstancias do facto, e pelas pessoas que lho contaram já não podia duvidar, procurou obter a declaração de um dos Ministros, ou o documento comprovativo; a para esse fim interpellou o Sr. Presidente do Conselho, que respondeu ser verdade que linha feito esse contracto com a Vedoria da Casa Real; mas como para se proceder com a gravidade com que esta Camara deve tractar os negocios, cumpria que se conhecessem todas as circumstancias do facto, o que só se podia verificar á vista da escriptura de arrendamento, pediu esse documento, pedido que a Camara sanccionou o fez seu. Esse documento ainda não veiu, nem o N. Orador sabe se virá, mas foi-lhe necessario dar os motivos por que fez esta exigencia, a qual como se não cumpriu, deve tambem dizer que a escriptura pedida já lhe não é necessaria para o mais essencial, que era a certeza do facto do arrendamento por cem annos, que á vista da declaração do Sr. Ministro está provado, e por isso tem o necessario para assentar o seu juizo. A escriptura era só necessaria para conhecer as circumstancias, se tinha havido lesão enormissima no contracto, ele, o que mais pertence aos Tribunaes averiguar do que a esta Camara, á qual sómente pertence: 1.° velar que a Lei fosse observada, e defendidos os interesses da Corôa; 2.° que não se tivesse attentado contra os interesses e direitos da Nação. Eis a tarifa da Camara.

Para nesse exame se proceder com acerto, passou o N. Par a considerar o que era o Alfeite até o dia 18 de Março de 1834, e o que ficou sendo depois daquella época: até á data acima e desde longo tempo fazia o Alfeite parte da dotação da Casa e Estado do Infantado, que o Decreto citado extinguiu, determinando (o que muito convinha que se notasse bem) que todos os bens, que formavam aquella grande Casa, ficariam Taiti por diante sendo considerados como nacionaes, e por isso desde então logo assim foi considerada: mas vendo-se desde logo que era necessario para a decoro e recreio da Soberana, que um certo numero de Palacios e Quintas do Infantado ficasse fazendo parte da dotação da Casa Real, segundo o preceito da Carta Constitucional, deu-se á Soberana o goso de certos e determinados bens, que a Lei teve a cautela de declarar quaes fossem, para seu recreio e decoro.

O N. Par chamando para reforçar a sua argumentação o que a este respeito se pratica no» paizes, que são mais velhos do que nós no regimen constitucional, onde estes palacios e quintas não podem ser arrendados, ou afforados, ou vendi» dos, ou doados sem uma lei que o authorise, pediu ao Sr. Ministro do Reino que consultasse a lei franceza de 1832 sobre a dotação do Rei; e passando á argumentação que interrompera, observou que igualmente estes bens não podiam ter.