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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

SESSÃO DE 4 DE FEVEREIRO DE 1865

Presidencia do ex.mo sr. conde de castro vice-presidente

Secretarios, os dignos pares

Conde de Peniche

Mello e Carvalho

Pelas duas horas e meia da tarde, achando-se presentes 33 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Mencionou a seguinte correspondencia.

Officio do ministerio da justiça, com referencia ao requerimento do digno par o sr. marquez de Vallada, communicando ao ex.mo sr. presidente, que pelo ministerio a seu cargo não foi o sr. bispo de Vizeu encarregado de negociações algumas com a santa sé.

Dito do ministerio da marinha e ultramar declarando-se, em relação ao requerimento apresentado pelo digno par o sr. marquez de Sá da Bandeira, pelo qual renova o pedido que fizera no anno proximo passado, relativamente a esclarecimentos concernentes a escravos existentes nas provincias ultramarinas, que tendo sido pedidos os ditos esclarecimentos aos governadores das ditas provincias, em portaria circular de 17 de junho ultimo, ainda até hoje se não recebeu resposta alguma; porém logo que cheguem serão promptamente enviados á camara.

(Estavam presentes os srs. presidente do conselho e ministro da guerra.)

O sr. Ferrão: — Mando para a mesa o seguinte requerimento (leu).

Peço a V. ex.ª se digne submette-lo á votação da camara.

O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Leu-o.

«Requeiro que, pelo ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça, seja remettida, com urgencia, a esta camara, uma estatistica das causas ou negocios da competencia das relações de Lisboa, Porto e commercial, decididas definitivamente nos tres annos ultimos, a contar de 1 de outubro de 1861 até 1 de outubro de 1864, com declaração do numero de processos, que nos referidos tribunaes ficou pendente de um para outro anno.

«Camara dos pares, 4 de fevereiro de 1865. = O par do reino, Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão.»

Foi approvado.

O sr. Marquez de Vallada: — Ainda que tinha annunciado que, por occasião da discussão da resposta ao discurso da corôa, se occuparia detidamente do exame dos actos da gerencia do sr. ministro da guerra, como dias depois declarou que tencionava tomar parte na interpellação que ao mesmo sr. ministro da guerra annunciou o digno par o sr. Sebastião José de Carvalho, interpellação que ainda estava pendente, mas para responder á qual o illustre ministro annunciou já que estava habilitado; entende o orador dever declarar que, quando' se entrar na ordem do dia e lhe chegar a sua vez de tomar parte na discussão, não se occupará dos pontos que dizem respeito á referida interpellação, pois se reserva para quando ella entrar em discussão.

O sr. Visconde de Gouveia: — Pedi a palavra para mandar para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro das obras publicas, e um requerimento. A nota de interpellação é a seguinte, que vou ler (leu.)

Peço que seja enviada ao sr. ministro das obras publicas. O requerimento é este que passo a ler (leu.)

Este requerimento tem relação com a nota de interpellação que mandei para a mesa, e versa sobre objectos momentosos, como são as vias de communicação que prendem com um paiz tão rico e tão importante como é o Douro, paiz que tem soffrido tanto por todos os actos legislativos que têem sido causa de sua ruina, e sobre o qual pésa uma ameaça legislativa que póde trazer a sua completa destruição. Em vista portanto d'estas considerações que me parecem ponderosas, peço a V. ex.ª que consulte a camara se consente que seja expedido com urgencia este requerimento para ser satisfeito.

O sr. Presidente: — Vae ler-se a nota de interpellação, e depois será lido o requerimento.

O sr. Secretario: — (Leu).

«Pretendo interpellar o sr. ministro das obras publicas ácerca dos seguintes objectos:

«1.° Sobre o estado em que se acham os estudos do caminho de ferro do Porto á Regua, e do seu seguimento até á raia de Hespanha; e se esses estudos abrangem sómente a directriz marginal, ou tambem outras directrizes que se afastem mais ou menos da margem do rio Douro.

«2.° Sobre as medidas que o governo deve ter tomado para realisar a promessa feita no fim da ultima sessão, relativamente á construcção d'aquella via ferrea; e se em consequencia d'isso ha pendentes algumas negociações com o governo de Hespanha sobre o entroncamento do dito caminho de ferro do Douro com algum do reino vizinho.

«3.° Sobre o estado em que se acham os trabalhos da estrada marginal do Douro (ha tantos annos começada), e

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sobre os motivos, por que não se tem levado a effeito a construcção da ponte sobre a foz do Varosa, sem a qual aquella estrada é quasi inutil; e bem assim o' prolongamento até á Barca do Carvalho, indispensavel complemento da mesma estrada.

«4:° Sobre o destino que se deu aos estudos da ponte do Douro junto á Regua (ha muito, concluidos e remettidos para a secretaria); e sobre as providencias que o governo deve ter dado, em cumprimento das suas promessas, para se realisar este importante e indispensavel melhoramento.

«5.°. Sobre o estado em que se acham os trabalhos do terceiro e ultimo lanço da estrada de Trancoso a Lamego, e da ponte do mesmo sobre o Varosa; e bem assim sobre os motivos por que não começaram ainda os trabalhos do lanço de" Lamego ao Douro, em frente da Regua, complemento forçado daquella importante estrada, e ha muito declarado tal por lei, sem que o governo tenha cumprido aquella terminante e justissima determinação.

«Sala das sessões, 4 de fevereiro de 1865. — Visconde de Gouveia.»

Mandou-se expedir a nota de interpellação. Leu-se o requerimento.

«Requeiro que se peça ao governo, pela secretaria das obras publicas, a remessa a esta camara do mappa da despeza annual feita com o pessoal technico e mais empregados na estrada marginal do Douro, desde a epocha em que se lhe deu principio; e de outro mappa do numero de trabalhadores occupados annualmente na mesma estrada, com distincção dos que trabalharam nas obras de arte, e da despeza feita annualmente com os jornaes dos mesmos, ou com as tarefas, se as houve.

E bem assim igual remessa das copias de quaesquer documentos por onde conste quaes os pontos da mesma estrada, e da do Salgueiral á Regua, e da Regua á foz do Corgo, que se deixaram construir e permanecer abaixo do nivel das grandes cheias, e qual a inferioridade em metros com referencia a esse nivel nos differentes pontos.

«Sala das sessões, em 4 de fevereiro de 1865. — Visconde de Gouveia.»

Approvou-se que se expedisse.

O sr. Eugenio de Almeida: — Eu peço a V. ex.ª licença para mandar para a mesa um requerimento que me enviou a camara municipal de Abrantes, para ser presente a esta camara. Pede ella, que a camara dos dignos pares interponha o seu valimento para com o governo, a fim de que entre as obras que estão auctorisadas por lei, se dê preferencia á ponte sobre o Tejo, a qual esta decretada ha muitos annos, e não tem ainda sido feita, o que esta causando grandes difficuldades de communicações com todas as terras vizinhas, que se acham inteiramente interrompidas, principalmente n'esta estação.

Peço a V. ex.ª que se digne dizer-me se este requerimento deve ser remettido á commissão de petições d'esta camara, ou se a mesa, com o voto da camara, póde dar-lhe o seguimento pedido.

Em todo o caso eu peço a V. ex.ª que se digne tomar este justo pedido debaixo da sua protecção, porque se trata não só de interesses publicos, aos quaes se não póde negar importancia economica, mas tambem do bem-estar daquelles povos: mando para a mesa a representação.

O sr. Secretario: — Leu-a.

O sr. Presidente: — Parece-me que o melhor meio é remetter já este requerimento á commissão de obras publicas. Foi approvado.

O sr. Seabra: — E para mandar para a mesa o seguinte requerimento (leu). (Entrou o sr. ministro da justiça).

O sr. Secretario: — (Leu).. «Requeiro que seja convidado o sr. ministro das obras publicas para vir a esta camara dar algumas explicações sobre a creação de uma direcção de correio no ponto de Mogofores, porque é da maior necessidade.

«Gamara dos pares, 4 de fevereiro de 1865 = Seabra.»

Foi approvado.

O sr. S. J. de Carvalho: — Como vejo presente o sr. ministro da guerra, por isso pedia a s. ex-a que me declarasse se havia duvida em que fosse remettido a esta camara, com toda a urgencia, o processo a respeito da concessão da ' medalha ao general Francisco de Paula Lobo de Avila. Este documento não pediria eu em requerimento apresentado á mesa, se não visse presente o illustre ministro, porque não queria que se deprehendesse que, da apresentação d'elle, havia a idéa de eu desejar addiar indefinidamente a minha interpellação. Vejo presente o sr. ministro que sabe, o todos nós sabemos, que o processo a que alludo existe na secretaria da guerra. S. ex.ª não encontrará, de corto, difficuldade em que seja remettido a esta camara o processo, pois me fornece provas e elementos d'estudo, que eu, aliàs, considero valiosos e importantes para a interpellação que espero que se realise com toda a brevidade.

O sr. Ministro da Guerra (Ferreira Passos): — O processo será remettido para a mesa quando a camara o julgar conveniente.

O sr. Presidente: — Passâmos á ordem do dia. O sr. secretario vae ler o projecto de resposta ao discurso da corôa.

ORDEM DO DIA

discussão DO projecto de resposta ao discurso da corôa

Senhor. — A presença de Vossa Magestade no seio da representação nacional é sempre motivo do maior jubilo para os portuguezes, sobretudo quando uma nova legislatura se abro, promettendo estreitar os vinculos que unem a dynastia ao paiz.

A camara congratula-se com Vossa Magestade pela boa harmonia que reinai entre a nação portugueza o as potencias suas alliadas; vê com prazer encetadas as relações politicas e commerciaes com o imperio do México, confiando que o tempo haja de aperta-las e engrandece-las; e applaude com igual satisfação ter sido aceita á mediação offerecida por Vossa Magestade para desatar por meio de pacifico accordo o conflicto suscitado entre o imperio do Brazil -e ã Gran-Bretanha. Quando lhe for presente o tratado de limites, ultimamente celebrado com a Hespanha, aprecia-lo-ha com a madureza requerida pela gravidade do assumpto.

Nomeando os novos membros da camara electiva pacificamente, o suffragio popular prestou á lealdade do systema representativo um testemunho valioso. Sem o exercicio plenissimo dos direitos politicos o mandato não é honroso, e a liberdade prevertida torna-se o mais funesto de todos os sophismas.

A dotação do clero e a reforma da legislação civil e penal são pontos melindrosos, que prendem ha muito o estudo e os cuidados do parlamento e do governo; foi por isso com o maior contentamento que a camara ouviu a boa nova de que progridem e estão quasi concluidos os trabalhos preparatorios para o definitivo arredondamento das parochias, e de que o projecto do codigo civil, obra digna de illustrar uma epocha e um reinado, se acha tão proximo já do termo da sua ultima revisão, que póde ainda ser submettido ao voto das côrtes na presente sessão da legislatura.

Ácerca dos estorvos que atalharam até agora a immediata execução da lei hypothecaria, tão urgente para a reorganisação economica da propriedade, a camara dos pares examinará o modo opportuno proposto para os remover; assim como os meios adequados de prover á fundação e estabelecimento das prisões penitenciarias, inculcadas pelos progressos da legislação criminal e pela suavidade dos costumes do seculo.

As propostas sujeitas ao seu exame para acudir ao aperfeiçoamento de alguns ramos do serviço do exercito, depois da execução do plano de organisação approvado pela carta -de lei de 23 de junho de 1864, serão attendidas com o zêlo que recommendam os legitimos interesses da classe militar.

A manutenção do nosso credito, apesar da influencia nociva da crise monetaria e commercial, que a Europa e parte da America acabam de atravessar, é para a camara motivo de vivo prazer; estimando saber, ao mesmo tempo, que as receitas derivadas da arrematação do contrato do tabaco e da melhor arrecadação dos impostos, auctorisam o governo de Vossa Magestade, a poder affirmar que as despezas publicas foram custeadas sem ser necessario appellar para o emprestimo, no uso das auctorisações legaes.

Sobre a organisação do serviço das alfandegas desejará a camara convencer-se de que se conciliaram n'ella os interesses do fisco com as novas condições economicas creadas pelas vias de communicação e desenvolvimento industrial; e quanto á reforma da casa da moeda tambem confia que fosse concebida e traçada em harmonia com as indicações da sciencia, e com os fins a que similhante estabelecimento tem de attender especialmente.

A proposta tendente a pôr termo ás deducções nos vencimentos dos empregados do estado, sem risco de deficit no orçamento ordinario, mui agradavel será á camara o poder avalia-la satisfactoriamente em presença do relatorio sobre a situação da fazenda publica e do calculo das despezas, conciliando o que exigem as circumstancias do thesouro com o que a justiça e a equidade apontam, comparada a insufficiencia dos ordenados com a carestia das subsistencias.

A camara dos pares examinará escrupulosamente o uso que o governo fez das auctorisações que lhe foram concedidas, assim como as providencias extraordinarias para a instituição do banco ultramarino; e com o mesmo cuidado apreciará a revisão das convenções postaes e telegraphicas e as medidas empregadas para obter a fundação do credito predial, o desenvolvimento da viação ordinaria e accelerada, a navegação a vapor para Africa, Açores e Algarve, e o incremento das construcções navaes.

Entre as reformas que mais instam por immediata solução, a da legislação sobre o commercio dos vinhos e cereaes deve reputar-se uma das primeiras, e das que asseguram desde logo mais proveitosos resultados. Entretanto acredita a camara que a par d'ella, outras, não menos desejadas e necessarias, como a da administração civil, a da instrucção publica, a da policia de segurança e a de beneficencia, serão tambem contempladas, merecendo ainda n'esta sessão a attenção e os desvelos que por tantas vezes têem sido afiançados. No desenvolvimento de sua prosperidade physica e de seus melhoramentos moraes, o progresso é a lei constante das sociedades modernas, e a condição essencial dos governos livres. Grandes exemplos recentes estimulam a nossa actividade e impõem ás camaras immensas responsabilidades. O futuro não espera, e o presente não póde parar nem adormecer. A nova legislatura herdou das que a precederam deveres severos e obrigações indeclinaveis a que, de certo não quer faltar. Fiel á sua missão o ao patriotismo que a inspira, a camara dos pares conta que os divinos auxilios a não hão de desamparar para corresponder dignamente ao que exigem d'ella a sua indole, o voto esclarecido da nação, e a conservação e esplendor das liberdades publicas.

Sala da commissão, em 1 de fevereiro de 1865. = Conde de Castro, presidente — José Bernardo da Silva Cabral — Luiz Augusto Rebello da Silva, relator.

O sr. Presidente: — Esta em discussão na sua generalidade.

O sr. Marquez de Vallada: — Se em nome das grandes idéas que formam o seu credo, perguntasse aos srs. ministros quaes são os principios que seguem, e quaes são as medidas que julgam necessarias para desenvolve-los, faria uma verdadeira inutilidade, porque no programma de ss. ex.ªs professam-se todos os principios, e ao mesmo tempo encerra-se n'elle a negação de todos; limitar-se-ha portanto a perguntar-lhes quaes são os seus fins; para onde querem levar este paiz, e quaes são os meios que n'isso empregam, e mais nada, por estar bem convencido de que o governo desconhece qual é o verdadeiro estado do paiz, quaes são as doenças que achacam a sociedade, e quaes os remedios mais efficazes para cura-las.

Por esta occasião e para este fim, sente não ver no seu logar o sr. ministro da fazenda (O sr. Ministro da Justiça: — Esta na outra camara empenhado n'uma discussão), e não menos sente a ausencia do sr. ministro das obras publicas, talvez tambem por estar empenhado n'alguma discussão, porque tem de prescindir da presença de ss. ex.ªs, comtudo, como vê o sr. presidente do conselho, nutre a esperança de que o nobre duque se dignará responder a varias considerações que tem de expor. Ainda considera a s. ex.ª, e pede-lhe licença para continuar a chamar-lhe director politico do seu partido, apesar da guerra que dentro d'elle lhe estão fazendo muitos dos que se dizem seus partidarios, e que tambem alcançava o sr. Mendes Leal quando ministro da marinha, como se fez publico pela carta que s. ex.ª dirigiu ao nobre presidente do conselho, e que fez inserir nos jornaes, obtida a devida venia.

A attenção publica foi excitada pelas revelações d'aquella carta, e deseja ardentemente saber se ha ou não crise ministerial. Pela sua parte o orador tem por certo que ella existe pela propria natureza das cousas: esta situação é produzida pelo conjuncto de elementos incompativeis que tendem cada vez mais a separar-se. Muitos dos homens que se dizem amigos do sr. duque, estão-n'o a guerrear, nem póde ser outra cousa, porque não podem perdoar-lhe seu alto nascimento, nem sua aprimorada educação.

Não é sua intenção occupar-se da questão politica, e nem agora tocará na de alta moralidade publica, a questão importante por excellencia, porque já tem o seu logar designado na interpellação annunciada pelo digno par Sebastião José de Carvalho, que ha de ser considerada em todas as suas relações pelo interpellante com a proficiencia e isenção que todos lhe reconhecem, e por elle digno par até onde lh'o permittirem as suas forças. N'esta occasião limita-se a dar um voto de approvação ao projecto de resposta, que não é senão uma mensagem de respeito ao throno, e a expressão dos votos da camara para que se realisem as promessas que o governo fez. Não tem, nem póde ter outra significação a resposta que se discute, e por isso votando por ella não vota a favor do ministerio; e isso conhece-se bem, até olhando para a commissão que a propoz, onde se acha um membro mui distincto da opposição, que é o relator da commissão.

De accordo com o que prometteu, observou que o sr. ministro da justiça apresentára na legislatura passada duas propostas muito importantes: uma para abolir a pena de morte, e outra para regular o uso da liberdade de imprensa, e deseja saber se o nobre ministro ainda conserva as mesmas idéas que lh'as dictaram, ou se já as modificou. Emquanto á primeira, é convicção do orador que não chegou ainda o caso de poder-se adoptar sem grave perigo para a sociedade. E evidente pela simples leitura dos jornaes, quando não fosse bastante o simples bom senso para o affirmar, que os crimes tem augmentado muito n'estes ultimos annos pela certeza da impunidade. Não quer occultar que os apaniguados d'essa abolição dizem com todo o desembaraço que as estatisticas criminaes apontam pelo contrario uma diminuição mui grande na criminalidade; mas elle orador não se deixa seduzir por palavras que pouco trabalho lhes dão a dizer. Quer factos, e esses dizem que, tendo por diversas vezes requerido n'esta camara as estatisticas ao menos d'estes ultimos trinta annos, a resposta que veiu do ministerio competente, foi que não havia essas estatisticas! Sem tirar todo o effeito que poderia tirar d'esta resposta, limita-se a perguntar, se não ha essas estatisticas para se fazer a comparação, como ha quem se atreva a dizer que a criminalidade vae em decadencia? Ainda mais, com essa resposta negativa quanto ao passado e bem proximo, vieram as de alguns dos ultimos annos, e essas o que indicam é uma progressão constante da criminalidade.

E nem podia ser de outro modo, porque ao incentivo da impunidade se ajuntam outros, que tiram a sua origem do progresso material. Diz-se que a civilisação, que n'este progresso se firma e d'elle se auxilia, deve necessariamente influir para que os crimes diminuam; mas infelizmente as estatisticas dos paizes mais cultos, isto é, aquelles em que mais se desenvolve o progresso material, apontam uma progressão constante na criminalidade; e para o mostrar, chamou a attenção dos dignos pares para o que se passa em França, na Inglaterra e na Allemanha; e aqui designou especialmente o reino do Wurtemberg como aquelle que prima entre todos pelo desenvolvimento dado á civilisação material; o que se vê ali? que a criminalidade cresce n'uma proporção espantosa. (O sr. Ferrão: — Apoiado.) O orador agradecendo o testemunho tão auctorisado de um jurisconsulto justamente apreciado, observa que todos os criminalistas que têem estudado a questão que elle orador apenas vem esboçando, são unanimes em convir que a civilisação material desgraçadamente produz sempre e em toda a parte este triste resultado — a corrupção dos costumes e o desenvolvimento da criminalidade.

Como assumpto connexo trata do systema penal e reforma das prisões. O orador tinha estudado com interesse esta questão, e fazia parte de uma commissão que foi creada pelo governo para propor um projecto de reforma das prisões; mas infelizmente, depois que o digno par Silva Sanches teve a presidencia d'essa commissão nunca mais a convocou, talvez por motivos ponderosos que elle, sr. marquez, ignora quaes fossem, e por isso não os censura; lamenta apenas o facto que a inhibiu de apresentar o resultado dos seus trabalhos. E como o actual sr. ministro nomeou outra

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commissão para tratar d'essa reforma, pergunta a s. ex.ª qual é o systema que para ella prefere; se o cellular completo, se o isolamento parcial. É do sr. ministro do reino deseja saber se esta resolvido a melhorar o serviço da policia de segurança publica, que tamanha relação tem com a da reforma das prisões, que só por o emprego de ambos se póde reprimir proficuamente o crime. É uma cousa que s. ex.ª bastantes vezes tem promettido sem que chegasse ainda a occasião de cumpri-la. Será agora? deseja-o com todas as veras, porque não ha segurança riem pelas provincias nem aqui na capital, o que mostrou por alguns exemplos. E que se não dissesse que sempre houve crimes, e sempre os haverá por mais que se faça; pois se a essa causa se ajuntar a certeza da impunidade, mais poderosa ha de ser essa causa. Crimes sempre os houve na historia da humanidade, o que n'ella não ha é a impunidade erigida em systema.

Deseja Saber se o sr. ministro esta resolvido a renovar a iniciativa do governo por uma nova proposta para a abolição da pena de morte. Pela sua parte, e depois do que tem exposto, não póde occultar que, já como experiencia, já como regra permanente, a considera desastrosa o maior possivel á sociedade; e firmando-se na opinião do conde de Maistre, diz com toda a segurança de uma convicção profunda, que a apresentação de certas providencias, tomadas arbitrariamente sem terem sido precedidas por outras que preparem o terreno, prova grande imprevidencia e dá origem a desastres e horrores.

Referindo-se ao officio do sr. ministro da justiça que se leu na correspondencia, observou que s. ex.ª não disse que não tinha o governo entrado em nenhumas negociações com o representante da santa sé a respeito da reducção dos conventos de religiosas; e assim acredita que é exacto o que os jornaes disseram quanto a terem começado negociações para as quaes o sr. ministro dos negocios estrangeiros nomeou como negociador o digno prelado de Vizeu, o qual, depois de ter dado principio á sua incumbência, pediu a sua demissão, ou foi demittido. Por isso deseja o orador ser informado do que a tal respeito ha; assim como do estado em que se acha a questão da confirmação do bispo eleito de Macau; e o que se tem feito relativamente á questão provocada com tamanha imprudencia com os bispos que se recusaram a cumprir os decretos do governo supprimindo alguns conventos, quando já estavam entaboladas as negociações com o representante da santa sé: assim como pede que se lhe diga em que estado esta a questão com o sr. Bispo de Coimbra, pois por uma parte é sabido que s. ex.ª reverendissima não quer dar posse ao escrivão da camara ecclesiastica nomeado pelo governo, e por outra parte, ainda vê o sr. ministro naquellas cadeiras, tendo aliàs asseverado que ou o sr. bispo havia de aceitar o escrivão, ou deporia a pasta elle sr. ministro nas mãos do Sua Magestade.

Tambem pede a s. ex.ª que lhe diga se tem tenção de renovar a proposta regulando o uso da liberdade de imprensa. No caso affirmativo, deseja que s. ex.ª attenda aos meios de acabar a confusão que se dá nos diversos julgamentos, com relação á fórma de processo em policia correccional ou no jury; sendo uma a jurisprudencia do supremo tribunal de justiça, e diversa e variavel a dos tribunaes inferiores; e é preciso que cesse este estado de cousas em assumpto de tão vital interesse, quer para os cidadãos em particular, quer para a sociedade. Esta soffre muito da licença que se deixa aos livros e aos jornaes para atacarem a religião, a magestade real e a vida particular dos cidadãos, cousas estas que o governo, como representante supremo da sociedade, tem rigorosa obrigação de defender mais no interesse d'ella mesmo que dos offendidos. E para prova de que o não faz, alem do que já deixou dito, lembrou a Vida de Jesus, de Renan, que nega audazmente a divindade de Jesus Christo, atacando assim na sua base a religião catholica, a qual reune ao seu caracter de unica verdade, a qualidade de ser a religião do estado; e citou igualmente o Lucifer para perguntar se foram já chamados aos tribunaes os seus redactores, que são calumniadores encartados, que têem redigido todos esses jornaes indecentes que calumniam toda a gente, que são ministeriaes quando o governo lhes dá alguma cousa, ou opposição emquanto os não compram. Formam entre si uma especie de maçonaria com seus aprendizes, companheiros e mestres; vão a casas particulares pedir dinheiro por meio de ameaças, ou mandando cartas, o que sabe pelo que geralmente consta, e não porque nunca taes exigencias lhe fizessem, talvez por saberem que lhes não daria cousa alguma: são finalmente os mesmos homens que calumniaram o Senhor D. Pedro V, El-Rei o Senhor D. Fernando, e a virtuosa Rainha a Senhora D. Maria II...

O sr. Marquez de Ficalho: — Sr. presidente, eu peço a V. ex.ª que chame á ordem o digno par, o sr. marquez de Vallada, e a s. ex.ª digo que esta fazendo um pessimo serviço. Agora não se trata d'essa questão, e entendo até que certas personagens e em certas e determinadas occasiões, devem estar fóra da discussão, porque não podem entrar n'ella. O digno par devia callar-se porque tem culpas no cartorio.

O sr. Marquez de Vallada: — Não lhe parece estar fóra da ordem. Sempre foi licito fallar das pessoas reaes, já para dirigir-lhes louvor, já para desaffronta-las, e chamar a attenção do governo sobre os que as desacatam pela imprensa.

O sr. Presidente: — O digno par o sr. marquez de Ficalho chamou á ordem o digno par o sr. marquez de Vallada, e portanto parece-me que é á camara que pertence resolver esta questão que vou pôr á votação.

O sr. Conde d'Avila: — Sr. presidente, o digno par o sr. marquez de Vallada deve primeiro justificar, se esta ou não na ordem, para depois da sua justificação a camara poder então resolver a final (muitos apoiados).

O sr. Presidente: — Bem. Queira o digno par justificar em como esta na ordem.

O sr. Marquez de Vallada: — Explica a expressão, tem culpas no cartorio; dizendo que se refere a ter sido por duas vezes demittido de official mór da casa real; mas nenhuma dellas por causa de que lhe podesse vir desdouro; a primeira em 1844 por politica, mediante um decreto referendado pelo sr. conde de Thomar; e a segunda em 1851 a seu pedido, em consequencia da libré de que usavam os seus creados, e que se dizia confundir-se com a da casa real, sendo tanto uma como outra vez reintegrado por uma maneira bem honrosa para elle. Porém quer da sua bôca, quer da sua penna, jamais saíu uma só expressão de menos respeito para Suas Magestades...

O sr. Presidente: — Perdoe-me o digno par, parecia-me a proposito terminar este incidente, e que entrássemos daquillo que estava dado para ordem do dia.

O sr. Marquez de Niza: — A palavra sobre a ordem.

O sr. Presidente: — Eu não posso dar a palavra ao digno par sobre este incidente, que deve terminar.

O sr. Marquez de Vallada: - Pela sua parte já terminou, e vae continuar a discutir a reposta ao discurso da corôa.

O sr. S. J. de Carvalho: — Pede a palavra sobre a ordem.

O sr. Presidente: — Eu não dei a palavra a ninguem senão ao sr. marquez de Vallada.

O sr. Marquez de Niza: — Mas o digno par que tem a palavra permitte que eu falle sobre a ordem.

Uma voz: — Sr. presidente, V. ex.ª deve pôr termo a este incidente.

O sr. Presidente: — Antes do sr. marquez de Niza já o sr. Sebastião José de Carvalho tinha pedido a palavra, que pediu ha pouco pela segunda vez; e eu, que regulo os trabalhos, julgo acertado fazer esta proposta. Se a camara entende que o digno par esta fóra da ordem... (O sr. Marquez de Vallada: — Mas eu já a terminei, como disso.) Vou propor o que acabo de dizer, que é: se a camara entende que esta questão esta fóra da ordem?

O sr. Marquez de Niza: — Mas eu queria fallar antes da votação da camara.

O sr. Presidente: — A camara póde votar contra, mas eu estou no direito de propor.

A camara decidiu que o sr. marquez de Vallada não tinha saído da ordem.

O sr. Presidente: — Bem, a questão de ordem esta acabada.

O sr. Marquez de Niza: — A questão de ordem esta acabada; mas eu poderei fallar n'outra occasião sobre este incidente?

O sr. Presidente: — O digno par póde fallar depois neste incidente e em quantos incidentes quizer.

O sr. Marquez de Vallada: — Continuando o seu discurso, faz mais algumas considerações sobre a imprensa. Refere-se de novo ao Lucifer, ao que se passou com o Cábrion, e a um folheto que appareceu em 1858 tambem cheio de ataques á religião, e sobre o qual ainda não pronunciaram os tribunaes, apesar de se terem dado logo ordens terminantes; o que mostra a necessidade de uma reforma na legislação que rege a imprensa.

Pergunta ao sr. ministro do reino quaes são as suas idéas com relação á instrução publica, 'e se tenciona fazer alguma cousa em seu beneficio para tira-la do estado decadente em que se acha, e acabar um estado de cousas em que de facto se nega o direito paterno em assumpto do tamanho momento, qual é a instrucção e educação de seus filhos: e ao mesmo sr. ministro, na qualidade de ministro dos negocios estrangeiros, pede lhe diga se se trata de alguma concordata com a santa sé para a reducção de alguns conventos de religiosas; e se s. ex.ª não julga necessaria uma outra que regule as coisas religiosas no nosso paiz, pois são cousas que não deve descurar um governo que deveras queira organisar o paiz, revolvido e alastrado de ruinas por effeito do cataclismo pelo qual passou, e das commoções que foram e estão sendo o seu funesto acompanhamento. E por ultimo, se s. ex.ª e seus collegas estão unidos e compactos na resolução de não demorar por mais tempo a tão desejada e necessaria organisação, e nos meios e modo de a effectuar.

O sr. Seabra: — Parece-lhe que a camara não esta resolvida a prolongar muito este debate, no que esta de perfeito accordo, porque ha muitos annos é sua opinião que o discurso á corôa não deve considerar-se senão como uma homenagem de respeito ao throno. Esta prompto a entrar com o seu contingente e dar um voto consciencioso nas questões especiaes, mas não concorrerá nunca para se perder o tempo em questões de omni scibili em politica, de que não póde resultar proveito nenhum.

Comtudo, lendo no projecto de resposta o paragrapho que começa pelas palavras: «Nomeando os novos membros da camara electiva pacificamente, etc», não póde conter-se que não felicitasse a commissão pelo testemunho que veiu prestar ao principio da liberdade da uma, sem o qual o governo representativo é uma mentira, a constituição desapparece, e o baixel do estado soçobra pela violencia das tempestades politicas. Sincero amigo da liberdade, com os primeiros raios da qual se lhe aqueceu o coração, conhece todo o alcance das palavras da commissão; mas serão ellas uma aspiração ou um voto de que se pede a realisação? É a este ultimo sentido que as toma, porque, salvas mui raras excepções, o que se tem visto entre nós é-o sophisma d'este principio,.ao qual attribue todas as desgraças de que temos sido victimas.

O orador, lamentando que tal tenha sido a pratica, ainda mais lamenta que se chegue a quere-la estabelecer em systema com o nome de candidaturas, que se procura abonar com duas rasões, que não passam de dois sophistnas. É o primeiro que o governo se não deve entregar nas mãos dos partidos, e o sophisma consiste em confundir-se a idéa moral de governo com as pessoas dos ministros. Aquelle é estavel, deve ser superior aos partidos; mas estas podem e devem rarear, e as que hoje pertencem á um partido serem substituidas por outras de outro partido. O segundo é que o governo não exerce pressão alguma quando os seus agentes indicam os nomes e pedem aos eleitores que os adoptem. Consiste o sophisma em occultar que logo que esses nomes lhe são indicados, o povo treme, já porque a idéa de que o governo manda é geralmente mui forte para que se atrevam os eleitores a desobedecer-lhe, já principalmente porque as auctoridades sabem corroborar as suas indicações com ameaças, mais ou menos disfarçadas, mas bastante intelligiveis para produzirem effeito, como o recrutamento e as contribuições.

Para mostrar que isto que tem dito é o effeito de uma sincera convicção, pela qual a pratica esta de accordo com a theoria exposta, conta o que se passou com elle mesmo, sendo ministro da justiça, quando se tratou das eleições em Aveiro.

Fazendo algumas considerações sobre o paragrapho em que se falla do codigo civil, disse que acompanhava a commissão tanto nos desejos que manifesta como no modo, pois entende que a carta se resume na garantia dos direitos civis o individuaes, sem os quaes não ha liberdade politica: esta affiança-os e protege-os, e elles dão-lhe o fundamento e a vida. Hoje ha grandes confusões que cumpre fazer cessar. Nas questões de direito civil a maior parte das nossas leis são subsidiarias, e d'aqui resulta que o juiz é ao mesmo tempo legislador, porque na immensidade das disposições vae buscar a que mais lhe agrada; e póde assim dizer-se que é elle que faz a lei. Por este modo a divisão dos poderes, estabelecida na carta, não existe realmente.

O sr. S. J. de Carvalho: — Disse que tinha pedido á palavra quando se levantou o incidente entre os dignos pares marquezes de Ficalho e de Vallada, por isso referindo-se de passagem a esse incidente disse que lhe parecia não se haver seguido em todo o seu rigor a disposição regimental quo regula taes incidentes. Pediu á mesa, em vista da declaração feita pelo sr. ministro da guerra no principio da sessão, que se officiasse ao ministerio da guerra pedindo que fossem remettidos com urgencia á camara os documentos que elle, orador, havia requerido. Referindo-se ao orador que acabava de fallar disse que uma vez levantada a discussão na resposta ao discurso da corôa, se vê obrigado a declarar as rasões porque se teria abstido de tomar parte no debate se o orador a que se referia produzindo varias considerações sobre a liberdade da uma, o não houvesse animado a tomar a palavra para de coração se associar á manifestação franca e enthusiastica que o mesmo digno par havia feito a favor dos verdadeiros principios liberaes. Que julgando conveniente a proclamação de taes principios, folga com que a commissão que redigiu a resposta ao discurso da corôa se referisse ao acto eleitoral nos termos em que o fez. Que a liberdade da uma não era uma realidade, que as ultimas eleições se não fizeram, desaffrontado o espirito dos eleitores da pressão da auctoridade, mas que como a commissão se não propunha senão a paraphrasear o discurso da corôa, fizera muito bem em responder á asserção do governo de que em todo o reino as eleições se fizeram pacificamente, pelo modo porque o fez as antigas maiorias, disse que o digno par se enganou quando proferiu essas palavras tomando por symptoma de liberdade a dissidencia que então lavrava na maioria no seio da qual o digno par fallava. Que depois da reforma eleitoral tem havido para todos os governos as mesmas maiorias compostas, arrastando as mesmas cadeias. Que a grilheta a que o digno par alludiu só se despedaçaria quando a liberdade da uma fosse uma realidade e não uma ficção, e que para isso a principal condição essencial era accommodar á educação constitucional que o paiz tem, e a sua instrucção á lei eleitoral.

Que as eleições podiam fazer-se pacificamente, sem que por isso se entendesse que tinham -sido feitas livremente. O silencio feito em roda da uma, assimelha-se á paz dos tumulos; é a ausencia da vida, da vida que accusa a luta dô opiniões, que anima, vivifica e robustece o systema da liberdade. Que prescindindo de produzir contra o governo todas as provas, que resultam de factos praticados em todo o paiz, e pelos quaes se vê que a liberdade da uma nas ultimas eleições fôra affrontada pela acção do governo, bastava-lhe apresentar perante a camara o facto de que o sr. ministro da fazenda, que vê presente, poude trazer ao parlamento uns poucos de membros da sua familia cercando-a de uma popularidade que o paiz lhe não conhecera até á ascensão de s. ex.ª ao poder.

Que a pressão da auctoridade fôra a mesma que tem sido sempre, que a lei eleitoral que elle, orador, votaria com enthusiasmo, não deu ao paiz os fructos que d'ella se esperavam colher. Que a culpa não era da lei mas dos governos que a não queriam cumprir, e que não trabalhavam pior dar ao paiz a educação constitucional que elle deve ter para comprehender bem a importancia do mandato que pela eleição constitue.

Citando a opinião do digno par o sr. Seabra que tem uma sessão da camara dos senhores deputados dissera, sendo collega d'elle orador, que com o novo systema eleitoral se havia partido a grilheta que algemava.

O sr. Presidente: — Eu não sei se já disse ao digno par que a primeira cousa de que se ha de tratar logo que finde a discussão sobre a resposta ao discursado throno, ha de ser a sua interpellação; mas por emquanto não se póde fixar dia.

O sr. S. J. de Carvalho: — Eu peço perdão a V. ex.ª; mas parece-me que se póde marcar desde já o dia se se disser que a interpellação que preterido dirigir ao sr. mi-

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nistro da guerra terá logar na sessão immediata áquella em que se votar o projecto de resposta ao discurso do throno. E o que requeiro a V. ex.ª

O sr. Presidente: — Parece-me que a camara não terá duvida em approvar o requerimento do digno par Sebastião José de Carvalho (apoiados).

Muito bem; n'esse caso será a ordem do dia da primeira sessão, depois de votada a proposta que esta pendente, a interpellação que o digno par Sebastião José de Carvalho annunciou ao sr. ministro da guerra. Logo que finde a discussão da resposta á falla do throno, marcarei o dia para a interpellação.

O sr. S. J. de Carvalho: — Peço a V. ex.ª que declare desde já que seja a sessão immediata áquella em que finde a discussão do projecto de resposta, aquella em que se deve verificar a minha interpellação (apoiados).

O sr. Presidente: — Muito bem. Se a camara assim o entende, terá a bondade de manifesta-lo (apoiados). Os dignos pares que approvam a indicação do sr. Sebastião José de Carvalho, tenham a bondade de se levantar (apoiados).

O sr. Marquez de Niza: — Eu sinto ter de chamar outra vez a attenção da camara sobre o incidente que teve logar aqui, tanto mais quanto o digno par o sr. Sebastião José de Carvalho, já se occupou d'elle; entretanto eu encaro-o debaixo do ponto de vista differente d'aquelle em que o encarou o digno par. S. ex.ª referiu-se ao que se passou quando o digno par o sr. marquez de Ficalho interrompeu o sr. marquez de Vallada. V. ex.ª, sr. presidente, propoz que = a camara resolvesse se o digno par estava ou não na ordem =. Eu não posso deixar ficar em pé este precedente, que seria terrivel. O regimento confere unicamente ao presidente o direito de chamar á ordem, porque considera, e considera bem que elle deve estar com tanto sangue frio, que nunca chamará á ordem qualquer digno par, senão quando elle effectivamente estiver fóra d'ella. É só o presidente que tem esse direito, porque então, a não ser assim, quando qualquer membro da camara fallasse em sentido que não agradasse a outro, este chama-lo-ia logo á ordem. Isso não póde ser. O artigo 52.° do regimento é muito explicito (leu).

Temos tambem o artigo 54.°, que é muito explicito, o qual confere unicamente ao presidente, como disse, o direito de chamar á ordem (leu).

Portanto eu peço a V. ex.ª simplesmente que pergunte á camara se quer sustentar o artigo 54.° do regulamento ou altera-lo, porque se quizer sustenta-lo, nunca mais se repetirão estes incidentes.

O sr. Marquez de Ficalho: — Parece-me que não me expliquei bem. Eu pedi ao sr. presidente que chamasse á ordem o digno par, mas não o chamei eu. Julgo que estava no meu direito de pedir ao sr. presidente que chamasse á ordem o digno par, e muitas vezes a camara o tem feito. Não insisti em querer defender a minha proposta, porque a camara decidiu que o digno par estava na ordem. Fez muito bem, e o digno par póde continuar sempre da mesma maneira, porque eu nunca tornarei a pedir ao sr. presidente que o chame á ordem.

O sr. Marquez de Vallada: — Muito obrigado.

O sr. Marquez de Niza: — V. ex.ª põe á votação a minha proposta?

Vozes: — Não é preciso, porque o regimento é lei.

O sr. Presidente: — E lei em quanto não for revogado.

O sr. Marquez de Niza: — Bem; fica completamente satisfeito o meu fim.

O sr. Conde de Thomar: — Se a camara me permitte, direi só duas palavras referindo-me principalmente a uma asserção que ha pouco se fez n'esta casa. Parece-me que a rectificação de uma asserção deve seguir-se a esta.

Sr. presidente, eu não tinha tenção de entrar na discussão do projecto de resposta ao discurso da corôa. Devo comtudo dar uma pequena explicação, ou antes rectificar uma asserção que fez o sr. marquez de Vallada. A rectificação não é muito facil de fazer; mas verei se a faço de modo que não se possa dizer de que faltei a alguma conveniencia constitucional.

Sr. presidente, o digno par, o sr. marquez de Vallada, disse que tinha sido demittido do cargo de official moída casa real por politica, e por decreto referendado pelo conde de Thomar. É claro e evidente que, segundo o digno par, s. ex.ª foi demittido por politica, e que essa demissão foi referendada pelo conde de Thomar. O decreto existe, e eu não declino a responsabilidade da minha referenda; mas tenho a declarar que nunca da minha parte, nem da parte dos collegas com quem tive a honra de servir, e que hoje se acham espalhados por differentes campos politicos dos que existem no paiz, foi a politica tomada em consideração para as nomeações ou demissões dos creados da Soberana. (O sr. Conde de Castro: — Apoiado.) Limito-me a esta pequena explicação.

E visto que tomei a palavra, peço licença para fazer uma pergunta ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, a qual será muito simples. É sabido que ha pouco tempo saíu do porto de Lisboa em direcção á America, e designadamente a Montevideu, uma divisão naval portugueza. E tambem sabido que hoje existem pendencias de alta importancia entre o imperio do Brazil e algumas daquellas republicas, as quaes têem grande ciúme que a bandeira de qualquer nação europeia appareça nas suas paragens, principalmente n'esta occasião. Desejava eu saber se a divisão naval que saíu de Portugal, teve unicamente em vista o exercicio dos nossos marinheiros, ou a protecção do nosso commercio e a dos subditos portuguezes, ou se teve instrucções para intervir directa ou indirectamente nos acontecimentos que estão tendo logar naquellas paragens. Limito-me a esta pergunta, desejando que o sr. ministro dos negocios estrangeiros tenha a bondade de me dar uma resposta.

O sr Presidente do Conselho (Duque de Loulé): — Sr. presidente, entendo não dever demorar a resposta á pergunta que acaba de me fazer o digno par, attenta a sua reconhecida importancia. Não faço o mesmo a respeito de outras, que me foram feitas por alguns dignos pares, porque na continuação do debate satisfarei a ss. ex.ªs A pergunta do digno par o sr. conde de Thomar, como disse, é de tal natureza, que convem dar já a explicação necessaria (apoiados.)

Sr. presidente, a nossa pequena divisão naval teve instrucções muito positivas e claras para que de modo algum influisse, nem directa, nem indirectamente nas questões que se agitam entre o imperio do Brazil e algumas republicas da America do sul. Foi tão sómente incumbida de proteger os interesses que ali temos, e bem assim os direitos da população portugueza, e de os patrocinar conforme fosse necessario, attendendo ao estado de guerra em que se acham aquelles paizes.

O sr. Conde de Thomar: — Estou completamente satisfeito.

O sr. Ministro da Guerra — Pedi a palavra para mandar para a mesa os documentos exigidos pelo digno par o sr. Sebastião José de Carvalho.

Vozes: — Deu a hora.

O sr. Presidente: — A primeira sessão terá logar na terça feira, e logo que se conclua a discussão do projecto de resposta ao discurso da corôa, terá logar no dia immediato a interpellação do digno par o sr. Sebastião José de Carvalho.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas da tarde.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão de 4 de fevereiro de 1865

Ex.mos srs. Conde de Castro

Duque de Loulé

Marquez de Ficalho

Marquez de Niza

Marquez de Vallada

Conde de Avila

Conde da Azinhaga

Conde da Fonte Nova

Conde de Linhares

Conde da Louzã

Conde de Parati

Conde de Peniche

Conde da Ponte de Santa Maria

Conde de Rio Maior

Conde de Thomar

Visconde de Algés

Visconde de Benagazil

Visconde de Condeixa

Visconde do Fornos de Algodres

Visconde de Gouveia

Visconde da Vargem da Ordem

Visconde de Ribamar

Visconde de Soares Franco

Barão de Villa Nova de Foscôa

Antonio de Azevedo Coutinho Mello e Carvalho

Alberto Antonio de Moraes Carvalho

Antonio José de Mello (D)

Antonio Luiz de Seabra

Antonio de Macedo Pereira Coutinho

Barreto Ferraz

Custodio Rebello de Carvalho

Diogo Antonio de Sequeira Pinto

Francisco Antonio Fernandes da Silva Ferrão

Francisco Simões Margiochi

João de Almeida Moraes Pessanha

João Osorio e Sousa

Joaquim Antonio de Aguiar

Joaquim Filippe de Soure

José Augusto Braamcamp

José da Costa Pinto Bastos

José Bernardo da Silva Cabral

José Gerardo Ferreira Passos

José Joaquim dos Reis e Vasconcellos

José Maria Baldy

José Maria Eugenio de Almeida

Luiz Augusto Rebello da Silva

Luiz de Castro Guimarães

Manuel Antonio Vellez Caldeira Castello Branco

Miguel do Canto e Castro

Sebastião José de Carvalho

Vicente Ferrer Neto Paiva

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