O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

427

e bom tractamento dos libertos nos trinta e sete artigos que o compõem.

Entre as provisões do Decreto de 14 de Dezembro de 1854 acha-se determinado, que desde a publicação do mesmo Decreto todos os escravos que forem propriedade do Estado ficarão de condição livre, e tambem que todos os escravos importados por terra nas colonias portuguesas ficarão na condição de libertos.

Ora, como pelo Decreto de 10 de Dezembro de 1836 foi abolido o trafico da escravatura que se fazia por mar, segue-se daqui, que se acha prohibida a introducção de escravos nos territorios portuguezes.

Attendendo, pois, a esta circumstancia, a commissão do ultramar achou que era desnecessario determinar que o Alvará de 19 de Janeiro de 1761 fosse mandado executar, e por isso foi eliminado do projecto de Lei o que a elle diz respeito.

Quanto á disposição fundamental do projecto de Lei, aquella que estabelece que tenha execução a toda a monarchia o Alvará, com força de Lei, de Janeiro de 1773, se ella for adoptada e promulgada como Lei do Estado, obter-se-ha que em todos os territorios de Portugal ha de completamente cessar de existir o estado de escravidão no mesmo tempo em que cessar de viver a geração contemporanea á sua promulgação.

Este mesmo foi o resultado obtido no reino de Portugal pela publicação do referido Alvará, achando-se extincta completamente a escravidão, sem que o Estado tivesse que pagar indemnisação alguma, porque por aquelle Alvará se legislou em favor de individuos ainda não existentes, e que por isso não podiam ser objecto de indemnisação.

Outra caracteristica da medida proposta é que a substituição nos trabalhos agricolas e outros dos escravos por homens livres, se fará gradualmente, e á proporção em que os primeiros forem cessando de existir; portanto, não poderá dar-se desarranjo algum no que diz respeito á offerta, ou á procura dos trabalhadores.

Os tractados feitos para a suppressão do trafico da escravatura e o Decreto de 10 de Dezembro de 1836 prohibiram absolutamente este iniquo commercio, e estabeleceram os meios de repressão que se julgaram sufficientes, quando aquellas medidas se tomaram.

Entretanto, é certo que, se bem se tenha conseguido diminuir consideravelmente o mesmo trafico nas colonias portuguezas, elle alli não se acha de todo extincto, pois que de tempos a tempos se recebem noticias de casos occorridos nas calonias africanas, e em Timor, de exportação de escravos.

Dos lucros enormes que dentro de pouco tempo se tiram dos capitães empregados no commercio de escravos, resulta, que em quanto este trafico não for anniquillado nas nossas colonias, pouco desenvolvimento poderá ter nellas qualquer industria agricola, ou fabril, que alli se pertenda estabelecer, porque, em geral, os capitaes empregam-se nas especulações donde mais lucros se podem esperar.

E a prova de que o adiantamento das ditas colonias progride na razão directa da perseguição feita ao trafico, está em que naquellas em que esta perseguição tem sido mais efficaz, taes como nas provincias de Cabo-verde, S. Thomé e Principe, e Angola, tem augmentado a exportação e importação de generos do commercio licito, e as suas alfandegas teem augmentado em rendimentos; de sorte que as receitas publicas destas provincias quasi que chegam para as suas despezas, ao mesmo tempo que na provincia de Moçambique, onde o trafico não tem sido tão perseguido, e onde por isso se tem mantido mais ou menos, alli o commercio lícito é insignificante, a industria agricola pouca, e por isso são pouco valiosos os rendimentos das suas alfandegas, ou antes da sua alfandega, porque naquella possessão tem-se deixado existir o inaudito absurdo de permittir que a cidade de Moçambique fosse a metropole commercial dos mais portos da provincia, sendo vedado o commercio directo destes com todos os mais portos do globo, inclusivamente os de Portugal e suas colonias.

A experiencia e o raciocinio teem demonstrado que o trafico da escravatura não poderá acabar em quanto existir o estado de escravidão.

Mas o estado de escravidão não póde ser abolido desde já nas colonias portuguezas, porque seria necessario dispender dois ou tres mil contos de réis para indemnisar os possuidores de sessenta a setenta mil escravos, que tantos se calcula existirem nas mesmas colonias, e as circumstancias da Fazenda publica não permittem fazer tal despeza.

Não resta, portanto, outro meio senão o de adoptar para aquellas provincias as disposições do Alvará de 16 de Janeiro de 1773, isto é, a abolição gradual da escravidão.

E a abolição gradual que foi effeituada pelas disposições deste Alvará, e pelas do Decreto de 14 de Dezembro de 1854, que falicita aos escravos a faculdade de se emanciparem, concorrendo simultaneamente para diminuir o numero destes, tornará por isto possivel que dentro de alguns annos se faça a emancipação geral em todas as possessões portuguezas.

A commissão observará ainda, que havendo sido abolida completamente a escravidão nas colonias da Gram-Bretanha, da França, da Dinamarca, e da Suecia, e nos territorios de quasi todos os Estados hispano-americanos, e até mesmo na Regencia de Tunes, não poderá distar muito a época em que ella seja tambem abolida nas colonias dos outros Estados europeus aonde ainda existe.

Quando, pois, tudo nos indica que uma mudança, no estado presente das cousas, se torna inevitavel, a prudencia nos aconselha que é melhor faze-la a tempo e gradualmente, do que deixa-la exposta a contingencias imprevistas.

Por todos os motivos que ficam expostos, e pelos principios de justiça e de humanidade que devem dominar as mais considerações, a commissão do ultramar, de accôrdo com o Sr. Ministro da Marinha e Ultramar, que foi ouvido, é de parecer que o projecto de lei, apresentado pelo digno Par Visconde de Sá da Bandeira, deve ser approvado, sendo, porém, reduzido á fórma seguinte:

Projecto de lei sob n.° 486.

Artigo 1.º Os filhos de mulheres escravas, que nascerem nas provincias ultramarinas desde a publicação desta Lei em diante, ficarão considerados de condição livre, do mesmo modo que para o continente do reino dispõe o Alvará de 16 de Janeiro de 1773.

Art. 2.° O Governo fará os regulamentos necessarios, assim para dar a devida protecção aos filhos das mulheres escravas, de que tracta o artigo 1.°, como para o effeito de que esta Lei tenha a mais prompta e inteira execução.

Art. 3. Fica derogada a legislação em contrario.

Casa da commissão, 26 de Março de 1855. = Marquez de Loulé —Barão de Lazarim —Visconde de Castro — Conde do Bomfim — Sá da Bandeira.

Alvará de 16 de Janeiro de 1773.

Eu El-Rei Faço saber aos que este Alvará, com força de Lei, virem: Que depois de ter obviado pelo outro Alvará de dezenove de Setembro de mil setecentos sessenta e um, aos grandes inconvenientes que a estes reinos se seguiam, de se perpetuar nelles a escravidão dos homens pretos, tive certas informações de que em todo o reino do Algarve, e em algumas provincias de Portugal, existem ainda pessoas tão faltas de sentimentos de humanidade e de Religião, que guardando nas suas casas escravas, umas mais brancas do que elles, com os nomes de pretas e de negras, outras mestiças, e outras verdadeiramente negras, para pela reprehensivel propagação dellas perpetuarem os captiveiros por um abominavel commercio de peccados, e de usurpações das liberdades dos miseraveis nascidos daquelles successivos, e lucrosos concubinatos, debaixo do pretexto de que os ventres das mais escravas não podem produzir filhos livres, conforme o direito civil: E não permittindo, nem ainda o mesmo direito, de que se tem feito um tão grande abuso, que aos descendentes dos escravos, em que não ha mais culpa que a da sua infeliz condição de captivos, se estenda a infamia do captiveiro, além do termo que as Leis determinam, contra os que descendem dos mais abomináveis réos dos atrocíssimos crimes de lesa Magestade Divina, ou humana: E considerando a grande indecencia, que as ditas escravidões inferem aos meus vassallos; as confusões e odios que entre elles causam, e os prejuizos que resultam ao Estado de ter tantos vassallos lesos, baldados, e inuteis, quantos são aquelles miseraveis que a sua infeliz condição faz incapazes para os officios publicos, para o commercio, para a agricultura, e para os tratos e contratos de todas as especies: Sou Servido obviar a todos os sobreditos absurdos. Ordenando, como por este Ordeno: Quanto ao preterito, que todos aquelles escravos, ou escravas, ou sejam nascidos dos sobreditos concubinatos, ou ainda de legitimos matrimonios, cujas mais e avós são, ou houverem sido escravas, fiquem no captiveiro em que se acham, durante a sua vida sómente: Que porém aquelles cuja escravidão vier das bisavós, fiquem livres e desembargados, posto que as mais e avós tenham vivido em captiveiro: Que quanto ao futuro, todos os que nascerem do dia da publicação desta Lei em diante, nasçam por beneficio desta inteiramente livres, posto que as mais e avós hajam sido escravas: E que todos os sobreditos, por effeito desta Minha Paternal e Pia Providencia libertados, fiquem habeis para todos os officios, honras, e dignidades, sem a nota distinctiva de libertos, que a superstição dos Romanos estabeleceu nos seus costumes, e que a união christã e a sociedade civil faz hoje intoleravel no Meu reino, como o tem sido em todos os outros da Europa.

E este se cumprirá tão inteiramente como nelle se contêm. Pelo que: Alando á Mesa do Desembargo do Paço, Conselho da Minha Real Fazenda e do Ultramar, Casa da Supplicação, Mesa da Consciencia e Ordens, Senado da Camara, Junta do Commercio destes reinos e seus dominios, Governador da Relação e Casa do Porto, e mais Ministros, Officiaes de Justiça, e Pessoas destes reinos, que cumpram, e guardem, e façam inteiramente cumprir e guardar este Meu Alvará, sem embargo de quaesquer outras Leis, ou Disposições que se opponham ao seu conteudo, as quaes Hei tambem por derogadas para este effeito sómente, ficando aliás sempre em vigor. E Mando ao Doutor João Pacheco Pereira, do Meu Conselho, que serve de Chanceller Mór destes reinos e senhorios, o faça publicar e registar na Chancellaria Mór do Reino: E da mesma sorte será publicado nos Meus reinos, e em cada uma das comarcas delles, para que venha á noticia de todos, o se não possa allegar ignorancia: registando-se nas Relações de Lisboa e Porto, o nas mais partes onde similhantes Lei s se costumam registar, e lançando-se este mesmo Alvará no Meu Real Archivo da Torre do Tombo. Dado no Palacio de Nossa Senhora de Ajuda, em dezeseis de Janeiro de mil setecentos setenta e tres. = REI.

Projecto de lei n. 479.

Artigo 1. Os Alvarás, com força de Lei, da 19 de Setembro de 1761, e de 16 de Janeiro de 1773, que determinaram: 1.°, que ficassem de condição livre todos os individuos escravos que entrassem no territorio do reino de Portugal; e 2.°, que os filhos de mulheres escravas que nascessem no mesmo territorio, depois da publicação do ultimo dos ditos Alvarás, nascessem de condição livre, serão executados desde a publicação desta Lei, em todos os territorios da monarchia portugueza, sem excepção alguma.

Art. 2.° O Governo tomará todas as medidas que forem necessarias, para que as disposições desta Lei tenham prompta e inteira execução.

Art. 3.° Fica derogada a legislação em contrario.

Camara dos Pares, 22 de Fevereiro do 1855. = Visconde de Sá da Bandeira.

O Sr. Visconde de Sá — A hora está muito adiantada, e por isso procurarei limitar-me o mais que fôr possivel.

Pela historia do projecto da emancipação dos escravos existentes nas colonias portuguezas que se lê no parecer da commissão se vê, que este projecto é já cousa antiga, pois que em 1836 se achava preparado um Decreto, que por circumstancias se não publicou, para que a disposição do Alvará de 1773 tivesse execução nas provincias ultramarinas. Em 1842 apresentou-se nesta Camara outro projecto que tinha por fim a emancipação immediata de todos os escravos que existiam, no Governo geral do Estado da India que naquella época comprehendia tambem Macau, Timor e Solôr. Os Srs. Deputados daquelle Estado que então existiam, em Lisboa, naturaes daquelles paizes, foram consultados sobre a conveniencia de tal medida, assim como o foi o Sr. D. Manoel de Portugal e Castro, ultimo Vice-Rei do mesmo Estado, e todos deram por escripto a sua opinião, sendo unanimes em que sem inconveniente algum a emancipação se podia fazer alli immediatamente, porque a escravidão não era necessaria. Entrando o projecto de lei em discussão nesta Camara, o Governo concordou na conveniencia do principio, mas pediu que se sobreestive na sua approvação, até que elle podesse propôr ás Côrtes os meios necessarios para a indemnisação dos proprietarios dos escravos. Assim se adiou a discussão do projecto. Em 1849 foi apresentada a esta Camara uma nova proposta de lei com o fim de que os Alvarás de 19 de Setembro de 1761, e de 16 de Janeiro de 1773, fossem executados em todos os territorios portuguezes do Ultramar, e continha muitas das provisões, que foram ordenadas pelo Decreto de 14 de Dezembro de 1854, promulgado pelo Governo em virtude da auctorisação que lhe dá o acto addicional. Este Decreto é um daquelles que faz honra á administração que o publicou. Elle facilita aos escravos a acquisição da sua alforria; e dá aos escravos o direito de remirem a sua propria liberdade; robora o principio importante, de que todo o individuo deve ser considerado de condição livre, até que se prove que elle é escravo: organisa Juntas protectoras dos escravos e libertos com direito de intervirem perante a justiça em beneficio destas classes, de cuidarem dos seus pecúlios, de promoverem a emancipação gradual, e dos mais interesses das mesmas classes; determina, que um costume muito louvavel, que ha em Cabo-verde desde remotos tempos, se torne igualmente extensivo a todos os dominios portuguezes, este costume consiste em que o filho da mulher escrava, em favor de cuja liberdade no acto do baptismo apresenta alguem certa pequena quantia de dinheiro, a qual seja entregue ao padre, fica desde logo de condição livre; medida esta que n'um certo prazo deve contribuir para a diminuição do numero dos escravos. O mesmo Decreto prohibe que nas vendas de escravos seja separado o marido de sua mulher, e os pais dos filhos menores; determina que nos leilões de escravos tenham preferencia os lanços em favor da emancipação dos escravos que se estão arrematando, e que estes lanços não possam ser cobertos por outros: prohibe que castigos crueis sejam dados aos escravos: declara o modo como os libertos podem passar á condição de ingenuos, e manda fazer registos geraes de todos os escravos existentes nos territorios portuguezes. Estabelecidos que sejam estes registos o numero de escravos nas colonias não póde augmentar. E se fôr adoptado o projecto em discussão, seguir-se-ha que o seu numero ha-de diminuir progressivamente pela morte, fuga, e emancipação. Ora, no decurso dos annos o numero de escravos achar-se-ha tão diminuto, que se tornará facil dar indemnisações pecuniarias aos senhores dos escravos então existentes, effeituando assim a emancipação total, o que hoje se não pode fazer porque não se poderiam empregar 3.000:000$000 réis no resgate de 60 a 70 mil escravos que ha nos territorios coloniaes portuguezes. E ainda mesmo que o estado das cousas se deixasse á acção do tempo, esta seria bastante para que deixasse de haver escravidão quando acabasse de existir a geração actual.

Será sómente então que neste particular nos acharemos nas mesmas circumstancias que aquellas nações europeas que nas suas colonias tem abolido a escravidão, á custa de despezas muito consideraveis.

O Parlamento inglez applicou para o resgate de 800 mil escravos vinte milhões de libras esterlinas, e os escravos que assim se libertaram, em geral, teem-se portado bem: o Governo francez applicou para a remissão de mais de 200 mil escravos uma somma muito consideravel, e os emancipados teem-se conduzido perfeitamente bem, tendo occorrido sómente na ilha de Guadelupe, ao princio, algumas desordens, que em breve acabaram; póde-se tambem dizer que os pretos forros nas pequenas colonias de Dinamarca e da Suecia se tem conduzido com toda a ordem.

A Hollanda tem igualmente tractado de libertar os escravos das suas colonias, dando-se indemnisações pecuniarias aos seus donos, e espera-se que não ha-de tardar a época em que isto se effeitue.

Uma proposta para se fazer nas nossas colonias o mesmo que fizeram nas suas a Inglaterra e a França, para libertar todos os escravos indemnisando os proprietarios, seria inutil, porque o estado da fazenda publica não permittiria que as Côrtes a approvassem. Mas se a emancipação total se não póde obter assim, poderá conseguir-se por actos progressivos, o que tem a vantagem de ir introduzindo na vida civil individuos, que, entrando nella a pouco e pouco, nenhum desarranjo causam á ordem existente das cousas, especialmente no que diz respeito aos trabalhos agricolas. Não havendo por este modo a receiar que succeda o que occorreu na ilha Mauricia, onde os emancipados considerando que o trabalho é apenas um appendice da escravidão,,limitavam-se a trabalhar para si, e não para os outros. Foi então necessario recorrer e promover á emigração de trabalhadores ou cules da India para a ilha Mauricia, e outras colonias inglezas.

Nós não precisamos da introducção nas nossas colonias de individuos de outros paizes para nellas trabalharem. O Decreto de 14 de Junho de 1814 permitte a entrada de novos individuos para trabalharem nas colonias da Africa continental, não como escravos, mas como libertos sujeitos a prestarem serviços durante um certo numero de annos. Agora direi, que me parece que o projecto deve ser approvado, tambem pelo motivo de que sem a abolição da escravidão é impossivel civilisar os paizes africanos; e que será sómente por meio da civilisação dos negros existentes nas colonias portuguezas, que estas poderão ter um grande desenvolvimento em agricultura e industria, ganhando com isso a nação portugueza, no augmento que effectivamente deverão ter a sua navegação, commercio, e industria fabril, especialmente a do reino; por isso devemos por todos os modos cuidar em emancipar e civilisar os negros, e a sua civilisação será mais facil de effeituar do que muita gente pensa; para nos convencermos disto bastará reflectir o que succedeu nas ilhas de Sandwich, onde os habitantes eram mais barbaros do que são os africanos, e entretanto os missionarios americanos conseguiram formar delles no espaço de alguns annos uma nação bem ordenada, com um governo representativo, composto de um Rei e duas Camaras, imprensa periodica, vestuario á moda da Europa.

Resultados analogos da civilisação dos indigenas tem sido obtidos em outras ilhas do Mar Pacifico. Na Nova Zelândia, por exemplo, onde elles eram mais barbaros e mais crueis, estão hoje comparativamente policiados, e sendo dotados de grande intelligencia, tem tractado do se aproximarem aos costumes europeus. O nosso dever e o nosso interesse concordam em que nos cumpre empregar todos os meios ao nosso alcance para que os negros habitantes das nossas colonias, sejam ensinados pelos principios da moral religiosa, e instruídos nas artes da civilisação europea. Assim poderemos consolidar um imperio na Africa Austral, e obter alli resultados similhantes aquelles que a Hollanda tira de Java, Sumatra, e outras ilhas do Archipelago oriental, concorrendo poderosamente para que se eleve a cathegoria politica da nação portugueza; Terminarei o que tinha a dizer com a leitura dos extractos de dois officios que se acham impressos na collecção de documentos sobre o trafico da escravatura, apresentados ao Parlamento pelo Governo inglez em 1854.

Extracto de uma nota dirigida pelo Conde de Lavradio, Ministro Plenipotenciario de Portugal em Londres, ao Conde de Clarendon, Ministro dos Negocios Estrangeiros de Sua Magestade Britânica, datado de 17 de Setembro de 1853:

«O Governo de Sua Magestade Fidelissima está firmemente resolvido, mesmo á custa de grandes sacrificios (além dos muitos que já tem feito) a impedir não só o trafico, mas a pôr um termo ao estado de escravidão nas suas possessões, tanto na Azia como na Africa, e isto não só porque tal é o seu dever, mas também o seu interesse.

O interesse de Portugal, sobre tudo depois da separação do Brasil, é fixar a população nas suas possessões africanas, liberta-la gradualmente com prudencia, e civilisa-la encaminhando-a para a cultura das terras e exploração de suas muitas riquezas naturaes.»

Extracto de uma nota dirigida pelo Conde de Clarendon ao Conde de Lavradio, em 26 de Novembro de 1853, em resposta á nota do Conde de Lavradio, em 17 de Setembro antecedente: «O abaixo assignado não póde concluir esta nota sem exprimir a sua satisfação, sabendo do Conde de Lavradio, que o Governo de Portugal está determinado, não sómente a não poupar meios nem despezas cooperando activamente para a extincção do trafico da escravatura, mas está tambem resolvido a acabar com o estado de escravidão nos dominios portuguezes da Azia e da Africa.»

Vê-se por estes extractos, que o Governo portuguez tem feito ao Governo britannico a declaração de que está firmemente resolvido a acabar com a escravidão nas colonias portuguezas; e isto é mais um motivo que me faz esperar, que a Camara approvará o projecto em discussão.

O Sr. Conde de Thomar — Não pertende oppôr-se ao projecto, porque abunda inteiramente nas idéas do digno Par, e nas doutrinas que S Ex.ª expendeu conforme ás que se acham no relatorio que precede, este projecto.

Como observa pelo artigo 2.°, o Governo fica authorisado a fazer os regulamentos para dar a devida protecção aos filhos das mulheres escravas, de que tracta o artigo 1.°; pede aos Srs. Ministros que lhe digam se não acham inconveniente algum em que o projecto seja adoptado tal qual está; e se receando alguns inconvenientes, teem já pensado no modo de lhe obviar.

O digno Par não sabia que se tractava deste assumpto porque, tendo estado por alguns dias fora da capital, só agora é que viu o projecto; entretanto confia no digno Par o Sr. Visconde de Sá que é competente para tractar da mate