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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

SESSÃO DE 8 DE MARÇO DE 1865

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. SILVA SANCHES

PRESIDENTE SUPPLEMENTAR

Secretarios, os dignos pares

Conde de Peniche

Visconde de Gouveia

Pelas tres horas da tarde, sendo presentes 32 dignos pares, declarou-se aberta a sessão.

O sr. Presidente: — Convido o digno par, o sr. visconde de Gouveia, a occupar o logar de secretario.

Lida a acta da precedente sessão julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver observação em contrario.

Deu-se conta da seguinte correspondencia:

Um officio do sr. ministro da marinha, remettendo oitenta exemplares da conta da gerencia relativa ao anno economico de 1863-1864, e a do exercicio findo no de 1862-1863.

Outro officio do presidente da junta do credito publico, remettendo cem exemplares da conta da gerencia da mesma junta, relativa ao anno economico de 1863-1864.

Mandaram-se distribuir.

O sr. Marquez de Niza: — Sr. presidente, ha tres dias que esta installado o novo gabinete; a praxe tem sido constantemente apresentarem-se na camara dos senhores deputados e na nossa os novos ministros, para darem parte da sua installação; não tem tido logar esta formalidade, porque as nossas sessões não têem durado alem das quatro horas; parece-me portanto que seria conveniente suspender a sessão até ás horas em que costuma acabar a sessão da camara dos senhores deputados, fazendo-o constar aos srs. ministros para que possam aqui participar a installação do novo gabinete.

O sr. Presidente: — Eu peço ao digno par que mande por escripto a sua proposta, entretanto vou consultar a camara para ver se a admitte á discussão.

Consultada a camara, foi admittida a proposta á discussão

O sr. Rebello da Silva: — Não era propriamente este o objecto para que tinha pedido a palavra; mas como esta em discussão, direi que me parece conveniente, visto achar-se installado o ministerio ha tres dias: ignoro comtudo se na mesa já existe alguma participação official, e V. ex.ª me confirmará; mas parece-me que é um acto de deferencia da camara, que é zelosa no cumprimento do seu dever, não encerrar os seus trabalhos sem esperar que os srs. ministros aqui tenham vindo para dar explicações.

O objecto principal para que pedi a palavra, era para rogar a V. ex.ª que, de accordo com o presidente da camara dos senhores deputados, tome qualquer disposição para que as sessões, em que tenham logar as explicações dadas pelos srs. ministros, a que provavelmente devem concorrer bastantes espectadores, como tem succedido na outra casa do parlamento, se não celebrem n'este pequeno âmbito; era esta a minha proposta, e parece-me que todos os membros d'esta casa concordarão n'ella, facilitando-se assim a publicidade. Proponho portanto que a mesa resolva, de accordo com a dos srs. deputados, que se dêem as providencias necessarias para podermos funccionar de modo que nos não achemos em tão estreitos limites, vedando assim a publicidade, que é tão necessaria em negocios d'esta ordem (apoiados).

O sr. marquez de Niza leu a sua proposta, a qual foi novamente lida na mesa pelo digno par secretario, e posta á discussão.

É do teor seguinte:

PROPOSTA

Requeiro que se continue a sessão até á hora a que acaba a da camara dos srs. deputados, participando-se aos srs. ministros, a fim de que possam, querendo vir conforme a praxe, declarar a formação do novo gabinete. = Marquez de Niza.

O sr. Presidente: — Para proceder com ordem, esta em discussão a proposta do sr. marquez de Niza.

O sr. Conde de Thomar: — Parece-me que a proposta deveria ter algumas modificações; não ha duvida que é das praxes em todos os paizes regidos constitucionalmente, depois dos factos como os que acabam de ter logar no nosso paiz de se formar um ministerio que, aos corpos legislativos se faça a devida communicação, apresentando-se os srs. ministros.

É reconhecido o motivo por que ss. ex.ªs não têem comparecido n'esta casa, ainda que me parece que, estando o ministerio completo, podia dividir-se para satisfazer estes deveres, que em toda a parte são impostos aos srs. ministros; mas ss. ex.ªs são juizes da necessidade que têem de estarem presentes todos na camara dos srs. deputados.

Sr. presidente, este corpo é muito respeitavel, e é necessario que o poder executivo mostre que respeita a camara dos dignos pares, para que esta camara o respeite tambem (apoiados). Parece-me portanto que não nos devemos collocar nas nossas, cadeiras á disposição dos srs. ministros; o mais conveniente é a camara auctorisar a mesa a mandar saber se o sr. presidente do conselho vem, ou não, acabada a sessão da camara dos srs. deputados, dar as explicações do estylo; se elle disser que vem, esperemos; mas sem ter a certeza, não me parece conveniente. O acto que nós agora praticámos poderia ter logar ámanhã. Pedia portanto ao sr. marquez de Niza que limitasse a sua proposta, auctorisando a mesa a mandar saber se o sr. presidente do conselho vem, ou não, porque não devemos estar aqui submissos ás ordens do executivo.

O sr. Marquez de Niza: — Convenho em modificar a minha proposta no sentido em que acabou de fallar o digno par, o sr. conde de Thomar, e portanto peço licença para a retirar, e no caso que a camara consinta, substituindo-a por outra, em que se declare o sr. presidente auctorisado a mandar saber se o sr. presidente do conselho vem, para depois prorogarmos a sessão.

Não é isto?

O sr. Conde de Thomar: — Exacto.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que permittem ao sr. marquez de Niza o poder retirar a sua proposta para a substituir pela indicação do sr. conde de Thomar, queiram levantar-se.

O sr. Vaz Preto: — Peço a palavra, e desejava que a camara me ouvisse antes de resolver que o sr. marquez de Niza retire a sua proposta. Perdoe V. ex.ª Peço ao sr. marquez de Niza que consinta, se tencionar retirar a sua proposta, que eu a faça minha, que a tome sob a minha responsabilidade, e logo que me permitta que eu exponha as rasões d'esta minha opinião, fallo-hei breve, convicta e francamente, e a camara as attenderá.

O sr. Marquez de Niza: — Eu não sei se fui bem explicito.

O sr. conde de Thomar lembrou que era mais conveniente mandar-se saber á outra camara, se os srs. ministros estão ou não dispostos a vir; porque, no caso que venham, fica de pé parte da minha proposta relativa á prorogação da sessão, e se não vierem, tenho a firme tenção do propor outra cousa.

Entendi dar esta explicação ao digno par, para melhor se illucidar do contheudo da minha proposta.

O sr. Vaz Preto: — Sr. presidente, se o sr. marquez de Niza consente, eu admitto a proposta tal qual ella se acha redigida; faço-a minha e sustenta-la-hei perante os dignos pares.

Sr. presidente, desde o momento que o sr. marquez de Niza apresentou a sua proposta resolvi apoia-la, e mesmo toma-la sobre mim e defende-la, no caso do s. ex.ª a querer retirar, depois de ouvir as explicações do sr. conde de Thomar; a proposta é conforme com todos os principios e dignidade nossa. Era dever porém do governo, depois de constituido, vir em seguida ás duas casas do parlamento apresentar-se, ou por escripto fazer-lhe communicação da sua existencia e da sua formação; nada d'isso se fez, preteriram-se as formulas, e o actual gabinete começa já a caminhar n'uma senda sinuosa, sem saber por onde ha de saír nem por onde ha de entrar; n'este presupposto e na actualidade das circumstancias é dever tambem nosso reunirmo-nos, continuarmos a sessão, declara-la até permanente, se tanto for necessario, esperar que o gabinete tenha por nós a consideração e deferencia que nos é devida, communicando-nos verbalmente ou por escripto o que os principios lhe prescrevem e as praxes lhe ensinam. Se não vier, pois, é sobre elle que recáe toda a responsabilidade, porque nós cumprimos a nossa missão, obramos dentro da esphera de actividade que os principios e doutrinas constitucionaes nos traçam; em summa, porque nós somos poder independente, e como tal não devemos estar aqui ás ordens dos srs. ministros, e por isso eu não aceito a proposta com a modificação do sr. conde de Thomar; eu folguei quando o sr. marquez do Niza apresentou aquella proposta, e sei perfeitamente o motivo por que s. ex.ª aceita a modificação, é porque deseja que o ministerio se apresente, com a brevidade que é devida a esta camara, e que da nossa parte não pareça haver acinte e desejo de lhe crear difficuldades, a não ser aquellas que a sua incompatibilidade com os principios e prescripções constitucionaes lhe creou, e n'este ponto estou de accordo com s. ex.ª; mas o que o sr. marquez de Niza deseja, como nós, é que se mantenha a dignidade d'esta camara, o que nos colloquemos na posição, altura e elevação de poder independente, que somos. Neste caso, e sem querer crear 'difficuldades, sr. presidente, eu insisto na proposta do sr. marquez de Niza, completamente em harmonia com a indole e decoro do poder que nos é conferido, porquanto a nós compete-nos satisfazer ás attribuições inherentes á independencia do poder legislativo, assim como o governo ás do poder executivo; e não podemos nem devemos prescindir do respeito e consideração que nos é devida, e não me parece muito curial perguntar ao governo quando vem apresentar-se diante de nós, quando o seu dever é esse, e quando a responsabilidade lhe cabe pelos seus actos, como indica o sr. conde de Thomar e desejo que esta camara faça; porquanto isto me parece ser contrario ao decoro e dignidade que devemos manter, devemos reunirmos como é costume, funccionarmos como julgarmos, em conformidade com as sãs doutrinas, e deixar embrenhar á sua vontade esse governo impossivel no labyrinto inextrincavel que elle para si creou. Nós e o governo somos dois poderes que actuam em espheras de actividade differente, mas que devemos estar em harmonia, e que nos devemos mutua consideração e respeito, acatando sempre os verdadeiros principios e as prescripções que a constituição do estado nos indica.

Sr. presidente, eu repito que insisto pela proposta do sr. marquez de Niza; entretanto se a camara permittir que s: ex.ª a retire, eu curvo-me até á sua decisão.

O sr. Marquez de Niza: — Preciso dar uma explicação; porque o digno par fallou em sessão permanente, não era esse o meu pensamento; era sim, que a sessão tivesse o seu decurso regular e ordinario. Nós costumamos acabar ás cinco horas, e desde as quatro, que acaba a sessão da outra camara, ha uma hora de intervallo em que os srs. ministros podiam aqui apresentar-se, e não achava conveniencia nenhuma em declarar a sessão permanente mas sim ordinaria.

O sr. Conde de Thomar: — Sr. presidente, quasi que devia ceder da palavra, porque a camara deve já estar ao facto da proposta do sr. marquez de Niza, e da modificação que apresentei, pois entendia (e digo francamente) que a camara antes de se apresentar o ministerio desejava fazer logo uma censura, que é o que me parece deduzir-se das palavras do digno par, do outro lado da camara. O ministerio ainda se não apresentou nem deu explicações, e nós praticamos um grande acto de civilidade, auctorisando a V. ex.ª para fazer saber aos srs. ministros que a camara dos pares deseja ouvir as suas explicações sobre a organisação que ultimamente teve logar: emquanto as cousas se podem levar por meios suaves, eu não desejo nunca que se usem de outros, eis-aqui a rasão porque apresento esta minha idéa, e se a camara se convencer d'ella approve a proposta do sr. marquez de Niza, mas em todo o caso nunca sessão permanente; porque se a camara assim se declarasse, quantas horas ou quantos dias teriamos nós de estar aqui á espera que se apresentassem os srs. ministros?

Isto não póde ser.

O sr. Presidente: — Tinha-me esquecido fazer uma declaração ao sr. Rebello da Silva. S. ex.ª desejou saber se havia sobre a mesa alguma communicação official da nomeação do ministerio; declaro a s. ex.ª que não ha communicação nenhuma a este respeito.

O sr. Vaz Preto: — Sr. presidente, entendi mal o sr. marquez de Niza, porque julguei que s. ex.ª tinha feito uma proposta para se prorogar a sessão, depois da hora que está marcada, visto o dever que o ministerio tem de se apresentar diante d'esta camara, e anciedade que nós temos de ouvir as suas explicações.

Mas n'este caso mesmo, parece-me desnecessario convidar o governo ou fazer-lhe saber que nós estamos reunidos, porque a nossa sessão começa a certas e determinadas horas, e finda tambem durante horas determinadas, e horas differentes da camara dos senhores deputados, e portanto acabada ali a sessão o ministerio podia e devia comparecer aqui.

O ministerio esta constituido ha tres dias, e elle tem de se apresentar n'esta camara, segundo as indicações e praxes do systema representativo, e dar explicações da fórma e modo porque se constituiu.

Por consequencia, nós como poder independente cumprimos com o nosso dever, reunindo-nos e esperando-o, e o ministerio comparecendo cumpre tambem com o seu. Como não ouvi ainda o governo, com isto não quero nem desejo irrogar-lhe censura nem tão pouco lançar já sobre elle desfavor; se elle deixar porém de cumprir com os seus deveres então sim, porque é elle mesmo que se crimina; não sou eu, nem esta camara que lança sobre o ministerio esse desfavor, é elle, por isso que não cumpre a sua missão posterga todas as praxes, todos os usos e costumes, e esquece-se do seu brio e decoro, praticando para comnosco um acto do desconsideração. Da minha parte pois não havia nem ha ainda intenção de fazer censura ao governo; o que digo por emquanto sómente, é que entendo que o governo deve sempre praticar aquelles actos de respeito o deferencia que lhe cumpre guardar para com os poderes legalmente constituidos e diante dos quaes elle tem uma missão superior a cumprir; emfim eu não quero que se possa dizer que já estou aqui mostrando desejos de crear difficuldades ao novo gabinete; a camara ha de votar o que julgar mais conveniente, e com isso fico eu satisfeito, porque da minha parte fiz o que estava ao meu alcance, apresentando-lhe as considerações que se me offereceram ao espirito.

O sr. Presidente: — Como não ha mais ninguem inscripto consulto a camara sobre se permitte que o digno par, o sr. marquez de Niza, retire a sua proposta para ficar substituida pela indicação do sr. conde de Thomar.

Consultada a camara resolveu affirmativamente.

O sr. Seabra: — Eu ouvi dizer a V. ex.ª que não havia participação official da existencia do novo ministerio, e não sei se esta na pratica parlamentar deixar de se fazer essa participação. Se ella é necessaria, como creio, sou de opinião que um corpo do estado, independente e tão respeitavel como este, não póde por maneira alguma dar-se por sabedor da existencia de actos que lhe não foram communicados officialmente; portanto, emquanto não tivermos participação official, parece-me que não nos podemos dirigir a quem não nos participou regularmente a sua existencia. Os decretos publicados no Diario têem força para obrigar os cidadãos individualmente, mas os corpos legislativos como corpos moraes, como poderes distinctos e independentes têem direito a serem tratados de outra maneira (apoiados).

O sr. Mello e Carvalho: — Sr. presidente, tenho-me abstido de fallar n'esta camara porque conheço a minha insufficiencia para bem o fazer; no entanto, hoje seria reprehensivel o meu silencio, attenta a circumstancia que comigo se deu e que passo a expor singelamente.

O sr. presidente do conselho, no primeiro dia em que se apresentou na camara dos senhores deputados com os seus collegas do novo gabinete, perguntou-me se havia sessão n'esta camara, e eu disse-lhe que provavelmente não have-