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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

SESSÃO DE 8 DE ABRIL DE 1848.

Presidiu — O Em.mo e R.mo Sr. Cardeal Patriarcha.

Secretarios, os Sr.s Pimentel Freire

Margiochi.

Aberta a Sessão pela uma hora e meia da tarde, estando presentes 32 D. Pares, leu-se e approvou-se a Acta da ultima Sessão. — Concorreram os Sr.s Ministros do Reino, Negocios Estrangeiros, Guerra, e Marinha.

Mencionou-se a seguinte

CORRESPONDENCIA.

1.º Um officio da Camara dos Sr.s Deputados, enviando uma Proposição de Lei, confirmando a concessão feita á Ordem Terceira, e Misericordia da Villa de Guimarães, de certos bens nacionaes.

Passou á Commissão de Administração Pública.

O Sr. Presidente — Parece-me que antes de se entrar na ordem do dia, dever-se-hão verificar as interpellações, que os D. Pares desejavam fazer ao Sr. Presidente do Conselho, e ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros. O primeiro que manifestou este desejo foi o Sr. Conde de Lavradio, querendo interpellar o Sr. Presidente do Conselho, e como S. Ex.ª está presente, poderá declarar se está habilitado para responder ao D. Par. (O Sr. Presidente do Conselho — Estou prompto a responder.) Neste caso dou a palavra ao D. Par o Sr. C. de Lavradio.

O Sr. C. de Lavradio....

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros — Sr. Presidente, eu serei o mais exacto, o mais franco, e o mais explicito que ser possa nas explicações que me foram pedidas pelo D. Par. — A politica do actual Gabinete cifra-se no completo desenvolvimento da Carta Constitucional, e na união da familia portugueza; para o conseguir a Administração seguirá o caminho da justiça, da moralidade, da moderação, da economia, e do progresso rasoavel (Apoiados repetidos): buscará por todos os meios que estejam ao seu alcance, que tenhamos boas Leis de eleições, de fixação de quadros, de habilitações para os empregos publicos, de responsabilidade, e todas aquellas que o paiz necessitar; na intelligencia de que o Governo sabe perfeitamente, como o D. Par, quaes são as nossas necessidades e o unico e verdadeiro caminho que elle deve seguir para as remediar.

Em quanto aos negocios de Fazenda, sinto muito que S. Ex.ª me não tivesse prevenido a este respeito, porque teria pedido ao meu collega, que se acha ausente, que viesse a esta Camara responder-lhe. Mas direi para esclarecimento de S. Ex.ª e da Camara, que o Sr. Ministro da Fazenda para o systema que apresentou na outra Casa, consultou a opinião publica e de pessoas entendidas na materia, e declarou que nesta parte não tinha um pensamento reservado, porque quando o apresentou na Camara dos Sr.s Deputados disse — que estava prompto a adoptar qualquer modificação que se julgasse conveniente para maior utilidade do Paiz.

Pela leitura que vou fazer da Circular, que em 3 do corrente dirigi aos Governadores Civis, verá S. Ex.ª que estamos de perfeito accordo sobre as qualidades essenciaes que devem ter os empregados publicos.

Circular de 3 de Abril de 1848 (leu-a)

A unica objecção que se poderá apresentar contra esta Circular, é a origem donde devem dimanar as informações pedidas; mas tambem a respeito desses altos funccionarios o Governo faz diligencias por obter todas as informações necessarias.

Quanto aos objectos de justiça, de que tambem tractou o D. Par, eu lembro a S. Ex.ª que não foi proposta do Governo, mas da Commissão de Legislação da Camara dos Sr.s Deputados; e quando entrar em discussão nesta Camara, terá o D. Par occasião de emittir a sua opinião a este respeito.

Sr. Presidente, eu creio que todos os precedentes da minha vida devem fazer acreditar que não tenho prazer nenhum em fazer derramar sangue, males, e perseguições; antes bem pelo contrario, e é talvez esse mesmo ardente desejo que eu tenho, que me fizesse usar da expressão pela qual o D. Par me censura. Eu desejo evitar por todos os meios que estejam ao meu alcance, seguindo sempre a estrada da justiça e da moderação, que a desordem appareça no Paiz (Apoiados), e afoitamente perguntarei á Camara se terá havido Ministerio algum, que lenha dado maiores provas de abnegação, pela prudencia e paciencia com que tem tolerado os excessos da liberdade da imprensa, não obstante as continuas proclamações á revolta, e aos ataques dirigidos contra a Lei fundamental do Paiz. De todo o meu coração desejo que a hydra revolucionaria não appareça entre nós. Mas se assim acontecer, não obstante os meios suaves, que emprego para o evitar, repito, não obstante a censura do meu antigo collega e amigo o Sr. C. de Lavradio, que eu, os meus collegas, e camaradas, todos estamos resolvidos a esmaga-la com mão de ferro (Muitos apoiados).

Nestes ultimos dias e por differentes pessoas se tem querido fazer acreditar o haver eu dito aos Sr.s Joaquim Antonio de Aguiar e Antonio Aluísio Jervis de Atoguia, (O Sr. C. de Thomar — Ouçam, ouçam) que se algum motim apparecesse nas ruas de Lisboa, em legar de o reprimir pela força eu aconselharia a Sua Magestade que chamasse ao Seu Conselho os membros da Junta do Porto. Por absurdo e ridiculo que este boato possa parecer, julguei do meu dever dar-lhe a mais cabal contradição, porque elle póde ter tido por fim o illudir os incautos e ignorantes, arrastando-os pela esperança de não acharem opposição, a demonstrações que, ainda que a nosso pesar, não deixaremos nunca de reprimir e castigar (Apoiados repelidos).

Se a Camara me permitte lerei uma carta que o Sr. Jervis d'Atouguia me dirigiu relativamente ao que eu disse nesta casa a respeito dos acontecimentos de Ruivães. (Vozes — Lêa, lêa — leu a carta a que alludira).

O Sr. Presidente — Pediu tambem a palavra o D. Par o Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães?....

O Sr. Fonseca Magalhães — Eu pedi a palavra para ter a honra de perguntar a V. Em.ª se me será permittido fazer uma ou duas observações sobre o objecto das explicações pedidas pelo D. Par, o Sr. C. de Lavradio, e dadas pelo illustre Presidente do Conselho? Eu não sei se nesta Camara é concedido a algum outro Membro della, sem ser o proprio que pedio a presença do Sr. Ministro, expor algumas considerações ou observações sobre o objecto das perguntas dirigidas ao Governo? (O Sr. Presidente — Parece-me que o Regimento desta Camara não diz nada a este respeito. Entretanto se a Camara não repugna póde o D. Par usar da palavra. (Vozes — Falle, falle.) Eu, Sr. Presidente, estou muito certo de que o desejo do Governo é que o Paiz se conserve em paz e obediente ás Leis; e que não inspire o menor receio aos homens bons delle, e a ninguem, de que se altere a ordem e a tranquillidade. Não me custa a acreditar isto do Governo, porque elle é o primeiro interessado em que assim seja. Na verdade, qualquer Governo, bom ou máu, decerto deseja e quer muito ser obedecido: não se entenda que assim me explico pretendendo que se conte o actual Governo em o numero dos maus, que tem, como os que são bons, por primeiro cuidado, entre tolos, o de fazer se obedecer, e até de grangear amigos.

Entendo que os Srs. Ministros desejam que a Carta Constitucional seja executada, e que haja boas Leis, a que os cidadãos obedeçam por convicção propria de que ellas ião uteis á sociedade. Muito bem: o illustre Marechal fallou com muita razão, como costuma, sobre as diligencias que o Governo havia de fazer para que não houvesse causa justa de descontentamento; declarou que o Governo procuraria por meios adequados e dignos que tal causa de descontentamento não houvesse nesta Nação; mas que. se apesar de todos estes esforços, verdadeiros esforços, e por factos, e não de palavras (Apoiados), houvesse um acontecimento pelo qual fosse perturbada a ordem publica, seria uma obrigação do Governo, e a mais sagrada, porque se fundava em razão indisputavel, oppor-se a essa hydra revolucionaria, com mão de ferro.

O D. Par, o Sr. C. de Lavradio, não achou appropriadas estas methaphoras na linguagem governamental. Eu tambem as reputo demasiadamente antiquadas, e pertencentes a outras instituições. É melhor usar da mão da justiça e da Lei; ou, se quizerem, da espada da justiça e da Lei, porque os povos as entenderão melhor; e é justo empregar expressões que se comprehendam em seu sentido directo. É preciso que o Governo esteja (como diz que está) disposto a empregar todos os meios para que os preceitos da justiça sejam observados, para que o povo viva contente e satisfeito, e para que tenha confiança nas suas authoridades; por isso mesmo que o mal que elle tem sentido provém, em grande parte, das authoridades que lhe não merecem confiança (Apoiados) por seu comportamento. Não accuso nenhumas dellas; e sei que as ha boas, e excellentes. O que peço ao Sr. Ministro do Reino e Presidente do Conselho, é que siga os impulsos do seu coração, e que nomeie para todas as terras, com especialidade para os principaes logares, homens que posam merecer confiança pelo seu merecimento, e pela sua honestidade, mais ainda do que pela sua intelligencia; por isso mesmo que, pela maior parte, os males que as authoridades fazem não derivam tanto da sua falta de conhecimentos como de má vontade e de más inclinações. Por consequencia deve o Governo, quando nomeia funccionarios administrativos, attender mais á honra e probidade das pessoas que escolhe, do que aos conhecimentos e superior intelligencia; posto que bem sei que alguns conhecimentos são indispensaveis. É com tudo certo que só a minima parte dos deffeitos de quem governa ou administra, provém de ignorancia; a maior parte delles nasce de outras causas, que todos sabemos. Quando ha vontade de bem servir, acham se muitos meios da instrucção, e de descubrir a verdade sobre qualquer negocio. Um dos primeiros deveres da authoridade publica, é velar porque a ordem não seja alterada; e realmente nas circumstancias difficeis em que nos achamos, deve-se ter muito em vista que os cidadãos se respeitem mutuamente, que se não tractem de modo que façam despertar antigos odios, que seria necessario fazer por uma vez esquecer. Eu já disse aqui e o repito: é indispensavel lançar um véo sobre o passado, se queremos ter um futuro tranquillo. Porém será isto o que se pratica? Acaso ignora alguem o que estava succedendo ainda ha pouco na segunda cidade do Reino, aonde uma legião de caceteiros insultava os cidadãos pacíficos? (O Sr. V. de Fonte Arcada — Apoiado.) E todavia não sei que se tenham dado providencias contra taes desatinos; e estas deviam, pelo menos, ser tão notorias como os factos que as motivavam. Eu vi nos jornaes de todas as côres daquella cidade, e em cartas de varios homens de todos os principios politicos, narrados estes factos e condemnados. Foi sabido que alli houve insultos, e até sangue, e espancamentos; attentados estes que se commettiam na presença das primeiras authoridades daquella terra; porém não vi, nem me constou que uma só providencia se tomasse.

Sr. Presidente, o vergonhoso e infame imperio dos caceteiros já nós o tinhamos visto neste Paiz debaixo d'outras influencias governativas; e então foi muito condemnado, e com razão, por homens de principios oppostos aos que regiam nesses tempos; mas desgraçadamente os principios e os systemas succedem-se, e os caceteiros ficam, até talvez os mesmos sempre. Que os cidadãos se respeitem, digo eu, e a ordem publica se guarde severamente. Muito me pesa ter que mencionar, que nesta mesma Capital, no dia dos annos de Sua Magestade a Rainha, ao recolher-me a minha casa, pouco antes das 11 horas da noite, ouvi della mesma grandes vozerias de vivas e morras! Vivas admitto, mas eu ouvi os vivas alternados com os morras, entoados em grita numerosa. (Vozes — D'onde?) D'onde não sei, mas sei que se ouviu isto por espaço de quasi meia hora. Parece-me impossivel que as authoridades locaes não ouvissem o mesmo. Havia grande distancia dos logares desses alaridos á minha residencia, que todos sabem onde é, quanto melhor se ouviriam das proximidades dos sítios aonde se soltaram? (O Sr. C. da Taipa — Tambem eu ouvi.) Sinto muito que não apparecesse authoridade administrativa, ou militar mesmo, para reprimir tamanho desacato no fausto dia dos annos da Soberana, que generosamente mandou amnistiar, isto é, esquecer todos os factos passados, até certa época! Considero os factos que refiro altamente reprehensiveis — verdadeiros attentados. E repito, parece-me impossivel que nem uma só authoridade publica se apresentasse para os cohibir e castigar. Nem me consta que fossem até agora estranhados. Eu ao menos nem uma linha encontrei no Diario do Governo a tal respeito. É justissimo que o Governo exija de todos os Cidadãos uma completa obediencia ás Leis; mas o Governo é o primeiro que tem obrigação de as cumprir (O Sr. Presidente do Conselho — Ha de cumpri-las,) estimo muito; mas nem por isso me póde o Governo vedar a mim que lh'o diga (O Sr. Presidente do Conselho — Isso de certo,) e veja o Governo que desse seu cumprimento ha de derivar a justiça e razão com que póde tambem obrigar os outros a cumprir as suas obrigações. (O Sr. Presidente do Conselho—Apoiado.) A isto me limito, e espero que o nobre Presidente do Conselho, cuja franqueza a todos inspira confiança, tenha a bondade de me dizer (se o entender justo) se lhe merecera attenção estas circumstancias que são verdadeiras, e estes factos que eu narrei; e se o Governo os toma em contemplação.

O Sr. Presidente do Conselho — O D. Par o Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães só póde ter fallado no passado (O Sr. V. de Fonte Arcada — Peço a palavra), quando tractou de caceteiros, no presente pelo que respeita aos gritos que S. Ex.ª ouviu, digo, que só fallou no passado em quanto a caceteiros, porque hoje na Cidade do Porto reina a mais perfeita ordem e tranquillidade, assim o asseveram todas as participações do Governador Civil, e o D. Par de certo não duvidará da verdade dai asserções daquelle Empre-