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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

SESSÃO DE 3 DEB JUNHO 1848.

Presidiu — O Em.mo e Rev.mo Sr. Cardeal Patriarcha.

Secretarios, os Sr.s M. de. Ponte de Lima.

Margiochi.

ABERTA a Sessão tres quartos depois da uma hora da tarde, estando presentes 31 D. Pares, leu-se e approvou-se a Acta da ultima Sessão. — Concorreu o Sr. Ministro da Fazenda.

Mencionou-se a seguinte

CORRESPONDENCIA

1.º Um officio do D. Par D. de S. João das Areas, participando, que por falta de saude está impossibilitado de concorrer ás Sessões.

2.º Outro officio do D. Par Serpa Machado, communicando não poder assistir ás Sessões.

O Sr. V. DE SÁ DA BANDEIRA — Pedi a palavra para exigir esclarecimentos de algum dos membros da Commissão de Fazenda, sobre o Projecto de Lei apresentado pelo D. Par Margiochi, relativamente á moeda. (O Sr. Sousa Azevedo — Peço a palavra.) É um objecto importante, porque temos uma quantidade de moedas, cuja emissão faz transtorno nas operações commerciaes, e desejava, que se fizesse alguma cousa a este respeito.

O Sr. SOUSA AZEVEDO — Não posso dizer mais ao D. Par, senão que tenho na minha mão, para corrigir, o discurso que aqui pronunciei, pedindo ao Governo os esclarecimentos, que estão na Secretaria da Fazenda, para a Commissão dar quanto antes o seu parecer sobre o objecto, de que se tracta.

O Sr. PRESIDENTE — Vamos passar á ordem do dia, mas como não está presente o Sr. Ministro da Fazenda, parece-me que deveremos entrar na discussão do Parecer n.º 31; e não póde progredir a do n.º 30, porque não está presente ninguem por parte do Governo.

O Sr. SILVA CARVALHO — Peço a palavra.

O Sr. PRESIDENTE — Tem a palavra.

O Sr. SILVA CARVALHO — Parece-me que não é absolutamente necessaria a presença do Sr. Ministro da Fazenda, elle está na outra Camara, e se o fôr, póde-se mandar chamar: o Projecto que está em discussão é tão simples, (O Sr. C. do Tojal — Apoiado) que se podia discutir...

O Sr. PRESIDENTE — Mas hontem a Camara decidiu o contrario, e não posso contrariar a sua decisão, senão querendo ella tomar outra resolução (Apoiados). Portanto vai-se entrar na discussão do Parecer n.º 31.

Estando a lêr-se o Parecer, entrou o Sr. Ministro da Fazenda.

O Sr. SILVA CARVALHO — Sobre a ordem. (O Sr. Presidente — Tem a palavra sobre a ordem.) Agora, como chegou o Sr. Ministro da Fazenda, pedia a V. Em.ª, que propozesse á Camara se queria entrar na discussão do Projecto, que estava dado para ordem do dia em primeiro logar, porque talvez não tenha outra occasião tão cedo de estar presente o Sr. Ministro.

O Sr. PRESIDENTE — Eu creio que isso é conforme; mas consulto a Camara. Aquelles Sr.s, que são de opinião, que se tracte da discussão do Parecer n.º 30, visto ter chegado o Sr. Ministro da Fazenda, queiram ter a bondade de se levantar.

Decidiu-se, que se entrasse na discussão do Parecer n.º 30.

ORDEM DO DIA.

PARECER N.° 30 sobre a PROPOSIÇÃO DE LEI N.º 24, prorogando o prazo, por anteriores disposições concedido, para o pagamento de dividas do Estado, cuja discussão começou a pag, 783, col. 3.ª, e pag. 793 col. 4.ª

Entrou em discussão, por não estar ainda vencido, o artigo 3.º pag. 785, col. 1.ª com a emenda da Commissão, pag. ditas, col. dita.

O Sr. PRESIDENTE — Está vencido, e portanto estava em discussão o artigo 3.º do Projecto, e as emendas que lhe foram feitas nesta Camara. Tem a palavra o Sr. Conde de Lavradio: eu não sei se mais alguns Sr.s ficaram com a palavra. (O Sr. Sousa Azevedo — O Sr. Ministro da Fazenda, e eu.) Na ultima Sessão estavam inscriptos os Sr.s Ministro da Fazenda, Sousa Azevedo, e Silva Carvalho (O Sr. Sousa, Azevedo — Apoiado), e portanto valendo esta inscripção de então, dou a palavra ao Sr. Ministro da Fazenda.

O Sr. MINISTRO DA FAZENDA — Sr. Presidente, eu não tenho agora um ponto especial em que entre nesta questão, porque passaram-se dous dias, depois que assisti á discussão; mas farei por me recordar de algumas objecções, que ouvi na ultima Sessão, e a que me parece o D. Par o Sr. Conde de Lavradio disse, eu não tinha respondido.

Em primeiro logar pedirei desculpa á Camara de não ter comparecido hontem, porque tive de assistir na outra Camara, á discussão de um Projecto de Fazenda muito importante, e que pedia muitas explicações, pelo que mandei pedir desculpa a esta Camara (Apoiados).

Uma das cousas, a que S. Ex.ª disse eu não tinha respondido, era que não tinha dito a quanto montava a quantia das dividas, que se deviam realisar: a esta mesma pergunta não é facil responder, nem á importancia das dividas antigas, que ainda não estão realisadas, nem tão pouco o que se poderá realisar. É verdade, que se podia calcular pelos requerimentos, que tem entrado no Thesouro, qual era essa quantia; mas devo informar, que as addições para solver por este Projecto, são diminutas, e os requerimentos que estão no Thesouro para solver as dividas anteriores a 1833, é muito pequena. Portanto, a questão é vêr, qual é a quantia que está por liquidar, e depois a que se deve realisar: ambas estas perguntas tem muitas soluções, e póde-se considerar, que ha avultadissima quantia; mas quanto importará, nem se se realisará, é o que não se póde responder com facilidade.

Outra pergunta, que fez o D. Par — era a quantidade de papel-moeda circulante — e poderei dizer, que andará por 1.500 a 1.600:000$000: 1.300:0000$000 é o ultimo algarismo; mas não será exacto.... (O Sr. Sousa Azevedo — É mais alguma cousa.) Ora, pelos ultimos dados, que eu pude obter ácerca das Notas, a sua quantidade circulante andava pele valor de 5.000:000$000; mas hoje existirão apenas no valor de réis 4.000:000$000, com pouca differença, porque tendo sido amortisadas já na importancia de réis 800:000$000, e como muitas não tenham recebido o carimbo, com mais certeza poderemos dizer, que existem 4.000:000$000 réis em Notas do Banco de Lisboa, e sem erro poderá o D. Par tomar disto apontamentos, para formar o seu calculo.

Titulos azues por amortisar andarão por uns 800:000$000 réis, e os Titulos das tres operações não chegarão a 100:000$000 réis. Pelo que pertence porém ao augmento destes Titulos, estou resolvido a não fazer emissão alguma, em quanto esta questão de Fazenda se não fixar de uma maneira positiva, vindo-se a saber mui evidentemente, quaes as dividas activas, e quaes as passivas do Estado: não farei uma unica nova emissão, em quanto não souber quaes os meios, e a maneira, por que ha de ser feita, e as bases sobre que se ha de firmar a sua amortisação, a não ser sobre algum objecte, que esteja pendente e a que a Lei obrigue: no entanto, estes meus dados poderão servir de numero regularisador para qualquer calculo, que S. Ex.ª pertenda fazer.

Respondendo agora ao D. Par o Sr. Fonseca Magalhães, sobre se esta proporção havia sido bem calculada, posso asseverar a S. Ex.ª, que o Projecto actual do Governo não é mais, do que uma repetição dos Decretos anteriores, a este respeito promulgados, e sómente com a variante de uma moeda fraca; porque as dividas aos extinctos Conventos, que tiverem sido contrahidas em moeda metalica, serão satisfeitas, um quarto em dinheiro de metal, ou em Acções sobre o Fundo especial de amortisação; um quarto em Notas do Banco de Lisboa; um quarto em Papel-moeda; e um quarto em Titulos azues etc... em quanto que as que tiverem sido contrahidas nas especies de metal, e Papel-moeda, serão satisfeitas, um quinto em dinheiro de metal, ou em Acções sobre o Fundo especial de amortisação; um quinto em Notas do Banco de Lisboa; um quinto em Papel-moeda; e dous quintos em Titulos azues etc. Por aqui se vê, que toda a moeda fraca, que o Governo apresenta, conserva uma perfeita proporção, sem que se note a mais pequena tendencia para uma dada especie de moeda fraca; porque o Projecto explica-se até de maneira, que as moedas fracas estão todas comparadas a um quarto, e a um quinto, necessariamente se achará um beneficio nessa certa igualdade de moeda fraca, introduzindo-se neste Projecto, como nova, a fracção das Notas de Banco de Lisboa, que sendo na realidade uma moeda fraca, convêm por todos os meios possiveis amortisa-la; e deste meio, que se estabelece no Projecto, é um dos que, sem duvida, se deveria lançar mão.

Ha porém uma alteração a este artigo 3.º, feita pela illustre Commissão desta Casa; porque, no artigo 3.º vindo da outra Camara, falla-se em Titulos azues, mas nada se diz a respeito dos Titulos das Tres operações, e nisto havia certamente uma grande omissão, pois senão dá fundado motivo para na Lei se omittir taes Titulos. A illustre Commissão de Fazenda assentou pois, em dividir a fracção, que estava destinada para os Titulos Azues, e estabeleceu, que uma metade fosse em Titulos Azues, e a outra em Titulos das Tres operações, não era, entendo eu, justo introduzirem-se as Notas do Banco ao passo que se abandonavam inteiramente os Titulos das Tres operações. Eram estas as reflexões que eu tinha a apresentar, e que já o teria feito se antes me tivesse sido possivel usar da palavra. Tambem deverei responder a uma objecção feita pelo D. Par o Sr. Tavares de Almeida ácerca de uma especie, talvez de ociosidade, de vir no artigo 3.º do Projecto a palavra metalica conjunctamente a de Acções sobre o Fundo especial de amortisação, porque, disse S. Ex.ª — quem tiver de pagar uma divida, naturalmente entrará com a parte correspondente em Acções sobre o Fundo especial da amortisação, por isso lhe ser mais favoravel — á verdade; mas o D. Par deve lembrar-se, de que nem todos os devedores se poderão aproveitar desse beneficio da emissão em Acções, porque dividas tão pequenas se darão, que não possam admittir no seu pagamento uma parte em Acções. Mas por outro lado, devendo nós ter em muita consideração os Fundos de amortisação, quantos mais meios se acharem para obter-se o pagamento destas dividas, tanto mais seria a economia para a Fazenda Nacional.

Eis aqui pois os motivos especiaes, que o Governo teve para apresentar este Projecto, que elle julga de grande consideração.

O Sr. SOUSA AZEVEDO — Sr. Presidente, reflexões muito ponderosas teem sido feitas neta Camara por occasião do Projecto, que se discute; acho-as justas, rasoaveis, e mesmo muito proprio da natureza e fim de ta Camara o ter graves apprehensões, e até escrupulos, quando se apresenta uma Lei de Fazenda sobre arrecadação de direitos, no estado actual, em que se acha a Nação, falta de meios para satisfazer ás obrigações de mais rigorosa necessidade; e quando se considera a nossa situação, que me parece, sem duvida, incomparavel com alguma outra, em que nos tinhamos achado, pois que a tal ponto temos chegado, que as idéas se confundem no meio das difficuldades, que de todos os lados se encontram sobre o modo de se sahir deste estado anormal, em que desgraçadamente nos acoamos, e que só a muita, e constante solicitude do Corpo Legislativo poderá vencer, adoptando as providencias, que as criticas circumstancias do Paiz altamente reclamam.

Sr. Presidente, não poderei fazer longas reflexões sobre este objecto, porque o meu estado de saude me não permitte, e porque as minhas idéas de certo não me soccorrem para bem tractar tão alto assumpto; mas a minha posição especial de Membro da Commissão de fazenda, que com quanto não venha assignado o meu nome no Parecer, foi isso devido a omissão casual, porque tendo eu dito ao Sr. Relator, que estava de accordo com a doutrina do Parecer; e não havendo declaração em contrario, deve entender-se, que o assignei; mas, dizia eu, que a minha qualidade de Membro da Commissão de Fazenda, e a do logar publico que exerço em uma Repartição superior de Fazenda, me chamavam a dar algumas explicações sobre esta questão.

O D. Par, que primeiro fallou sobre a materia, o Sr. Conde de Lavradio, começou lamentando, que se não apresentasse um systema completo de Fazenda, sendo as medidas trazidas como em retalho ao Parlamento, para receberem a sua decisão. S. Ex.ª, rigorosamente fallando, tem razão; porque, em quanto não houver um systema completo de Fazenda impossivel será, que as differentes partes desse todo se possam bem considerar, porque só da sua comparação entre si, e em relação a outros ramos do serviço, com que prendem, é que poderá resultar a justa apreciação do seu complexo: por exemplo, o methodo da arrecadação de Fazenda Publica não poderá ser bem avaliado, sem que se compare e examine a relação, que tem não só com o processo de Fazenda, propriamente tal, mas relativamente aos outros ramos de serviço publico, o administrativo, e judicial, de que tem dependencia para a solução voluntaria, ou judicial das respectivas obrigações: de maneira, que o fim que parece pretender o Sr. C. de Lavradio não ficaria preenchido com a sua proposição, e seria necessario um systema combinado, não só de Fazenda, mas tambem administrativo, e judicial.

É porém certo, e já se observou em resposta á objecção do mesmo D. Par, que o seu argumento poderia ser agora, pelo menos, attenuado pela qualidade da medida, que se apresenta; e em verdade assim me parece, porque se tracta de uma providencia de excepção. Se acaso este Projecto dissesse respeito a estabelecer prescripções tendentes a fiscalisar, e arrecadar as dividas do Estado, muito bem colheria a idéa do D. Par; mas o objecto de que nos occupamos é puramente excepcional: tracta-se de estabelecer o modo, por que certas dividas do Estado devem ser recebidas, e amortizadas, e por conseguinte esse, aliás, muito justificado escrupulo do D. Par, sobre a apresentação da medidas destacadas, e sem nexo, póde por agora considerar-se improcedente, porque a natureza do objecto comporta, que delle se tracte sem absoluta dependencia de um systema completo de Fazenda.

O D.º Par, o Sr. Silva Carvalho, expôz com toda a extensão, e exactidão, como costuma, a historia desta Legislação sobre o pagamento de dividas ao Estado com papeis de credito; S. Ex.ª fez-nos vêr qual tinha sido a sua origem, e que fóra o Governo posterior a 9 de Setembro de 1836, que estabeleceu aquella providencia; mas o D. Par lamentou, que tal medida se tivesse adoptado, porque, della resultára prejuizo dos interesses publicos, e que talvez nem sempre com applicação dos principios de justiça, a respeito de muitos devedores. Tambem, rigorosamente fallando, tem razão o D. Par, como a teve, o Sr. C. de Lavradio. S. Ex.ª tem razão, combatendo em geral a justiça, e mesmo o direito com que se decreta contra os verdadeiros principios! O poder dos Parlamentos, a acção do Corpo Legislativo não é infinita, deve assentar sobre bases moraes, justas, e conformes aos bons principios de administração. Em materia de tributos, e sobre regular o modo da arrecadação dos direitos do Estado, não ha uma faculdade ampla, e indefinida, devem observar se os principios, que regem sobre esta materia. Quando se determina, que certos devedores ao Estado paguem por um modo excepcional, e para elles vantajoso, vão ser necessariamente feridos os interesses, e os direitos dos outros Cidadãos Contribuintes, porque essa falla de meios, que resulta de uma medida excepcional, ha de trazer áquelles, que são bons