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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 545

Ninguem diria que ainda haviam de ver-me ao lado do governo, contra o sr. Barros e Sá!

(Riso.)

Mas, sr. presidente, o projecto não vale tanto como lhe attribue o sr. Barros e Sá.

(Áparte.)

O governo nunca teve o pensamento que lhe attribuiu o sr. Barros e Sá.

Pois o governo quer subverter as instituições monarchichas?

Pois o governo, porque apenas quer a reforma da camara dos pares, leva n'isso o intento de desprestigiar a corôa?

É só agora que o sr. Barros e Sá conhece que são estes os intuitos de individuos que em toda a sua carreira politica tem acompanhado!!

Estou realmente atterrorisado, não só por isto, como porque pouco tempo falta para dar a hora; creio que é mais conveniente ficar com a palavra reservada para a proxima sessão.

A camara está decerto fatigada, e nem eu podia, no pouco tempo que me resta, dizer tudo o que julgo conveniente sobre a materia. Espero, pois, que os dignos pares attenderão o meu pedido com a benevolencia do costume, dispensando-me de encetar materia nos poucos momentos que me restam.

Discurso do digno par o sr. Miguel Osorio, proferido na sessão de 28 de março, que devia ler-se a pag. 275, columna 3.ª

O sr. Miguel Osorio: - Sr. presidente, por certo a camara não espera que eu venha elucidar a questão, nem ella precisa dos fracos recursos da minha intelligencia para esse fim, nem tenho a immoderada vaidade de me reputar á altura de a poder auxiliar n'esse caminho, que aliás me parece facil.

Eu não vou fazer outra cousa mais do que expôr os motivos por que voto o projecto das reformas politicas, e porque me associo ás idéas do governo n'esta questão.

Já v. exa. e a camara vêem que, quando eu pedi a palavra a favor do projecto, não era meu intuito subtrahir-me, na altura do debate, á collocação que porventura me competisse, mas unicamente apresentar a expressão sincera da minha deliberação em apoiar o governo n'esta questão.

Eu não podia proceder de outra fórma, sr. presidente, porque a logica, que é a disciplina do espirito, e os principios, que são a disciplina da politica, obrigavam-me a trilhar este caminho traçado pelo governo.

A logica, sr. presidente, já fez com que eu, quando n'esta casa se discutiu a reforma vincular, prophetisasse, com o seu auxilio e não com o dom prophetico, a reforma que necessariamente se lhe havia de seguir, isto é, a suppressão da hereditariedade do pariato, e mais tarde a da nomeação regia. O progresso tem isto, uma reforma chama por outra, póde-se obstar á transformação no principio, é impossivel parar no meio; o corpo transformado ficaria um monstro; a sociedade, como a natureza, tem horror aos monstros, e estes, quando apparecem, raro logram viver e nenhuns se reproduzem.

Succedeu esta minha previsão ha vinte e dois annos. - É triste dizel-o, ha já vinte e dois annos que eu occupo n'esta casa uma posição que herdei, se é pecha ser par hereditario tambem a tenho, e ainda mal, porque, herdando-a, não herdei os dotes nem a capacidade d'aquelle a quem substitui. Mal representado está, pois, quem, como elle, bem serviu a patria, expondo a vida nas campanhas da independencia, e que, entrando no parlamento nas constituintes de 1820, soube manter-se sempre á altura do seu dever (Apoiados.) sem nunca mudar de rumo. O que eu herdei, sr. presidente, foi o desejo e a vontade de lhe seguir as pisadas.

Perdôe-me a camara esta interrupção, que era necessaria para satisfazer ao meu coração e mostrar que a tradição não prejudica o progresso; honremol-a, mas não fiquemos presos a ella.

Já se vê, portanto, sr. presidente, que não é o odio que tenho ao pariato hereditario, nem o odio á camara dos pares, o que me leva a fallar assim.

Como podia eu ser desaflecto a uma instituição a quem devo toda a minha, posto que pequena, importancia politica? Só pelo meu valor pessoal nunca eu teria entrado no parlamento; eu nunca fui nada senão par do reino. Herdei esta cadeira, na qual me tenho sabido conservar, não sei se á altura dos meus deveres, mas á altura da minha consciencia. Se hoje a camara se fechasse, por um incidente, não digo como aquelle que o sr. visconde de Moreira de Rey lembrou como possivel, que felizmente não é; se esta porta se fechasse, como era da minha opinião que ella se devia fechar, para se reformar toda a camara em outro sentido, fazendo-se todo o pariato electivo, e logo direi quaes as minhas idéas a esse respeito, eu saía, e de certo não tornava a entrar: digo de certo, por duas rasões, a primeira, porque o paiz, tendo de escolher, escolheria outro representante que fosse melhor, e a segunda porque não havia de escolher quem não quizesse ser escolhido. Nunca me sujeitei a suffragio de qualidade alguma, e não espero sujeitar-me, pelas circumstancias de me não chamar a vocação para as luctas politicas e porque eu seria o primeiro a votar contra mim. Permitta-me ainda a camara que eu me occupe por mais algum tempo da minha situação especial, posto que conheça quanto é ingrato fallar de si proprio; más ha uma cousa que n'este momento é grata ao meu espirito; vem a ser que quando se notam tantas contradições a todos os homens politicos, e se faz arma de aggressão d'ellas, eu me encontro com as idéas que aqui sustentava ha vinte e dois annos, e vejo a advogal-as os homens politicos mais importantes do meu paiz. Por menos vaidoso que eu seja, não posso occultar que me lisongeia esta situação; despertou-me estas considerações a citação que fez do meu discurso sobre a reforma vincular o sr. Thomás Ribeiro.

É grato relembrar que eu tivesse já as idéas que vejo hoje adoptadas, pelo menos, por uma grande parte da camara dos pares com que o governo conta, porque, se elle não se firmasse nas suas maiorias, não apresentava uma reforma d'esta natureza.

Eu não achava conveniente a reforma vincular; combati-a, e permitta-me a camara que eu note, como então o fiz, que eu combatia uma lei que estava mais em harmonia com os meus interesses pessoaes do que a legislação então vigente; na parte politica disse então, que era insustentavel a hereditariedade de pariato com a fórma democratica que queriam dar á propriedade; e como para mim as fórmas de governo são accidentaes, eu havia de votar mais tarde contra estes morgados politicos que não tinham rasão social de existencia e tornavam-se até perigosos.

Parecia-me que mais tarde haviamos de emendar os defeitos que aquella reforma trazia á organisação politica, e desde logo disse que n'essa occasião eu seria um dos primeiros a auxiliar quem o tentasse.

O que deve ser a camara dos pares?

Deve ser um corpo, que constitua uma força poderosa para se oppor ás demasias de baixo e ás demasias de cima; a demasias da paixão politica, e porventura a demasias, que felizmente se não têem dado, do poder magestatico ou soberano.

Resta saber se este corpo, no estado actual, formado principalmente de funccionarios publicos, aonde só podem entrar com difficuldade alguns proprietarios, escolhido em repetidas crises, algumas por elle promovidas, pela paixão politica dos governos, preenche esse fim. Parece-me evidentemente que não. Obsta a reforma a isso? Talvez não. Logo tratarei esse ponto.

Fui, sr. presidente, mais alem do que as minhas pro-