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observações era resposta ao D. Par o Sr. V. de Algés.

Creio que não soltei nenhuma palavra de desfavor á Camara Municipal de Lisboa; a Camara de Lisboa é uma Corporação benemerita, e merecedora de elogios; quem conheceu o antigo Senado, e o comparar com a Camara actual, não póde deixar de conhecer a grande differença da esterelidade daquelle, e utilidade desta. Não posso porem deixar de dizer, que eu não considero que o Estado furte á Camara de Lisboa os direitos, que a esta pertencem: não conheço dois Estados, ha um só, e esse é quem recebe os tributos: á Camara Municipal de Lisboa dá-se uma prestação, assim como se dá a qualquer outra Repartição: não admitto por tanto a theoria, de que a Camara seja senhora dos impostos, e que o Governo lhos tem tomado: aqui não póde haver senão um Thesouro, um só cofre, e deste hão de sahir as sommas precisas para todas as despezas do Paiz.

Ora, Sr. Presidente, eu receei votar pela verba das Obras publicas, em quanto não fosse determinado quaes as obras em que esses dinheiros haviam de ser empregados; e disse eu, que uma grande parte das sommas que até agora se votavam para as Obras publicas eram consumidas em gratificações, e não em trabalhos materiaes; e mesmo actualmente ha um grande pessoal naquella Repartição, porque destes 71:000$000 réis, são 10:000$000 réis para a Inspecção central, e ficam uns 60:000$000 réis para trabalhos braçaes: ora, realmente extraordinario, que para dirigir obras que consomem 60:000$000 réis, haja um pessoal que absorve 10:000$000 réis. Mas falla-se em contas, e contas exactas; creio que o são: estive algum tempo no Ministerio do Reino, mas nunca tive occasião de examinal-as. Porem a respeito de contas, Sr. Presidente, nós até temos tal Repartição, que nunca as deu, e que presume o direito de as não dar ainda hontem se approvou aqui uma verba avultada para quem nunca deu contas, e se julga com o direito de as recusar. É facto porém, que quando eu fui Ministro do Reino, suspendi-lhe a prestação em quanto as não desse: mas logo depois de mim houve quem lhe continuasse as mesadas, e independentemente das coutas. É um absurdo, e até pouco honroso, que haja quem não queira dar contas da applicação do dinheiro publico, nem da sua gerencia administrativa (Apoiados).

Termino dizendo, que não vejo o modo como esta Camara ha de prover a essa verba de réis 100:000$000, se os votar; porque, é evidente ser necessario para isso crear uma nova fonte de receita; e não tendo esta Camara attribuições para a designar, vejo offerecer-se um grande embaraço para a resolução deste objecto.

O Sr. C. de Lavradio — As reflexões que ouvi fazer aos dois D. Pares, que ultimamente fallaram, são dignas de muita attenção, por isso desejava que se não fechasse desde já a discussão, porque é necessario ou combate-las, ou adopta-las. Eu sou de opinião, que para esta Proposta ir na Lei da Despeza é necessario, que a Camara tenha authoridade de propôr o augmento necessario da Receita: isto por tanto é uma questão importante. Pôde esta Camara tomar iniciativa sobre a creação desses meios, que necessariamente hão de ser o resultado de um imposto! Parece-me que não; mas como a despeza é util, no que todos concordam, o que devemos examinar é, se podemos obter esses 100:000$000 réis por meio de economias feitas neste Orçamento das despezas; e parece-me que se bem o examinarmos, poderemos daqui tirar esses 100:000$000 de réis sem inconveniente (Apoiados): pela minha parte desde já me comprometto a propôr algumas economias. Não sei se chegarei aos 100:000$000 de réis; mas talvez me aproxime; e no entanto o que a Camara póde já resolver é, que todas as economias que se poderem fazer no Orçamento, que estamos votando, sejam applicadas ás Estradas. Agora necessito dar uma satisfação ao Sr. Tavares de Almeida.

S. Ex.ª intendeu, que eu queria tractar de um modo differente de Lisboa as Provincias. Não Senhor, eu advogo tanto os interesses de Lisboa como os das Provincias, e quero que as sommas votadas no Orçamento geral sejam proporcionalmente repartidas por todo o Reino, e reconheço que as Provincias teem o mesmo direito que Lisboa ás Estradas; mas não posso convir com S. Ex.ª quando disse, que não havia senão um só Thesouro com uma só applicação (Apoiados). Perdoe S. Ex.ª que lhe observe, que a despeza geral é tirada dos rendimentos geraes; mas ha rendimentos a que chamarei provinciaes, ou de Districto, pagos pelas respectivas Provincias ou Districtos, para as suas despezas; e ha os rendimentos pagos pelos Municípios para as suas despezas.

Quando eu advoguei a causa de Lisboa, não foi para querer pôr esta Cidade em situação superior á das outras terras do Reino, mas para mostrar que aos seus rendimentos municipaes não teem as Provincias direito algum, por isso que elles são pagos pelos habitantes do Município: é necessario fazer bem essa distincção.

Concluo sobre a Proposta do Sr. D. de Palmella, que só a devemos votar debaixo desta condição — que a despeza para as Estradas seja tirada das economias, que se fizerem no Orçamento da despeza.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros — Sr. Presidente, julgo que nada me resta a accrescentar ás considerações geraes, que se teem apresentado ácerca da Proposta do D. Par o Sr. D. de Palmella A Camara neste momento já terá formado o seu juizo. Tenho para mim como evidente, conformando-me com os precedentes desta Casa, e com a doutrina sustentada na Sessão passada, que a Camara dos Pares tem o direito de fazer qualquer augmento nas verbas do Orçamento da despeza. (Muitos apoiados.)

Esta questão, Sr. Presidente, é differente daquella em que se pretende dar a esta Casa o direito de augmentar o Orçamento da receita. Quanto a este ultimo direito, estou convencido de que em conformidade com os principios, e com a Carta Constitucional, é necessario que a iniciativa tenha logar na Camara Electiva: por tanto, para o caso actual o que me parece que se deve fazer, é formular na outra Casa do Parlamento uma Proposta, ou fazer-se algum additamento, ou emenda no Projecto das Estradas. (Apoiados).

O Sr. V. de Castro — Em quanto ao direito, o Sr. Ministro dos Negocios do Reino acaba de o estabelece de uma maneira, que a Camara não póde deixar de o admittir: agora pelo que respeita á idéa das economias, que apresentou o Sr. C. de Lavradio, receio que ella tenda a destruir a Proposta do Sr. D. de Palmella, porque me parece que a Administração se não póde comprometter a acceita-la com aquella clausula: tenho pouca fé em que possamos aqui rapidamente imaginar economias do valor de 100:000$000 de réis, até pela razão que expendeu o meu digno Collega o Sr. V. de Algés, de que não é na discussão do Orçamento, que se podem estabelecer os quadros e outras medidas desta ordem (Apoiados), pois que isso depende de Propostas de Lei maduramente reflectidas. Pois o Sr. C. de Lavradio, que declarou não querer fazer mal aos Empregados, quererá agora retirar o seu pensamento, que é o que importa sujeita-lo a uma condição que neste momento seria inexequivel? Não devemos esperar isso do D. Par; e demais, Sr. Presidente, eu não creio em economias reaes, que não sejam precedidas da feitura das Estradas: daqui é que devemos derivar toda a qualidade de economia importante (Apoiados.) Não farei o paralello, como fez o D. Par, das duas verbas Theatros e Obras publicas; farei outro mais frisante, que é o de estarmos discutindo um Orçamento de réis 10.000:000$000, e haver quem tenha escrupulo de votar 100:000$000 para as estradas, pois é bem visto que os 71:000$000 que ahi vem para as Obras publicas, só servem para certos reparos, e para o pessoal. Sim, Sr. Presidente, das Obras publicas, das estradas, e das communicações faceis é que devem vir as economias. Eu estive algum tempo no Ministerio da Marinha, e vi que os Arsenaes tem um pessoal que nem é compativel com os systemas modernamente adoptados naquella qualidade de obras, nem de modo algum correspondente ao que alli se faz; tive portanto muito desejo de fazer economias naquella Repartição; mas declaro francamente á Camara, que não me atrevi a demittir um só Empregado, salvo por erro de officio; porque, demitti-los e reduzi-los á miseria era tudo a mesma cousa (Apoiados); mas se tivessemos entrado francamente na feitura das Estradas, não tinha a menor duvida em reduzir á metade o seu pessoal, e creio que outro tanto se poderia praticar nos Arsenars de guerra, porque os operarios que sahissem haviam de achar meios de subsistencia na variada industria, que então se desenvolvia: digo portanto, que não sejamos demasiadamente escrupulosos neste ponto; não nos liguemos tanto ás formulas; o confiemos que as economias hão de vir depois das Estradas. Ainda mais: pois este Reino tão circumscripto como é, depois das communicações faceis que as Estradas devem trazer, não se governará com metade do numero de Empregados hoje existentes? Isto para mim é axiomático: hoje ha immensas Authoridades por essas Provincias; e todas ellas tem um estado maior que rivalisa com o da Capital; e mal póde deixar de ser assim attento o isolamento em que se acham: ha Provincia cuja correspondencia é mais demorada do que o seria em outros Paizes se estivesse distante da Capital a centenares de legoas! Mas desde o momento em que houver Estradas, simplifica-se tudo naturalmente, e metade dos Empregados actuaes hão de fazer muito melhor serviço.

Por estas e por muitas outras considerações de não menor importancia, é que desejo que todos os nossos esforços convirjam para que dêmos o primeiro impulso a esta grande necessidade publica; não nos detenhamos agora a ver donde esses 100:000$000 hão de vir, porque elles de certo virão donde tem de vir 2.800.000$000 para o Ministerio da Guerra e 3.000:000$000 para a Divida publica. Se porém o Governo, mesmo nestes seis mezes, poder fazer economias equivalentes aquella somma, isso será muito para desejar, e para louvar; mas eu queria primeiro que tudo, que a Camara pozesse o Governo em situação de ficar authorisado a fazer alguma cousa; pelo menos a tornar transitavel esta estrada do Alemtejo. Voto portanto francamente pela Proposta que foi para a Mesa.

O Sr. V. de Algés — Pouco tempo gastarei, porque é mais para uma explicação do que para entrar na doutrina, pois largamente se tem fallado nella, e eu o que pretendia era referir-me a uma parte do que disse o Sr. Tavares de Almeida, ácerca de estygmatisar a doutrina de poderem ser recebidos tributos sem irem todos para os cofres geraes do Estado; mas o Sr. C. de Lavradio dispensou-me dessa tarefa, e já mostrou por principios de doutrina orthodoxa, que S. Ex.ª se havia enganado, pois que os tributos podem ser recebidos pelas Corporações incumbidas da sua especial applicação: esta é que é a verdadeira theoria; mas no sentido do D. Par, ainda quando a sua proposição tambem não fosse menos exacta, ella não colhia apesar disso, porque os tributos destinados para a Camara Municipal, que tem de os applicar a certos objectos do interesse do Município, são por direito constituidos, e deviam necessariamente entrar nesse cofre especial. (Apoiados.) Mas se lhos quizerem tirar, e fazer com que entrem nos cofres publicos do Estado, muito bem; mas hão de receber todos os encargos que com elles vem ao Município, hão de fazer as obras das calçadas, cuidar na illuminação da Cidade, limpeza della, etc....

Agora pergunto tambem ao D. Par — em que Código se acha estabelecida a doutrina contraria?

Diz S. Ex.ª —o Governo está no seu direito de tirar esses impostos á Camara Municipal: pois bem, conceda-se isto por hypothese, mas receba então o Governo todas as obrigações da Camara, e isso é que o D. Par talvez não ache possivel, nem conveniente: por consequencia ahi vê, que a sua doutrina não é exacta, e que os Municípios podem receber tributos especiaes para satisfazer com elles aos encargos a que são destinados. (O Sr. Tavares de Almeida — Peço a palavra.)

O Sr. Presidente — Peço aos D. Pares que já tem fallado sobre este capitulo mais vezes, que fallem só aquellas que o Regimento lhes permitte.

O Sr. V. de Algés — Os tributos que são votados para applicações do interesse do Município, dão direito a quem os paga, de saber a applicação que a Camara lhes dá, e o fructo que delles se tira.

Agora vou mostrar ao D. Par que não procede de maneira nenhuma a sua doutrina, e exemplifico o caso de um tributo que, por hypothese, estava applicado a qualquer Municipalidade. O Governo (segundo queria S. Ex.ª) chamava ao seu cofre geral esse tributo (isto suppondo que tinha direito para o fazer), recebia a responsabilidade, e não podendo applica-lo ao que devia por certas circumstancias (o que não acontece no Município, que tinha de o applicar exclusivamente a certo e determinado objecto) deu-lhe outro destino: a quem se havia de pedir a effectiva responsabilidade? Pois isto foi o que eu disse e sustento, porque são os verdadeiros principios, e são verdadeiras tambem as hypotheses que estabeleci.

Agora disse tambem S. Ex.ª, que não tinha esperanças, de que certas Corporações dessem contas, e por isso offerecia as suas reflexões ácerca da verba dos 71:000$000 para Obras publicas. Eu desde já declaro, que na proxima Sessão (se fôr vivo) hei de pedir estreitas contas aos Srs. Ministros. (O Sr. Presidente do Conselho — Apoiado.) Sinto que neste momento não esteja presente o Sr. Ministro da Fazenda; mas estão os seus Collegas para lhe transmittirem a recommendação que faço, de que é necessario que por uma vez acabe esta falta de contas, que desde 1845 se não dão, pois são as ultimas que conheço; e aproveito a occasião para tecer os devidos louvores a um Empregado, que não está onde estava (e peço ao Sr. C. do Tojal que me queira attender) o Sr. Conselheiro José Joaquim Lobo (O Sr. C. do Tojal — Apoiado) que em 1846 era Director geral da Secretaria da Fazenda; pois as ultimas contas são as do tempo de S. Ex.ª o Sr. Conselheiro Lobo, e desde então para cá não ha outras. (Apoiados.) É necessario que o Relatorio do Sr. Ministro do Reino para o anno (porque eu intendo que não é no Orçamento) mostre em que se consumiu averba dos 71:000$000, que se applica para Obras de reedificações, e outros objectos de primeira necessidade; mas porque não tem havido contas, não se segue que fique como regra que as não haja daqui em diante. O D. Par citou para exemplo a Academia das Sciencias, que nunca deu contas, e disse que por essa razão lhe suspendera as prestações quando foi Ministro do Reino. Muito bem, eu concordo nisso, porque não temos outro modo de saber se as cousas se fazem, e até se o que se dá é sufficiente para esses Estabelecimentos, Ou é de mais, ou de menos. (Apoiados.)

Por tanto, Sr. Presidente, para isto é que eu queria dar explicações: voto pela Proposta do Sr. Ministro do Reino, e estimo que S. Ex.ª já concordasse comigo na duvida da competencia da Camara para augmentar uma verba de receita, que importará a imposição de algum tributo. O Sr. V. de Castro fallou nas authorisações geraes, que se concedem ao Governo para haver meios. Não nos illudamos, porque quaesquer que sejam as authorisações que estejam na Lei de meios, o deficit certissimo: se podessemos ter a doce e lisongeira esperança, de que essas authorisações habilitariam o Governo para esta despeza, e mais algumas, ainda isso poderia ter logar; mas eu estou persuadido, de que não será muito conveniente contar com meios que não existem, e é esta uma origem de grandes males, e que nos tem conduzido a muito mau estado. Agora pela proposta do Sr. Ministro do Reino, o negocio leva o seu verdadeiro caminho, porque o Governo compromette-se a apresentar essa proposta ou no Projecto das Estradas, ou numa Lei especial, e então á vista disto até me parece, que se podia retirar a Proposta primitiva.

O Sr. C. da Cunha — Requeiro que V. Em.ª consulte a Camara para saber se a materia está sufficientemente discutida.

Assim foi julgado por 19 votos contra 18.

O Sr. D. de Palmella — Serei mui succinto na explicação que vou dar. Pertendi sómente exprimir o desejo de que se não tornasse vão este voto pronunciado pela Camara. Ninguem póde contestar a urgencia de economias. Espero que algumas se farão; e tanto melhor para o Paiz, se se verificarem no intervallo desta á futura Sessão. Entretanto quizera que a feitura de Estradas não ficasse ainda dependente de outras decisões; por isso redigi a minha Proposta com vistas de reduzir a questão á maior simplicidade. O Orçamento da despeza vai á outra Camara com algumas emendas. Se fôr approvada a minha Proposta, a outra Camara tomará a iniciativa do voto ácerca da fonte de receita que convirá estabelecer para esse encargo. Se não fôr approvada, será inutil tractar de designar esse recurso.

Approvada averba (8) correspondente ao capitulo 8.º do Orçamento, bem como a Proposta do Sr. D. de Palmella, salva a redacção.

(Continuar-se-ha.)