14 DE JANEIRO DE 1959 545
6. Desdobra-se o projecto em discussão em dez capítulos, alguns deles subdivididos em secções. A matéria vem aí tratada com lógica, harmonia, amplidão e profundidade.
Aos poucos artigos quê lhe dedica o Código Civil corresponde agora uma riqueza de pormenores disciplinada com melhor arrumação, redacção mais precisa e preenchimento de lacunas importantes.
Em face de todas as circunstâncias expostas e não se lhe suscitando contra o projectado diploma qualquer objecção de princípio, a Câmara aprova-o na generalidade.
II
Exame na especialidade
7. lio capítulo I do projecto, «Da atribuição da nacionalidade originária», a secção I tem a epígrafe a Da atribuição por mero efeito da lei» e contém apenas três artigos.
No artigo 1.º, n.º l, enumeram-se em cinco alíneas os que são considerados cidadãos portugueses com fundamento no facto de terem nascido em território português. É a disposição em que o jus soli impera em absoluto. Duas objecções lhe opõe a Câmara. A primeira é a de que, havendo no ultramar súbditos portugueses cujo estatuto não é o da plena cidadania, é inconveniente o emprego da expressão «cidadãos portugueses», que faz ocultar, por contraste, a situação dos nacionais não beneficiados, com os direitos inerentes à cidadania. O remédio para o caso consiste em suprimir a expressão, começando o artigo por dizer simplesmente: «São portugueses ...».
É a segunda que a menção várias vezes repetida de «legítimos» e «ilegítimos» é inútil, observação esta extensiva a várias disposições do projecto. Deve dar-se ao texto do artigo 1.º redacção mais condensada, até com a vantagem de tornar mais explícita a sua amplitude.
O n.º 2 do artigo considera nascidos em Portugal, até prova em contrário, os recém-nascidos expostos em território português. Preenche-se assim uma lacuna em termos que, mediante a possibilidade de ilidir a presunção, impedem que, no caso visado, se imponha coactivamente a nacionalidade portuguesa.
Por sua vez, o artigo 2.º baseia-se inteiramente no jus sanguinis ao ressalvar a nacionalidade portuguesa para os. filhos nascidos em território estrangeiro de pai português que nesse território se encontre ao serviço do Estado Português. É a regra em vigor (Código Civil, artigo 18.º; n.º 5.º), que não precisa de ser justificada e deve também ser aplicável ao caso dos filhos de mãe portuguesa que porventura venha a encontrar-se em território estrangeiro no mesmo serviço.
8. Estabelece o artigo 3.º uma importante regra de interpretação ao determinar que para os efeitos dos artigos 1.º e 2.º só os agentes diplomáticos e consulares de carreira são- considerados como estando ao serviço do Estado a que pertencem.
A falta de disposição restritiva no vigente regime, não pode deixar de se entender ser a residência em território estrangeiro não serviço da Nação Portuguesa» (Código Civil, artigo 18.º, n.º 5.º) mera circunstância de facto que para este efeito aproveita, a qualquer agente oficial do Estado Português, seja qual for a sua função. Em contrário, a disposição em projecto vem introduzir nesta matéria uma- limitação muito rigorosa.
É duvidosa a justiça desta restrição. Sem esquecer que a atribuição dá nacionalidade portuguesa aos filhos dos representantes do Estado Português que não sejam agentes diplomáticos os consulares de carreira pode sempre ficar garantida mediante o emprego de alguns dos processos previstos no artigo 4.º, parece ser razoável conceder àqueles que se encontram no território, estrangeiro no desempenho de missão oficial independente do exercício das funções de uma- carreira o mesmo tratamento dado aos agentes diplomáticos ou consulares.
9. Na Secção II do mesmo capítulo, «Da atribuição por efeito da vontade, declarada ou presumida», indicam-se as condições em que se consideram cidadãos portugueses os nascidos no estrangeiro quando filhos legítimos ou ilegítimos de pai português (artigo 4.º) ou de mãe portuguesa (artigo 5.º).
Como nota o relatório do diploma (n.º 4), consagra-se assim o princípio firmado no Código Civil (artigo 18.º, n.ºs 2.º e 3.º), segundo o qual a declaração de opção pela nacionalidade portuguesa com fundamento na nacionalidade portuguesa do progenitor pode fazer-se sem subordinação» a prazo e, portanto, a todo o tempo.
Solução diferente da do Code de la nationalité française (artigo 45.º), a sua. manutenção implica, na verdade, os inconvenientes apontados. Mas o carácter universalista da expansão do povo português, que o relatório vinca, e a circunstância de a maior parte dos problemas desta índole se originarem no Brasil, nação irmã onde a linha divisória entre as duas nacionalidades não tem muitas vezes repercussão na prática, conduz a apoiar a solução adoptada: e com tanto mais garantia de segurança para o Estado Português que, mediante a faculdade expressa no artigo 34.º, o Governo tem a possibilidade de impedir o funcionamento da regra geral nos casos em que considerar a sua aplicação capaz de produzir efeitos verdadeiramente inconvenientes.
10. Trata a secção III da filiação em matéria de nacionalidade.
Aos seus quatro artigos (6.º a 9.º) nada há a opor.
Há apenas a notar que o artigo 8.º aplica à matéria em causa o princípio geral sobre a equiparação dos filhos legitimados aos legítimos (Decreto n.º 2 de 25 de Dezembro de 1910, artigo 2.º) e que, além do lapso que na parte final do n.º 2 do artigo 9.º diz «perfilhado» por «perfilhante», o n.º 3 deste mesmo artigo só dá. efeitos à perfilhação em matéria de nacionalidade quando ela for feita durante a menoridade do perfilhado. A liberdade da atitude deste em tal matéria, quando maior, fica assim inteiramente ressalvada.
11. É epígrafe do capítulo II «Da aquisição da nacionalidade», e divide-se ele em duas secções, sendo a primeira. «Da aquisição da .nacionalidade pelo casamento» (artigos 10.º e 11.º).
No primeiro destes artigos, o preceito em vigor, segundo o qual é portuguesa a mulher estrangeira que casa com cidadão português (Código Civil, artigo 18.º, n.º 6), passa a permitir uma importante excepção: a regra não se aplicará se até à celebração do casamento a mulher declarar que não quer adquirir a nacionalidade portuguesa e provar que mão perde a nacionalidade anterior.
Ao problema da repercussão do casamento na nacionalidade da mulher se refere com largueza o relatório do projecto (n.º 6), indicando as divergências sobre ele que a doutrina tem admitido e os sistemas-base em que as várias legislações se têm fixado, embora com variações de pormenor.
Acerca do princípio em vigor no caso português, faz-se notar que ele deriva da ideia de os cônjuges deve-