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9 DE JANEIRO DE 1960 843

ao defender a rejeição pura e simples do diploma em discussão - como única maneira de suspender a vigência do preceito referente à caducidade do mandato dos presidentes e vice-presidentes das câmaras - tenha proposto que a Assembleia, simultaneamente com aquela rejeição, afirmasse todavia ao Governo o seu apoio para que fizesse logo reviver os restantes preceitos nele contidos.
O não ter querido bulir na essência dessas disposições deve, de resto, ter pesado no espírito da Assembleia ao optar pela ratificação com emendas. A Assembleia Nacional preferiu ver mantido transitoriamente em vigor, sem qualquer alteração, o preceito legislativo que lhe suscitou reparos, a rejeitar na íntegra um diploma com cujos dispositivos, na sua quase totalidade, se encontrava de acordo.
Não oferece dúvida, portanto, que a Assembleia Nacional, abstendo-se deliberadamente de pôr em causa, na «generalidade», estes preceitos do decreto-lei, implicitamente aprovou a própria «generalidade» que os inspira dentro desse diploma legislativo, sancionando, assim, a oportunidade e a vantagem de serem alteradas, na linha de pensamento com que o foram pelo decreto-lei, as disposições do Código Administrativo por ele visadas. E não oferece dúvida, de igual modo, que só dentro do mesmo espírito a Câmara Corporativa poderá sugerir - se for caso disso - qualquer alteração dos mesmos preceitos, no «exame na especialidade» a que adiante terá de proceder.

7. Bastante diferente foi, porém, n atitude da Assembleia Nacional quanto à nova redacção do artigo 72.º do Código Administrativo, constante do artigo 1." do Decreto-Lei n.º 42 178, e quanto ao disposto no artigo 2.º do mesmo diploma legislativo.
Quando se procura apurar, neste domínio, qual a «generalidade» a que a Assembleia deu a sua aprovação e dentro da qual tem de mover-se n «exame na especialidade» da Câmara Corporativa, verifica-se sem grande custo:

a) Que a Assembleia, votando a ratificação do decreto-lei, desejou manter - como o diploma mantém - a natureza jurídica da magistratura municipal consignada no Código Administrativo: magistrado único de livre nomeação e demissão governamental;
b) Que a Assembleia, tomando a atitude que tomou, desejou igualmente conservar o princípio - que o decreto-lei também conserva - de que os presidentes e vice-presidentes das câmaras municipais não devem ser nomeados por tempo indeterminado, mas por um período de tempo pré-fixado;
c) Que, pelo contrário, ao declarar o diploma carecido de emendas, a Assembleia parece ter querido repudiar a aplicação rígida do princípio da renovação, preconizada pelo decreto-lei para os casos de doze anos consecutivos de exercício do cargo por parte dos presidentes e vice-presidentes das câmaras municipais, contra o que até agora o Código Administrativo permitia.

8. Pela aprovação do primeiro princípio, pôs a Assembleia Nacional fora de causa o problema da vantagem ou oportunidade de restabelecer a dualidade de magistraturas municipais - presidente da câmara, como representante eleito da colectividade municipal, e administrador do concelho, como representante do Governo junto do município -, sistema que entre nós foi já adoptado e deu as suas provas, boas e más, durante quase um século de monarquia liberal e de regime republicano.
Não faltou, durante o debate na Assembleia, quem sustentasse com brilhantismo a necessidade de restabelecer essa dualidade de magistraturas, justamente como maneira de resolver o problema suscitado pela nova medida legislativa quanto à caducidade do mandato dos presidentes e vice-presidentes das câmaras. E não faltou também quem chamasse a atenção para os riscos de um eventual regresso a essa dualidade. Mas nem o primeiro orador (o Sr. Deputado Sim eito Pinto de Mesquita) concretizou qualquer proposta imediata nesse sentido, nem o segundo (o Sr. Deputado José Saraiva) deu às suas palavras qualquer sentido de contradita à tese do primeiro.
A Câmara Corporativa está vinculada, a respeito desse problema, a pareceres que oportunamente emitiu .sobre a proposta de lei n.º 73 da I Legislatura e sobre o projecto de lei n.º 95 da IV Legislatura, da iniciativa do Sr. Deputado Mário de Aguiar 2, o que, aliás, não a impediria, se fosse caso disso, de rever a sua posição. Mas a forma puramente incidental como o problema foi posto na Assembleia e a concordância implícita que esta deu, na sua votação, ao princípio monista não só desoneram como impedem esta Câmara de entrar na apreciação do assunto.

9. Desonerada e impedida está também a Câmara Corporativa de discutir o problema de saber se os presidentes e vice-presidentes das câmaras municipais de, vem sem nomeado» por tempo indeterminado - como os Ministros, os governadores civis e outros magistrados de confiança política - ou por um período de tempo certo e determinado.
Foi este, manifestamente, um segundo ponto sobre que a Assembleia Nacional tomou posição ao dor, em princípio, a sua ratificação ao Decreto-Lei n.º 42 173. Na verdade, o decreto-lei não só manteve, como afirmou de modo mais incisivo ainda - reduzindo de oito para quatro anos o mandato dos presidentes e vice-presidentes das câmaras - o princípio da nomeação por período certo de tempo, já perfilhado pelo Código Administrativo. E, não tendo esse princípio sido posto em crise por nenhum dos Srs. Deputados que intervieram no debate, é forçoso concluir que a ratificação do diploma abrange uma implícita concordância da Assembleia com tal princípio, que assim entra no domínio da «generalidade» já aprovada e em cuja «apreciação» u esta Câmara é vedado entrar.

10. Há, é certo, no discurso proferido em 17 de Março pelo Sr. Deputado Homem de Melo algumas passagens que parecem querer referir-se expressamente u o problema e tomar posição em favor da nomeação por tempo indeterminado 3. Mas uma leitura mais

1 Publicado no suplemento no Diário das Sessões n.º 75, de 8 de Fevereiro do 1986. Foi relator desse parecer o Prof. Doutor Domingos Fezas Vital.
2 Publicado no suplemento no Diário das Sessões n.º 62, de 11 de Dezembro de 1946. Foi ralador desse parecer o digno Procurador Álvaro Malafaia.
3 Reportamo-nos, sobretudo, à seguinte passagem do seu discurso: «A confiança política, tal como a confiança administrativa, não são coisas que se concedam a prazo. Ao nomear um governador civil ou um presidente de câmara o Governo faz saber que tem confiança em determinada pessoa para o exercício da função, mas que se reserva o direito de lha retirar no momento que entender. Em cargos electivos impõem-se a fixação de um prazo pura que o corpo eleitoral, volte a pronunciar-se, e neste caso aceita-se até que se proíba a reeleição no fim de certo tempo, no intuito de evitar que influências permanentes junto dos eleitores desviem a vontade dos mesmos. Não pode ser idêntico o processo no preenchimento de cargos do confiança».