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9 DE JANEIRO DE 1960 845

municípios acumulou as funções de magistrado governamental dentro do concelho. O Poder Central, ou não está representado no concelho - como sucede nos alvores do municipalismo medieval -, ou, quando o está - e hoje seria inconcebível que o não estivesse -, nomeia ele próprio o seu representante, seja este o alcaide ou o juiz de fora dos velhos tempos ou o administrador do concelho da monarquia liberal e da época republicana; e os interesses municipais, ou são geridos por um representante eleito, que coexiste ao lado do magistrado governamental, ou entregues directamente a este.
Por isso é que, na base de todo este problema - como argutamente viu o Sr. Deputado Simeão Pinto de Mesquita - está a questão da unidade ou dualidade de magistraturas municipais. Mas essa questão, como se disse (supra, n.º 8), foi posta fora de causa pela votação da Assembleia Nacional; e à Câmara Corporativa, portanto, não pode ceder à tentação de a abordar.
14. Todas estas considerações visam a salientar que a nomeação dos presidentes e vice-presidentes das câmaras por período certo de tempo - que o Código Administrativo perfilhou e o Decreto-Lei n.º 42 178 respeitou - está na lógica do sistema que entre nós vigora quanto à natureza jurídica daqueles cargos.
Tal como a respeito do problema da unidade ou dualidade de magistraturas - e conforme se disse já (supra, n.º 9) - não tem a Câmara Corporativa de se pronunciar sobre este ponto, que faz parte, como aquele, da «generalidade» já aprovada pela Assembleia a respeito do Decreto-Lei n.º 42 178. Mas o que nada a impede é de frisar que não se pode, a este respeito, perfilhar uma solução diversa sem rever, desde a base, toda a arquitectura da administração municipal, tal como o Código Administrativo a concebeu.
Quer dizer: aceitando a solução de fazer convergir na mesma entidade, dentro do concelho, a representação municipal e a representação do Poder Central, não pode deixar de confiar-se a designação dessa entidade (presidente da câmara) à escolha do Governo. E aceitando a ideia de dar maior relevo, na magistratura municipal, à representação da colectividade do que à representação governamental, não pode deixar e aceitar-se também, a transitoriedade e periodicidade do cargo. O presidente da câmara, numa palavra, embora escolhido pelo Governo, tem de receber um mandato a curto prazo, como sucederia se fosse realmente eleito pelos munícipes. Só assim se vinca devidamente a sua qualidade de órgão de concelho e a obrigação que o Governo tem de rever periodicamente o problema da representação municipal, como o eleitorado o faria se lhe fosse dado pronunciar-se.

15. Inteiramente diferente deste é o problema do saber se os magistrados municipais devem ou não ser obrigatoriamente substituídos ao cabo de um certo número de anos de exercício do cargo. Foi este o terceiro e último ponto sobre que a Assembleia Nacional tomou posição; e, desta vez, não para aprovar o disposto no decreto-lei - como nos dois pontos anteriores -, mas antes para o declarar carecido de emendas. O decreto-lei pretendeu introduzir o princípio da substituição obrigatória para os casos de doze unos consecutivos de exercício do cargo; e a Assembleia discordou desse princípio, pelo menos na aplicação rígida que o decreto-lei preconizava.
Porque se trata, aqui também, de um ponto de «generalidade» fixado pela Assembleia Nacional, não compete à Câmara Corporativa discutir o problema em toda a sua amplitude, mas tão-sòmente conformar-se com a decisão já tomada e sugerir a alteração do preceito legislativo no sentido mais consentâneo com o espírito que dominou á discussão e a votação na Assembleia.
Nada impede, porém, a Câmara - até pela importância que isso tem para o «exame na especialidade» a que adiante terá de proceder - de observar e registar que este problema não tem uma solução doutrinalmente imposta pela solução adoptada quanto nos problemas anteriores. Esses problemas, sim, na lógica do nosso sistema administrativo local, exigem - conforme se viu - uma solução em cadeia, de forma que não se pode bulir na solução de um sem rever a solução dos que fluíram para trás; mas este, chegados ao ponto a que chegámos, pode ser solucionado com perfeita autonomia doutrinal.

16. Repare-se, efectivamente, que o sistema da transitoriedade e periodicidade do cargo de presidente da câmara - última solução em cadeia dos problemas já anteriormente focados - não formula, só por si, qualquer exigência na solução do problema que agora nos ocupa. Esse sistema de mandato a curto prazo só uma coisa exige: que o Governo periodicamente reveja a representação municipal, verificando se o presidente cessante continua a ser a pessoa mais idónea para representar a colectividade - merecendo, portanto, continuar no seu posto -, ou se outrem surgiu entretanto com maior idoneidade que mereça substituí-lo. Mas, na lógica do sistema, nada impede que a recondução se faça um número indefinido de vezes, como nada impede que se lhe imponha um limite, se circunstâncias e outra ordem o justificarem.
Tudo seria diferente se o problema em apreciação tivesse de ser colocado perante outros pressupostos doutrinais, designadamente se a presidência das câmaras municipais, em vez de ser um cargo de natureza mista, fosse apenas uma magistratura administrativa da confiança do Governo. Então, sim, a lógica do sistema exigiria, como sucede nos demais cargos de confiança (Ministros, governadores civis, regedores, etc.), que a nomeação do presidente da câmara fosse feita por tempo indeterminado; e o nosso problema teria de ser solucionado em conformidade, ou melhor, nem chegaria sequer a pôr-se, pois, sendo a nomeação feita por tampo indeterminado, seria contraditório impor uma substituição obrigatória ao fim de um tempo determinado.
Foi assim, de resto, que argumentou o Sr. Deputado Homem de Melo no seu discurso de 17 de Março, embora com um salto lógico, pois a conclusão que directamente se tira do pressuposto «lugar de confiança» não é a da inadmissibilidade de um limite à livre recondução - único problema sobre que o ilustre Deputado quis pronunciar-se -, mas a da inadmissibilidade de a nomeação ser feita por período certo de tempo; e esta é que implica aquela. De qualquer modo, a sua argumentação parte de um falso pressuposto: o de os presidentes das câmaras serem, entre nós, actualmente, um puro cargo de confiança política; e isto torna vã a sua tentativa de demonstrar que o problema de dever ou não existir um limite à livre recondução dos magistrados municipais tem de ser, do ponto de vista doutrinal, forçosamente resolvido em certo sentido. Tê-lo-ia, sem dúvida, se fosse certo o pressuposto de que partiu o Sr. Deputado Homem de Melo; mas, dentro dos pressupostos em que de facto assenta o nosso sistema administrativo local, não acontece assim: o problema tem completa autonomia.

17. Dizer que, na lógica do sistema administrativo vigente, o problema em exame não tem uma solução doutrinalmente imposta pela solução já dada aos que o antecedem na pirâmide de que ele é o vértice equivale