O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 5

REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES

3.º SUPLEMENTO AO N.º 104 ANO DE 1941 16 DE ABRIL

II LEGISLATURA

CÂMARA CORPORATIVA

Projecto de decreto relativo á organização social e económica das populações indígenas

1. Desde os recuados tempos da conquista a expansão ultramarina Au Portugal sempre se regrou pelos sentimentos humanitários de protecção, defesa e elevação moral e material dos indígenas povoadores das terras ocupadas. Com profunda verdade se escreveu no preâmbulo justificativo de um decreto promulgado logo nos primeiros tempos da Revolução Nacional, de que saiu a República unitária e corporativa que é hoje o Estado Português: «A governação ultramarina de Portugal obedeceu historicamente à norma crista, humanitária e patriótica de manter e civilizar as populações indígenas do nosso vasto domínio colonial edis as encor-porar fraternalmente no organismo político, social e económico da Nação Portuguesa».

2. A política de extermínio das populações nativas não mancha a história da colonização lusitana. Pela própria formação "católica, da grei, o conquistador português por toda a parte se fazia acompanhar da cruz evangelizadora, à sombra da qual procurava formar muita cristandade». Já em 1510 era com os v piais da terra* que Afonso de Albuquerque se propunha criar e firmar o Império do Oriente. É no Brasil, e principalmente com os aldeamentos indígenas, organizados e assistidos pelos missionários da Companhia de Jesus, que começa de formar-se a nação cristianíssima que em 1822 se emancipa da mãi-pátria, guardando em si a língua, a fé, a doçura de costumes e o culto familiar do povo que lhe desbravara a selva. E é com orgulho que os portugueses de hoje podem ler em livros de historiadores brasileiros esta confissão desvanecedora: «0 catolicismo foi realmente o cimento da nossa unidade.
A pouco e pouco o materialismo do pensamento foi minando a actividade do Estado e gravemente se atentou contra a formação espiritual da raça adentro da moral cristã em que fora temperada. E tam longe foi o desvario que até para os domínios coloniais se quis levar o laicismo, simplesmente capaz de produzir ou aperfeiçoar o homem-máquina, mas absolutamente incapaz de substituir as missões religiosas no apostolado caldeador das almas e no bom combate pela constituição perfeita do lar e da família.

3. Reagiu porém a Nação. E logo no início da Revolução Nacional volveram-se olhos carinhosos para as terras distantes do Império, lembrados de que a função mais alta de um país colonial é civilizar e não mecanizar as populações nativas que o Estado tutela não apenas para produzir trabalho e rendimentos, mas essencialmente para melhorar a condição moral do indivíduo e criar a vida colectiva, de que resulta a melhor unidade e o engrandecimento da Nação. Os decretos n.ºs 12:485 e 12:533, respectivamente de 13 e 23 de Outubro de -1926, que aprovam o Estatuto Orgânico das 3/MíõcJf Católicas Portuguesas e o Estatuto Político Civil e Criminal dos Indígenas, soo marcos imperecíveis no caminho da tradicional política colonial portuguesa, sempre inspirada nos mais altos princípios da civilização cristã. Segue-se-lhes o Código do Trabalho dos Indígenas, aprovado pelo decreto n.º 16:199, de 6 de Dezembro de 1928, o qual contém normas que nenhum país excede em protecção aos indígenas. E continua
a obra colonial da Ditadura Nacional1 com a promulgação do estatuto básico da administração ultramarina - o Acto Colonial, aprovado pelo decreto n.º 18:070,

Página 6

244-(6) DIÁRIO DAS SESSÕES-N.º104

de 8 de Julho de 1930 -, em cujo título n se prescrevem objectivos e normas de política indígena perfeitíssimos.

4. Com a promulgação da Constituição Política da República, em 22 de Fevereiro de 1933, estabelece-se a normalidade governativa, lançando-se os fundamentos sólidos do Estado Novo com raízes aia tradição cristã e corporativa da grei. O Acto Colonial é integrado na Constituição. E, desde esse instante, todos os seus princípios se tomam absolutamente indissociáveis dos restantes princípios do estatuto constitucional.
Ora, pela Constituição, o Estado impõe-se alguns direitos e obrigações que, por sua natureza, há aqui necessidade de destacar:
a) Desenvolver a povoação dos territórios nacionais;
6) Defender a economia nacional das explorações agrícolas parasitárias ou incompatíveis com os interesses superiores da vida humana;
c) Organizar economicamente a Nação de maneira a realizar o máximo de produção e riqueza socialmente útil e a estabelecer uma vida colectiva de que resulte poderio para o Estado e justiça entre os cidadãos;
d) Assegurar a constituição e a defesa da família;
e) Favorecer a constituição de lares independentes e em condições de salubridade e a instituição do «casal de família»;
f) Ministrar o ensino, tendo em vista a formação do carácter, do valor profissional e de todas as virtudes morais e cívicas, orientadas aquelas pelos princípios da doutrina e moral cristãs.
E no Acto Colonial - para que o nomadismo, mais ou menos praticado pelos povos do sertão, deixasse de existir como fonte de miséria e destruição de vidas, promovendo-se o seu apego à terra e ao lar - estabelecia-se que o Estado garantiria aos indígenas a propriedade e a posse dos seus terrenos de cultura, nos termos em que a lei o declarasse.
Há portanto que alentar nestes princípios e fixá-los no seu conjunto pleno de harmonia para que tanto quanto possível seja feita a sua aplicação às populações nativas do Império, cuja assimilação pretendemos efectivar, e por toda a parte se espalhem os consequentes benefícios duma organização social e económica mais moral e fecunda para os indivíduos, assim como mais perfeita e útil para a Nação.

5. Quando, em Junho de 1933, se realizou a Conferência dos Governadores Coloniais foram focados pelo Chefe do Governo os mais importantes aspectos da administração ultramarina, cujo estudo e resolução passaria a constituir o mais devotado interesse do Estado Novo. Hás entre eles as suas palavras destacaram a seguinte aspiração: «... por cima de tudo, porque mais alto e mais belo, devemos organizar cada vez mais eficazmente e melhor a protecção das raças inferiores, cujo chamamento à nossa civilização cristã é uma das concepções mais arrojadas e das mais altas obrai da colonização portuguesa».
E o Ministro das Colónias dizia em 1936, no seu discurso inaugural do ciclo de conferências de alta cultura colonial, depois de asseverar que Portugal respeitava no indígena a sua dignidade humana»:
Mais do que conquistadores de terras, sempre fomos e queremos continuar a ser conquistadores de almas, e a nossa vitoriosa política de assimilação domina de muito alto certo concerto de colonização, obscuro, deshumano, anti-social, que apenas tem em vista interesses materiais, mediante o enunciado de princípios arbitrários e de conteúdo mau definido. Em matéria colonial praticamos uma política de bondade - e a bondade é, V. Ex.ªs o sabem, a mais pura lente de clarividência.
Após a I Conferência dos Governadores Coloniais é promulgada a Carta Orgânica do Império. E no seu capítulo viu desenvolve-se e articula-se o pensamento do Acto Colonial ao mesmo tempo que se converte em disposição de lei o que o Chefe do Governo quisera declarar como obrigação suprema do Estado Novo. Então se manda que tem todas as colónias se fará a organização das populações indígenas para fins de assistência, de administração pública e de defesa militar, ao mesmo tempo que a todas as autoridades e colonos se impunha o dever de velar pela conservação e desenvolvimento das populações, também procurando melhorar as suas condições de vida e favorecer as iniciativas tendentes à sua civilização ou ao aumento do seu amor por Portugal.
Pela lei n.º 1:948, de 13 de Fevereiro de 1937, foram introduzidas alterações à Carta Orgânica, a qual novamente foi publicada em 5 de Maio do corrente ano. E aí é reforçada a protecção à propriedade indígena, sempre na orientação clássica da obra colonial portuguesa.

6. A braços, porém, com as desastrosas repercussões da crise económica que durante anos assaltou e perturbou todos os países do mundo, quasi não houve tempo para outros esforços que não fossem para atenuar os efeitos da depressão económica. E se Portugal pode orgulhar-se de ter oposto, na metrópole e nos seus domínios, uma resistência exemplar à violência da catástrofe que tantas ruínas ocasionou em noções mais poderosas e de maiores recursos, também é certo que a obra construtiva, apesar de larga, não pôde ter a extensão e grandeza que positivamente haveria alcançado se outros cuidados e muitos prejuízos não tivessem obrigado a desvios e paragens mo campo da construção.
Acima de tudo impunha-se que se obtivesse e mantivesse o equilíbrio financeiro, sem o qual se daria fatalmente a desorganização de toda a máquina administrativa e o descalabro progressivo das contas públicas. E com a agonia do Tesouro sofreriam todas as actividades criadoras até à liquidação irremediável pelo esgotamento ou pela asfixia, pois que dentro de um Estado pobre tudo se converte em ruínas por maior que seja a capacidade de acção das suas forças vivas.
E o equilíbrio das coutas conseguiu-se, existe. Desapareceu, portanto, a preocupação maior do Governo nestes últimos anos de administração ultramarina. Presentemente a situação parece estabilizada. E, a não surgir outra anormalidade que a prejudique, chegou-se à hora de se transformar em obra o ideal construtivo do Estado Novo doutro dos princípios já estabelecidos para a organização geral da Nação.

7. De diversa natureza e importância são os problemas da nossa administração ultramarina. E muitos eles são. Mas, iniludivelmente, a base de toda a construção colonial deve ser a massa da sua população indígena. E ela o agente máximo da prosperidade do Império. E é perante cia que o Estado assume a obrigação maior da sua função colonizadora.
A organização geral do ultramar não deve, portanto, perder de vasta a organização das suas populações nativas. A lei do Estado Novo não se limitou a estabelecer as obrigações do Estado e dos seus agentes, porque também impôs aos colonos o dever de velarem pela conservação e desenvolvimento das populações, ou seja, mais concretamente, a obrigação de organizarem os seus serviços próprios de maneira que deles venha a resultar, principalmente, benefício social pela melhoria das condições de vida do pessoal neles empregado.
Convém prevenir a hipótese de nas colónias a propriedade agrícola acabar por embaraçar-se na falta de

Página 7

16 DE ABRIL DE 1941 244-(7)

serviçais que a procurem, tudo aconselhando, portanto, que se chame à «colonização» das terras, pela concessão de vantagens atraentes, os braços de que precise para o trabalho permanente.
Em todos os domínios coloniais a obrigação maior e mais indeclinável da administração é a defesa intransigente das populações suas tuteladas e promover por todas as formas; ao seu alcance a conservação, aumento e valorização do capital humano de que depende a sua prosperidade. Um dos preceitos máximos da nova política portuguesa está consubstanciado nestas palavras: temos obrigação de sacrificar tudo por todos, não devemos sacrificar todos por alguns.

8. É indiscutível que sempre uma idea de assistência material e moral às populações indígenas do Império predominou no espírito português. Assegurou-se-lhes a paz e a justiça. Efectuou-se o apostolado cristão para a formação espiritual das almas. Concede-se-lhes hospitalização a socorros médicos. Cuidou-se da sua riqueza agrícola e pecuária. Deram-se-lhes escolas e oficinas. E, finalmente, defenderam-se no seu trabalho contra os abusos ou os tratamentos susceptíveis de correcção.
A obra de protecção às populações indígenas nas colónias portuguesas é justo título de orgulho para a actividade colonial da Nação. Com essa protecção despendem as colónias valiosas quantias. E o que se tem feito neste campo no ultramar português bem demonstra que, através de todas as circunstâncias, Portugal tem cuidado, com especiais desvelos, os indígenas das suas colónias.
Mas é inegável que uma organização mais conveniente do povoamento indígena, o seu estabelecimento em lugares mais acessíveis para que a assistência a todos alcance e favoreça poderá tornar ainda melhor e mais eficaz a protecção, que jamais deixou de ser dispensada com extremos de solicitude.
É também certo que nenhuma organização seria duradoura se não procurasse criar no indígena o sentimento que fixa os homens à terra: o amor à propriedade. E eis por que no Acto Colonial já ficou preceituado que o Estado garantiria aos indígenas a «propriedade e a posse dos scus terrenos de cultura».
Mas a propriedade deve ser mais que um campo arável. As culturas anuais são insusceptíveis de criar o amor ao chão: após a colheita sucede o ervedo, e nenhuma afeição fica ali enraizada. Tem-se notado porém que o indígena estabiliza nos lugares onde possua ou crie arvoredos que lhe prodigalizem frutos. E, assim, a propriedade indígena deverá ser parcialmente constituída por culturas permanentes, correlativamente se associando a esta idea a constituição do «casal de família», que é um princípio do estatuto orgânico da Nação.
Assim melhor se organizará a propriedade privada. Mas ao mesmo tempo convém que se não destrua, e, pelo contrário, se mantenha e aperfeiçoe a comunidade agrícola, tradicional em muitos povos, para que entre os lares independentes se perpetue o espírito de «associação» de que resulta o bem colectivo.
Daqui o pensamento de se reservar, em tôrno das «aldeias» organizadas, o terreno bastante para o trabalho colectivo da respectiva população, e do seu produto ser extraído um «fundo» de previdência e assistência que consinta a melhoria progressiva das suas condições de vida e o amparo a necessitados.

9. Ficaria, porém, incompleta toda a obra de civilização que não procurasse a reforma dos espíritos.
Todos os povos inferiores que se isolaram nos seus costumes e superstições, e nos seus ritos bárbaros, desapareceram ou vão em caminho de desaparecimento. O progresso é mais um produto da alma do que do braço. Mas a formação do espírito só pode ser obra das missões católicas portuguesas, na religião se buscando o elemento da unidade social, que só por si tem criado nações, agregando povos diferentes.
Ora pelo Estatuto Orgânico das Missões Católicas Portuguesas (1926) já o ensino de práticas agrícolas e profissionais se acrescentava ao da religião e da língua nacional. E no programa de acção que a lei lhes estabeleceu há tudo quanto pode querer-se para a desejada elevação moral e material dos povos nativos, até à constituição perfeita do lar e da família.
Dar-se-á, pois, um papel primacial às missões católicas portuguesas na formação e direcção das «aldeias» que o Estado vai organizar. Tudo recomenda que as populações cristãs sejam agrupadas em povoações isoladas dos agrupamentos gentílicos, evitando-se assim o contacto e o abandono espiritual que faz regressar o homem à selva.

10. Em suma, o que o Estado Novo vai agora tentar é a organização das sociedades indígenas dos territórios coloniais de modo que dela resulte «o maior aumento possível dos bens do corpo, do espírito e da fortuna», com primazia do aperfeiçoamento moral, entrando definitivamente no caminho de, pela fé, pela língua, pela educação, pela comunidade dos sentidos e das ideas, dos hábitos e dos gostos, criar os laços naturais que ainda mais justifiquem a unidade e indestrutibilidade do Império.
Deslocadas as populações para os lugares mais férteis e mais salubres e tanto quanto possível na proximidade das vias de comunicação; agrupadas segundo as raças, para que as misturas de sangue não produzam depauperamentos o receptividades prejudiciais; organizada a sua vida económica em condições de bem-estar e de maior apêgo à terra, pondo esperanças no termo dos seus hábitos vagabundos; facilitada a assistência dos serviços sanitários e de fomento pelo agrupamento e melhor distribuição dos povos que agora vivem disseminados; produzida a maior abastança e melhor combatidos os males destruidores legìtimamente, pode esperar o Estado que as populações se multipliquem e, em consequência, toda a riqueza aumente, atraindo o comércio e as indústrias, que são fontes permanentes, de colonização.
E, assim, todos os problemas de administração, de povoamento, de civilização, de fomento e de nacionalização aparecem deminuídos nas suas dificuldades, pois que em grande parte se resolvem com a simples melhoria das condições em que vive e trabalha a quási totalidade da população indígena.
É evidente que o objectivo proposto terá de ser alcançado lentamente, por forma a não violentar as populações indígenas, que precisamente se deseja beneficiar.
Nesta matéria temos de caminhar devagar, para caminharmos com segurança, pois não é de repente que se podem alterar hábitos muito antigos.
Importa porém começar.
É possível que na grandiosidade da tarefa que o fim proposto impõe se gaste a vida de mais de uma geração. Mas por isso mesmo a sua realização deve iniciar-se sem demoras, para que de ano para ano os benefícios da organização vão produzindo seus frutos.
Foi êste projecto largamente debatido na II Conferência dos Governadores, que o aprovou.

Página 8

244-(8) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 104

Assim:
Usando da faculdade conferida pelo n.º 4.º do § 1.º do artigo 10.º da Carta Orgânica do Império Colonial Português, o Ministro das Colónias decreta e eu promulgo o seguinte:

Artigo 1.º Devem as colónias considerar fundamental a sua acção no sentido de continuar e progressivamente melhorar a organização social e económica das populações indígenas, por forma a permitir ao Estado a efectivação cada vez mais eficaz da sua assistência moral e material.
Art. 2.º A organização social das populações indígenas deverá assentar, essencialmente:
a) Na formação de agrupamentos sociais-económicos, dentro da uniformidade das raças e das crenças;
b) Na constituição e defesa da propriedade;
c) Na constituição e defesa da família.
Art. 3.º Competirá aos governos das colónias onde exista o indigenato e a dispersão populacional dificulte em assistência o gradual agrupamento das populações em «aldeias», compostas de um mínimo de vinte famílias, devendo ser constituídas principalmente por casais católicos portugueses. As «aldeias gentílicas» serão formadas por famílias indígenas agrupadas quanto possível segundo as raças.
Art. 4.º Para perfeita realização dos fins que o presente decreto se propõe atingir são garantidos aos habitantes das aldeias:
a) A assistência técnica;
b) A assistência sanitária;
c) A assistência espiritual;
d) Medidas de previdência;
e) Medidas de protecção à família;
f) A defesa contra as emigrações inconvenientes.
Art. 5.º A base da formação das aldeias é o «casal de família». Cada «casal de família» deve ser constituído por uma casa de habitação, gentílica, mas higiénica, um quintal de 2 a 4 hectares com um cercado e a instalação própria para os animais e aves domésticas.
Em tôrno da aldeia deve ser reservada uma área mínima de 5 a 10 hectares por cada família, destinada ao pascigo dos gados e à cultura.
No cercado serão praticadas exclusivamente as culturas permanentes (arvores frutíferas e outras e as de horta).
Art. 6.º No terreno reservado fora do «casal de família» devem ser praticadas as culturas alimentares para uso indígena e para venda.
Vivendo a aldeia em regime de trabalho colectivo, o seu produto terá como aplicação primária o pagamento do imposto indígena devido pela «aldeia». Ao remanescente dar-se-á a seguinte aplicação:
75 por cento para ser distribuído equitativamente pelas famílias aldeadas;
25 por cento para constituir um fundo de fomento e reserva, com os fins seguintes: melhoramentos gerais e compra de animais de criação e de trabalho; aquisição de utensílios e de material agrícola, adubos e insecticidas; socorros em períodos de crise; amparo a viúvas e velhos necessitados.
Art. 7.º O «casal de família» não poderá ser alienado, nem por qualquer forma onerado. Transmitir-se-á indiviso, por herança, devendo essa transmissão ser regulada em cada colónia pelo respectivo governador, tanto quanto possível de harmonia com os usos e costumes dos povos, mas sem excluir a correcção que lhes deve ser introduzida pela nossa concepção de família.
Não havendo herdeiros directos, reverterá à posse do Estado, que poderá atribuí-lo a outra família, em condições especiais a estabelecer.
Art. 8.º Na distribuição dos «casais de família» terão preferência:
1.º Os chefes de família entre vinte e cinco e quarenta anos que hajam prestado serviço militar, com bom comportamento;
2.º Os chefes de família, nas mesmas condições de idade, que tenham servido como trabalhadores contratados em grandes emprêsas agrícolas;
3.º Em igualdade de circunstâncias, os chefes de família que tenham maior número de filhos.
§ 1.º Nas aldeias terão preferência as famílias que mais se recomendem pela moralidade dos seus costumes.
§ 2.º A admissão das famílias nas aldeias será precedida de inspecção médica, que eliminará principalmente os portadores de doenças contagiosas.
Art. 9.º As «aldeias» devem ser estabelecidas em terrenos férteis e salubres, na proximidade de nascentes ou de correntes de água e à margem de vias de comunicação.
§ único. Os serviços médicos e de agricultura escolherão os locais onde se devem estabelecer as «aldeias». Os serviços de agrimensura faraó as necessárias demarcações.
Art. 10.º A chefia da «aldeia» caberá a um «principal», da escolha das autoridades administrativas, o qual gozará das regalias que pelos usos e costumes locais competirem aos chefes indígenas e terá as atribuições que a Reforma Administrativa Ultramarina aos mesmos confere. A direcção superior e a fiscalização das «aldeias» caberá às autoridades administrativas. Nas «aldeias» a direcção espiritual e económica deverá caber às missões católicas portuguesas.
Art. 11.º Para a fundação, desenvolvimento económico, evolução moral, sanidade e higiene das «aldeias» o Estado concederá o seguinte:

a) Alfaias agrícolas e sementes para os trabalhos dos primeiros anos;
b) Plantas de produção permanente para a formação dos quintais ou cercados;
c) Alimentação até à primeira colheita;
d) Dispensa do pagamento do imposto indígena no primeiro ano de instalação;
e) Socorros médicos e medicamentos;
f) Direcção de culturas, por um técnico agrícola;
g) Ensino primário elementar, por um professor auxiliar, de formação missionária, quando a distância das «aldeias» à sede das missões anais próximas impeça as crianças da frequência regular das suas escolas.
§ 1.º Deve constituir uma aspiração, a realizar sempre que seja possível, a formação, em cada «aldeia», duma maternidade-creche.
§ 2.º Os indígenas aldeados não poderão ser recrutados para trabalhos do Estado ou particulares durante os três primeiros anos da sua instalação.
§ 3.º Ficam os governadores das colónias autorizados a prolongar por mais dois anos a isenção referida na alínea d) do presente artigo sempre que ela se mostre necessária para facilitar o aldeamento previsto neste decreto.
Art. 12.º Será organizado o serviço sanitário por forma a garantir eficaz assistência médica às populações aldeadas.
§ único. O serviço sanitário terá também especialmente em vista a extinção ou neutralização das endemias destruidoras (varíola, doença do sono, etc.) e o combate às doenças venéreas, impaludismo e outras que atacam as populações indígenas.

Página 9

16 DE ABRIL DE 1941 244-(9)

Art. 13.º Nas emprêsas agrícolas a organização do trabalho deverá orientar-se pelo princípio de colonização das propriedades ou dos terrenos circunjacentes, efectuada por famílias indígenas, com sua casa e quintal reservado à sua vida própria.
Art. 14.º Os governadores das colónias regulamentarão o presente decreto, tendo em atenção os usos e costumes das várias populações indígenas e os interêsses especiais das respectivas colónias.
Publique-se e cumpra-se como nêle se contém.

Francisco José Vieira Machado.

Parecer sôbre o projecto de decreto relativo à organização social e económica
das populações indígenas

A Câmara Corporativa, pela secção de Política e economia coloniais, a que foram agregados os Procuradores António Vicente Ferreira, Francisco Gonçalves Velhinho Correia o Vasco Lopes Alves, emite o seguinte parecer sôbre o projecto de decreto respeitante, à organização social e económica das populações indígenas:

1. O projecto que se examina faz parte do conjunto de diplomas preparados pelo Ministério das Colónias e destinados a resolver alguns importantes problemas de administração colonial, entre os quais figura o da colonização europeia, já apreciado por esta Câmara.
Tanto o projecto de decreto relativo à colonização, como o projecto relativo à organização social e económica dos indígenas, versam a questão do povoamento das colónias, realizado, no primeiro caso, por europeus e no segundo por indígenas.

2. A colonização não se limita a fixar emigrantes nas terras ocupadas: tem um fim mais vasto e humano: a acção civilizadora exercida pela metrópole sôbre os povos mais atrasados.
Êste objectivo sobreleva mesmo o primeiro, como bem o reconheceram os portugueses séculos antes de êle aparecer explícito no artigo 22.º do Tratado de Versailles. No intuito de o atingir já o Estado Português promulgara a legislação citada no relatório que precede o projecto de decreto e pretende publicar agora o presente diploma, que se destina a proteger os indígenas, promovendo o seu aldeamento, porque a necessidade de o fazer, gerada pela própria colonização, se afigura imperiosa.

3. No tratamento dos. indígenas, a avita tendência latina impôs-nos a política de assimilação, seguida desde o início dos descobrimentos, a qual obedece não só aos princípios cristãos de humanidade, mas também aos patrióticos fins de encorporar os indígenas no organismo político, social e económico do Império.
Sempre se praticou também a política de associação, colaborando o Estado Português com as organizações sociais indígenas; e transformando-as. Ainda hoje em Angola restam vestígios desta política na região do Congo, onde houve o cuidado de adaptar a organização feudal europeia às sociedades indígenas.
Mas no século XIX fomos demasiadamente longe no caminho da assimilação até equiparar o europeu ao indígena nos direitos e obrigações fundamentais, quer de ordem pública quer de ordem privada. As realidades então impuseram-se e iniciou-se a revisão da nossa política nos últimos tempos da monarquia. Reconheceu-se a necessidade de atender na política indígena ao factor primordial psicológico das populações, variável de colónia para colónia e por vezes, na mesma colónia, de região para região; atendeu-se à colaboração da administração europeia local com os chefes indianas, verdadeiros conhecedores dos usos e costumes das populações; em fim, procurou-se assegurar os direitos naturais dos indígenas e, simultâneamente, promover o aperfeiçoamento das suas instituições dentro dos próprios quadros da sua organização tradicional.
Não se atribuíram aos indígenas os mesmos direitos que as instituições constitucionais da metrópole conferem aos cidadãos portugueses; não se submeteu a sua vida privada e pública aos códigos metropolitanos, mas deu-se-lhes a ordem social, política e administrativa compatível com o seu estado social presente.
Hoje em dia, com o Acto Colonial, a Carta Orgânica do império e o Estatuto Político, Civil e Criminal dos Indígenas, possuímos base segura de uma boa política indígena, a que dão notável refôrço o Código do Trabalho Indígena, o diploma orgânico das relações de direito privado entre indígenas e não indígenas e o Estatuto Orgânico das Missões Católicas Portuguesas.

4. Um passo mais se pretende dar com o presente diploma, destinado a remediar a desorganização dos quadros sociais indígenas, derivada da própria ocupação europeia.
Esta desorganização provém, em primeiro lugar, das campanhas de ocupação ou de pacificação, que enfraqueceram a autoridade dos chefes indígenas ou mesmo os suprimiram, e de várias outras causas, entre as quais avultam os contactos dos indígenas com os europeus e com a civilização europeia, principalmente por motivo do serviço militar, do trabalho em emprêsas agrícolas, mineiras e outras, e pela catequese religiosa. Os indivíduos que sofreram estas influências comportam-se, em regra, como desenraizados no seio das tribus de origem.
Também se devem incluir entre as causas da desorganização o modo como se fizeram as primitivas concessões de terrenos, sem reservas ou com reservas insuficientes, causando o êxodo e a dispersão das tribus indígenas, e o efeito das epidemias, como a varíola e a doença do sono, que dizimaram os habitantes, ermando extensas regiões.
Destas causas de desintegração resultou pulverizarem-se as sociedades indígenas, a ponto de existirem hoje centenas de régulos ou sobas sem prestígio nem tradições, nas vastas regiões dos nossos grandes domínios africanos.

5. Para obviar à situação criada pelos factores de desintegração citados no número anterior, pensaram alguns coloniais que convinha agrupar os indígenas em «aldeias», como outrora fizeram as missões religiosas no Brasil para a defesa dos índios, mas adaptado o aldeamento às circunstâncias presentes. De algumas experiências neste sentido tem a Câmara notícia.

Página 10

244-(10) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 104

A Companhia de Moçambique, por exemplo, mandou edificar uma povoação-granja, em Nhangoma, a uns 20 quilómetros da Beira, segundo o plano e as ideas do um seu distinto chefe de circunscrição. Até agora, pouco animadores foram os resultados obtidos, certamente por não se harmonizar o aldeamento com a psicologia dos indígenas, nem com esta se conformarem os princípios do trabalho colectivo ou seja do comunismo agrícola.
Sôbre esta experiência se pronunciou da seguinte forma o, ao tempo, director dos negócios indígenas do território da Companhia, tendo os factos posteriores confirmado a sua opinião:

«Não se procura fazer evolucionar os indígenas dentro dos próprios quadros da sua civilização rudimentar, nem integrá-los na vida da colónia, prolongamento da mãi-pátria, porque, tendo a organização social dos indígenas por base «a família» e sendo a maior parte das povoações indígenas do território constituídas por uma só família, com os seus descendentes ou parentes e com campos de cultura independentes para cada família, não é nada aconselhável que se vá substituir a sua vida individual doméstica e familiar pela comunista, levando-os como um rebanho de animais para cultivarem a terra colectivamente».

Se, pelo que fica dito, as lições da experiência aconselham a modificar algumas disposições do presente projecto de decreto, elas todavia não invalidam as vantagens do aldeamento, claramente postas em evidência no relatório do referido projecto.

6. Não é indiferente para a realização do aldeamento indígena o quadro actual das sociedades indígenas na respectiva colónia.
Os indígenas, excluindo evidentemente os assimilados, podem dividir-se em duas classes, conforme vivem ou não em regime tribal. Os primeiros são pouco propensos ao aldeamento, destacando-se de entre êles como os menos propensos os das tríbus nómadas. Os segundos, antigos soldados e serviçais ou indivíduos cristianizados e mussulmanizados (r. g. os da Guiné e do norte de Moçambique), que vivem nas povoações e arredores, são os mais aptos para o aldeamento. Sucede ainda nalgumas regiões ser o aldeamento contrariado pelo esfacelamento da organização social indígena.
Tal estado de cousas mostra de forma clara a necessidade de arrumar criteriosamente a organização administrativa gentílica.

7. Muito relacionado está o aldeamento dos indígenas com o importante problema da assistência.
A assistência moral e material aos indígenas, que é uma das características fundamentais da nossa política colonial, encontra-se há muito consignada em vários diplomas, e o Estatuto Político, Civil e Criminal dos Indígenas, aprovado pelo decreto n.º 16:473, de 6 de Fevereiro de 1929, expressamente diz no seu artigo 5.º que «os indígenas têm direito a protecção, assistência, educação e instrução por parte do Estado».
Como diploma que largamente trata da assistência aos indígenas, merece citar-se o Código do Trabalho dos Indígenas nas colónias portuguesas de África, aprovado pelo decreto n.º 16:199, de 6 de Dezembro de 1928. No referente à assistência social, estabelece êle, entre outros preceitos, a criação de creches para tratamento de crianças emquanto as mais estiverem no trabalho; a dispensa de trabalho concedida às mulheres por certo número de dias antes e depois do parto; o ensino obrigatório da língua portuguesa e o ensino profissional ministrados aos filhos dos trabalhadores; e a faculdade, mesmo o dever, de associação dos patrões com o fim de criarem organismos de previdência para garantia de pensões a trabalhadores inválidos ou às famílias dos mesmos. No tocante à assistência médica, define-a, estabelece a sua obrigatoriedade, e indica como organismos em que ela deve ser ministrada, segundo o número de trabalhadores a que se destina, os hospitais, as enfermarias e os postos sanitários de 1.ª e de 2.ª classe. E para que da assistência imposta não resultem encargos incomportáveis para os pequenos industriais e agricultores, toma o Estado para si parte do respectivo ónus.
Outro diploma que consigna importantes disposições sôbre assistência ao indígena é o Estatuto Orgânico das Missões Católicas Portuguesas, constante do decreto n.º 12:485, de 13 de Outubro de 1926. Define este Estatuto o programa geral das missões nacionais, no qual se contém expressamente a assistência social aos indígenas sob várias modalidades - espiritual, moral e de ensino (profissional, agro-pecuário e outros) - e a assistência sanitária, não só realizada pela acção domiciliária nas povoações, como feita de colaboração com as autoridades na extinção de epidemias.
Como se vê, é muito importante a assistência que, no cumprimento dêste e de outros diplomas, já hoje efectivamente disfruta uma grande parte da população indígena; mas urge ir mais longe e proporcionar a todos os indígenas a maneira de fruir a assistência a que o Estado lhes reconhece direito. O aldeamento que o presente diploma promove, grupando indígenas que vivem disseminados, estabelecendo aldeias na proximidade das vias de comunicação e garantindo a efectivação da assistência a todos os aldeados, representa um passo importantíssimo para conseguir aquele fim.

8. A orientação económica do projecto baseia-se no aproveitamento da vocação agrícola da maioria das tribus indígenas para obter o aumento da produção de géneros de consumo e de matérias primas necessários ao mercado europeu, sem perder de vista a melhoria das condições de vida dos indígenas e o desenvolvimento da colonização interna em cada colónia.
Nas regiões onde a natureza do clima não permito o estabelecimento da colonização rural europeia têm os governos coloniais procurado aperfeiçoar e orientar a vocação agrícola dos indígenas, com resultados notáveis, tomando como lema a conhecida fórmula «Para o indígena a produção, para o europeu a comercialização e industrialização», sistema que também favorece a colonização livre europeia.
A aplicação dêste sistema exige:
a) Leis de protecção ao indígena, e designadamente de garantia da propriedade do solo;
b) Organização de trabalhos de hidráulica agrícola e outros tendentes a aumentar a produção;
c) Vulgarização de conhecimentos agrícolas em granjas-escolas, onde se pratiquem novas culturas, criação de gado. etc., e educação, nos mesmos estabelecimentos, de chefes e monitores indígenas para fiscalizarem as culturas;
d) Direcção e fiscalização exercidas pelas autoridades administrativas, que devem, por um lado, incitar o indígena a cultivar determinadas áreas de terreno e, por outro, garantir preços razoáveis e mercados para os produtos obtidos.
As exigências indicadas, que não deixam de contribuir também para o bom êxito do aldeamento, acham-se todavia já contidas nos princípios insertos no Acto Colonial, na Carla Orgânica do Império, na Reforma Administrativa Ultramarina, nos preceitos relativos aos serviços agrícolas e pecuários e à cultura do algo-

Página 11

16 DE ABRIL DE 1941 244-(11)

dão e no recente diploma que organizou as juntas de exportação.

9. A doutrina do presente projecto de decreto merece, pois, de um modo geral, a concordância da Câmara Corporativa.
A Câmara deseja, porém, deixar neste lugar consignado que, sem embargo das modificações que adiante propõe, julga necessário, para se atingirem os fins em vista, que se verifiquem as condições essenciais a seguir indicadas:
1.º O aldeamento indígena, nas colónias em que é aplicável, deve fazer-se gradual e cautelosamente. Não é de esperar que indígenas criados em sanzalas ou libatas dispersas pelo sertão busquem espontâneamente a vida em aldeias ou que, uma vez aldeados, reconheçam logo as vantagens da sua nova situação. Urge começar por um local que para o efeito se torne mais recomendável, fazer hábil selecção das famílias e rodeá-las de toda a possível assistência até se habituarem à vida na aldeia e reconhecerem e apreciarem os seus benefícios.
O primeiro aldeamento que vingar numa determinada região facilitará o bom êxito dos que nela depois se tentarem.
O exemplo de progresso e confôrto, que der à restante população indígena o primeiro aldeamento que vingar, e a experiência que nele colher a autoridade administrativa sôbre a melhor assistência a prestar aos aldeados, hão-de facilitar o desenvolvimento progressivo desta política.
2.º Nas colónias de Moçambique e de Angola - nesta sobretudo -, onde existam regiões de colonização europeia, deve atender-se, antes de dar início ao aldeamento, à necessidade ulterior de estabelecer reservas indígenas e reservas para aquela colonização.
O princípio das «reservas» encontra-se já na legislação colonial; mas há que aplicá-lo com antecedência o com largueza nos lugares escolhidos para o aldeamento, não só para comodidade dos aldeados e simpatia dêstes pelo sistema, como para evitar as frequentes e desagradáveis questões que sempre resultam do intercalamento de casais europeus num aldeamento indígena.

10. A análise do projecto na especialidade põe em evidência, na opinião da Câmara, a necessidade de alguns esclarecimentos e modificações, que só enunciam e justificam nos números seguintes.

11. A doutrina dos artigos 1.º e 2.º do projecto não carece de justificação. Concorda a Câmara inteiramente com ela, só tendo a sugerir ligeiras modificações na sua redacção, como no final se verá.

12. O artigo 3.º do projecto, que atribue aos governos das colónias onde exista o indigenato o dever de agrupar as populações indígenas em aldeias, admite para o efeito duas espécies de aldeias: as constituídas principalmente por casais católicos portugueses e as formadas por famílias indígenas agrupadas, quanto possível, segundo as raças.
A Câmara julga de toda a conveniência o gradual agrupamento em aldeias dos casais católicos portugueses, como indica o artigo 3.º do projecto; mas, para os restantes indígenas, em vez de com todos êles formar aldeias gentílicas, segundo o preceituado no referido artigo, julga preferível distinguir as famílias cujo contacto com a civilização europeia as tenha afastado da vida tribal, reunindo-as em aldeias, e as restantes famílias indígenas, que formam a grande massa
da população gentílica, para as quais só entende oportuna a melhoria das condições em que os respectivos povoados se encontram.
Trata-se, como se vê, de separar três classes de indígenas muito distintas, cada uma das quais reclama tratamento diferente como a seguir se justifica:
1.º Os católicos devem evidentemente ter aldeia separada de todos os que o não sejam; não precisa, portanto, ser largamente justificada a constituição das aldeias que lhes são destinadas. Os parentes e os amigos dos aldeados que lá não puderam instalar-se por não serem católicos, se tiverem vontade de junto dêles residir, encontrarão nesse facto mais um incentivo para se converterem ao catolicismo.
2.º As famílias cujo contacto com a civilização europeia as afastou da vida tribal, constituídas por indígenas e mestiços assimilados a indígenas, desagregados dos grupos sociais de que provêm e não sujeitos à tutela de patrões europeus ou de instituições sociais de qualquer natureza, são elementos aptos a ser aldeados, mas não ficariam bem nos aldeamentos de católicos e não se sujeitariam a isso nem a ser incluídos num agrupamento gentílico de cujo viver há muito se afastaram.
3.º A generalidade da população gentílica, pelo atraso em que se encontra, esquivar-se-á naturalmente à vida em comum com qualquer das duas classes de indígenas referidas e oferecerá séria resistência ao aldeamento imediato, se êste lhe fôr imposto; mas pode e deve prestar-se a ir auferindo o proveito da melhoria dos tipos de construção e das condições de higiene e de desenvolvimento das suas povoações, que hábil e gradualmente lhe forem insinuando, até reconhecer espontâneamente a conveniência de se aldear, a exemplo das famílias dos dois outros grupos.

13. Julga também a Câmara que a matéria do artigo 9.º do projecto, ligeiramente modificada a redacção, tem melhor cabimento num parágrafo do artigo 3.º Quanto ao § único do dito artigo 9.º, bem ficará a doutrina do seu primeiro período naquele mesmo parágrafo do artigo 3.º; a do segundo e último período está contida no § 2.º do mesmo artigo.
Cabe ainda, num § 3.º do referido artigo 3.º, incluir preceito que marque o modo por que o aldeamento deve pôr-se em execução em qualquer colónia, que é o indicado pela Câmara na parte final do n.º 9 dêste parecer, como necessário para o empreendimento ser coroado de êxito.

14. Deixando a matéria do artigo 4.º do projecto para ser tratada juntamente com a do artigo 12.º, entra-se na apreciação do artigo 5.º
O artigo 5.º começa por estabelecer como base de formação da aldeia o «casal de família», e seguidamente marca, ao quintal que faz parte do casal, a área de 2 a 4 hectares para cultura de árvores de fruta e outros géneros alimentares e, ao terreno reservado para pascigo de gado e cultura de géneros destinados a alimentação e a venda, a área mínima de 5 a 10 hectares por família.
Estando já na metrópole o «casal de família» subordinado a regras de direito que não podem aplicar-se ao casal de família do projecto, parece conveniente mudar-se a designação deste, sugerindo a Câmara a de «casal de família indígena», ou simplesmente «casal indígena».
Quanto às áreas atribuídas aos quintais e às terras para pascigo e culturas, apesar dos largos limites entre os quais podem variar, nada assegura que dentro delas se contenham as dimensões convenientes para as variadíssimas circunstâncias regionais de clima, de qualidade do terreno, de fertilidade do solo, de géneros que

Página 12

244-(12) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 104

mais convenha cultivar, do valor que no local estes possam ter, etc. Parece mais conveniente que, em vez de limites largos e iguais para todas as regiões de todas as colónias, se marquem limites próximos, ou dimensões fixas, para cada região de cada colónia. E, como todo o aldeamento tem de ser precedido da determinação das culturas e das áreas que, na região, cada família deve cultivar, entende a Câmara que se deve atribuir aos governos coloniais a faculdade de fixarem tanto a área de cada quintal e de cada talhão privado para culturas, como a área de terreno destinada a logradouro comum para pascigo de gado, e que esta faculdade fique consignada no artigo 4.º do diploma a publicar pelo govêrno da metrópole.
No mesmo artigo 4.º se preceituará que a área do terreno do logradouro comum será demarcada logo que se decida a formação da aldeia respectiva e que as áreas dos quintais e dos talhões para cultura se demarcarão à medida que se ocuparem.

15. O primeiro período do artigo 6.º do projecto de decreto limita-se a dizer que no terreno reservado fora do «casal indígena» devem ser praticadas culturas alimentares para uso indígena e para venda, parecendo por isso à Câmara preferível que tal idea fique consignada no § 1.º do artigo 4.º, que àquele terreno se refere.
Prescreve depois o mesmo artigo que se aplique aos moradores da aldeia o regime de trabalho colectivo, e que o produto se destine, em primeiro lugar, ao pagamento do imposto indígena devido pela aldeia, sendo o remanescente, parte distribuído pelas famílias aldeadas, parte empregado na constituição de um fundo de fomento e reserva destinado, entre outros fins, a socorros em períodos de crise e a amparo de viúvas e velhos necessitados. A imposição do trabalho colectivo nas aldeias não parece à Câmara de adoptar, já pelos inconvenientes reconhecidos em tal regime de trabalho, já por estar isso em contradição com o disposto no artigo 3.º do Estatuto Político, Civil e Criminal dos Indígenas, o qual garante a todo o indígena a liberdade do seu trabalho, e com o disposto no artigo 4.º do Código do Trabalho dos Indígenas, onde se diz que o Govêrno da República assegura aos indígenas das suas colónias plena liberdade de escolherem o trabalho que melhor lhes convier, quer de conta própria, quer por contrato para serviço de outrem, se assim o preferirem. E, para ocorrer às despesas com os serviços de assistência e de previdência em benefício dos aldeados, a cujo custeio o projecto destina parte do produto do trabalho colectivo, sugere a Câmara a inscrição anual, nos orçamentos coloniais, das verbas para tal fim necessárias, disposição que em outro artigo será incluída.

16. Sôbre a doutrina do artigo 7.º, que ficará a constituir o novo artigo 5.º, nada se oferece à Câmara objectar, propondo simplesmente ligeiras modificações de redacção e a supressão do período final, por desnecessário.

17. Também de perfeito acordo com a doutrina do artigo 8.º, não tem a Câmara a propor-lhe senão ligeiras alterações de redacção nos seus dois parágrafos: no § 1.º para o tornar mais explícito e no § 2.º para atender a uma circunstância importante não prevista no projecto, que é a de os componentes de uma família não constituírem elementos de trabalho suficientes para a sua manutenção, caso êste em que evidentemente não lhe deve ser distribuído casal. Passará êste artigo a ser o novo artigo 6.º

18. A doutrina do artigo 9.º do projecto não deve constituir um artigo especial, por se achar já incluída nos parágrafos dos artigos 3.º e 4.º sugeridos pela Câmara.

19. O artigo 10.º do projecto atribue às missões católicas portuguesas a direcção espiritual e económica das aldeias. No que respeita à direcção económica das aldeias, a Câmara julga inconveniente entregá-la às missões, por ser duvidoso que estas a tal incumbência se prestem e porque se devem prever atritos com as autoridades administrativas.
A Câmara considera preferível que a direcção e fiscalização das aldeias caibam inteiramente às autoridades administrativas, e para as missões religiosas fique a orientação espiritual e a colaboração com a autoridade administrativa na orientação económica.
Também, em vez de se atribuir a chefia da aldeia a um «principal», como o mesmo artigo 10.º estabelece, considera preferível escolher para ela um «indivíduo competente», pois que a qualidade essencial do chefe é a competência para o cargo.
Em vez de dar a todos os chefes de aldeia as atribuições que a Reforma Administrativa ultramarina confere aos chefes indígenas, melhor parece que se confiram a cada um os deveres e atribuições que, pelo governador respectivo forem estabelecidos segundo o estado social das populações, devendo prever-se também, como medida educativa, a constituição de juntas administrativas eleitas, pelos moradores, quando o número e o grau de civilização dêstes o permitir, presidida cada uma delas pelo respectivo chefe de aldeia.

20. Os artigos 4.º, 11.º e 12.º do projecto de decreto referem-se, o primeiro, a formas de assistência aos aldeados e a outras providências julgadas pelo Govêrno necessárias para garantir a consecução dos fins que o decreto se propõe atingir; o segundo, a concessões que o Estado fará para a fundação, desenvolvimento económico, evolução moral e sanidade das aldeias; e o terceiro, especialmente à assistência médica. A Câmara parece mais conveniente modificar a distribuição da matéria pelos três artigos, definindo-se no primeiro - o novo artigo 8.º - o serviço de assistência que o Estado garante aos aldeados e o modo de regular a distribuição do respectivo encargo pelos serviços públicos e pelas missões religiosas patrocinadas pelo Estado, mencionando-se no segundo - o futuro artigo 9.º- os auxílios materiais gratuitos que o Estado prestará aos aldeados, e definindo-se no terceiro - o futuro artigo 10.º- a forma de ocorrer às despesas correspondentes aos auxílios e modalidades de assistência indicados nos dois artigos anteriores.

21. A respeito do novo artigo 8.º formula a Câmara as seguintes observações:

a) Reúnem-se no novo artigo os preceitos referentes à assistência sanitária, que no projecto se encontram dispersos, e precisa-se que essa assistência compreenderá socorros médicos e medicamentos a toda a população da aldeia, e a instalação de um pôsto sanitário ou enfermaria em condições análogas às que, para os trabalhadores, estabelece o Código do Trabalho dos Indígenas;
b) A maternidade-creche é obrigatòriamente criada, em vez de constituir aspiração, como se diz no § 1.º do artigo 11.º do projecto;
c) Em vez de o Estado conceder um técnico agrícola para a direcção de culturas, como prescreve a alínea f) do artigo 11.º do projecto, inclue, por melhor parecer, entre as formas de assistência aos aldeados a «orientação agro-pecuária, dada por um técnico agrícola»;

Página 13

16 DE ABRIL DE 1941 244-(13)

d) A menção do ensino primário elementar é a que se encontra, com igual redacção, no artigo 11.º do projecto, que trata das concessões feitas pelo Estado à aldeia:
e) Para completar a matéria do novo artigo 8.º adicionam-se a êste dois parágrafos: o § 1.º, para declarar que se deixa aos governos das colónias o encargo de regularem, de acôrdo com as missões, a forma como os serviços de assistência ficarão distribuídos entre elas e os serviços públicos, pois que, nas colónias, melhor e mais fàcilmente do que na metrópole se poderá encontrar a solução conveniente das dificuldades que surgirem ; o § 2.º, para dispensar pelo período de um ano, a contar da data da instalação de uma aldeia, mas prorrogável até três, o pagamento do imposto indígena e proibir, no mesmo período, o recrutamento para trabalhos do Estado ou para serviços de particulares. Esta providência, além de incitar ao aldeamento, justifica-se inteiramente pelas necessidades dos trabalhos de instalação, não remuneradores, e pela menor produção das terras nos primeiros anos de cultura.
No novo artigo 9.º devem, no parecer da Câmara, inscrever-se os auxílios materiais gratuitos indicados nas alíneas a), b) e c) do artigo 11.º do projecto e deve consignar-se que nos orçamentos coloniais se inscreverão anualmente as verbas necessárias para o custeio dos encargos mencionados tanto neste artigo como no anterior. Rejeitando-se o regime de trabalho colectivo para os aldeados, desaparece a possibilidade de aproveitar a parte do seu produto, que o artigo 6.º do projecto destinava a Fundo de fomento e reserva e, como fraco poderá ser o montante de multas e outras receitas que os governos coloniais estabeleçam em favor dos aldeamentos, indispensável se torna garantir pelas receitas ordinárias da colónia o custeio dos encargos.

22. O artigo 13.º do projecto prescreve que «nas emprêsas agrícolas a organização do trabalho deverá orientar-se pelo princípio de colonização das propriedades ou do terreno circunjacentes, efectuada por famílias indígenas com a sua casa e quintal reservado à sua vida própria». A Câmara concorda com a idea fundamental contida no enunciado; mas julga que a conveniência de fixar famílias indígenas na vizinhança do local do trabalho tanto existe para as emprêsas agrícolas como para as emprêsas pecuárias, mineiras ou industriais, devendo portanto alargar-se a todas elas o mesmo preceito.
Simultâneamente com o referido caso, julga a Câmara que haveria vantagem em considerar outro não menos importante, que é o da criação de bairros indígena junto dos centros urbanos, de evidente interêsse para estes e para cuja realização justo é que, no todo ou em parte, contribuam as respectivas municipalidades.

23. Trata o artigo 14.º, último do projecto de decreto, da regulamentação dêste. Concorda a Câmara com a sua doutrina, nenhuma alteração tendo a propor à respectiva redacção.

24. Justificadas, como ficam, nos números anteriores as modificações que esta Câmara julga conveniente introduzir no projecto de decreto cuja análise concluiu, e se destinam a aperfeiçoar a doutrina nêle exposta, adaptá-la melhor às conveniências da administração das colónias e facilitar a sua aplicação sem perturbar a boa harmonia tradicional entre os indígenas e as autoridades portuguesas, a Câmara Corporativa é de parecer que convém publicar, dando-lhe a redacção seguinte, o projecto de decreto relativo à

Organização social e económica das populações indígenas

Artigo 1.º Constituo dever fundamental dos governos coloniais promover o melhoramento progressivo da organização social e económica das populações indígenas, tornando cada vez mais eficaz a assistência moral e material que lhes é prestada pelo Estado.
Art. 2.º A organização das populações indígenas deve assentar essencialmente:
a) Na constituição e defesa da família;
b) Na constituição e defesa da propriedade;
c) Na formação de agrupamentos sociais-económicos, dentro da uniformidade dos usos e das crenças.
Art. 3.º Compete aos governos das colónias onde exista o indigenato e a dispersão populacional dificulte a assistência promover o gradual agrupamento dos indígenas, procurando:
a) Formar aldeias com casais educados nas missões religiosas patrocinadas pelo Estado;
b) Formar aldeias com outros indígenas cujo contacto com a civilização europeia os tenha afastado da vida tribal;
c) Melhorar as condições de construção e higiene das povoações gentílicas existentes, sem prejuízo da organização tradicional nas tríbus a que pertençam, por forma a preparar progressivamente os seus habitantes para poderem, no futuro, ser aldeados nos moldes dêste diploma.
§ 1.º As aldeias devem, ser estabelecidas para um mínimo de vinte famílias, em terrenos salubres e férteis escolhidos pelos serviços médicos e de agricultura, tanto quanto possível na proximidade de nascentes ou correntes de água, e devem ficar ligadas às vias de comunicação.
§ 2.º A área ocupada por cada aldeia e pelo espaço necessário ao seu natural desenvolvimento constituirá reserva especial devidamente demarcada.
§ 3.º O aldeamento de indígenas será inicialmente executado nos pontos que para isso mais se recomendem e a sua extensão a outros locais será feita à medida que a experiência e o êxito das realizações forem permitindo suprir as deficiências dos primeiros trabalhos e convencendo o próprio indígena das vantagens da sua adopção.
Art. 4.º A base da formação das aldeias é o «casal indígena», constituído por uma casa de habitação gentílica, de construção higiénica, e um quintal, com cercado e instalação própria para aves e animais domésticos, em que serão plantadas árvores frutíferas e praticadas principalmente culturas de horta.
§ 1.º Junto de cada aldeia, além da área para o seu natural desenvolvimento, deve reservar-se outra área, destinada parte a logradouro comum para pascigo de gado e parte a talhões privados de cada casal para cultura de géneros destinados a alimentação e a venda.
§ 2.º Tanto a área de cada quintal e de cada talhão privado como a área de terreno destinada a logradouro comum da aldeia para pascigo de gado serão em cada região fixadas pelo respectivo govêrno colonial, de acôrdo com as necessidades e condições locais. A última destas áreas será demarcada logo que seja resolvida a formação da aldeia indígena e as duas primeiras à medida que a ocupação se fôr fazendo.
Art. 5.º O casal indígena não poderá ser alienado nem por qualquer forma onerado e transmitir-se-á indiviso por herança. As disposições referentes à posse e transmissão serão reguladas, em cada colónia, pelo respectivo governador, quando possível em harmonia com

Página 14

244-(14) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 104

os usos e costumes dos povos, sem todavia excluir a correcção que nestes convenha introduzir pela nossa concepção de família.
Art. 6.º Na distribuição dos casais indígenas terão preferência:
a) Os chefes de família entre vinte e cinco e quarenta, anos que hajam prestado serviço militar com bom comportamento;
b) Os chefes de família nas mesmas condições de idade que tenham servido como trabalhadores contratados em grandes emprêsas agrícolas;
c) Em igualdade de circunstâncias, os chefes de família que tenham maior número de filhos.
§ 1.º Além do que estabelece o corpo dêste artigo, atender-se-á sempre, em primeiro lugar, na admissão de famílias nas aldeias àquelas que mais se recomendam pela moralidade dos seus costumes.
§ 2.º A admissão nas aldeias será precedida de inspecção médica, que eliminará os portadores de doenças contagiosas e as famílias cujos componentes não constituam elementos de trabalho bastantes para a sua manutenção.
Art. 7.º A direcção e a fiscalização das aldeias caberá às autoridades administrativas, que darão às missões religiosas patrocinadas pelo Estado todo o apoio para que assumam a sua orientação espiritual e com elas colaborem na orientação económica.
§ 1.º A chefia de cada aldeia será dada a indivíduo competente, escolhido pela -autoridade administrativa, com os deveres e atribuições que, em cada colónia, lhe forem conferidos, de acôrdo com o estado social das populações.
§ 2.º Quando o número e o grau de civilização dos moradores das aldeias o permitirem, poderão constituir-se juntas administrativas eleitas, presididas pelos chefes respectivos.
Art. 8.º As aldeias serão dotadas dum serviço de assistência sanitária, social, técnica e espiritual -integrado no regime de assistência geral e protecção dos indígenas -, que compreenderá, designadamente:
a) Socorros médicos e medicamentos a toda a população da aldeia, com instalação de um pôsto sanitário ou enfermaria nas condições em que para os trabalhadores dispõe o Código do Trabalho dos Indígenas;
b) Instalação de uma maternidade-creche para tratamento de filhos dos indígenas aldeados, desde que o seu número seja superior a vinte;
c) Orientação agro-pecuária dada por um técnico agrícola;
d) Ensino primário elementar por professor auxiliar, de formação missionária, quando a distância da aldeia à sede da missão mais próxima impeça as crianças da frequência regular das suas escolas.
§ 1.º Será regulada em cada colónia a forma como hão-de cooperar nesse serviço de assistência os serviços públicos e as missões religiosas patrocinadas pelo Estado.
§ 2.º No primeiro ano de instalação das aldeias os seus moradores serão dispensados de pagamento de imposto indígena e não poderão ser recrutados para trabalhos do Estado, regalias estas que duas vezes poderão ser prorrogadas por mais um ano. Também neste período e suas prorrogações não poderá ser feito recrutamento nas aldeias para serviço de particulares.
Art. 9.º Para a fundação e o desenvolvimento económico das aldeias contribuirá o Estado com os seguintes auxílios gratuitos:
a) Alfaias agrícolas e sementes para os trabalhos dos primeiros anos;
b) Arvores e plantas para cultura dos quintais;
c) Alimentação até à primeira colheita.
Art. 10.º Para ocorrer às despesas com os auxílios constantes dos dois artigos anteriores serão inscritas anualmente nos orçamentos coloniais as verbas necessárias.
Art. 11.º Além do disposto no artigo 3.º, compete ainda aos governos coloniais:
a) Criar bairros indígenas junto dos centros urbanos, a expensas ou com o concurso das municipalidades respectivas;
b) Promover que o recrutamento da mão de obra nas emprêsas mineiras, industriais, agrícolas e pecuárias se oriente no sentido da colonização das propriedades, ou terrenos circunjacentes, com famílias indígenas dispondo de casas e quintal para a sua vida privada.
Art. 12.º Os governadores das colónias regulamentarão o presente decreto, tendo em atenção os usos e costumes das várias populações indígenas e as circunstâncias especiais da respectiva colónia.

Palácio de S. Bento, 21 de Fevereiro de 1941.

Eduardo Augusto Marques.
António Vicente Ferreira.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Vasco Lopes Alves.
João Baptista de Almeida Arez, relator.

Parecer relativo ao projecto de lei n.º 133, sôbre condicionamento da actividade dos engenheiros e outros técnicos estrangeiros em Portugal

1. A Câmara Corporativa, pelas suas secções de Política e administração geral, de Ciências e letras e de Obras públicas e comunicações, ouvidas as secções de Minas, pedreiras e águas minerais, de Indústrias metalúrgicas e químicas, de Indústrias têxteis, de Electricidade e combustíveis e de Construção e materiais de construção, emite o seguinte parecer sobre o projecto de lei n.º 133, relativo ao condicionamento da actividade dos engenheiros e outros técnicos estrangeiros em Portugal, apresentado à Assemblea Nacional, na sua sessão de 25 de Janeiro último, pelos ilustres Deputados Srs. Augusto Cancela de Abreu e Francisco Leite Pinto.

I

Apreciação na generalidade

Já numa das sessões da Assemblea Nacional realizadas em 1939, ao discutir-se o projecto de lei n.º 34, destinado a regular o exercício da profissão médica por estrangeiros, que se converteu nu lei n.º 1:976, de 10 de Abril de 1939, os ilustres Deputados Sr. Augusto Pires de Lima e Augusto Cancela de Abreu mostraram a analogia de fundamentos que justificaria a aplicação, em princípio, da doutrina dêsse projecto a outras profissões liberais, especialmente à dos engenheiros, o que sòmente por circunstâncias de momento não se fez.

Página 15

16 DE ABRIL DE 1941 244-(15)

Também pouco antes, na sessão de 24 de Janeiro de 1939, os mesmos ilustres Deputados autores do projecto de lei sôbre que versa o presente parecer chamaram a atenção do Govêrno para a necessidade de serem definidas as condições da admissão e da actividade dos técnicos estrangeiros em emprêsas nacionais ou estrangeiras estabelecidas em Portugal, com ou sem permanência, especialmente nas concessionárias de empreitadas do Estado, dos corpos administrativos e dos serviços autónomos, o que já tinha sido pedido pela Ordem dos Engenheiros em representação dirigida ao Sr. Ministro das Obras Públicas e Comunicações.
Por mais de uma vez tem, pois, sido posta em foco, como necessitando de urgente remédio, a situação dos engenheiros e de outros técnicos portugueses perante as condições em que, até agora, têm podido exercer a sua profissão em Portugal os seus concorrentes estrangeiros.
Na realidade, não pode ser posta em dúvida a oportunidade do projecto de lei n.º 133, o qual, no fundo, não visa - assim como a lei já promulgada para os médicos - senão a estabelecer princípios e a regular a sua aplicação de acôrdo com o preceito fundamental do decreto-lei n.º 22:827, de 14 de Julho de 1933, assim redigido: «as emprêsas, sociedades ou firmas industriais ou comerciais, singulares ou colectivas, nacionais ou estrangeiras, que exerçam a sua actividade em qualquer parte do território continental, só podem ter ao seu serviço empregados de nacionalidade portuguesa ...», mas sem deixar de abranger os engenheiros e outros técnicos que exercem a sua profissão por conta própria, que aquele preceito não compreende.

2. Apresenta-se já com aspectos pouco animadores o exercício da profissão de engenheiro, sobretudo na especialidade de engenharia civil, pois é considerável o número de diplomados pelas nossas escolas que, ao acabarem os cursos e ao pretenderem iniciar a carreira, encontram as maiores dificuldades em obter colocação, apesar dos porfiados esforços empregados nesse sentido e da solicitação de auxílio à Ordem dos Engenheiros, que, junto dos poderes públicos, por várias vezes tem solicitado providências que atenuem semelhante situação.
Pelo exame do número de engenheiros formados pulas nossas duas escolas superiores de engenharia - o Instituto Superior Técnico e a Faculdade de Engenharia da Universidade do Pôrto - nos dez anos decorridos de 1930 a 1939, verifica-se que, nos dois respectivos quinquénios, as médias anuais foram:

Quinquénio de 1930-1934

Engenharia civil ................ 21,2
Engenharia electrotécnica ....... 10,8
Engenharia mecânica ............. 3,4
Engenharia de minas ............. 3,0
Engenharia químico-industrial ... 2,2

Média geral ............ 40.2

Quinquénio de 1935-1939

Engenharia civil ................ 43,0
Engenharia electrotécnica ....... 13,0
Engenharia mecânica ............. 3,6
Engenharia de minas ............. 1,2
Engenharia químico-industrial ... 1,8

Média geral ............... 62,6

Como se vê, a média geral anual aumentou, no total das especialidades, de um para outro quinquénio, em pouco mais de 50 por cento; e, por especialidades, ao passo que na engenharia civil subiu de 21,2 para 43 - isto é, aumentou de 100 por cento -, conservou-se aproximadamente estacionária nas engenharias mecânica e químico-industrial, teve aumento de 20 por cento na engenharia electrotécnica e deminuição de 60 por cento na de minas.
São, pois, os engenheiros civis os que, entre os diplomados pelas nossas escolas superiores de engenharia, constituem o grupo em que a produção mais se tem acentuado, a ponto de ter duplicado de um quinquénio para o outro; e os factos parecem mostrar que essa produção excede a actual capacidade de absorção do meio em que os ditos engenheiros se destinam a exercer a sua actividade - ou, pelo menos, que em breve prazo assim poderá suceder, se a tempo não forem tomadas providências -, apesar do inegável desenvolvimento que, nos últimos anos, tem sido dado aos trabalhos de fomento e de ressurgimento económico e financeiro, quer no continente, quer nas colónias.
E, já que foi feita referência às colónias, não deixará de observar a Câmara Corporativa que muito é para sentir não serem mais amplos os seus quadros técnicos, em harmonia com a vastidão dos respectivos territórios e com as suas possibilidades de desenvolvimento, e, ainda, que melhores condições materiais não sejam oferecidas aos engenheiros, estimulando-lhes o desejo de servir no nosso vasto Império ultramarino, onde tam necessários são e onde, quer no meio oficial quer no particular, tam largo campo lhes é oferecido para exercerem a sua actividade profissional.
Com relação às outras especialidades - minas, mecânica, electrotécnica e químico-industrial -, apresenta-se o problema em muito menos desfavoráveis condições, pois, ao passo que, no período considerado e por quinquénios, a formação de novos engenheiros se manteve, em média anual, estacionária nas especialidades de engenharia mecânica e químico-industrial, e deminuíu mesmo de 60 por cento na de minas, apenas há a registar aumento de 20 por cento na de engenharia electrotécnica.

3. Quer, porém, com relação aos engenheiros civis, quer com relação aos destas últimas especialidades, plenamente se justifica, que sejam tomadas medidas para defesa dos engenheiros portugueses, pois se, quanto àqueles, há a contrapor o seu já elevado número à menor tendência para o chamamento de técnicos estrangeiros, quanto a estes - isto é, quanto aos diplomados das outras especialidades - tal tendência é manifesta por parte de certos meios industriais. E esta tendência pode, dentro em pouco, originar, a êsses diplomados, uma situação análoga à já verificada no domínio da engenharia civil, o que é tanto mais para recear quanto é certo que as condições actuais da Europa podem determinar, como já têm determinado, amplos movimentos migratórios, nos quais figuram numerosos elementos que, nos seus países, exerciam profissões liberais e que, portanto, procurarão, como é natural, obter os necessários meios de vida pela continuação do exercício das suas profissões.
A adopção das solicitadas providências, longe de ser apenas manifestação do são nacionalismo que o Estado Novo preconiza, ou concretização da idea exagerada de que os países podem bastar-se a si próprios económica e cientìficamente, e, ainda menos, expressão do desejo de, por princípio, dificultar a vida dos estrangeiros em Portugal, representa antes, e principalmente, a convicção de que é indispensável, emquanto é tempo, impedir que engenheiros e outros técnicos estrangeiros venham tornar difícil, e até por vezes angustiosa, a vida dos seus colegas portugueses, provocando verdadeiras crises de trabalho dentro das respectivas profissões. Bastam os nossos males e dificuldades internas

Página 16

244-(16) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 104

para que não possamos, de ânimo leve, admitir que êles nos venham ainda de fora sem, ao menos, procurarmos reduzi-los o mais possível.
Trata-se de verdadeira medida de defesa do trabalho nacional, portanto do interêsse nacional.
Como vimos, há no País, nos diversos ramos da engenharia, e particularmente na especialidade de engenharia civil, número bastante de engenheiros para satisfazer as necessidades, e êsses engenheiros são, afora alguns, poucos, casos especiais, suficientemente habilitados e competentes para não se admitir a liberdade de concorrência de técnicos estrangeiros.
Como muito bem disse o ilustre Deputado Sr. Dr. Alçada Guimarãis durante a discussão do projecto de lei do condicionamento do exercício da medicina em Portugal por médicos estrangeiros: «O projecto suscita, no fundo, o problema do reconhecimento de direitos aos estrangeiros que o § único do artigo 7.º da Constituição e o artigo 26.º do Código Civil fazem assentar no sistema da igualdade. É êste um princípio aceite na generalidade das legislações, mas, embora claramente consignado na nossa Constituição, não significa que ao Estado seja vedado cercear ou limitar, na medida conveniente, os direitos dêle emergentes. O que há é que respeitar um mínimo de direitos aos estrangeiros, o suficiente para conservar a sua qualidade de pessoas fora do Estado a que pertencem e para que possam exercer livremente a sua actividade como homens civilizados».
Além disto, a doutrina que assegura apenas aos nacionais dos diversas países o exercício das profissões liberais foi prevista no projecto da Comissão Económica da Sociedade das Nações de 1938, e está assegurada, entre outras, na Constituição brasileira, que sòmente permite o exercício das profissões liberais aos brasileiros natos e aos naturalizados que ali tenham prestado serviço militar (artigo 133.º), nas leis do Estado de Nova York de 1923 e 1926, nas leis francesas de 26 de Julho de 1935 e 17 de Junho de 1938 que garantem o exercício da medicina apenas aos respectivos nacionais, e, ainda, na nossa lei n.º 1:976 sôbre o exercício da medicina.
Os técnicos portugueses que fizeram os seus cursos em escolas estrangeiras ou que, tendo-os feito em escolas nacionais, pretenderam trabalhar em país estrangeiro conhecem bem as dificuldades que muitas vezes ali encontraram para o conseguir.
Por todas estas considerações fica demonstrado justificar-se plenamente a medida que faz objecto do presente projecto de lei.

4. Mas, se apenas aos nacionais deve ser assegurado o exercício das profissões liberais, casos há - uns de natureza especulativa, outros de natureza prática - que plenamente justificam a permissão do exercício da profissão a engenheiros estrangeiros, a bem da ciência, do ensino, da indústria, ou de determinados trabalhos de construção, e isto sem desdouro para os engenheiros portugueses, que os há dos mais sabedores e competentes. Simplesmente, porém, a mais intensa especialização escolar e post-escolar, o mais vasto campo de acção, o mais íntimo contacto com as fontes do progresso técnico, fazem com que, em determinadas circunstâncias, engenheiros estrangeiros devam ser considerados vantajosos e óptimos colaboradores, principalmente no campo industrial, onde, por exemplo, não é difícil suceder que um engenheiro português de certa especialidade não seja, no entanto, suficientemente especializado em alguns dos seus pormenores ou aspectos técnicos, pormenores ou aspectos que podem ter capital importância para determinada indústria.
Impõe-se, pois, a necessidade de considerar celtas restrições na aplicação do princípio basilar em que êste projecto de lei assenta.

5. Seja, porém, dito de passagem que a doutrina preconizada só parcialmente resolve o problema da situação dos engenheiros. Emquanto não estiver devidamente regulamentado o exercício da profissão, não raramente continuará a suceder que, em vários ramos da engenharia, funções da competência exclusiva dos engenheiros sejam exercidas por indivíduos, tanto nacionais como estrangeiros, que o não são.

6. Ocorre preguntar se não conviria tornar extensiva às colónias a doutrina do projecto. Se as colónias constituem com a metrópole, segundo a Constituição e o Acto Colonial, num todo indivisível, a unidade nacional perfeita e completa, parece razoável responder afirmativamente a semelhante pregunta. No entanto, são tam pronunciadas as diferenças de meio, desenvolvimento, cultura, condições de vida e recursos entre a metrópole e, pelo menos, uma parte importante dos nossos domínios ultramarinos, que, embora pareça aconselhável a aplicação às colónias da doutrina do projecto de lei - pois não há razão para que no ultramar não se procure defender o trabalho dos engenheiros e outros técnicos portugueses da concorrência dos estrangeiros, tanto mais que, nas regiões em formação, mais se faz sentir a intromissão de actividades internacionais atraídas pelas maiores possibilidades que aí julgam encontrar -, demanda essa aplicação aturado estudo e cuidadoso conhecimento das condições locais, tam diferentes de colónia para colónia e até, em certos casos, de uns para outros pontos da mesma colónia.
Por estas considerações e, ainda, porque colónias estrangeiras, vizinhas das nossas, têm adoptado medidas rigorosas tendentes a defender os seus técnicos nacionais, a Câmara Corporativa limita-se a assinalar a importância do problema e a fazer votos por que, em breve, o seu estudo seja eficazmente empreendido pelo Ministério das Colónias.

7. As razões alegadas para justificar as medidas de protecção aos engenheiros igualmente procedem para os arquitectos, pois é fora de dúvida havê-los em Portugal em quantidade bastante para as necessidades do País e suficientemente aptos e competentes para resolverem, em regra, os problemas de ordem arquitectural postos pelo Estado ou pelos particulares, como bem o atesta a obra por êles realizada em todo Portugal e nas colónias durante os últimos anos.
Dêste modo, o projecto de lei n.º 133 deveria antes ser designado de «condicionamento da actividade dos engenheiros, arquitectos e outros técnicos estrangeiros em Portugal», devendo notar-se, porém, que o têrmo «engenheiros» abrange não apenas os correspondentes às especialidades dos engenheiros portugueses que, em harmonia com o respectivo Estatuto, se achem inscritas na Ordem dos Engenheiros, mas todos aqueles engenheiros estrangeiros que possam vir concorrer com os cidadãos portugueses que, pelo decreto n.º 11:988, de 29 de Julho de 1926, têm direito a usar o título de engenheiro, entre os quais se contam também os engenheiros geógrafos, agrónomos, silvicultores e hidrógrafos.
Por estas considerações, a Câmara Corporativa emite parecer favorável ao projecto de lei n.º 133, considerado na generalidade.

Página 17

16 DE ABRIL DE 1941 244-(17)

II

Apreciação na especialidade

8. Quanto ao corpo do artigo 1.º, nada mais é necessário acrescentar ao que fica dito para mostrar o inteiro acôrdo desta Câmara. Também ela não vê inconveniente na doutrina do seu § 1.º, pelo qual é conservado o direito ao exercício da profissão às mulheres que, sendo portuguesas de origem, tenham perdido a sua nacionalidade pelo casamento, desde, porém, que tal direito lhes seja apenas reconhecido emquanto estiverem domiciliadas em Portugal.
Já o mesmo não sucede com o § 2.º, relativamente ao qual esta Câmara, insistindo no seu modo de ver, mantém o que expôs no parecer sôbre o projecto de lei n.º 34, que regulava o exercício da profissão médica por estrangeiros, e que a seguir se transcreve:

O artigo 2.º do projecto preceitua que os estrangeiros nacionalizados portugueses sòmente poderão ser equiparados aos indivíduos nacionais, para efeitos do exercício da profissão de médico, decorridos que sejam dez anos a partir da respectiva naturalização.
Nos termos dêste artigo, os médicos estrangeiros que quisessem exercer a profissão médica em Portugal somente poderiam fazê-lo depois de aprovados no respectivo exame de habilitação perante qualquer das Faculdades de Medicina e decorridos que fôssem dez anos a partir da sua naturalização. Ora como a naturalização sòmente pode ser concedida, normalmente, no fim de três anos de residência, o médico estrangeiro que pretendesse exercer a sua profissão em Portugal apenas poderia fazê-lo no fim de treze anos.
Depois de tam longo período não interessaria, por certo, ao médico estrangeiro o exercício da sua profissão.
Além de que não se justifica que portugueses, originários ou naturalizados, sejam inibidos do trabalho necessário para angariar os seus meios de subsistência.
Nem a medicina, que é uma profissão liberal, tem qualquer analogia com os serviços do Estado, regidos por preceitos muito especiais.
Por estas considerações a Câmara Corporativa não emite parecer favorável à doutrina do artigo 2.º do projecto.

Não pensa diversamente a Câmara Corporativa sôbre o § 2.º do artigo 1.º do projecto de lei n.º 133.
Se, porém, a Assemblea Nacional se conservar fiel à orientação de fixar o prazo de dez anos, ou outro, entende esta Câmara que o § único do artigo 1.º do projecto que ela sugere deve converter-se em § 1.º, e que o § 2.º do projecto n.º 133 deve ser redigido nos seguintes termos:

§ 2.º Os engenheiros já naturalizados portugueses, que, à data da entrada em vigor desta lei, não estejam legalmente habilitados a exercer a profissão em Portugal, ou os engenheiros estrangeiros que, depois da mesma data, vierem a pedir a naturalização, só poderão exercê-la decorridos dez anos sôbre a data da dita naturalização.

Esta redacção não daria lugar a errada interpretação de que um engenheiro naturalizado há menos de dez anos, e com exercício da profissão, fôsse forçado a interromper êsse exercício depois da lei publicada e a aguardar o têrmo dos ditos dez anos, e atingiria o objectivo, que a Assemblea Nacional parece haver tido em vista, de evitar que os estrangeiros se aproveitassem da naturalização a fim de poderem exercer a profissão em Portugal.
Ainda na hipótese de a Assemblea Nacional manter o prazo de dez anos, ou outro, entende também esta Câmara que deveriam ser especialmente considerados os indivíduos nascidos em Portugal, filhos de pais estrangeiros e que, tendo optado pela nacionalidade dêstes, fizeram todo o curso em escolas de engenharia portuguesas. Seria razoável e justo que, se êles declarassem querer ser portugueses, fÔssem dispensados do prazo de espera, a partir da data da naturalização, pura poderem exercer a profissão.

9. Sôbre o artigo 2.º do projecto, que constitue correcção dos inconvenientes que, certamente, adviriam da aplicação integral do artigo 1.º, concorda esta Câmara, de modo geral, com a sua doutrina; mas, além da referência expressa aos arquitectos e de redacção diversa, sugere quatro aditamentos correspondentes a outros tantos casos que muito interessam à indústria:
a) Ao n.º 1.º do artigo 2.º devem aditar-se as seguintes palavras: «ou de técnica industrial», de maneira que os engenheiros e arquitectos estrangeiros possam ser autorizados a prestar serviços da sua profissão em Portugal, na instalação de laboratórios e nos respectivos trabalhos de investigação técnica industrial exigida pelos progressos de certas indústrias;
b) Ao n.º 4.º do artigo 2.º, além de ligeira modificação de forma, deve aditar-se o seguinte: «ou, na direcção superior de serviços técnicos, a emprêsas ou sociedades estrangeiras que a exerçam com carácter permanente, se, na respectiva indústria, empregarem capitais importantes».
Parece justo conceder às emprêsas ou sociedades estrangeiras que, na indústria que exploram no País, empregarem capitais importantes a faculdade de colocar na direcção superior de serviços técnicos pessoa da sua confiança, que pode ser estrangeira.
Devem ainda aditar-se ao artigo 2.º os n.ºs 5.º e 6.º, assim redigidos:
c) «5.º Prestação de serviços a emprêsas ou sociedades portuguesas provenientes da transformação de emprêsas ou sociedades estrangeiras, desde que se mostre justificada a permanência dos engenheiros ou arquitectos que nelas prestavam serviço antes da referida transformação».
d) «6.º Prestação, pelo prazo de um ano, que poderá ser prorrogado, de serviços na instalação de quaisquer maquinismos ou aparelhos, quando os engenheiros ou arquitectos forem indicados pelas emprêsas fornecedoras».
Não é necessário fazer a justificação destes dois aditamentos - tanto êles se impõem. O do n.º 5.º pode ser mesmo conditio sine qua nom da transformação das emprêsas ou sociedades estrangeiras em emprêsas ou sociedades nacionais - o que muito interessa à economia do País. O do n.º 6.º pode representar condição importante para as emprêsas fornecedoras obterem o necessário rendimento da sua técnica na instalação de fábricas, máquinas ou outros aparelhos, ou na sua afinação.
São também de fácil justificação as modificações introduzidas na doutrina do § único e suas alíneas do artigo 2.º relativamente às condições em que deve ser dada a autorização do Govêrno.
Na alínea a) deve substituir-se «Ministro da Educação Nacional» por «Ministros respectivos», visto que a serviços dependentes de diversos Ministérios compete tratar dos assuntos a que se refere o n.º 1.º E também se justifica que, feita a já referida alteração no corpo do artigo 2.º, se acrescentem à alínea a) as palavras; «ou o Sindicato Nacional dos Arquitectos».

Página 18

244-(18) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 104

Na alínea b) convém modificar a expressão: «ouvidas as escolas superiores de engenharia», por esta outra: «ouvidas segundo os casos, as escolas superiores de engenharia ou as Escolas de Belas Artes e a Ordem dos Engenheiros ou o Sindicato Nacional dos Arquitectos».
Se é inegável que as escolas superiores de engenharia ou as Escolas de Belas Artes são as mais competentes para conhecerem as Conveniências do ensino, também é certo que a Ordem dos Engenheiros ou o Sindicato Nacional dos Arquitectos são os organismos mais competentes para saber se, entre os seus membros, algum existe que, porventura, reúna as condições necessárias para corresponder aos requisitos que as ditas escolas fixem em harmonia com as conveniências do ensino de que elas, na realidade, são juizes.
Na alínea c) deve substituir-se a redacção do projecto por esta outra: «Quanto aos n.ºs 3.º, 4.º e 5.º, pelo Sub-Secretário de Estado das Corporações e Previdência Social, consultados os Ministros respectivos e ouvidos a Ordem dos Engenheiros ou o Sindicato Nacional dos Arquitectos». Não são necessárias novas considerações para justificar este aditamento. Além de que, o presente projecto de lei abrange também os engenheiros estrangeiros concorrentes de colegas portugueses que não podem ser inscritos na Ordem dos Engenheiros, mas que, pelo decreto n.º 11:988, têm direito ao uso do título, como, por exemplo, os engenheiros agrónomos, silvicultores e geógrafos.
De evidência é o aditamento sob a alínea d): «Quanto ao n.º 6.º, pelo Sub-Secretário de Estado das Corporações e Previdência Social, consultados os Ministros respectivos e ouvida a Ordem dos Engenheiros».
No corpo do artigo 2.º sugere a Câmara Corporativa modificação que, neste passo do parecer, facilmente se compreende: se nalgum ou nalguns dos casos seguintes» em vez de «nos casos seguintes».
Na verdade, convém esclarecer que não há razão para um engenheiro ou arquitecto estrangeiro, autorizado a trabalhar em Portugal com fundamento num dos números do artigo 2.º, não poder ser autorizado a trabalhar com fundamento noutro ou noutros números do mesmo artigo.
Ainda a Câmara Corporativa sugere a conversão do § único do artigo 2.º em § 1.º e o aditamento ao artigo 2.º do seguinte § 2.º: «A especialização dos engenheiros ou arquitectos estrangeiros será sempre devidamente comprovada». Êste preceito destina-se a evitar possíveis abusos. Como se pode verificar, êste parágrafo encerra, embora simplificada, a doutrina do artigo 3.º no projecto. Parece à Câmara Corporativa que não se deve fazer qualquer referência à prova de serem os engenheiros ou arquitectos estrangeiros da especial confiança das emprêsas ou sociedades estrangeiras. O simples, pedido de autorização que elas fizeram denuncia a confiança que os engenheiros ou arquitectos lhes merecem.

10. Estabelece o artigo 4.º do projecto o princípio de que a admissão de cada engenheiro estrangeiro, ao abrigo dos n.ºs 3.º e 4.º do artigo 2.º, seja condicionada pela admissão simultânea de um engenheiro português, que com êle colaborará como seu adjunto.
Sugere a Câmara Corporativa a conversão do artigo 4.º do projecto no artigo 3.º, assim redigido:

As emprêsas que tiverem ao seu serviço engenheiros ou arquitectos estrangeiros, nos termos do artigo 2.º, serão obrigadas:
1.º No caso do n.º 3.º, a receber, sem encargo para elas, como estagiários ou como bolseiros, engenheiros ou arquitectos portugueses que o Estado
designe para especialização no respectivo ramo técnico;
2.º No caso da segunda parte, do n.º 4.º, a admitir um engenheiro ou arquitecto português, por elas remunerado, que será o adjunto ou assistente do director de serviços técnicos e seu substituto.

Parece à Câmara Corporativa que, na hipótese do n.º 3.º do artigo 2.º, não era justo que, por não haver engenheiros, ou arquitectos portugueses especializados em determinado ramo técnico - facto êsse por que não são responsáveis as emprêsas que fazem pedidos de autorização a favor de estrangeiros -, elas fôssem obrigadas a admitir por sua conta, simultâneamente, engenheiros ou arquitectos portugueses a fim de, como adjuntos dos engenheiros ou arquitectos estrangeiros, com êles se especializarem; mas como, na verdade, há vantagem em se conseguir êste objectivo, parece defensável impor às referidas emprêsas a obrigação de, sem encargo para elas, receberem engenheiros ou arquitectos portugueses designados pelo Estado como estagiários ou como bolseiros.
Mais parece à Câmara Corporativa que, na hipótese do n.º 4.º do artigo 2.º, visto haver conveniência para o País em animar o estabelecimento em Portugal de emprêsas ou sociedades estrangeiras que no País empreguem importantes capitais, elas devem ser autorizadas a ter, na direcção superior de serviços técnicos, pessoas da sua confiança, embora de nacionalidade estrangeira, com a obrigação, porém, de, em troca de tal vantagem, colocarem junto de cada uma dessas pessoas, como seu adjunto ou assistente, e substituto, um engenheiro ou arquitecto português, cuja remuneração ficará a cargo das ditas emprêsas ou sociedades.

11. Diz o artigo 3.º do projecto que «os engenheiros estrangeiros que actualmente exercem a sua profissão em Portugal podem continuar a exercê-la desde que estejam legalmente habilitados», se satisfizerem certas formalidades junto da polícia de vigilância e defesa do Estado.
O artigo 5.º, assim redigido, permitiria a qualquer engenheiro estrangeiro nas condições citadas, isto é, legalmente habilitado, continuar a exercer a profissão em Portugal por tempo indefinido.
Sugere a Câmara Corporativa a conversão do artigo 5.º em artigo 4.º, redigido nos termos seguintes:

Os engenheiros ou arquitectos estrangeiros que, à data da entrada em vigor desta lei, estejam autorizados a exercer a sua profissão em Portugal, quer com carácter permanente quer com carácter temporário, poderão, no primeiro caso, continuar a exercê-la e, no segundo, completar os trabalhos que tiverem sido autorizados a executar.

Impõe-se a justiça deste preceito. E é desnecessário fazer referência a formalidades junto da polícia de vigilância e defesa do Estado por constarem de diploma que obriga a todos os estrangeiros.

12. Parece à Câmara Corporativa que o artigo 6.º do projecto (artigo 5.º do projecto sugerido por esta Câmara) deve ficar redigido nos termos seguintes:

Os estudantes estrangeiros inscritos no presente ano lectivo nas escolas portuguesas de engenharia, no curso de arquitectura das Escolas de Belas Artes, ou no curso preparatório das Faculdades de Ciências para admissão nas primeiras daquelas escolas, podem, obtidos os seus diplomas, exercer os respectivas profissões.

Página 19

16 DE ABRIL DE 1941 244-(19)

13. O artigo 7.º do projecto n.º 133 (artigo 6.º do projecto que esta Câmara sugere) deve ser redigido nos termos seguintes:

Os engenheiros e arquitectos estrangeiros, autorizados a exercer a profissão em Portugal, não poderão exercê-la antes de os seus diplomas serem registados, respectivamente, na Ordem rios Engenheiros ou no Sindicato Nacional dos Arquitectos, e sem estarem nestes devidamente inscritos.
§ único. Exceptuam-se os engenheiros a que se refere o n.º 6.º do artigo 2.º

Sucede, por vezes, que prestam serviço temporário em Portugal, na instalação de fábricas ou na montagem e afinação de máquinas ou outros aparelhos, engenheiros estrangeiros que são diplomados, mas não por escolas equivalentes às de engenharia portuguesas. Não podem, portanto, ser registados os seus diplomas. Mas, como êsses engenheiros prestam apenas serviço temporário, de justiça é que êles possam exercer um Portugal a sua profissão independentemente do registo dos diplomas.
Fica essa doutrina consignada no § único do artigo 6.º do projecto sugerido pela Câmara Corporativa.
Parece ainda a esta Câmara que, sendo a Ordem dos Engenheiros o organismo corporativo em que se centraliza a acção fiscalizadora da actividade dos engenheiros, a defesa do seu título e a observância das condições legais para o exercício da profissão, deve pertencer a ela, e não à Secretaria Geral do Ministério das Obras Públicas e Comunicações, o registo dos diplomas a que se refere o artigo 7.º do projecto, bem como o registo dos diplomas dos engenheiros portugueses formados por escolas estrangeiras equivalentes às escolas superiores de engenharia portuguesas. Daí a redacção do artigo 6.º do projecto que sugere.

14. Quanto ao artigo 8.º e § único do projecto, cuja doutrina é análoga à que consta da lei n.º 1:976, relativa ao exercício da medicina por estrangeiros, entende a Câmara Corporativa, visto serem muito diferentes as condições do exercício das respectivas profissões, que êle deve ser redigido como segue:

A infracção do disposto no artigo 2.º e seus parágrafos será punida com a pena de prisão correccional até dois anos e multa correspondente, e a do disposto no artigo 6.º com prisão correccional até três meses e multa correspondente.
A reincidência será punida com a pena de expulsão do País.

Êste artigo é o n.º 7.º do projecto sugerido pela Câmara Corporativa.

15. Aparte modificação de técnica, o artigo 8.º do projecto sugerido por esta Câmara corresponde ao artigo 9.º do projecto n.º 133.
Parece, também à Câmara Corporativa que o artigo 10.º do projecto n.º 133 deve ser eliminado. As penalidades a que se refere, êste artigo constam de diplomas que obrigam todos os estrangeiros.

16. Sugere esta Câmara a eliminação do artigo 11.º e seus parágrafos do projecto n.º 133, não só por ser bastante indefinida a expressão «técnicos estrangeiros de categoria inferior à de engenheiros», não se sabendo bem até onde ela se aplica, como também porque, relativamente a tais categorias, não se verifica, em geral, necessidade de admissão daqueles técnicos; como a inserção de novo artigo, o 9.º, que se refere aos engenheiros estrangeiros que, pela especialidade a que se dedicam, podem ser concorrentes dos engenheiros portugueses a quem o decreto n.º 11:988 dá direito ao uso do título, mas que, de acôrdo com o Estatuto da Ordem dos Engenheiros, aprova do pelo decreto-lei n.º 27:288, nela não se achem inscritos. Êsse artigo deve ser redigido nos seguintes termos:

Os estrangeiros habilitados com as especialidades correspondentes aos cursos que, nos termos do decreto n.º 11:988, de 29 de Julho de 1926, atribuem aos respectivos diplomados o título de engenheiro, não os qualificando todavia para a inscrição na Ordem dos Engenheiros por determinação do respectivo Estatuto, podem exercer em Portugal a sua profissão em todos os casos referidos no artigo 2.º
§ único. A autorização, para exercício da profissão em Portugal, aos engenheiros a que se refere o corpo dêste artigo, fica sujeita às disposições aplicáveis da presente lei, substituindo-se a Ordem dos Engenheiros pelo Sindicato Nacional da respectiva especialidade.

17. Parece a esta Câmara que o artigo 12.º do projecto n.º 133 deve ser substituído pelo n.º 10.º do projecto que sugere, redigido nos termos seguintes:

A fiscalização do cumprimento desta lei compete às autoridades administrativas, aos agentes da fiscalização do trabalho e aos agentes da polícia de vigilância e defesa do Estado, que procederão às necessárias investigações e remeterão os respectivos autos ao juízo criminal competente.

18. O artigo 12.º do projecto sugerido por esta Câmara corresponde textualmente ao artigo 13.º do projecto n.º 133.

19. Entende ainda a Câmara Corporativa que seja inserto um novo artigo (n 11.º), assim redigido:

O disposto no artigo 6.º aplica-se igualmente aos engenheiros ou arquitectos portugueses que tenham feito os seus cursos em escolas estrangeiras de categoria considerada equivalente à das respectivas escolas nacionais.

Por todas estas considerações, parece à Câmara Corporativa que o projecto de lei n.º 133 deve ser substituído pelo seguinte:

Artigo 1.º A profissão de engenheiro ou de arquitecto só pode ser exercida em Portugal, respectivamente, por engenheiros ou por arquitectos de nacionalidade portuguesa.
§ único. Conservam, porém, o direito ao exercício da profissão, emquanto estiverem domiciliadas em Portugal, as mulheres que perderem a nacionalidade pelo casamento.
Art. 2.º Os engenheiros e arquitectos estrangeiros podem ser autorizados a prestar serviços da sua profissão em Portugal nalgum ou nalguns dos casos seguintes:
1.º Necessidades de investigação científica ou de técnica industrial;
2.º Conveniências do ensino;
3.º Falta, devidamente comprovada, de engenheiros ou de arquitectos portugueses especializados em determinado ramo técnico;

Página 20

244-(20) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 104

4.º Prestação de serviços a emprêsas ou sociedades estrangeiras que exerçam temporàriamente a sua actividade no País, ou, na direcção superior de serviços técnicos, a emprêsas ou sociedades estrangeiras que a exerçam com carácter permanente, se na respectiva indústria empregarem capitais importantes;
5.º Prestação de serviços a empresas ou sociedades portuguesas provenientes da transformação de emprêsas ou sociedades estrangeiras, desde que se mostre justificada a permanência dos engenheiros ou arquitectos que nelas prestavam serviços antes da referida transformação;
6.º Prestação, pelo prazo de um ano, que poderá ser prorrogado, de serviços na instalação de quaisquer maquinismos ou aparelhos, quando os engenheiros ou arquitectos forem indicados pelas emprêsas fornecedoras.
§ 1.º A autorização compete ao Grovêrno:
a) Quanto ao n.º 1.º, pelos Ministros respectivos, ouvidos o Instituto para a Alta Cultura e a Ordem dos Engenheiros ou o Sindicato Nacional dos Arquitectos;
b) Quanto ao n.º 2.º, pelo Ministro da Educação Nacional, ouvidas, segundo os casos, as escolas superiores de engenharia ou as Escolas de Belas Artes e a Ordem dos Engenheiros ou o Sindicato Nacional dos Arquitectos;
c) Quanto aos n.ºs 3.º , 4.º e 5.º, pelo Sub-Secretário de Estado das Corporações e Previdência Social, consultados os Ministros respectivos e ouvidos a Ordem dos Engenheiros ou o Sindicato Nacional dos Arquitectos;
d) Quanto ao n.º 6.º, pelo Sub-Secretário de Estado das Corporações e Previdência Social, consultados os Ministros respectivos e ouvida a Ordem dos Engenheiros.
§ 2.º A especialização dos engenheiros ou arquitectos estrangeiros será sempre devidamente comprovada.
Art. 3.º As emprêsas que tiverem ao seu serviço engenheiros ou arquitectos estrangeiros, nos termos do artigo 2.º, serão obrigadas:
1.º No caso do n.º 3.º, a receber, sem encargo para elas, como estagiários ou como bolseiros, engenheiros ou arquitectos portugueses que o Estado designe para especialização no respectivo ramo técnico;
2.º No caso da segunda parte do n.º 4.º, a admitir um engenheiro ou arquitecto português, por elas remunerado, que será o adjunto ou assistente do director de serviços técnicos e seu substituto.
Art. 4.º Os engenheiros ou arquitectos estrangeiros que, à data da entrada em vigor desta lei, estejam autorizados a exercer a sua profissão em Portugal, quer com carácter permanente quer com carácter temporário, poderão, no primeiro caso, continuar a exercê-la e, no segundo, completar os trabalhos que tiverem sido autorizados a executar.
Art. 5.º Os estudantes estrangeiros inscritos no presente ano lectivo nas escolas portuguesas de engenharia, no curso de arquitectura das Escolas de Belas Artes, ou no curso preparatório das Facilidades de Ciências para admissão nas primeiras daquelas escolas, podem, obtidos os seus diplomas, exercer as respectivas profissões.
Art. 6.º Os engenheiros e arquitectos estrangeiros, autorizados a exercer a profissão em Portugal, não poderão exercê-la antes de os seus diplomas serem registados, respectivamente, na Ordem dos Engenheiros ou no Sindicato Nacional dos Arquitectos e sem estarem nestes devidamente inscritos.
§ único. Exceptuam-se os engenheiros a que se refere o n.º 6.º do artigo 2.º
Art. 7.º A infracção do disposto no artigo 2.º e seus parágrafos será punida com a pena de prisão correccional até dois anos e multa, correspondente, e a do disposto no artigo 6.º com prisão correccional até três meses e multa correspondente.
A reincidência será punida com a pena de expulsão do País.
Art. 8.º A infracção do disposto no artigo 3.º importará o cancelamento da autorização concedida aos engenheiros ou arquitectos estrangeiros.
Art. 9.º Os estrangeiros habilitados com as especialidades correspondentes aos cursos que, nos termos do decreto n.º 11:988, de 29 de Julho de 1926, atribuem aos respectivos diplomados o título de engenheiro, não os qualificando todavia para a inscrição na Ordem de Engenheiros por determinação do respectivo Estatuto podem exercer em Portugal a sua profissão em todos os casos referidos no artigo 2.º
§ único. A autorização, para exercício da profissão em Portugal, aos engenheiros a que se refere e corpo dêste artigo, fica sujeita às disposições aplicável da presente lei, substituindo-se a Ordem dos Engenheiros pelo Sindicato Nacional da respectiva especialidade.
Art. 10.º A fiscalização do cumprimento desta [...] compete às autoridades administrativas, aos agentes da fiscalização do trabalho e aos agentes da polícia, de vigilância e defesa do Estado, que procederão às necessárias investigações e remeterão os respectivos autos ao juízo criminal competente.
Art. 11.º O disposto no artigo 6.º aplica-se igual mente aos engenheiros ou arquitectos portugueses que tenham feito os seus cursos em escolas estrangeiras de categoria considerada equivalente à das respectivas escolas nacionais.
Art. 12.º As disposições desta lei não prejudicam as cláusulas de reciprocidade ajustadas ou que venham a ajustar-se entre Portugal e qualquer outro país.
Art. 13.º Fica revogado o artigo 14.º do decreto n.º 11:988, de 29 de Julho de 1926.

Lisboa, Sala das Sessões da Secção de Obras Públicas e Comunicações da Câmara Corporativa, 21 de Fevereiro de 1941.

Domingos Fezas Vital.
Abel Pereira de Andrade.
José Gabriel Pinto Coelho.
Gustavo Cordeiro Ramos.
João Serras e Silva.
Avelino Soares.
José Coeiro da Mota.
Júlio Dantas.
António Vicente Ferreira.
António dos Santos Viegas.
Manuel Moreira de Sá e Melo.
Francisco Augusto Ramos Coelho e Sá relator.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×