110 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 171
Do bom ou num uso que deles se fará depende a sua utilidade, a justiça devida àqueles que para a sua formação contribuem.
Os fundos devem ser, por isso, destinados a corrigir desvios agudos de momento, não a manter posições artificiais para além da realidade.
Ninguém desconhece as perturbações que a guerra trouxe ao Mundo e que nós, mesmo dentro da nossa posição de neutrais, não deixámos de sentir. A guerra passou, passaram as perturbações mais graves, mas não acabaram as suas consequências. Simplesmente, há tanto tempo duram que temos de considerar que se estabeleceu como normal a anormalidade delas derivada.
Não me parece contudo que seja desde já possível abandonar o princípio da intervenção do Estado. Simplesmente há que modificá-lo na sua incidência para novos conceitos. Toca a noção das realidades.
Não o ter feito há muito, ter ficado amarrado ao princípio que ditou a finalidade da intervenção no início desta, o ter querido manter através de tudo uma situação artificial sobro o que tinha passado a definitivo, a preocupação do preço baixo e não o mais baixo possível dentro da realidade, muito deve ter custado à nossa economia geral, devo ser a razão de muitas das dificuldades presentes.
Muito lhe sacrificámos do benefício da nossa situação financeira, a ele sacrificámos quase todos os fundos que tínhamos acumulado, para a correcção das dificuldades que eram de esperar finda a guerra, e, creio poder afirmar, por ele fizemos um grande saque sobre o nosso futuro.
Outra conclusão não posso tirar da impossibilidade que todos sentimos para a continuação pelo Estado da acção contínua a que nos habituáramos, do poder tributário do País reconhecidamente esgotado, da enorme dívida do Fundo de Abastecimento.
Vivemos pràticamente da riqueza que havia e não da que criámos.
E ao focar agora esta situação não me sinto no papel de fácil crítico perante os resultados a que chegámos. Constato sim, e com desgosto, a inutilidade de muito passo dado, do muito tempo perdido em acção que foi inútil.
Não mo parecem também descabidas aqui estas considerações.
Elas servem para demonstrar que não andaremos francamente para um futuro melhor se nos continuarmos a alhear do resultado económico da exploração. Se continuarmos a ter o ódio ao lucro e não simplesmente a tê-lo ao exagerado lucro.
Não haverá possibilidade de êxito para um plano de fomento se estas realidades não forem tomadas na justa consideração. O reconhecê-lo é fundamental para que a agricultura, como as outras actividades, possa prosperar, para o resultado útil do que vamos fazer.
Com as considerações que acabo de apresentar quis examinar perante V. Ex.ª, Sr. Presidente, cada uma daquelas condições que são indispensáveis para que a agricultura, podendo cumprir a sua missão, possa trazer um aumento de riqueza que, chegando a todos, contribua de facto para o enriquecimento do rendimento nacional e, por ele, a subida do nível de vida em termos de realidade que todos desejamos.
Trouxe perante V. Ex.ª uma visão diferente da que geralmente é apresentada, trouxe-a a partir da periferia para o centro, bem sabendo, contudo, que a visão certa estará naquele ponto em que a apreciação de cima o a de baixo se confundam e justaponham. Contribuir para que se atinja osso ponto é a minha intenção. Trouxe ainda perante V. Ex.ª a noção de algumas falhas, pelas quais se escapam muitas das nossas economias, pelas quais se invalidam os resultados do Plano de Fomento.
As obras de hidráulica agrícola são indispensáveis para se poder avançar para um futuro melhor. Não descansemos, contudo, só na sua execução.
O nosso poder de investimento é pequeno, temos por isso que dele tirar o rendimento total. Eu não enfileiro ao lado dos que as receiam, na possibilidade de trazerem a saturação de alguns produtos; o que penso é que é indispensável estudar o que vamos produzir, o que necessitamos, as condições em que o podemos fazer.
Nós não podemos partir do conceito de que o poder de compra actual ditará as condições económicas do futuro. Temos de pensar que é necessário aumentá-lo para que se não limite ao poder de pagamento do que ó indispensável à vida. Temos de elevá-lo dessa situação para a de não só atingir a de possibilidade da compra do necessário mas até do supérfluo. Só nessa posição teremos atingido um nível de vida para que temos de tender.
Assim, só lamento não ser possível elevar para mais alto nível o nosso investimento em obras de hidráulica agrícola.
Antes de entrar na apreciação das verbas destinadas à colonização interna e repovoamento florestal desejo ainda focar um ponto.
O fazê-lo parece-me indipensável para se julgar da verdade das considerações que fiz, e ainda como necessário para o esclarecimento do caminho para o futuro.
Pela observação do campo, das vilas e aldeias, tenho de tirar a conclusão de que estão certas as considerações postas. Isto é, que não criámos riqueza e que não há uma subida de nível de vida, pelo menos na base do nosso edifício económico. Pela observação da vida das cidades pode-se tirar a conclusão de que de facto houve uma subida apreciável. Daí a necessidade, portanto, de esclarecer se se trata de um nível de vida real ou fictício, se derivado da movimentação da riqueza criada ou se do desgaste da que tínhamos.
A simples observação do que temos à vista e sentimos pode levar a uma conclusão precipitada e injusta, convindo por isso observar o problema em maior profundidade.
Temos, por um lado, como primeiro campo de observação:
O rendimento nacional não acompanhando o desenvolvimento demográfico da população;
A nossa fraca renda individual;
O limite tributário do País, pràticamente atingido;
A dificuldade de emprego das novas camadas da população;
A necessidade de um plano de fomento, pequeno para as necessidades que sentimos e para o qual se têm de movimentar verbas que a outras formas de capitação ou emprego seriam destinadas.
Pode aqui haver erro ou falta de inteira consideração de todos os dados.
Vejamos o que a observação do arrumo da população nas várias actividades nos poderá trazer como esclarecimento:
O primeiro campo fácil de estudos foi-me facultado pelo brilhante trabalho apresentado no último Congresso da União Nacional, sob o título «Para uma política económica», pelos Srs. Engenheiros Camilo Lemos de Mendonça, Augusto Alberto Henriques e Francisco Cruz Rodrigues.
As suas conclusões em faço do estudo dos censos da população, desde o de 1890 ao de 1940, e relacionados estes com o índice do produtividade e na sua comparação com a situação dos outros países, não podem deixar do nos abrir todo um panorama de dificuldades a vencer, não podem deixar de pôr perante os nossos olhos mais uma razão para a dúvida do real aumento do nível de vida. Tão grave considero a situação, tra-