1342 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 167
A organização corporativa não pode, nem por comodidade, ser veículo para a realização da política económica e social do Estado. O que deve é ser elemento de primordial valia para a definição dessa política.
Daqui o não se entender que esteja em causa a existência dos organismos actualmente designados por «de coordenação económicas». Ou, melhor, não se entende que tenha de estar em causa a sua permanência ou duração por motivo de se instituírem as corporações.
Na medida em que estas se estruturem é exacto que para elas devem passar certas funções de carácter corporativo que até agora, e na sua missão de elementos a orgânica pré-corporativa, a esses organismos estavam confiadas. E é ainda correcto que, enquanto necessário e na fase incipiente das corporações, esses mesmos organismos hajam de exercer o encargo de efectuar a ligação entre o Estado e as corporações.
O Sr. Mário de Figueiredo: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Com todo o gosto.
O Sr. Mário de Figueiredo: - Na alínea b) da base IV da proposta diz-se, não só que as corporações proporão ao Governo, mas também que das corporações poderão emanar regimes normativos, com o assentimento do Governo. Estamos, portanto, em presença de regimes normativos emanados das próprias corporações com assentimento do Governo. Quem os executa?
O Orador: - V. Ex.º, na sua pergunta, parte da premissa de que eu esteja de acordo com o que está escrito nessa base da proposta do Governo. Mas não estou.
Só nestes aspectos se entende que a estruturação das corporações interfira com a sua vida. Mas interfere apenas na absorção de uma limitada zona da sua competência actual e deixa livre aquela outra em que os organismos mencionados se apresentam como instrumentos da intervenção do Estado na vida económica.
Se a estes deve ficar a competência para «coordenar e regular superiormente a vida económica e social», afigura-se, no seguimento do que já se referiu, que ao Estado devam pertencer os apropriados instrumentos executivos, com estrutura e maleabilidade adequadas, e cuja duração, permanência ou extinção deverá ser consequência da própria necessidade, durabilidade ou dispensabilidade da intervenção.
Mas isso é problema diferenciado deste outro da estruturação corporativa.
Ligá-lo, neste sentido, à instituição das corporações seria erro que levaria a admitir a hipótese, que importa arredar desde já, de aquelas se transformarem - ou também serem - em órgãos da intervenção estatal no domínio económico. Seria confundir perigosamente problemas e seria comprometer a característica eminentemente representativa e estruturadora de uma organização que visa fins diversos e situados noutro plano. Seria, em síntese, sacrificar a própria capacidade de a representação orgânica vir a projectar-se no panorama político nacional.
Contra este risco foram já ditas palavras judiciosas quando se afirmou: «O socialismo trouxe-mos a concepção materialista da história, vendo na essência da evolução das sociedades sòmente os interesses económicos na sua acepção mais positiva e independente da superioridade do espírito.
Esta ideia tem o perigo de influenciar aqueles mesmos que, reagindo contra os desmandos liberais e socialistas, defendem o Estado corporativo. A tendência seria assim, porventura, só para a disciplina da produção, pela existência de corporações económicas, e estas mesmas sem grandes preocupações de outra índole. Não é este o nosso pensamento.
Na organização das corporações económicas deve ter-se em vista que os interesses por elas prosseguidos, ou, melhor, os interesses da produção, têm de subordinar-se, não só aos da economia .nacional no seu conjunto, mas também à finalidade espiritual ou destino superior da Nação e dos indivíduos que a constituem». (Salazar, 26 de Maio de 1934).
É a defesa desta característica vincada das corporações que terá de ser acautelada por todas as formas
- na sua estrutura e na sua vida -, sem o que serão conduzidas ao fracasso na sua autenticidade representativa, na sua independência de acção e na realização dos objectivos superiores, a que as queremos ver dirigidas.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Se é de lamentar que não se possa desde já obter a integração total mas corporações da representação das actividades dispersas pelas províncias ultramarinas, teremos de considerar, com especial preocupação, a conveniência de não conduzir a orgânica a instituir para terrenos que mais afastem ainda a viabilidade de atingirmos um dia esse fim.
Com efeito, como refere expressamente a Câmara Corporativa no seu parecer, ca organização corporativa ultramarina é ainda mais do que incipiente. Seguro, também, que o problema da representação, neste caso particular, se antevê difícil, porque o factor distância lhe empresta aspectos novos e anormais».
Sem ignorar o mérito de algumas realizações, haveremos, na verdade, de referir quanto se impõe a revisão das disposições legais que para o ultramar determinam o método da constituição dos organismos corporativos, as suas atribuições e estrutura funcional.
Em meu parecer, é inadiável reformar o diploma básico, que, desde 1937, se opõe a que a corporativiza-ção nas províncias ultramarinas possa seguir rumo compatível com a doutrina informadora do sistema. Consinta-se que os organismos possam ser instituídos com carácter efectivamente representativo, se possam adaptar, sem sacrifício da doutrina, às realidades do meio ambiente e correspondam, sem desvios, aos anseios das actividades, e ver-se-á florescer uma estrutura corporativa válida e eficiente, que virá a oferecer a base para a projecção nas corporações, que hoje mão é possível encontrar.
Caminhe-se nesse sentido reformador e no ultramar também se poderá recuperar o muito que se perdeu nos anos que passaram. Mas sem isso nem a dedicação de alguns homens nem a bondade do sistema serão suficientes para que se possam alcançar os objectivos desejados.
Traduzidos para a sua escala, os problemas estruturais dos organismos corporativos no ultramar suo, aliás, os que tive ensejo de mencionar para as corporações cuja instituição apreciamos. Dê-se-lhes pronto remédio e não se desperdice mais tempo, que já foi bastante aquele que, na senda errada, consentimos que passasse sobre nós.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Deixemos, porém, este rápido apontamento sobre a posição do corporativismo no ultramar- que não se encontra em causa, uma vez que na proposta de lei o Governo entendeu não o poder abranger, em face das realidades, na estrutura a definir - e retomemos a análise do quadro estrutural sugerido para as corporações, para medirmos da sua inserção na doutrina e objectivos que ficaram referidos.
Os dois rumos que se oferecem, e que se afastam diametralmente, situam-se, respectivamente, ou no ca-