28 DE JANEIRO DE 1960 329
O Orador: - Em tal hipótese uma das consequências lógicas -liberdade de recondução- de determinado pressuposto -e confiança política- seria, no jogo da própria mecânica do sistema, paralisada por uma das consequências lógicas - inadmissibilidade da recondução sem limites - de um outro pressuposto da figura do presidente da câmara - representante dos interesses municipais.
Todavia, não sendo assim, uma vez que esta qualidade de modo algum vai de encontro ao princípio de livre recondução, fácil é ver que, sob o aspecto em causa, a mesma qualidade nada conta para a lógica do sistema -consente todas as soluções- e, não contando, tem de continuar a extrair-se todas as consequências, por nada paralisadas, da circunstância do o cargo de presidente da câmara ser do confiança política, e entre essas consequências tem de extrair-se precisamente, tal como pretende o Dr. Homem de Melo, a da inadmissibilidade de limites de tempo à possibilidade de recondução.
Por conseguinte, ao contrário dó que se pretende no parecer, a posição deste nosso colega, ou, pelo menos, a posição que aqui defendeu anteriormente ...
O Sr. Homem de Melo: - E que defendo ...
O Orador: - ... afigura-se-me ser aquela que doutrinalmente é correcta.
Há, porém, mais no mesmo sentido.
Consoante se encontra no parecer, a qualidade de órgão municipal do presidente da câmara envolve como consequência lógica a de ser nomeado por prazo determinado, em termos de ao fim de cada período de exercício se rever a sua posição frente às exigências dos interesses da respectiva comunidade concelhia e indagar se continua a ser o mais idóneo representante desses interesses, tal como sucederia se fosse eleito.
Mas se a razão que explica a nomeação e termo dos presidentes das câmaras é a que fica apontada - reexame periódico da sua posição enquanto representante do município-, fácil é ver que esse reexame pode sempre concluir em um de dois sentidos diferentes: no sentido de que o presidente da câmara continua a ser o mais genuíno e qualificado representante do município, ou no sentido de que tal não sucede.
Ora basta a circunstância de, ao fim de um ou vários períodos de recondução, ser possível concluir que determinado presidente da câmara ainda representa melhor do que qualquer outra pessoa, de entre os «possíveis», a comunidade concelhia, para logo se constatar que a sua qualidade de órgão municipal e, ao contrário do que no parecer se afirma, doutrinalmente incompatível e, portanto, exclui a fixação de um limite de tempo às reconduções, pelo menos nos termos estabelecidos no Decreto-Lei n.º 42 178, uma vez que essa fixação pode pôr em causa e ir de encontro à própria finalidade da revisão periódica da posição do presidente da câmara no meio local, paralisando a possibilidade de extrair dessa revisão as naturais consequências no plano prático quando a mesma revele dever continuar à frente do município e o limite legal de tempo às reconduções o impeça.
Quer dizer: diversamente do que no parecer se sustenta, a solução do Decreto-Lei n.º 42 178 exorbita da lógica do sistema, o qual, se é certo poder comportar mais de uma solução para o problema em análise, também é verdade que exclui, pelo menos, o desse decreto-lei, motivo por que a autonomia doutrinal de tal problema não é tão grande nem tão vincada quanto no parecer se pretende.
Assente, assim, que a posição tomada no diploma com exame se afigura ser doutrinalmente incorrecta, que dizer, porém, anuiu no plano da lógica, do sistema da solução preconizada pelo próprio parecer?
O ponto de vista deste consiste em, por um lado, aceitar o estabelecimento de um limite de tempo às reconduções e, por nutro lado, admitir excepcionalmente que esse limite seja ultrapassado, sendo então a recondução feita por decreto, em vez de o ser por portaria.
É claro que esta maneiro do ver da Câmara Corporativa, deixando aberta a possibilidade, ainda, que excepcional, de os presidentes serem reconduzidos para além do limito de tempo em regra posto ao exercício das suas funções, permite a recondução daqueles que, mesmo depois de esgotado esse limite-regera, se revelem como sendo ainda os mais qualificados representantes do município, e assim, pelo menos em certa medida, tem em couta as implicações envolvidas pelo facto de o presidente da câmara ser um órgão municipal.
Tal maneira de ver não é, por conseguinte, pelo menos em absoluto, excluída pela lógica do sistema.
No entanto, implicando ambas as coordenadas delimitadoras da função de presidente da câmara - representação do Poder Central e representação do concelho - o princípio da possibilidade de recondução sem limites de tempo, tal como me esforcei por demonstrar, a solução natural para o problema em apreciação é a de consagrar esse princípio como tal, de harmonia com o regime do Código Administrativo, e não sob a forma de excepção, consoante defende a Câmara Corporativa.
Se a revisão da situação do presidente da câmara aquando das reconduções se explica pela necessidade de averiguar periodicamente da conformidade ou desconformidade da sua manutenção no cargo com os interesses do concelho, a solução de boa lógica é a de a decisão sobre a recondução ou não recondução ficar tão-somente dependente do juízo que a tal respeito deva ser feito, e isto seja qual for o número de reconduções, não se descortinando, uma vez que esse juízo sempre deve ser feito nos mesmos termos e em função do mesmo dado - o interesse do município -, justificação aceitável para ao fim de um certo número de anos se estabelecer o princípio da não recondução ou agravar as suas formalidades.
Deste modo, o ponto de vista do parecer, se não é, em absoluto, excluído pelas características da função de presidente da câmara que foram assinaladas, envolve, no entanto, um certo «entorse», é solução doutrinalmente mais natural.
Deslocando, porem, a questão do plano doutrinal para o fias razões de oportunidade e conveniências práticas, também se me afigura não convencer a argumentação da Câmara Corporativa.
No sentido da solução que propõe, aliás influenciada no essencial pelas ideias já aqui defendidas pelo nosso colega Dr. José Saraiva, o aspecto fundamental a ter em conta reside na circunstância de a experiência revelar que o decurso do tempo opera, na plano local, um acentuado desgaste nos presidentes das câmaras, que impõe a sua substituição ao fim de um certo número de anos de exercício das funções.
Esta razão tem sido invocada e vincada várias vezes, mas também já foi dito e repetido que dá-la como boa não envolve, de modo algum, a conclusão de que há que aceitar a solução do decreto-lei, ou mesmo a preconizada pela Câmara Corporativa. É que o regime do Código Administrativo, deixando ao Governo liberdade de não fazer a recondução e até de, em qualquer altura, demitir os presidentes das câmaras, dá-lhe a possibilidade, sem reservas, de, demitindo-o - com