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17 DE JANEIRO DE 1963 1843

Sem exageros e sem faltar à verdade, indicámos os defeitos da obra, ao mesmo tempo que sugerimos algumas das medidas que, em nosso entender, poderiam corrigir alguns desses defeitos, apontando outras providências para livrar os lavradores da ruína para que caminham a passos agigantados se as entidades responsáveis continuarem a fechar os olhos e os ouvidos às realidades.

Não nos moveu, pois, outro propósito que não fosse o de sermos dignos do mandato que nos confiou aquela gente ao votar o nosso nome para representar e defender nesta Assembleia Nacional os seus legítimos interesses, que são coincidentes com os da Nação, que queremos ver cada vez mais próspera e bem orientada.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Louvando o esforço e a intenção do Governo, afirmámos que a obra realizada estava a cumprir as suas funções de defesa dos campos contra cheias desordenadas e a função de enxugo dos campos marginais.

Quanto à função de rega que a obra se propunha, salientámos o desequilíbrio entre a água de rega disponível e a precisa para satisfazer as necessidades hídricas das culturas, o que não possibilita aos lavradores o bom êxito das culturas do Verão.

Se a isto acrescentarmos que o custo das obras e do seu funcionamento foi largamente ultrapassado; que os benefícios reais da produção ficaram muito aquém das estimativas dos técnicos; que o preço da energia eléctrica consumida em bobagem é excessivamente elevado; que não se tem prestado assistência técnica à lavoura para que fizesse um aproveitamento mais vantajoso das possibilidades económicas do vale do Lis, teremos assim encontrado a explicação e a justificação para os justos queixumes e clamores dos lavradores.

De tudo isto demos conta na intervenção que fizemos há um ano nesta Assembleia, tendo ao mesmo tempo sugerido a forma de, em parte, corrigir os defeitos da obra e preconizado as providências mais necessárias e instantes para livrar os lavradores da situação difícil em que se encontram.

Que fizeram os serviços responsáveis? Como corresponderam ao apelo para que algo de positivo se realizasse a fim de minorar a situação grave dos proprietários do vale do Lis?

Quando se esperava que a Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos viesse proferir o seu mea culpa, reconhecendo os defeitos apontados e cuidando de os reparar (pois não há obra humana que não tenha imperfeições), resolveu antes, à semelhança do fariseu da parábola do Evangelho, vir dizer que tudo está certo e que nada há a remediar.

É quanto se deduz da leitura das 36 páginas dactilografadas em que se prestam esclarecimentos sobre a matéria da minha intervenção, donde claramente ressalta a preocupação de exaltar tudo quanto do bom havia sido apontado à obra, para, ao mesmo tempo, esbater, se não mesmo anular, os defeitos que haviam sido postos em evidência.

Entre outras coisas os esclarecimentos vêm resumidamente dizer:

a) Do agrado com que centenas de proprietários das terras beneficiadas reconheceram, em exposição enviada em 1957 ao Sr. Ministro das Obras Públicas, o muito que se fez;

b) Que sempre tem pugnado pelo abaixamento do preço da energia eléctrica por entender que são, na realidade, elevadas as taxas, acrescentando-se, no entanto, que atribuímos ao custo da

energia eléctrica maior influência sobre o da exploração e conservação da obra do que aquela que na realidade ele tem;

c) Que para a salubridade da região resultaram grandes benefícios da execução da obra de regularização fluvial e da defesa e enxugo dos campos do Lis;

d) Que o clamor da falta de água parou em 1959-1960 e 1960-1961, corrigindo-se o defeito com a bombagem de água açudada do remanescente do leito do rio e de algumas valas de enxugo;

e) Que não houve proibição da cultura do arroz;

f) Que os encargos da obra a suportar pelos beneficiários são de reduzido valor, prevendo-se acentuada melhoria da rentabilidade da exploração.

Estes os argumentos em que a Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos se escuda para demonstrar a sem razão das razões por nós alegadas e para dizer que a situação económica dos proprietários melhorou consideràvelmente com a realização da obra do Lis.

Mas eles, os lavradores, é que não dizem isso! E têm razão, porque uma obra só é verdadeiramente boa, útil e benéfica quando os resultados obtidos excedem os encargos contraídos.

E os lavradores não dizem isso porque, para além das razões já por nós expendidas na intervenção do ano passado, as produções nos terrenos beneficiados são inferiores àquelas que o optimismo das previsões dos técnicos indicou, não resultando para as suas propriedades uma maior valia que viesse compensar, de modo razoável, os pesados encargos a que os seus donos ficaram sujeitos (taxa de exploração e conservação de cerca de 600$ por hectare, além do aumento das contribuições, como resultante da actualização dos rendimentos colectáveis e que se podem computar na média de 200$ a 250$ por hectare, e o pesadelo com a futura taxa de rega e beneficiação, ou seja o reembolso de 50 por cento do custo da obra pelo Estado).

A isto há ainda a acrescentar o péssimo estado em que se encontram as serventias no campo do Lis, muitas delas impraticáveis no Inverno, o que obsta a que os proprietários possam na época invernal ter acesso conveniente às suas propriedades e, portanto, cultivá-las.

E não se argumente com a maior fertilidade dos terrenos e, consequentemente, com a sua maior produtividade.

Os melhores terrenos do campo do Lis não vão além de uma fertilidade média e os demais daí para baixo. É que, por virtude da obra de defesa realizada e que tão necessária se tornava, os nateiros das inundações deixaram de desempenhar acção fertilizadora sobre as terras, restituindo-lhes em parte os elementos úteis que as colheitas retiravam, passando, por isso, agora as terras a exigir fortes adubações e estrumações, que a lavoura local lhes não pode dar por carência de matéria orgânica e por débil resistência económica.

Depois, nos últimos anos que precederam o início da obra e nos princípios desta, fizeram-se sucessivas culturas de arroz e, concluído o enxugo, os proprietários, na ânsia de obterem rendimentos para fazer face aos pesados encargos, fizeram no mesmo ano culturas de trigo e de milho, mobilizando totalmente as reservas da terra, sem procurarem manter, por meio de rotações aconselháveis, o seu nível de fertilidade já bastante afectado.

E também neste aspecto os serviços oficiais não fizeram coisa alguma do muito que tinham a fazer, e que consistia em instruir os proprietários sobre o ordenamento cultural mais adequado a cada espécie de terreno, sobre a forma de aumentar o nível de fertilidade, etc.