2808 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 111
Lançado em terreno caro, do concelho da Ribeira Grande, por sinal em momento de acentuada emergência - andava o Mundo quase todo em guerra -, o chamado Campo de Santana exigiu nivelamentos, terraplenagens e algumas construções. Tudo à -pressa, como a pressa da necessidade o exigia, mas o certo é que foi o bastante para que o chão se tornasse diferente, sem o préstimo que tinha. Ainda assim, apesar de pequeno e construído de afogadilho, o precário aeródromo de algum modo serviu os fins imediatos e restritos para que fora destinado.
Mais tarde, em virtude da evolução verificada no preço dos arrendamentos rústicos, surgiu o problema da renda justa, e, a propósito, foram então aqui produzidas algumas pertinentes observações.
Também, e quanto ao aeródromo da ilha de Santa Maria, da mesma forma, ou seja, com a mesma consciência e a mesma firmeza - com o mesmo ardor -, se tomou e sustentou a natural posição de defesa a bem dos legítimos interesses dos proprietários dos terrenos utilizados.
Tempos depois, nova questão se apresentou, aliás necessariamente derivada das circunstâncias em que fora escolhido e aproveitado o terreno de Santana: o aeródromo revelara-se obsoleto - incapaz. As suas pistas de relva fofa, tão boas para as chuvas como inaptas para as descolagens e aterragens, a não ser, e em certas condições de tempo, para aviões de hélices e de reduzida envergadura, distanciavam-se perigosamente das regras da nova técnica.
E principiou a batalha pela construção do novo aeródromo.
Mas logo algumas interrogações, e grandes, carregaram o quadro.
Seria o local próprio?
Aquele sítio apertado entre um morro de sólida imponência e a montanha desdobrada em alteroso pano de fundo seria o indicado para a construção de um aeroporto à altura das exigências presentes e futuras?
Não teria a ilha de S. Miguel incontestável direito a um aeroporto digno da sua área, da sua população, do seu movimento?
Não seria a falada e até já escrita solução de se construir uma única pista asfaltada de 1500 III uma solução de momento, mas uma solução encravada?
Como havia de ser com os aviões a jacto, com o inevitável acréscimo do tráfego?
O morro, a cadeia de montes do lado sul, permitiriam o aumento da nova pista e a construção de outras porventura indispensáveis?
Nova batalha - a batalha pela melhor localização do aeródromo de S. Miguel - começou então a ser travada pelos Deputados por Ponta Delgada, quer aqui, quer junto do Ministério das Comunicações. Batalha de argumentos que não temiam e antes reclamavam o exame aturado do local.
Na sessão de 11 de Abril de 1961 - por exemplo -, observou-se que as obras em projecto, relativamente ao aeródromo de Santana, uma vez realizadas, não satisfariam as exigências de um tráfego aéreo servido por aviões de todos os tipos, cumprindo, assim, olhar para diante.
Novos brados se seguiram.
Em 16 de Fevereiro de 1962 já na presente legislatura - preconizou-se a escolha de outro local que permitisse, embora com a modéstia dos nossos recursos actuais, «resolver as pequenas necessidades do presente, mas também acautelar, com mais largas perspectivas, as frequentes surpresas do futuro».
E na sessão de 11 de Janeiro de 1963, ao agradecer-se ao Governo o facto de ter sido inscrita no Orçamento Geral do Estado uma verba destinada à construção do aeródromo de S. Miguel, não se deixou, apesar disso, de voltar ao assunto da conveniente localização do novo aeródromo, repetindo-se que era preciso olhar para diante, para o futuro, e para a manifesta impossibilidade de o aeródromo de Santana poder servir o futuro ... e até o presente.
Resumo, mas recordo.
À última hora - estava já tudo resolvido e assente para ser levado a efeito nos terrenos de Santana, os tais que não oferecem os requisitos indispensáveis para uma solução harmónica com as exigências de hoje e de amanhã -, uma grave e imprevista dificuldade entravou a marcha do empreendimento. As danadas forças do erro e do mal assaltaram-nos no ultramar. Foi necessário mobilizar homens e dinheiro. Na linha de hierarquia das necessidades a atender, uma surgia a que nenhum português poderia deixar de reconhecer prioridade.
Período de lanceada expectativa esse, nada próprio para destemperos de fé e de compreensão e muito menos para ironias mesquinhas ou queixumes desabusados.
Entretanto o Chefe do Estado realiza a sua visita aos Açores. Os habitantes das ilhas todas, desde Santa Maria ao Corvo, não precisam de quem lhes lembre ou active o seu dever. Estão na vanguarda, no imenso mar, inflexíveis e atentos, no alerta constante, provado há que séculos. O almirante Américo Tomás só encontra corações abertos, palmas sinceras e flores em plena dádiva. E é ele, o Chefe do Estado, que deixa entrever, nas suas palavras ditas na ilha de S. Miguel - naquela sua linguagem patriòticamente profunda -, que o novo aeródromo seria uma realidade com o seu início no ano que findou.
Esta referência, além de necessária - por constituir elemento indispensável para o entendimento dos factos -, torna-se gratíssima neste momento, em que se impõe registar, com serena inteligência e sereno agradecimento, a publicação do Decreto-Lei n.º 45 444, de 16 de Dezembro de 1963, no qual a construção do prometido aeródromo de S. Miguel emerge de uma revisão geral do plano de infra-estruturas aeronáuticas do arquipélago e do especial facto de se haver reconhecido - como se declara no relatório do mesmo decreto-lei - que a situação do aeródromo de Santana, na ilha de S. Miguel, não era a mais aconselhável para o tráfego aéreo, pelo que teve de se escolher nova localização e elaborar novo projecto, pondo de parte a ideia de pavimentar e alargar a pista já existente.
«A ponderação destas circunstâncias - escreve-se ainda no citado relatório -, e as dificuldades financeiras que o empreendimento originou impediram que há mais tempo se iniciassem as obras do novo aeroporto».
Sr. Presidente: este acontecimento de que me estou ocupando não tem só relevância local, pela evidente melhoria que introduzirá no sistema de comunicações da ilha de S. Miguel com o exterior e pelas largas possibilidades oferecidas ao desenvolvimento do turismo. Prende-se com as redes do tráfego nacional e internacional. Assim, a sua importância sobe de ponto e merece ser aqui devidamente assinalada.
Mas, directamente relacionados com o Decreto-Lei n.º 45 444 existem mais alguns aspectos que cumpre salientar.
As aquisições e expropriações dos terrenos destinados à construção do novo aeroporto serão suportadas pelo Ministério das Comunicações, e não pela Junta Geral do Distrito de Ponta Delgada.
O Governo escutou os reparos feitos sobre a conveniência de se localizar o melhor possível o novo aeroporto de S. Miguel e estudou esses reparos, de modo a dar-lhes inteira satisfação.