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31 DE JANEIRO DE 1968 2309

Aceito, assim, em princípio, esse cocktail oleícola, que é o lotado corrente, em que o azeite só entra em pequeníssimas quantidades, muito embora avalie as implicações futuras e perniciosas da sua reiterada utilização.
Todavia, não me parece nem justo, nem razoável, que a comercialização dessa mistura seja feita e se pratique à custa de uma discriminação económica, tal como a portaria a estabelece no seu fatídico n.º 13.

O Sr. Virgílio Cruz: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Com todo o gosto.

O Sr. Virgílio Cruz: - A portaria a que V. Ex.ª está a fazer referência não proíbe os vendedores ambulantes de venderem o lotado corrente, desde que seja embalado.

O Orador: - Agradeço a V. Ex.ª a achega que me deu, mas informo que no desenvolvimento dás minhas considerações respondo claramente ao ponto de vista de V. Ex.ª, e por isso, se me der licença, vou continuar.
Com efeito, em tal número, proíbe-se a venda ambulante do lotado corrente a granel, com! o que se favoreceu extraordinariamente o comércio retalhista de mercearias com estabelecimentos fixos, em detrimento do comércio ambulante, ao qual foi, assim, criada a aflitiva situação que lhe advém do drástico encurtamento da sua normal actividade.
Em nome da necessidade de fiscalização - razão apresentada para a drástica medida - a portaria altera impiedosamente o tradicional equilíbrio existente entre as duas formas do comércio retalhista, que tem vivido lado a lado sem margem para quezílias, nem incompreensões de tomo, procurando eliminar o comércio ambulante.
Ressalta desde logo que tal determinação é lesiva de direitos que não podem considerar-se precariamente adquiridos, nem precariamente mantidos e exercidos.
Efectivamente, o comércio ambulante de azeites representa uma profissão tradicional, começada há mais de cem anos e que ocupa hoje mais de dois milhares de pessoas, que, com os seus familiares e empregados, perfazem cerca ai uma dezena e meia de milhares de indivíduos, que vivem ou dependem desta modalidade, que é exercida em todo o território nacional.
Oriundos principalmente dos concelhos de Vila Nova de Poiares e da Lousa, os primeiros vendedores ambulantes de azeita tiveram de procurar nesta actividade a sobrevivência, que a pobreza destes concelhos, sem agricultura rentável e sem indústrias, lhes negava ostensivamente, como ainda nega.
Então, deram-se, como muitos outros, à emigração para o estrangeiro ou tentaram criar dentro do País as condições de melhoramento das suas débeis economias.
É curioso notar que cada um dos concelhos do distrito de Coimbra tem fornecido, por idênticas razões, diferenciados contingentes profissionais, cuja actuação tem tido decisiva importância no desenvolvimento de certas estruturas das grandes cidades, designadamente da de Lisboa.
É, por exemplo, o caso dos padeiros e vendedores de pão, que provêm do concelho de Tábua; dos guardas-nocturnos, homens da limpeza pública e leiteiros, do de Arganil; e dos engraxadores, que, geralmente, pertencem ao concelho de Gois.
Todo este importante contingente se deslocou dos ditos concelhos de origem em busca de vida melhor e obedecendo à mesma imperativa necessidade de sobrevivência.
A nenhuns repeliram as cidades ou os outros centros populacionais onde se acolheram um dia, porque reconheceram desde logo que dos seus esforços e labutar só advinham vantagens para o progresso local.
E não se enganaram com a adopção destes ousados emigrantes os referidos centros populacionais.
Lutando e porfiando triunfarem na dura luta em que se empenharam, tornaram absolutamente imprescindíveis as suas funções, já que se adaptaram aos mais duros e difíceis mesteres.
Isto se passou também com os vendedores ambulantes de azeite, que enveredaram para esta profissão pela natural propensão para o comércio dos habitantes dos mencionados concelhos de Vila Nova de Poiares e da Lousa.
Espalhados pelos quatro cantos do País, criaram à custa de sacrifícios sem conta uma maior ou menor clientela, à qual vêm distribuindo com impressionante regularidade nos respectivos domicílios os artigos mais importantes e necessários à vida local, como seja o azeite, que foi sempre ò artigo principal do seu comércio.
Com a sua actuação em giros cada vez mais dilatados em busca de acrescido rendimento, passaram a lucrar as povoações, que, na generalizada falta de estabelecimentos locais, designadamente nas regiões mais empobrecidas, encontraram no vendedor ambulante o fornecedor de que careciam.
Desta sorte, à profissão de vendedor ambulante de azeite, pelo interesse que tem representado e seguramente representa, foi reconhecido um conjunto de obrigações e de direitos que a integram no número das profissões lícitas do trabalho nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O natural desenvolvimento do País e a progressão do comércio fixo não enjeitaram o comércio ambulante de azeites, que, por isso, tem acompanhado as exigências do progresso, modernizando os seus meios de actuação por forma a satisfazer as necessidades próprias e as alheias.
A despeito de integrarem no âmbito do seu comércio outros artigos além do azeite, este foi sempre o produto principal da venda ambulante.
Vendido a granel, geralmente a crédito e em pequenas porções, a uma cilentela heterogénea, o seu comércio fez surgir, por mercê desse crédito, uma dívida flutuante de bastantes milhares de contos, dessa clientela para os vendedores ambulantes e destes para com os seus fornecedores.
Vivia-se, todavia, numa atmosfera de respeito e de compreensão pelos direitos de cada um quando foi publicada a mencionada Portaria n.º 23 092 e estabelecida a referida discriminação económica com a eliminação da possibilidade da venda ambulante do lotado corrente a granel.
Sendo esta mistura a única gordura vegetal que não é obrigatoriamente embalada e a mais barata, e, por isso, a mais procurada pela grande massa dos consumidores, o comércio ambulante, não a podendo vender, sofre um rudíssimo golpe.
É que a clientela que lhe é afrontosamente retirada encaminhar-se-á para locais onde pode ser servida e não mais procurará o vendedor ambulante, nem para lhe pagar as dívidas que contraiu para com ele.
Tolhida fica, assim, a razão principal desta forma de comércio e ofendida a razão da sua existência centenária, pelo que restai aos que se lhe têm dedicado abandoná-la definitivamente.
Mas os vendedores ambulantes, privados de servirem a sua clientela e de receberem os seus créditos, não têm possibilidade de solver os compromissos para com os fornecedores.
Atingem-se, desta forma, situações cuja alta inconveniência me dispenso de evidenciar...