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2226 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 110

Na verdade, como componentes interdependentes e insoláveis da comunidade mundial em geral, e ocidental em particular, não podemos alhear-nos da imperatividade dos fenómenos político-sociais gerados mo seio da civilização a que pertencemos e denodadamente defendemos.
A cada época e a cada latitude a sua política. Se as realidades se transformam, deve a política adaptar-se-lhes, apenas com o limite de que se confinem dentro das traves mestras dos Principios inegociáveis.
Por isso se nos afigura que as chamadas «aberturas» do Governo - agora as que ao ultramar se referem - conciliam a prudência e a coragem necessárias.
Insatisfeitos e «velhos do Restelo» sempre os houve e sempre os haverá. Entre o imobilismo e a temeridade, o optimismo fácil e o pessimismo estéril, há que ser-se realista.

O Sr. Barreto de Lara: - Muito bem!

O Orador: - É, a nosso ver, o que o Governo está sendo.
Do que se trata, afinal, é de dar execução a um principio constitucional de que até hoje se fez modesto uso.
Sendo preciso desenvolver para progredir, corresponder, em suma, ao ritmo do nosso tempo, é indispensável que a descentralização e a autonomia passeou de princípio teórico, ou pouco menos, a realidade viva.
De outro modo não será possível viabilizar os recursos néon a dinâmica necessários para alcandorar o nosso ultramar e os seus milhões de habitantes para estádios de progresso económico e social que os integrem de facto - e não apenas na letra de textos legais - na plenitude do complexo de direitos e deveres inerentes à nobre condição de português.
Demais já fomos surpreendidos e ultrapassados pelos acontecimentos. Demais já deixámos perder oportunidades e possibilidades irrecuperáveis. Impõe-se agora um esforço de actualização e recolagem que, evidentemente, não cabe na capacidade de determinação de espíritos receosos, contemplativos ou escravos de tentadoras rotinas.
É por isso que nesta Assembleia, neste momento, repousa uma responsabilidade incomensurável, mas também uma oportunidade de contribuir para um Portugal maior no Mundo.
O homem é como a água: só repousa nivelado.
Entre poucos muito ricos e muitos muito pobres, entre privilegiados e desprotegidos, não será fácil encontrar, nos tempos que correm, uma trégua duradoura. A tarefa que se nos impõe, e que está na linha da nossa clássica visão personalista do mundo e da vida, é a de, sem demora, procurar nivelar abismas que separam etnias, grupos económicos e culturais, por forma que, sem se cair em abstracções irrealistas, cada região ou cidadão portugueses se não sinta o parente pobre de uma só família.

O Sr. Pinto Machado: - Muito bem!

O Orador: - Esta a realidade insofismável a que não vale a pena pregar o anátema de rótulos envelhecidos.
Bem recentemente, o ilustre governador da província da Guiné, general (António de Spinola, preveniu que «será utópico pensar que a mera definição de esquemas políticos com textos legais bastará para o fim em vista». Acrescentou que «também não deve esperar-se que as afirmações produzidas em actos públicos pelos chefes responsáveis cheguem para preencher tal lacuna». «É necessário», concluiu, «para além disso, definir claramente o rumo a seguir, através de uma orientação concreta e objectiva que todos apreendam e em que todos sintam a sua quota-parte de participação responsável.»
Palavras justas. Palavras que iluminam.
Não bastará, pois, alterar a própria Constituição se não empreendermos, logo de seguida, toda uma série de medidas, de reformas, diríamos mesmo, até de revoluções administrativas, para que de facto haja evolução e para que ela se processe com naturalidade, com coerência lógica, sem precipitações, mas também sem demoras desnecessárias.
Consciencializar a Nação e dirigi-la, impulsionando-a ao encontro do seu próprio desígnio histórico, proceder, enfim, à modernização e dinamização de orgânicas e sistemas ultrapassados pela fenomenologia da era planetária - eis o objectivo inadiável e indeclinável que tem de merecer as honras da nossa mais atenta preocupação.
Ao apoiarmos, conscientemente e sem hesitações, os propósitos do Governo, sentimos ser nosso dever justificar a nossa tomada de posição, e tecer algumas considerações que, embora possam ser talvez ajustáveis a todo o ultramar, queremos referir especialmente a Moçambique - terra em que nascermos e nos nasceram filhos, onde vivemos e que, por isso, melhor conhecemos.
Poderão elas, à primeira vista, parecerem demasiadamente particularizadas ou irrevelantes na apreciação da revisão constitucional, mas entendemos enumerar em detalhe e evidenciar alguns problemas, precisamente por se tratar de dificuldades e de falhas que, no fundo, militam a favor das renovadoras atitudes do Governo, sem as quais não julgamos possível uma solução permanente.
Embora aquela província ofereça já um admirável complexo unificado geoumano, racial e religioso, que constitui exemplo nos dias de hoje, podemos afirmar que, apesar de consideráveis progressos, ela está apenas a acertar os primeiros passos para o grande futuro que seguramente a espera.
Tenha-se presente, antes de mais, a premissa por vezes esquecida, de que ela se situa a muitos milhares de quilómetros da metrópole, em confronto com a qual se deve considerar uma região com substrato étnico, geográfico, religioso e social diferenciados.
Infelizmente é uma parcela pouco conhecida do mundo em geral, da maioria dos portugueses em particular, e até de grande partia dos Srs. Deputados que ilustram festa Câmara - o que torna algo anais difícil a compreensão, em termos de vivência, dos seus problemas e dos seus anseios.
A este respeito, não sabemos nos - por pouco entendidos na matéria - se seria de todo em todo impossível prever-se que, para deliberar sobre assuntos de maior envergadura que afectem particularmente o ultramar, esta Câmara, ou ao menos algumas das suas comissões especializadas, pudessem reunir no teatro dos problemas, ouvindo as opiniões dos cidadãos ali vivendo - daqueles que, pelos ensinamentos que só a permanência proporciona, lá olham o céu e sabem quando chove, ou anunciam, perscrutando as nuvens, que o vento vai mudar.
Na dúvida, aqui deixamos a sugestão.
Cabe nesta altura uma insistência. E essa para frisarmos que, em nossa opinião, a Assembleia Nacional deve reflectir, tanto quanto possível, o consenso dos portugueses de todos os matizes étnicos e políticos, desde os mais ilustres aos mais humildes, inclusive, senão, sobretudo, daquelas camadas que constituem a chamada maioria silenciosa, como tal classificada por não dispor de porta-vozes próprios, ou por viver num alheamento de que é preciso arrancá-la.