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98 I SÉRIE - NÚMERO 4

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Presidente da República: A modernidade perseguida pelo projecto Brasil Novo autoriza-nos a reclamar papel de relevo no conceito de nações. O esforço envidado pelo país ver-se-á, contudo, frustrado caso a comunidade internacional não consiga ampliar os actuais mecanismos de cooperação. Num mundo em que a interdependência económica se transformou em factor determinante no processo de aceleração do desenvolvimento, é imprescindível que o ideal de cooperação presida às relações entre Estados.
Com esse espírito, a Europa dos Doze está ultimando os preparativos para o surgimento, a partir de Janeiro de 1993, do mercado único. O Brasil acompanha com grande interesse a evolução desse histórico processo de integração, que elevará a Comunidade Económica Europeia ao status de grande potência económica deste final de século, com um mercado de 320 milhões de pessoas e um produto interno bruto ainda maior que o dos Estados Unidos da América.
A Comunidade Económica Europeia já é hoje o maior parceiro comercial do Brasil. Por isso, preferimos ver no advento do mercado único não uma ameaça de fechamento à cooperação com os tradicionais parceiros comerciais da Comunidade, mas, antes, como uma oportunidade privilegiada para incrementar a cooperação ora existente.
O Brasil sabe que pode contar com Portugal como actuante aliado de seus interesses junto à Comunidade Económica Europeia.

Aplausos gerais.

O que postulamos, aliás, não é mais do que aquilo que a própria Comunidade solicita aos seus parceiros comerciais, ou seja, a redução das barreiras proteccionistas, que, entre outras coisas, bloqueiam o acesso de nossos produtos manufacturados ao mercado comunitário. Estou convencido de que, com o avizinhar-se de 1993, o apoio de Portugal, com a ressonância que sua voz certamente terá no seio da Comunidade, será fundamental importância na condução desses temas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Altas Autoridades, minhas Senhoras e meus Senhores: O Brasil quer participar da construção de um mundo de paz e prosperidade. Saudamos com alegria o fim do conflito ideológico e estratégico que durante 45 anos se impôs como moldura básica das relações internacionais. Celebramos a falência dos regimes autoritários e a generalização da democracia como modo de convivência política São mudanças que apontam na boa direcção, na direcção dos interesses de sobrevivência e bem-estar da humanidade.
Para a geração a que pertenço, a palavra chave é "solidariedade". Foi essa a bandeira que empunhámos ao longo das duas últimas décadas na luta pela transformação profunda de nossas sociedades. Não fizemos tudo o que pretendíamos fazer, mas fizemos muito. O momento que vivemos tem marcas que se confundem com os nossos sonhos e reivindicações. Aí está o ideal da paz universal mais do que nunca valorizado como requisito da felicidade dos homens. Aí está a causa da preservação do meio ambiente transformada em altíssima prioridade política dos governos e das organizações sociais. Aí está a questão dos direitos humanos a mobilizar a indignação e a vontade de justiça Esse é, de certa maneira, o lado positivo da época que atravessamos.
Mas nem tudo é tão promissor. Não pode dar certo a troca da bipolaridade ideológica por uma nova bipolaridade entre riqueza e pobreza. Não podem conviver a miséria absoluta e um modelo de desenvolvimento baseado no desperdício, na destruição da Natureza, nos impulsos de dominação pela força. Como afirmei em outras ocasiões, a atitude humanista não pode ser selectiva: ou vale por todos os homens ou não vale nada.

Aplausos gerais.

Não se pode aceitar que o colonialismo político e o neocolonialismo económico sejam substituídos por um regime de cunho igualmente colonial na área do conhecimento e da ciência e tecnologia O raciocínio que nega o acesso universal aos frutos do engenho dos homens é o mesmo que antes negava o direito à independência nacional e ao desenvolvimento de todos os povos.

Aplausos gerais.

O Brasil já começou a fazer a sua parte no erguimento desse mundo novo que pretendemos. No campo do desarmamento, interpretando o sentimento da gente brasileira, renunciamos unilateralmente, perante as Nações Unidas, à possibilidade de realizar quaisquer explosões nucleares, ainda que com fins pacíficos. Não renunciamos, porém, ao direito de termos acesso a tecnologias hoje indispensáveis ao progresso de qualquer economia, de qualquer sociedade.
No que se refere aos direitos humanos, deixamos de usar o argumento da soberania para justificar factos absolutamente injustificáveis.

Aplausos gerais.

Acolhemos hoje as denúncias internacionais sobre violações ocorridas em nosso território como auxílio construtivo no esclarecimento desses casos e na luta por seu banimento definitivo. Na questão do meio ambiente, passamos a invocar o princípio da soberania para assumirmos integralmente - isto, sim! - a nossa responsabilidade pela reparação dos danos já causados e pela implementação de uma política ecológica consistente e efectiva, que reflicta a preocupação do povo brasileiro e de toda a humanidade com o assunto.

Aplausos gerais.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: "Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades", escreveu Luís de Camões. Muda, também, a própria Europa, a Leste e a Oeste, dando testemunho inequívoco da vitalidade do Velho Mundo, que, a despeito do flagelo de duas guerras, foi capaz de aprender a lição da história e ressurgir com força renovada.
Excelências, também o Brasil está mudando, e haveremos de contar, em todos os momentos - não lenho dúvidas -, com a disposição fraterna da Nação Portuguesa para levar a bom termo esse grande empreendimento.
Que Deus nos ajude!

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, declaro encerrada a sessão.