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I SÉRIE-NÚMERO 7 170

Srs. Deputados, existe hoje consenso quanto a uma questão de importância transcendental: se houver guerra, ela será desencadeada pelos Estados Unidos da América.
Cumpro um dever prestando homenagem aos grandes jornais norte-americanos que estão a chamar, com insistência, a atenção do povo dos Estados Unidos da América para uma contradição antagónica na estratégia da Casa Branca.
A invasão do Koweit pelo Iraque foi um acto de brutalidade, de barbárie, violador de normas e princípios básicos do direito internacional. Por isso mesmo se tornou fácil o consenso dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança na condenação -justa!- de Bagdade, através de sucessivas resoluções. Os cinco têm dito e redito que quem define o direito internacional no Golfo é o Conselho de Segurança e que o cumprimento das decisões daquele alto organismo executivo é obrigatório para todos os Estados membros das Nações Unidas. Qualquer iniciativa unilateral colocaria, portanto, automaticamente o país por ela responsável fora da lei, em desafio à comunidade internacional. Apesar disso, o Presidente dos Estados Unidos da América teima em levantar a hipótese de um ataque ao Iraque como saída admissível.
Obviamente, o Conselho de Segurança não atribuirá aos Estados Unidos da América, ou a qualquer outro país, mandato para tal iniciativa. A contradição não pode ser ignorada. O Pentágono tem deixado muito claro que a guerra não se anuncia, prepara-se sigilosamente.
Se o desfecho da crise for a guerra, os Estados Unidos da América actuarão, repito, sem mandato das Nações Unidas. Na prática, isso equivaleria a tripudiar sobre os princípios da moral e do direito, justamente invocados para condenar a agressão iraquiana ao KoweiL Pior o eventual bombardeamento de Bagdade, previsto em todos os planos divulgados pela imprensa americana e europeia, destruiria, de uma penada, todos os esforços feitos desde Agosto para tratar a questão do Golfo, no âmbito da ONU, como assunto que diz respeito a toda a humanidade. Ao passarem por cima do Conselho de Segurança, os Estados Unidos da América implantariam no mundo a "lei da selva" e fariam da Carta das Nações Unidas um papel sem valor. Não é por acaso que alguns dos mais respeitados jornais dos Estados Unidos da América estão a lembrar ao Presidente Bush que ele não deve usar a ONU na crise no Golfo como instrumento de sua estratégia, para depois a ridicularizar e desprestigiar.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aumenta nos Estados Unidos da América o debate nacional em volta dos verdadeiros objectivos da "Operação Escudo do Deserto", que atirou para a Arábia Saudita um corpo expedicionário de mais de 200 000 homens, sustentado logisticamente por gigantescas forças acronavais. O frenesim guerreiro que agita a Casa Branca, a Secretaria de Defesa e a naturalidade com que ali se fala de uma eventual ofensiva contra o Iraque demonstram que a motivação desse esforço militar não foi a ambição de fazer respeitar o direito internacional e a Carta da ONU.
É oportuno lembrar que a Casa Branca permaneceu passiva quando a Indonésia invadiu Timor-Leste; quando a Turquia invadiu Chipre; quando Marrocos invadiu o Sara Ocidental. O Presidente Bush olha para Israel como para um aliado muito último, não obstante o governo de Telavive se recusar a cumprir a resolução do Conselho de Segurança que ordenou a retirada de Gaza, de Golan e (Ia Cisjordânia. E já não falo de Granada e do Panamá!
O envolvimento norte-americano no Golfo e os seus objectivos permanentes naquela área são inseparáveis de interesses políticos, militares e económicos que se misturam num todo inextricável. Os jornais The New York Times e The Washington Post e as revistas Newsweek e Time têm publicado textos muito esclarecedores e muito dignos sobre as motivações dessa estratégia, criticando-a com dureza. O Herda Tribune publicou a opinião de um membro da Câmara dos Representantes, Sylvio Conte, que passo a citar: "O aumento do preço de 7 dólares por barril aumentaria em 21000 milhões de dólares por ano o valor da produção petrolífera dos EUA. Isso faz muita manteiga no prato das grandes companhias, em prejuízo do consumidor americano." Infelizmente, o aumento do preço do petróleo já foi muitíssimo além dos 7 dólares por barril!...

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O derrubamento de Saddam Hussein e a destruição de Bagdade, Bassorá e Mosasul e o regresso do emir Al Sabah ao Koweit não resolveriam, por si só, os problemas do Médio Oriente, área onde as crises endémicas são, sobretudo, da responsabilidade das potências ocidentais e, em primeiro lugar, da Grã-Bretanha, que, sobre as ruínas do Império Otomano, traçaram fronteiras artificialíssimas e inventaram Estados e reis, permitindo posteriormente que Israel se constituísse em factor de agressividade e instabilidade permanentes.
Os Estados Unidos da América, entretanto, recusaram liminarmente a realização de uma conferência internacional que discuta globalmente os problemas da região. O Presidente Georage Bush afirma que os Estados Unidos da América estão a colocar no Golfo a pedra angular de uma nova ordem internacional e fala da aurora de uma nova era. A ordem a que alude nos seus discursos messiânicos apresenta contornos inquietantes. Nesta época de pós-guerra fria, a terra, vista como aldeia planetária, não precisa de gendarme internacional. A humanidade não pediu, nem quer, gendarmes que a reduzam a um estatuto de menoridade.

Vozes do PCP:-Muito bem!

O Orador:-Nas quatro décadas e meia posteriores à rendição da Alemanha e do Japão, 25 guerras, em diferentes lugares do Terceiro Mundo, fizeram cerca de 22 milhões de monos-a estatística vem publicada em vários jornais, entre eles, na última edição do Monde Diplonatique. A maioria delas nada teve a ver com a defesa das liberdades e do direito internacional. A ganância e a fome de poder estiveram na origem de quase todas elas.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): -Bem lembrado!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar dos ventos de guerra que sopram no Golfo vindos de Washington, o meu partido, o Partido Comunista Português, não perdeu a esperança de que as forças que condenam o recurso às armas e defendem a paz acabem por prevalecer. É por isso, Sr. Presidente, que desta tribuna lembro ao Governo do PSD que ele cumpriria um dever humanista e patriótico se condenasse, com clareza, de maneira inequívoca, qualquer eventual acção de guerra no Golfo. Não basta dizer-se favorável a uma solução pacífica, negociada no respeito pelas resoluções do Conselho de Segurança. O Governo cometeu um enorme pecado