O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2678 I SÉRIE -NÚMERO 82

O Sr. Jorge Lemos (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por lembrar ao Sr. Secretário de Estado que se alguém é culpado pelo atraso na abertura da televisão à iniciativa privada, esse alguém não é a oposição, VV. Ex.as têm, há quatro anos, a maioria nesta Casa, a Constituição da República está revista desde 1989, e, se ainda não o fizeram até agora, é porque provavelmente teremos eleições a 6 de Outubro de 1991 e a existência de canais privados, até lá, não vos seria benéfica.
Retomaria uma questão já colocada pelo Sr. Deputado Narana Coissoró e daria como reproduzidos parte dos argumentos que ele já utilizou, para dizer que os senhores tentaram tornar difusa a responsabilidade que têm no controlo da televisão, ou seja, hoje é perfeitamente claro que há uma cadeia hierárquica de comando que começa em V. Ex.a, Sr. Secretário de Estado, ou no ministro que está sentado ao seu lado, e que acaba face ao écran, V. Ex.a transforma a RTP em sociedade anónima, vai distribuir o capital por uns institutos públicos, institutos ou departamentos governamentais todos dependentes do Governo, serão esses departamentos governamentais a nomear os membros da assembleia geral e serão esses membros da assembleia geral nomeados na cadeia hierárquica que irão eleger os gestores. Ou seja, VV. Ex.as tomam difusa a vossa responsabilidade mas, no fundo, a questão é a mesma: não estão interessados, nem um pouco, em deixar de poder controlar a televisão. E esta é a grande questão!
Por que não se discute aqui, Sr. Secretário de Estado, o modelo, se deve ser o de empresa pública ou o de sociedade anónima? Poderíamos até admitir que a sociedade anónima fosse o melhor modelo. Vamos partir desse princípio. Mas é ou não possível, nesse quadro, integrar aspectos que constam do projecto do PS, que me parecem benéficos, ou seja, que não fazem depender a nomeação dos gestores integralmente do poder político governamental?
VV. Ex.as encaram a televisão como uma fábrica de sabões ou de salsichas e, por isso, esqueceram-se de, nos estatutos, prever sequer os mecanismos relativos ao aspecto essencial, que é o da informação. É que nos estatutos da empresa esqueceram-se que esta era, essencialmente, uma empresa de informação. Esse aspecto está omisso, pelo que estes vossos estatutos tanto servem para uma fábrica de salsichas, de sabões ou de cimentos como para a empresa pública RTP.
Dizia há dias o Sr. Ministro, que pouco aqui aparece - é dos Assuntos Parlamentares mas não se nota muito-, ...

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Está a fazer versos!

Risos.

O Orador: -... num meeting realizado por uma fundação próxima do seu partido, que era preciso emendar a mão, relativamente à experiência de certos modelos que tinham caído. Digo-lhe, Sr. Ministro Dias Loureiro, uma vez que está hoje aqui connosco, que com esta proposta os senhores assumem integralmente os modelos que vigoravam nos países em que as sociedades se voltaram contra os regimes que estavam implantados contra a vontade dessas sociedades. O vosso modelo é exactamente o mesmo. E querem ver porquê? Porque querem mascarar ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, já excedeu o tempo de que dispunha.

O Orador: - Estou a terminar, Sr. Presidente. Só necessito de mais trinta segundos.

O Sr. Presidente: - Tenho receio que, a ver tanta coisa, não consiga terminar em trinta segundos.

O Orador: - Como dizia, querem mascarar o aspecto de participação social com uma mistificação. Li o vosso artigo 20.º, onde se prevê a existência de um conselho consultivo, e julgo que ele tem uma composição excelente - poder-se-ia fazer melhor, mas esta composição já é boa. O mesmo já não posso dizer das suas competências, previstas no artigo 21.º, segundo as quais o conselho consultivo aprecia os planos de actividade e o orçamento - uma empresa de salsichas também o faz; aprecia o relatório de contas - uma empresa de cimentos também; elege o presidente, o que é normal; elabora relatórios de actividade, o que também é normal, e pronuncia-se sobre quaisquer assuntos que o conselho de administração entenda submeter-lhe. Ou seja, este conselho consultivo é um joguete nas mãos do conselho de administração, pois só aprecia o que este quiser que aprecie!
Virem-nos dizer que isto é abrir a televisão à sociedade civil, que é permitir à sociedade civil que intervenha, que é permitir a desgovernamentalização da televisão, Sr. Secretário de Estado, haja algum decoro no que se diz! Assumam, pelo menos, o facto de que querem ter uma televisão pública, em que possam mandar. Mas digam-no claramente! Não venham é mascarar esse facto com formas que são inaceitáveis!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Secretário de Estado, não vou comentar a natureza do seu discurso, porque disponho de pouco tempo para o fazer e não vale a pena - se me permite, e isto apenas relativamente ao discurso que não ao autor - «gastar cera com ruins defuntos».
A questão é simplesmente que o seu discurso foi, verdadeiramente, uma tentativa para disfarçar aquilo que está na base desta proposta de lei do Governo, que, curiosamente, pretende resolver dois objectivos contraditórios.
O primeiro é o complexo do Governo e do PSD em assumirem a natureza pública do serviço de televisão. Ora, sucede que é isso mesmo o que está em causa. É que há, nos termos da Constituição da República, um serviço público de televisão e de rádio que, como tal, tem de ser encarado, preservado e defendido. Mas esse é o vosso complexo!
O segundo tem a ver com o facto de a vossa proposta acabar por ser a mais estatizante das propostas que neste momento estão em debate. Isto porque, ao definir uma sociedade de capitais públicos, exclusivamente públicos, acaba
apenas por admitir, em tese (que não já concretizado), a possibilidade de, amanhã, outros organismos públicos poderem vir a ter participação no aumento de capital desta sociedade que vai gerir o serviço público de televisão.
O que está em causa é, pois, que o Governo imagina não ter capacidade para amanhã, em confronto com outros gestores privados de televisão, decidir, autonomamente, aumentos de capital para o serviço público de televisão. E para, eventualmente, não ficar onerado com a crítica que então lhe possa ser feita vai devolver a responsabilidade dos aumentos de capital para um nível exterior ao Conselho