O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

17 DE MARÇO DE 1994 1641

Quando será que Governo e PSD lhe seguem o exemplo? Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este debate é uma boa oportunidade para debater a deplorável história recente da radiodifusão, em Portugal, e a forma como o Governo PSD, por acção e por omissão, permitiu que o processo de concentração da propriedade dos órgãos de comunicação social aplicado às rádios tenha conduzido à destruição da maior parte das rádios locais e à instauração de uma selva radiofónica que não conhece leis nem limites.
A morte das rádios locais já foi anunciada na imprensa como um facto em vias de consumação. Várias causas têm sido apontadas para esse facto e podemos, hoje, discuti-las.
Porém, há uma causa evidente para a situação lamentável a que, hoje, se assiste e que conhece, todos os dias, novos desenvolvimentos. Essa causa é a política do Governo para a comunicação social e, em particular, para a radiodifusão. A morte das rádios locais tem sido um objectivo prosseguido pelo Governo.
Todas as medidas tomadas pelo Governo em relação à actividade de radiodifusão e todas as medidas que o Governo se tem abstido de tomar, no sentido de fiscalizar a legalidade das situações existentes, corporizam uma actuação governamental marcada pela, arbitrariedade, pelo clientelismo e pelo objectivo de permitir aos grupos monopolistas que se movem no domínio da comunicação social destruir o movimento das rádios locais e substituí-lo por um amontoado de estações radiofónicas transformadas em meros postos de retransmissão.
Merece a pena rememorar os passos mais significativos deste processo.
A situação radiofónica que se vivia em Portugal, em 1987, era marcada pelo aparecimento recente do chamado movimento das «rádios piratas». Na ausência de uma legislação enquadradora da actividade de radiodifusão local e regional, centenas de rádios locais fizeram o seu aparecimento, criando um facto sem precedentes na história da comunicação social em Portugal.
As comunidades locais passaram a ter voz na rádio. A radiodifusão tornou-se um veículo de comunicação, de debate e de conhecimento mútuo entre as pessoas. A rádio aproximou-se dos cidadãos. As formas de comunicação através da rádio diversificaram-se, A actividade de radiodifusão tornou-se também uma expressão de livre associativismo.
É público e notório que entre as centenas de rádios locais que então apareceram coexistiram boas e más rádios. Rádios com e sem condições técnicas adequadas. Rádios com profissionais e rádios assentes exclusivamente em projectos lúdicos. No entanto, o aparecimento das rádios locais veio enriquecer globalmente o panorama da comunicação social em Portugal, pela diversidade de comunicação que introduziu, pela dinamização das comunidades locais que propiciou, pelo pluralismo que veiculou e por uma nova geração de profissionais de rádios que veio a gerar.
Evidentemente que se impunha uma regulamentação da actividade de radiodifusão. Evidentemente que fazia todo o sentido impor condições de viabilidade e de idoneidade técnica aos projectos de radiodifusão e disciplinar o espectro radiofónico.
No entanto, desde o controverso processo de licenciamento das frequências de rádio locais que se verificou que não foram esses os objectivos visados pelo Governo. A primeira medida do Governo foi proibir todas as rádios locais até que o processo de atribuição de alvarás ficasse concluído. A segunda medida foi a conclusão desse processo com uma atribuição de alvarás, marcada pela arbitrariedade e pela satisfação do clientelismo político, com prejuízo de muitos projectos sérios e idóneos.
O resultado está hoje bem à vista. Desde recursos de impugnação da atribuição de alvarás, julgados procedentes pêlos tribunais administrativos, até rádios que foram licenciadas e nunca emitiram.
A atribuição de frequências regionais seguiu o mesmo processo. A frequência regional de Lisboa foi atribuída a uma rádio de audiência ínfima, mas cujo proprietário fazia parte do júri. Nunca criou até hoje os emissores regionais de que era suposto dispor, limitando-se a alugá-los à RDP, e está hoje transformada em mera retransmissora de uma rádio nacional que pertence ao mesmo proprietário. A rádio que obteve a frequência regional do Porto foi, entretanto, absorvida por uma rádio local que havia perdido o concurso para atribuição da frequência regional de Lisboa.
A situação que hoje se vive é, assim, confrangedora. Dos 310 alvarás atribuídos em 1987, nem um terço está a cumprir o estatuto editorial a que se comprometeu; das 11 rádios que obtiveram alvarás em Lisboa e Porto, apenas três existem hoje nessa qualidade.
As responsabilidades do Governo neste estado de coisas não podem ser iludidas. O Governo tem pactuado e mesmo incentivado o total espezinhamento da legislação quê ele próprio aprovou. Se não, vejamos: dispõe o Decreto-Lei n.° 388/88, de 28 de Setembro, que «cada pessoa colectiva só poderá deter participação numa outra empresa de radiodifusão, não podendo essa participação exceder 30 % do respectivo capital» e ainda que «cada pessoa singular apenas poderá ser titular de capital ou exercer funções de administração numa única empresa de radiodifusão». Não faltam exemplos de incumprimento chocante destas disposições legais.
O Governo Regional da Madeira atribuiu um subsídio de 14 400 contos à empresa «Ramos, Marques e Vasconcelos», de que é sócio o conhecido dirigente do PSD Jaime Ramos, por conta de quatro rádios de que esta empresa dispõe na Região Autónoma da Madeira (Rádio Palmeira, Rádio Zarco, Rádio Sol e Rádio Brava), cabendo, assim, a cada uma destas rádios o dobro do subsídio que coube a qualquer uma das outras rádios existentes na Região.
São conhecidos e publicitados casos de rádios locais de Lisboa que anunciam as frequências em que transmitem no Porto, em Coimbra, no Alentejo e no Algarve; rádios do Porto que transmitem em Coimbra e em Viseu; rádios da Amadora que transmitem também no Porto e no Algarve; e rádios de Loures que transmitem também no Alentejo.
Por outro lado, são conhecidas rádios que aparecem de novo, controladas por outras rádios, destinadas a determinados sectores do público e o caso de uma seita religiosa que dispõe, pelo menos, de três rádios e de tempo de emissão em mais 17.
Por isso, pergunto: perante esta situação, que é publicamente conhecida, o que fez o Governo até ao momento para assegurar o cumprimento do disposto do Decreto-Lei n.° 388/88, de 28 de Setembro? A resposta é simples: nada!
O que não espanta quando se sabe que foi o próprio Governo que optou por vender a Rádio Comercial em OPV, sabendo perfeitamente que o comprador já controla-

Páginas Relacionadas
Página 1632:
1632 I SÉRIE - NÚMERO 49 (...) ciente, tanto mais quando sabemos que, em Portugal, 35 % das
Pág.Página 1632
Página 1633:
17 DE MARÇO DE 1994 1633 (...) metrias internas, a dispersão de grande parte do seu territó
Pág.Página 1633