2572 I SÉRIE - NÚMERO 79
campanha e chegámos às eleições convencidos de que já tínhamos conseguimos muito.
Hoje, todos falam na participação popular da construção europeia, em referendo, todos querem mais esclarecimento e menos secretismo. Mas, há uns anos atrás, era impossível ver o que vemos agora: um ministro anunciar na televisão o modo como vai defender os interesses de Portugal no momento em que estão ameaçados! Até aqui nada se explicava, até aqui nada se discutia.
O Sr. José Magalhães (PS): - Milagre do CDS!
O Orador: - Recuperámos a força do partido e a alegria dos militantes. Por entre adversidades da campanha (porque as adversidades não foram só do passado), jogámos com a nossa equipa, mas havia também uma equipa a jogar com os nossos dispensados, a ponto de se ter criado uma névoa favorável a um dos partidos, que foi a de ficar sem saber se teria perdido por mais do que parece e a ponto de se ficar também sem se saber se ainda teremos os nossos votos repartidos por outros lados. Sofremos a agressividade e a difamação, mas disso já se falou muito. E valeria a pena, talvez, que os que se queixam dos insultos e da agressão fizessem um balanço sério e veríamos então quem foi o mais atingido e o mais prejudicado.
Disseram-nos que não tínhamos família europeia, mas quem nos dizia isso eram justamente aqueles que durante 20 anos afirmaram desprezar as famílias europeias e não precisar de nenhum apoio internacional; disseram, lembrando outros, que o que interessava era o que se passava em Portugal. E, hoje, têm uma porta aberta, única e exclusivamente, pela sua força que é o mais efémero dos cimentes políticos, é o mais ligeiro dos laços políticos na Europa.
Choraram outros, também, por um velho CDS - os nossos adversários. Não eram saudades das ideias passadas, nem dos nossos líderes antigos, nem de princípios porventura esquecidos. Tinham saudade de um «CDS de bolso» - assim considerado por eles - absorvível e retráctil, a usar em caso de emergência. Mas esse tempo chegou ao fim.
Esta é a primeira conclusão que tiramos: é que o tempo em que o CDS representava apenas algum eleitorado de direita, disposto a integrar-se nas votações maciças do PSD ao mínimo sinal de protecção de estabilidade, ou ao mínimo sinal de autoridade ou de discurso carismático, esse tempo chegou ao fim. E isso vê-se, curiosamente, no desespero daqueles dirigentes que, ao comentarem as eleições, começaram por elogiar o Partido Socialista por ser um partido europeísta. Os dirigentes do PSD, que passaram a campanha a dizer que o PS era um partido irresponsável, que o secretário-geral do PS era um político irresponsável e porventura conluiado com os especuladores, por desespero para com o resultado do CDS, têm o desplante de comentar os resultados elogiando o PS como um pilar da democracia e da construção europeia!
Esse tempo mudou, esse tempo acabou. Curiosamente os resultados das eleições mostram que a alternativa é à direita. Os votos da direita são mais do que os votos da esquerda, o que significa que é possível dizer que o eleitorado quer algumas mudanças, mas não quer que essas mudanças signifiquem substituir o que está por uma qualquer governação sozinha ou acompanhada do lado esquerdo desta bancada. Ver-se-á, então, como é que aqueles que passaram já as duas últimas eleições a dizer que sem eles não haveria estabilidade vão entender a estabilidade para o futuro. Ver-se-á como é que vão olhar quais são as verdadeiras alternativas ao Governo, ou quais são as verdadeiras possibilidades de Governo.
O segundo aspecto que quero referir está relacionado com a abstenção. Esta foi imputada a tudo e a todos, mas foi por muitos imputada à classe política, e entendo que esta se defendeu mal dessa imputação. O que é que se pode apontar à classe política como responsabilidade da abstenção? Foram os candidatos? Seria bom que os partidos reconhecessem que os candidatos que se defrontaram nestas eleições eram dignos, preparados, sérios e que se sujeitaram a testes e avaliações como quase nenhum outro político em Portugal já se sujeitou algum dia.
Mas porque é que a campanha ou os políticos provocaram a abstenção? Foi a agressividade? Concordo com o Dr. Almeida Santos, mas o debate político pode alguma vez ser um debate morno?!
Foi o discurso hermético? Mas é alguma vez possível discutir questões de construção europeia sem alguma preocupação técnica, sem algum rigor nos termos, sem algum cuidado nas expressões?!
Então, porquê assumir a classe política que a abstenção exige uma reacção dos políticos, como quer o Partido Socialista? Porquê falar imediatamente da reforma do sistema político com as propostas que o PS reeditou?
Não respondemos às propostas de reforma do Partido Socialista, pois já tínhamos feito o essencial dessas propostas perante o silêncio desta Câmara, perante o silêncio que significava dispensabilidade do Partido Socialista.
Querem o referendo? Querem a proximidade dos políticos aos eleitores? Pois também queremos há muito tempo. Sejam bem-vindos ao grupo dos que querem o referendo, dos que querem o aproximar dos políticos aos eleitores. Só não queremos o que é, por razões de inedetismo, absolutamente inaceitável. Não, Sr. Deputado Almeida Santos, não queremos discutir aqui projectos legislativos formulados pelo povo, não queremos também que os Deputados passem para as galerias e que os cidadãos se sentem no Hemiciclo...
Vozes do PS: - Porquê?!
O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, só há uma coisa pior do que os políticos culpados: são os políticos contritos sem razão para isso. O que é se resolveria com a reforma do sistema político que propõe o PS, que de algum modo tenha a ver com a abstenção que estas eleições provocaram.
Porquê esconder as responsabilidades pessoais que nenhuma reforma transformará? Porquê ignorar o efeito perverso dos insultos (e valha a verdade que foram muitos)? Porquê esconder a importância da incoerência e as mudanças de discurso? Porquê esconder as intrigas partidárias e esconder a dramatização repetida com a ameaça de estabilidade? Porquê esconder uma invocação pacóvia das experiências das alcatifas europeias, que confirmam que alguns pensam que a Europa é só para iniciados? Porquê esconder as acusações sobre a especulação do escudo e esquecer que um Primeiro-Ministro disse que não é possível falar em Estado em Portugal por ser possível que algum jornalista traduza essa expressão por golpe de Estado? Porquê não aceitar que nada disto se resolve, nada destes aspectos da vida dos políticos se resolve com qualquer reforma, com qualquer proximidade dos eleitores, a não ser para que eles oiçam as coisas melhor?
Porquê não aceitar, enfim, que a reforma do sistema político é apenas mais uma coisa que já se pede há muito tempo, que não é imposta à força, nem sequer pela abstenção? Porquê não perceber, também, que é preciso falar de igual modo da reforma da Europa e das suas institui-