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5 DE NOVEMBRO DE 1994 291

- Bem... deixa-me ver então de quanto posso dispor para a despesa do almoço.
- Isso também não é permitido, atalha o criado, porque seria restringir a liberdade do 'técnico' e V. Ex.ª compreende que é dessa liberdade de acção que depende a honra da casa!»
Sr. Presidente e Srs. Deputados, é esta a questão que temos, presentemente, em discussão.
Concretamente, o que é que o Governo nos propõe? Restringir substancialmente o Mapa III do Orçamento do Estado, isto é, a classificação funcional, que é uma das classificações que o Governo não pode alterar sem a autorização da Assembleia da República.
Vou, então, dar um exemplo concreto, tendo em vista a tal lista e aquilo que uca para o cozinheiro e só para ele. Por exemplo, nas funções económicas passa a aparecer só «transportes e comunicações». Mas, de facto, a classificação funcional não abrange apenas «transportes e comunicações». Vou dar um exemplo do Orçamento do Estado para 1995, que está, neste momento, a ser estudado pela Assembleia. Para esta rubrica «transportes e comunicações» estão dotados 197 milhões de contos e o Governo pretende que aprovemos só isso! Porém, desses 197 milhões de contos - e vou apenas referir as verbas mais elevadas - sabemos que o Governo propõe que sejam 110 milhões de contos para os transportes rodoviários; 62 milhões de contos para os transportes ferroviários; 6 milhões de contos para os transportes aéreos e 10 milhões de contos para os transportes marítimos e fluviais.
Se este decreto não for ratificado, o que é isso significa? Significa que os Deputados ficarão com a ideia de que será isto. Mas, como só aprovam os 197 milhões de contos e, dentro dessa verba, o Governo pode fazer todas as alterações sem pedir a autorização da Assembleia, o Governo pode, decorridos meia dúzia de dias após a aprovação do Orçamento, alterar radicalmente isto e, por exemplo, em vez de dar 6 milhões de contos aos transportes aéreos, dá-lhes 110 milhões de contos e 6 milhões de contos aos transportes rodoviários.
É isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que está em causa. Peço desculpa por ter utilizado tanto tempo, mas julgo que não foi mal gasto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Louvo-me antecipadamente, Sr. Deputado Rui Carp, na lição de finanças públicas que apresentará.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Não perde pela demora!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, tinha pensado encarar esta intervenção em duas ópticas: a da transparência, que, de algum modo, já foi claramente enunciada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, com cujas palavras me solidarizo, e a do controlo da informação. É que este não é um caso único, nos últimos tempos, relativamente ao controlo da informação. Se VV. Ex.ªs me permitissem, gostaria de dizer que vivemos, actualmente, uma situação em que à demagogia das palavras começa a somar-se a demagogia dos números.
Com efeito, é preocupante a verificação de que o Governo já vai mais longe no seu controlo da informação e pretende, através de artifícios de mudança, em meio de ciclo, dos métodos de apuramento das realidades económicas, desenhar e ajustar essas realidades económicas ao seu próprio desejo e às suas próprias expectativas. Um exemplo é o que se passou recentemente no Banco de Portugal, onde, para evitar a informação credível e isenta que este organismo dava sobre a situação económica nacional, se desceu ao despautério de provocar a demissão do presidente do Gabinete de Estudos do Banco de Portugal.

O Sr. Rui Carp (PSD): - O que é que isso tem a ver com a classificação funcional?

O Orador: - Temos um foco de informação perfeitamente neutralizado, mas o Governo ainda não está satisfeito com essa neutralização. Aliás, toda esta intervenção é perfeitamente lógica, sobretudo quando sabemos, através da comunicação social, que um dos principais responsáveis do Banco de Portugal foi recentemente nomeado para participar na elaboração do programa do Governo que o PSD apresentará às eleições de 1995 e sobretudo quando ouvimos um alto responsável da Administração Pública, um alto responsável do Governo, o Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, qualificar o Banco de Portugal como uma mera empresa pública.
Ora, a meu ver, não é por acaso, Sr. Presidente e Srs. Deputados - e, nomeadamente, Sr. Deputado Rui Carp, que se interrogava a propósito da justeza desta introdução - , que esta alteração surge exactamente em ano eleitoral. Como, aliás, não foi por acaso que serviram, e estão a servir, ao Governo, em ano eleitoral, as alterações que o INE fez - e muito bem - relativamente ao cálculo do Produto Interno Bruto (PIB) e que têm permitido ao Governo - como teremos oportunidade de verificar, quando entrarmos na discussão do Orçamento do Estado para 1995 - manipular e jogar com as relações entre várias grandezas económicas e o PDS a seu bel-prazer e segundo a sua utilidade e interesse.
Portanto, estamos aqui claramente, pela oportunidade em que esta iniciativa surge, no domínio de um certo controlo da informação. Atrevia-me a sugerir ao Governo, aqui representado pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que, se não é assim, se disponibilizasse, por exemplo, para apresentar, em termos de Orçamento do Estado para 1995, o Mapa III, construído exactamente com a mesma lógica da classificação funcional que existia em 1994, pois, isso sim, seria uma prova de isenção e de alguma neutralidade política, na medida em que permitiria fazer comparações entre 1995 e 1994. V. Ex.ª seguramente reconhecerá que, com a proposta, inserta no Orçamento do Estado para 1995, do Mapa m da classificação funcional, se torna de todo em todo impossível fazer qualquer tipo de comparação com a proposta feita e aprovada no Orçamento do Estado para 1994.
Assim, como dizia, independentemente do juízo técnico que possa fazer-se relativamente a esta alteração, há um juízo político, que faço desde já, que é o da sua inoportunidade, uma vez que estamos a meio de um ciclo e não é nesta altura que se procede a alterações desta natureza.
Depois, há a questão da transparência. Não se trata de algo meramente quantitativo, mas é óbvio que os Deputados tinham o poder de se pronunciar e de apurar nove categorias diferentes de despesa - aliás, subdivididas em 48 subcategorias. Ora, com a proposta que o Governo aqui nos traz, apenas nos poderemos pronunciar sobre quatro categorias subdivididas em 19 categorias. Há aqui manifestamente um espaço de redução da capacidade de interven-