2362 I SÉRIE - NÚMERO 72
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Antes que seja tarde, antes que se multipliquem os casos de «acção directa», como no Carregado, onde um delinquente assaltante foi morto às mãos de alguns habitantes de um bairro, mostrando que é preciso dar aos cidadãos a certeza de que os mecanismos adequados estão em funcionamento, e que ele cidadão não está numa selva, isolado e abandonado.
Os conselhos realizam aqui uma função determinante, que é uma função de aproximação entre as funções policiais, os conselhos de segurança e os cidadãos e que é o oposto da filosofia que o Ministério da Administração Interna tem imprimido à política de segurança interna.
Enquanto o Ministério da Administração Interna privilegia a vertente repressiva, o grande aparato policial e as exibições de força, os conselhos baseiam-se numa lógica de desenvolvimento do conhecimento mútuo entre as polícias e as comunidades locais; baseiam-se numa filosofia de prevenção, que é rigorosamente a única que, de forma duradoura e consistente, cria um clima de tranquilidade; baseiam-se no estabelecimento de uma relação de confiança entre o profissional da polícia e o cidadão que só é possível quando são preenchidos os dois termos da seguinte equação: por um lado, o agente deve sentir que é ele mesmo um cidadão, que serve uma comunidade de cidadãos, e, por outro, o cidadão deve poder ver na política de segurança uma questão que lhe diz respeito e em que ele pode participar através das adequadas instituições locais.
A política das superesquadras é o oposto disto tudo. Ela é fruto simultaneamente das concepções que continuam a marcar fortemente as forças de segurança em Portugal, concepções de matriz militarista, facto a que não é alheia a circunstância de os altos comandos das forças de segurança serem militares, sem adequada formação para as especificidades das funções de segurança interna em regime democrático; mas, por outro lado, essa concepção é determinantemente fruto do vazo repressor que os Governos do PSD (e não só!) imprimiram às polícias, de que são exemplos lamentáveis cenas como as da Ponte sobre o Tejo, da Manuel Pereira Roldão ou das cargas sobre estudantes à porta da Assembleia da República. A concentração de meios policiais, com o encerramento das esquadras de bairro, constituiu um dos maiores erros que puderam ser cometidos contra a segurança dos cidadãos.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Os protestos populares, as petições e manifestações, as posições das autarquias, os casos relatados pela imprensa de todos os quadrantes deixam hoje sem margem para dúvidas a noção de que esta reforma de Dias Loureiro foi um rotundo fracasso, cujas consequências caiem sobre os cidadãos.
Devo chamar a atenção do Sr. Presidente e dos Srs Deputados para o projecto de lei n.º 533/VI, do PCP, que propõe a aprovação pela Assembleia da República das Grandes Opções da Política de Segurança Interna, bem como de algumas medidas de carácter imediato, designadamente a suspensão urgente do encerramento das esquadras e do processo de retirada da PSP de povoações e a transferência de parte dos efectivos das forças de intervenção para missões correntes de polícia, que é onde esses agentes são efectivamente necessários.
As opções propostas pelo PCP abrangem a área da distribuição de esquadras e postos (que deve ser feita por forma a assegurar a desejável proximidade dos cidadãos); a área da distribuição das forças de segurança (a PSP deve cobrir todas as zonas urbanas e não só as grandes); a área dos recursos financeiros; a área do ensino e conduta dos agentes (com a aprovação de um código deontológico); a área dos recursos humanos (garantindo o patrulhamento adequado e afectando os agentes a missões policiais). É preciso acabar com o escândalo das diligências judiciais que ocupam milhares e milhares de horas de trabalho das forças de segurança, quando deveria ser o Ministério da Justiça a dotar o aparelho de apoio dos tribunais dos meios humanos necessários à concretização dessas diligências, que não são uma função de segurança.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Neste plano dos recursos humanos e das funções que não cabem às forças policiais ou podem ser exercidas com vantagem por outras entidades impõe-se aqui referir as funções de fiscalização do cumprimento dos regulamentos municipais e as funções de fiscalização de certos aspectos do trânsito urbano, incluindo o estacionamento. São funções que, em vez de serem exercidas pelas forças de segurança, podem e devem ser exercidas pelas «polícias» municipais, no sentido de órgãos municipais com funções de polícia administrativa. A Assembleia da República já aprovou a lei que cria esses órgãos, os serviços municipais de polícia. São o tipo de funções que devem ser exercidas no âmbito municipal. Mas, a nossa opinião é e continua a ser contrária a que as Câmaras possam dispor de polícias municipais que sejam forças de segurança em sentido próprio, nem centramos nessa questão o debate sobre a política de segurança interna.
Pensamos que quem o faz acaba por desresponsabilizar o Governo pela situação que se vive. Como se o mal fosse o facto de não termos 305 chefes de polícia, um por cada presidente da câmara, e não o facto, esse sim real, de o Governo conduzir uma política errada. A Constituição reserva as funções de polícia para organizações únicas para todo o território nacional. Isso tem a ver, designadamente, com a necessidade de o controlo jurisdicional pelo Ministério Público, com a definição do estatuto dos respectivos agentes, numa zona onde estão em questão os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. Por outro lado, as exigências técnicas da matéria de segurança pública, precisamente nas áreas onde elas mais se fazem sentir (nas grandes áreas metropolitanas), são totalmente incompatíveis com os limites da área municipal. Imaginam-se as situações que se poderiam gerar pelo facto de essas áreas metropolitanas terem zonas contínuas urbanas, divididas artificialmente pelos limites concelhios, quando a polícia do presidente x visse os criminosos a escaparem-se pelo território do presidente y!
O País não precisa de ser enxameado por mini-polícias ao serviço de capelinhas camarárias, com toda a conflitualidade local que uma situação como essa iria acarretar. Nem as autarquias precisam de assumir responsabilidades para que não têm vocação nem novos encargos para os quais não dispõem dos recursos suficientes.
O País precisa, sim, que a polícia existente seja usada em funções de prevenção e dissuasão, em vez de estar acantonada em corpos de intervenção ou em vez de andar a fazer diligências por conta dos tribunais que não lhe cabe fazer ou em vez de andar a fazer segurança a tudo o quanto é «bicho careta». Em vez de superesqua-