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1992 1 SÉRIE - NÚMERO 62

desconhecer a larga medida em que se federou já. A cidadania europeia; o Parlamento Europeu, eleito e representativo dos cidadãos eleitores de todo o espaço comunitário; um Comissariado não representativo dos Estados-membros; decisões por simples maioria em número crescente; o primado das normas jurídicas da União Europeia sobre os normativos nacionais; políticas já comuns e a expectativa de outras; a previsão de um sistema de segurança comum; a convenção de um sistema monetário integrado e de uma moeda única. Iludamo-nos, se isso nos conforta. Mas não neguemos que a terra se move.
De resto, um pouco de familiaridade com a evolução das coisas, convence-nos de que o espírito federador que parece presidir aos destinos da Europa, tende a assenhorear-se do futuro do Mundo.
Nem tudo, nisso, serão rosas. Não tenho a menor dúvida a esse respeito. Não o serão, sobretudo, para um país de que só a História é grande, e mal preparado para a era da livre competição de todos com todos. Mas mais dolorosos seriam os espinhos se, tudo tendo em qualquer caso de ser assim, tivéssemos de enfrentar o futuro desenquadrados do espaço geográfico, civilizacional e político em que nos integramos.
Por graça de Abril, passámos de orgulhosamente sós a solidariamente acompanhados.
No dia de hoje, é justo que nos lembremos de que este mesmo conforto só foi possível porque aconteceu Abril.
Uma das artes que cultivamos com esmero é a de cuidar do acessório, descuidando por vezes o principal. Depois de termos arredondado o Mundo, descansámos. Ensarilhámos as armas do nosso estrutural universalismo e demos em preocupar-nos com coisas mais miúdas. O nosso empenhamento na construção da União Europeia foi talvez o primeiro regresso a um sentido de grandeza.
Temos, no torno, mais uma revisão da Constituição. Verifico, com satisfação, que vai marcar presença nela a preocupação de ultrapassar inveteradas rotinas. Acontece isso, nomeadamente, com aflorações de medidas de abertura à participação cívica dos cidadãos e a formas arrojadas de descentralização e partilha do poder. Medidas que, precisamente, dispensam a rebelião cívica difusa que tende à conquista das correspondentes prerrogativas.
Saúdo o espírito prospectivo que as anima. E exorto os arquitectos do futuro a seguirem por aí, libertando-se de fantasmas de pensamento, de comportamento e de espírito. Sempre sem esquecer, como decorre, a outra vertente dos novos pontos de equilíbrio político-social: a salvaguarda da autoridade necessária para que a liberdade não corra o risco de matar a liberdade. Após Abril, em plena fase de improvisação jurídico-constitucional, e de experimentalismo anarco-populista, estivemos à beira de nisso consentir. Foram tempos terrivelmente difíceis. Que as dificuldades então experimentadas e ultrapassadas sirvam de estágio para enfrentar as de agora, e sobretudo as que, reforçadas, nos reserva o futuro.
Tudo isto para significar que, para mim, o principal é uma boa revisão da Constituição que, salvaguardando o essencial do mais puro. espírito de Abril, o compagine com as exigências indeclináveis de um Mundo novo e diferente como é o de hoje e será o de amanhã.
Em face disso, tudo o mais parece acessório. Mesmo quando, a outro nível, pode parecer principal. Uma revisão que actualize Abril - ou seja a Liberdade, a Justiça Social, a Democracia e o Estado de Direito - há-de ter, entre outros méritos, o de salvaguardar o respeito devido à própria Constituição, antes e depois de revista. Antes porque ainda o não foi. Depois por tê-lo sido, reaproximando-se do novo ponto em que se situa a vida.
O que não podemos é dispensar-nos de cumpri-la porque ainda não foi revista, na perspectiva de que em determinado aspecto possa vir a sê-lo. Nem deixar de revê-la, onde se justificar que seja revista, fundados no facto de termos, antes da revisão; acabado de cumpri-la.
A vida é movimento. As constituições devem acompanhar a vida. Mas, enquanto não mudam, tudo se há-de passar como se a vida coubesse perfeita dentro delas.

Aplausos do PS.

Recordemos, pois, que Abril não foi apenas uma data mas o ponto de partida de uma caminhada. «Não um rasgo de que se repouse, mas um despertar de que se não descanse». Que Abril é, não um dia, mas todos os dias. Mais do que uma cronologia, uma vontade. A vontade de sermos livres num Mundo livre.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Vai usar da palavra, por direito próprio, o Sr. Presidente da República.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente da República (Jorge Sampaio): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Sr. Presidente do Tribunal Constitucional, Srs. Presidentes dos demais Tribunais Superiores, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Embaixadores e demais Representantes Diplomáticos, Ex.mo Representante do Sr. Cardeal Patriarca de Lisboa, Eminência, Altas Autoridades Civis e Militares, Srs. Oficiais que integraram o Movimento das Forças Armadas, a quem respeitosamente saúdo, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Quero, em primeiro lugar, saudar os militares - oficiais, sargentos, e praças - que prepararam e participaram no Movimento das Forças Armadas do dia 25 de Abril de 1974.

Aplausos do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes.

Eles gravaram uma página da História de Portugal.
Ao garantirem a liberdade e a democracia, puseram fim a um regime ditatorial, caracterizado pela opressão das polícias políticas, pela ausência de um estado de direito democrático, pela violação persistente de direitos fundamentais e pela recusa do direito à autodeterminação dos povos.
Hoje, é já muito grande o número daqueles que, felizmente, não viveram sob a ditadura. E a esses, sobretudo, que importa relembrar o exemplo desses homens que, mal equipados e em número reduzido, tiveram a coragem de arriscar tudo em nome da Liberdade. 
Mas, devo lembrar aqui, também, todos aqueles que sofreram e lutaram durante décadas para que um dia como o do 25 de Abril fosse possível. Mulheres e homens de várias gerações, de diversas ideologias e de todos os grupos sociais, mantiveram, desde 1926, uma tradição de luta e de resistência.

Aplausos do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes.

A ditadura militar, primeiro, e o Estado Novo, depois, em nenhum momento se puderam vangloriar de ter eliminado a resistência, de ter morto a esperança.