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1488 I SÉRIE - NÚMERO 42

terrupção voluntária da gravidez e a mudança que resultaria da aprovação dos diferentes projectos de lei com os quais esta Câmara é agora confrontada, entre estes o da Juventude Socialista.
O debate sobre o aborto, no momento e nas circunstâncias legais e sociais em que, o travamos, pode ser reduzido a termos simples: ou reconhecemos a realidade e dispomo-nos a agir sobre ela, com o instrumento que a Constituição nos concede - a lei -, sem fintarmos as nossas responsabilidades, ou tomamos parte na farsa de quem, com a alma apaziguada pela existência de uma lei inútil e rejeitada pela sociedade, despreza as angústias e os dramas de milhares de mulheres e homens, inseridos na realidade concreta das suas vidas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Se optarmos por fingir que a interrupção voluntária da gravidez é, em Portugal, regulada por uma lei, que é aceite pela sociedade, generalizadamente respeitada, verdadeiramente ordenadora das condutas individuais e definidora de um dever ser reconhecido pela consciência social, então não faremos mais do que, hipocritamente, fechar os olhos à realidade da liberalização selvagem do aborto, sem regras, sem prazos, sem garantias médico-sanitárias, sem segurança e sem dignidade.

Aplausos do PS, do PCP e de Os Verdes.

Com o nosso silêncio e a nossa passividade não salvaremos uma vida, não evitaremos um aborto, mas seremos cúmplices da realidade trágica do aborto clandestino, seremos nós, daqui desta Câmara, a condenar, por ano, milhares de mulheres à humilhação e ao risco.
Neste debate, fomos dos primeiros a escolher o nosso lugar: somos contra a hipocrisia.

Aplausos do PS, do PCP e de Os Verdes.

Recusamos voltar a cara aos 20 000 abortos ilegais que se realizam anualmente no nosso país.
Recusamos voltar a cara aos 300 000 abortos que se terão realizado desde 1984.
Recusamos voltar a cara ao desespero que esteve na sua origem e à solidão a que a lei e os poderes públicos votaram milhares de mulheres e de homens.
Recusamos voltar a cara à insignificância do número de condenações por aborto ilegal - seis por ano, em média, desde 1985 -, quando confrontados com os milhares de abortos realizados no circuito clandestino.
Recusamos confiscar a liberdade de consciência às pessoas e impor-lhes as nossas convicções morais, os nossos valores éticos, um credo oficial.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Todos somos contra o aborto. Todos estamos cientes de que o aborto é um acto desesperado, uma violência que a mulher comete sobre si própria e de que é a principal vítima.
Tivemos 13 anos para percebermos o que toda a Europa já compreendeu: nenhuma lei impedirá de abortar uma mulher determinada a fazê-lo. Para isso, a lei não serve, como a nossa actual lei não serviu; mas serve, isso sim, para provocar um grave problema de saúde pública como o é o aborto clandestino; serve para provocar a morte, ou, em qualquer caso, um penoso e gratuito sacrifício físico, psíquico e humano a milhares de mulheres portuguesas.
Resta-nos retirar da experiência dos outros os devidos ensinamentos, e acompanhar a Grã-Bretanha, os Estados Unidos, a França, a Itália, a Suécia, a Grécia, entre muitos outros países, nas medidas adequadas ao combate ao aborto clandestino, despenalizando a interrupção voluntária da gravidez, nas primeiras 12 semanas, e a livre pedido da mulher.

Aplausos do PS, do PCP e de Os Verdes.

Trata-se de salvaguardar o seu direito à saúde, à sua integridade moral, à sua dignidade social e a uma maternidade consciente e responsável.
Não podemos continuar a iludir a realidade, porque a nossa inércia é paga muito caro: no nosso país e nos termos da legislação em vigor, são realizadas cerca de 100 interrupções voluntárias da gravidez por ano, ou seja, 0,5% do total, enquanto o aborto continua a ser a segunda causa de morte materna.
A isto acresce a hipócrita discriminação económico-social subjacente à oposição às mudanças legislativas propostas pela Juventude Socialista:
É preciso assumir a verdade perante o País.
Hoje, as regras são simples e não vêm na lei: quem pode aborta em Londres ou em Espanha, ou é amigo de médico, em Portugal. A quem não pode - nomeadamente as mulheres mais jovens e as de menores recursos - oferece-mos-lhes como alternativa o circuito do aborto clandestino.
Somos todos cúmplices dessa alternativa.

Aplausos do PS, do PCP e de Os Verdes.

Sr.ªs e Srs. Deputados: Seguramente, alguns de vós terão conhecido de perto este drama e testemunhado a inevitável violação da lei.
Chega de hipocrisia. Chega de tragédias humanas gratuitas e evitáveis. Confiemos na consciência livre e no senso de equilíbrio da mulher para quem legislamos. Confiemos nas mulheres portuguesa. Conceda-mos-lhes o direito de assumirem uma decisão que a lei penal abusivamente lhes confiscou. Façamo-lo em nome da sua dignidade e do seu direito à saúde.
O julgamento, sempre difícil e doloroso, cabe à mulher. Deve ser exercido no respeito pelos limites legais e no quadro das suas convicções éticas, morais, filosóficas e, porque não, políticas e religiosas.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr.ªs e Srs. Deputados do PSD: O vosso partido tem defendido - contra a opinião da JS - que uma matéria com o melindre da que se reporta às regras da interrupção da gravidez deveria ser decidida em sede de referendo nacional.
Portanto, a votação que se seguirá a este debate tem para vós um significado diferente: se viabilizarem na generalidade o nosso projecto de lei, permitindo a continuação e o aprofundamento do processo legislativo, têm já a garantia de que o PS proporá a realização do referendo.
Com um referendo, nacional e vinculativo, transferirão para o povo português a responsabilidade de decidir o «sim» ou o anão» às alterações propostas à lei do aborto.
Limitaram-se, até aqui, a exigir o referendo. Ele está agora na vossa disponibilidade. Sereis vós a decidi-lo.

Aplausos do PS.