O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

3716 I SÉRIE - NÚMERO 100

República ter um mínimo de 180 e um máximo de 230 Deputados. É para nós a consecução de uma proposta que, ao longo do tempo, temos vindo a defender, como disse, e é, do meu ponto de vista, uma questão de muito profunda seriedade a maneira como encaramos a composição e o trabalho na Assembleia da República. Penso que é uma proposta positiva que toda a democracia portuguesa saudará.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos perante uma das alterações mais importantes e das mais prejudiciais à democracia daquelas que estão indiciadas nesta revisão da Constituição.
Reduzir o número de Deputados numa Assembleia como a nossa, actualmente com 230 Deputados, num país com 10 milhões .de habitantes, só pode ter um objectivo, que é a tentativa de, de uma forma artificial, levar à bipolarização ou à dualização da vida política.
O sonho do PS e do PSD, em última instância, é menos pluralismo na vida política e, particularmente, um Parlamento reduzido ao Bloco Central ou a pouco mais do que o Bloco Central.
Neste plano, creio que o PSD, naturalmente, tem uma responsabilidade, que é a responsabilidade, no fim de contas, de ser coerente com a sua própria proposta e o PS tem a responsabilidade de ter feito o que a direita queria e não ter o direito de estar distraído neste debate.

Aplausos do PCP.

Vozes do PCP: - Nem distraído, nem a fazer de conta que está!

O Orador: - Há neste plano uma questão que está, irrecusavelmente, colocada em cima da Mesa e não apenas por nós mas por constitucionalistas, como, por exemplo, Jorge Miranda ou Joaquim Gomes Canotilho, que é a de a redução do número de Deputados poder levar a uma crise de proporcionalidade e, em última instância, a ofender os limites materiais da revisão da Constituição. Aquilo que podemos ter nesta matéria é a transformação artificial, mediante um prémio de maiorias relativas em maiorias absolutas, no quadro de um projecto que se traduz, no fim de contas, na ideia de "agora governo eu", "agora governas tu", "agora governas tu mais eu", com a oposição afastada, ou quase afastada, do Parlamento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados. corresponde igualmente a uma ideia. À ideia de reduzir o número de Deputados corresponde a que em vez de o Parlamento constituir uma amostra reduzida do povo, tão perto quanto possível do povo, podemos ter aqui predominantemente profissionais da política, estreitamente ligados aos aparelhos partidários, onde aqueles que não tenham esta ligação também não tenham lugar no Parlamento. E isto corresponde, no fim de contas, a uma perspectiva de fortes concessões ao antiparlamentarismo; à ideia de que há Deputados a mais, quando sabemos perfeitamente que esta ideia, de que há Deputados a mais, ou a própria ideia parlamentar é, em última instância, de raiz claramente autoritária.. Aliás, esta proposta aparece
estreitamente ligada a uma outra, à proposta de alteração do sistema eleitoral, porque quer uma quer outra têm como objectivo, em última instância, afectar profundamente a proporcionalidade, a justiça, na transformação de votos em mandatos, e criar maiorias artificiais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E a ideia dos profissionais da política, das pessoas desligadas do povo, das pessoas que, no fim de contas, aparecem eventualmente eleitas por círculo uninominal tem raízes muito claras. Recordo-me, por exemplo, de uma carta do Conde de Abranhos, na pena de Eça de Queirós, dirigida aos eleitores de Freixo de Espada à Cinta, que passo a citar: "Um dia, meus amigos, irei visitar a vossa bela província do Minho, que eu apenas conheço incompletamente. Espero então, aos freixenses, apertar a vossa mão honrada, de verdadeiros liberais e de verdadeiros portugueses". E o secretário Zagalo, sempre solícito, dizia imediatamente: "Ora, é bem sabido que Freixo de Espada à Cinta não é no Minho, é em Trás-os-Montes (...)". E concluía: "Porém, este natural equívoco é a prova mais decisiva de que Alípio Abranhos foi eleito Deputado não por ter integrado um círculo mas pela simples evidência do seu formoso talento".
Ora bem, este tipo de propostas, que estão estreitamente ligadas, estão ligadas também a um outro tipo de comportamento: a ideia, aliás contraditória, de que se quer aproximar o Deputado do eleitor e ao mesmo tempo põe-se, muito mais eleitores a cargo de cada Deputado -
aspecto perfeitamente contraditório.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas também está ligado a um outro tipo de comportamentos políticos: afirma-se pretender valorizar o Deputado e ao mesmo tempo, nas eleições, quem aparece como candidato é o candidato a Primeiro-Ministro, com o Deputado completamente apagado. E os comportamentos são de tal ordem que até já temos, para as eleições autárquicas, um candidato. a presidente de câmara municipal a falar do concelho a partir do conhecimento adquirido da janela do avião nas viagens de Bruxelas para Lisboa - refiro-me, naturalmente, ao candidato do PS à Câmara Municipal de Almada.

O Sr. João Amaral (PCP): - É da aproximação à pista!

O Orador: - É o tipo de aproximação ao eleitor que em, última instância, se pretende.

O Sr. José Magalhães (PS): - O que é que isso tem a ver com o artigo 151.º?

O Orador: - Tem a ver, exactamente, com o artigo 151.º, Sr. Deputado José Magalhães, é exactamente isto. É que a ideia de aproximação do Deputado ao eleitor que o PS afirma defender não tem qualquer consistência prática. É contraditada quer pela redução do número de Deputados quer pela própria ideia dos comportamentos eleitorais que o PS tem.
Mas, a verdade, indiscutível, é que os círculos eleitorais mais pequenos, os círculos eleitorais castigados com a desertificação e a emigração, os círculos eleitorais com menos representação aqui, teriam ainda menos