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232 I SÉRIE - NÚMERO 6

A Oradora: - Arrefecido o fogacho de adolescente que fazia bramar o PS na oposição contra os desígnios do núcleo duro do PSD de criar um «Código Penal da Ponte», tiradas as boinas e todos os sinais meramente exteriores de contestação à política de direita, o PS adopta um discurso jurídico-penal, que criticou no passado, visando encobrir, através da intimidação, através de uma prevenção geral pura, de condenar, a indignação das populações relativamente a graves problemas sociais.
E se isto é grave, mais grave é que venham esconder esses objectivos sob ternos balidos de cordeiro, mais convincentes, como tem acontecido e aconteceu ultimamente, se a pele de que se reveste se apresentar aos olhos através de uma cara como autenticamente genuína.
É isso que o Governo e o PS fazem, pretendendo extrair da Constituição a justificação da neocriminalização de condutas, que o PSD só agora tem coragem de apoiar, cedendo, tardiamente para o ex-ministro Dias Loureiro, a exigências de repressão que formaram tendência no seu anterior governo.
O PS - quem diria! - e o PSD sofrem da «síndrome da ponte» e provam-no com as iniciativas legislativas que hoje discutimos. Por mais que se esforcem por demonstrar que pretendem garantir o direito à liberdade de circulação, o Governo e o PS falham, porque está bem claro que o Governo transforma a lei penal num exercício do poder contra grupos determinados, contra pessoas que não são criminosas, contra pessoas angustiadas, desesperadas e indignadas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - A neocriminalização de condutas só pode encontrar justificação quando desencadeie consequências comunitariamente inaceitáveis, o que não é o caso, porque todos compreenderam a revolta e a angústia dos trabalhadores da Marinha Grande perante os salários em atraso e o encerramento da empresa e a revolta dos trabalhadores da Grundig. Foi generalizado o buzinão da ponte e o repúdio da violenta carga policial.
E perante a benção do PS - que a houve e as câmaras de televisão gravaram-na - ao bloqueio da Ponte 25 de Abril, todos entendem que, debaixo da hoje tão abusada, a propósito desta proposta de lei, palavra liberdade, se esconde a funcionalização da lei penal aos objectivos do PS e não da comunidade, o uso da lei penal como instrumento político de direcção social, como promotora da segurança interna, que erige cidadãos que reclamam como inimigos públicos.
Todos compreendem que a lei penal não é, nesta proposta de lei, reduto de protecção, em última instância, dos valores fundamentais da comunidade, funcionando não como garante do direito à liberdade, mas como rolha no engarrafamento de direitos por efectivar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Estamos perante uma proposta que configura um novo crime de perigo, mas de perigo presumido, não de um perigo abstracto, e muito menos de um perigo abstracto concreto, como acontece com os artigos do Código Penal relativos a atentados contra a liberdade de circulação, que, hoje, já são punidos desde que se prove que dos mesmos resultou perigo para a vida, integridade física ou bens patrimoniais de valor elevado, de pessoas concretamente determinadas.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ª Deputada, o tempo do seu partido esgotou-se.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Para cometer o crime previsto na proposta de lei, não é preciso sequer provar que determinada ou determinadas pessoas viram cerceado o seu direito à liberdade de circulação. Assim, o arguido seria condenado com base em meras presunções de perigo. Ora, nos crimes de perigo presumido, como são os configurados na proposta de lei, a distância entre a conduta e uma eventual lesão de bens jurídicos tutelados é de tal forma grande que fica provado que a tutela penal visa não a salvaguarda de um perigo mas a imposição de condutas que interessam ao Governo.
Debalde o PS e o PSD confluem na criação de um novo crime de perigo presumido, sendo que este último partido o adoptou entre outras propostas relativas, nomeadamente, a crimes contra as pessoas, que o Ministério da Justiça preteriu em favor de propostas do Ministério da Administração Interna.
Tudo isto, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, é em vão, porque, nascendo deslegitimada, a proposta transforma-se em proposta simbólica - como acontece, por exemplo, em França, onde existe uma disposição no Código da Estrada, que de nada serve. E, como disse um ilustre penalista estrangeiro, o Direito Penal simbólico, a curto prazo, mitiga - neste caso, mitiga preocupações dos Srs. Ministros do Partido Socialista -, a longo prazo, destrói.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O tempo gasto a mais pela Sr.ª Deputada Odete Santos foi-lhe cedido pelo Partido Ecologista Os Verdes e deve ser descontado no tempo que cabe a este partido.

ara exercer o direito de defesa da honra do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Alberto Costa): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, a Sr.ª Deputada veio aqui colaborar e levar mais longe uma operação de inversão, no sentido de que proeurou, reforçando outras vozes, dizer que esta era uma posição incómoda, incoerente, inconfessável e desconfortável para o Governo,...

O Sr. António Filipe (PCP): - É isso tudo! Diz muito bem!

O Orador: - ... quando, na verdade, esta proposta é e suscita da parte do PCP uma questão incómoda e desconfortável, em relação à qual é preciso esclarecer posições.
Na realidade, o problema que aqui se coloca é o de saber se uma liberdade pode ficar refém do abuso das