O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2430 I SÉRIE-NÚMERO 66

Há, em todo o caso, um fenómeno que nos parece novidade e em relação ao qual também entendemos que a proposta de lei deveria dar uma resposta adequada. Quero referir-me à diferente atitude do poder local em relação ao património cultural.
De facto, vemos que os municípios têm demonstrado preocupações crescentes com a sua identidade cultural especifica e nós saudamos este comportamento novo. Os municípios têm reivindicado, crescentemente, apoio ao desenvolvimento e salvaguarda do património construído e à revitalização do seu património. Lembro, por exemplo, o caso dos centros históricos que, por todo o lado, começam a ser objecto - felizmente! - de medidas que eram urgentes. Ora, julgo que o Estado, em relação a este facto novo, tem obrigação de demonstrar um apoio inequívoco, um apoio multidisciplinar, um apoio transversal, um apoio formativo e informativo e menos executivo. Julgo que se deveria ter acentuado e consagrado normativamente a tendência para a auto-suficiência e para a capacidade de gestão locais.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não se compreende que, numa altura em que era preciso descentralizar, este diploma tenha sido tímido, mas muito tímido,, nestas matérias que se prendem com dar mais meios humanos, técnicos e materiais aos municípios.

Vozes do CDS-PP. - Muito bem!

O Orador: - Julgo que seria também de exigir da administração central uma maior agilidade operativa, uma maior contratualização. Embora saudemos o princípio geral da contratualização, julgamos que se poderia ter ido mais além.
O programa que o Governo propõe nesta proposta de lei revela alguma confusa assimilação de conceitos e também algumas incoerências e contradições. Em que se traduzem tais contradições? Por um lado, prevê-se que uma autarquia possa celebrar acordos para efeito da prossecução de interesses públicos na área do património cultural - veja-se o artigo 4.º -, e não se lhe atribui sequer capacidade para classificar um bem cultural - veja-se o artigo 99.º; por outro lado, não se compreende a capacidade de uma autarquia celebrar acordos e que essa mesma capacidade seja incompatível com a falta de autonomia para pregar uma tábua ou sequer apertar um parafuso num imóvel classificado como de interesse nacional ou regional.
A confusão de que falava prende-se com os conceitos de classificação e qualificação. Apelo a V. Ex.ª, Sr. Ministro da Cultura, para que compulse o artigo 19.º, onde é introduzida uma nova figura - a figura da qualificação. E essa figura é justificada por se entender que quando «determinado bem se mostre possuidor de eminente valia cultural, mas para o qual a classificação se mostre desproporcionada», então, seria de optar por esse conceito novo.
Sem qualquer outra norma, sem qualquer critério, pergunto a V. Ex.ª, Sr. Ministro, como é que um bem classificado de interesse regional está acima de um bem qualificado de interesse nacional. Como é que se poderão distinguir estes dois conceitos no caso vertente, se não houver uma clarificação de conceitos?
Por outro lado, quero chamar a atenção de V. Ex.ª, Sr. Ministro, para a arbitrariedade no que respeita a prazos quanto ao procedimento de classificação.

Vozes do CDS-PP: - Bem lembrado!

O Orador: -É dito que um ano é o estritamente necessário, segundo a lei, para a conclusão do processo de classificação a partir do acto de decisão do IPPAR que determinar a abertura do processo. Isto, no fundo, quer dizer simplesmente o seguinte: entre o momento em que um cidadão ou uma instituição solicita a classificação de um imóvel, seja para travar uma destruição, seja para uma situação de emergência, seja mesmo para uma situação que não implique qualquer urgência, e o acto de decisão estatal de abertura do processo pode haver muito tempo, podem até mediar anos, não há nada na proposta de lei que obrigue a que, após um pedido de um cidadão, o Governo tenha um prazo de um ano estritamente medido e não mais do que isso. A manter-se o normativo legal, pode crer V. Ex.ª, Sr. Ministro, que poderão mediar vários anos entre um pedido de classificação de um particular e a decisão que, depois, o Governo toma.
Já disse também há pouco, na pergunta que coloquei a V. Ex.ª, Sr. Ministro da Cultura, que este diploma, pura e simplesmente, extingue a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, e expliquei porquê. Julgo que um organismo que. tem 70 anos de existência, que tem milhares de intervenções realizadas, que tem um know-how invejável, com estruturas e equipas consolidadas no terreno, adaptado à evolução das ideias e métodos de intervenção; um organismo que criou um inventário do património arquitectónico, que está disponível na Internet e que não é salvaguardado aqui no articulado do diploma; um organismo que criou um arquivo e fontes documentais do património arquitectónico; um organismo que publicou a revista Monumentos, que desenvolveu o Projecto Carta de Risco, que tem 100 intervenções de obras, de uma forma genérica, no património por ano, obras que são maioritariamente de conservação e de manutenção, de custos relativamente baixos... É claro que não ignoro que estas obras são aquelas que não dão nas vistas, que não são mediáticas, que não puxam inaugurações! Eu sei isso, Sr. Ministro! Mas são estas obras que fazem falta ao património construído português!
O IPPAR não tem vocação nem competência técnica para este tipo de intervenções.
Acresce que a cada vez maior aproximação do património construído ao domínio social e económico, em detrimento do cultural, desaconselha a mudança de um organismo como esta Direcção-Geral para a área da cultura.
Por isso a destruição da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, como um corpo técnico e operativo, significa para o Partido Popular um grave risco para o património histórico e cultural.
Não quero também deixar de salientar que o Estado assume o direito/dever de salvaguardar e valorizar o património cultural, garantindo a sua fruição por todos. Isto está dito claramente na lei. No entanto, do nosso ponto de vista, deve também o Estado reconhecer que não é a única entidade com esse direito/dever. Aos cidadãos e às instituições tem de, a uns e outros, assistir também o direito e o dever de ser agente