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2361 | I Série - Número 59 | 15 De Março De 2001

muitíssimo bem definida, porque apresenta quatro graus de competência - até prefiro dizer «competência», que é uma palavra abstracta; agora utiliza-se «saberes», «competências»... Preferem o plural porque é mais «culinário», não é...?.

Risos.

Na verdade, julgo que há que dar um conteúdo a esses currículos e há também que estudar a forma de preparar os mediadores. Prefiro, até, a designação «mediador cultural», no sentido de aproximar as culturas - o mediador, por definição, é um elemento da sociedade, e social.
Mas, reparem: neste momento, estão a chegar milhares de eslavos a este País. Ora, nunca tivemos ensino de línguas eslavas em Portugal, ninguém sabe sequer aquilo que é uma língua eslava, porque muito pouca gente sabe russo, ucraniano ou romeno para falar com os moldavos.
Naturalmente que, quanto às línguas africanas, é outra miséria. Um dia, precisei de um dicionário de quicongo para um estudo, uma investigação que fiz e encontrei em Portugal um dicionário de poucas páginas, feito por um padre franciscano; cheguei a França e encontrei um dicionário de muitas páginas!
A verdade é que temos um desconhecimento muito grande de todos os povos que connosco trabalham. E julgo que se os mediadores fossem bem preparados podiam, sem qualquer dúvida, estabelecer uma ponte entre eles e nós, para que eles não sejam só o outro, como disse o colega Luís Fazenda. Esta é a verdade!
Agora, como dar-lhes acolhimento? Como permitir-lhes que depois tragam as famílias? É que não tenho qualquer dúvida de que, a continuar como está, dentro de uns anos temos cá famílias com apelidos Vichinsky ou Stravinsky e outras, porque não há dúvida de que vamos ter uma miscigenação como em Portugal nunca se deu. Nós fizemo-la noutros países e agora ela vai ser feita cá! Até porque alguns elementos eslavos são extremamente bonitos, de maneira que não tenho qualquer dúvida que isso pode vir a acontecer.
Em princípio, a minha bancada não tem, pois, a mínima intenção de levantar quaisquer obstáculos.
Estou a falar de povos que cá entram, que se adaptam bem, que querem aprender português, que têm simpatia, que são bem educados, que neste momentos estão cá, que criam bom ambiente e que os portugueses recebem bem.
Há, de facto, um trabalho a fazer e, por isso, a minha bancada não pensa, de forma alguma, levantar obstáculos a estes dois projectos de lei. Espero que se consiga uma fusão, se possível for, que permita dar mais consistência a um currículo que é da maior importância para o ambiente social português, para o ambiente de trabalho e para o ambiente intelectual e para o ambiente de um povo que quer viver em paz e que quer viver em paz com os outros.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado David Justino.

O Sr. David Justino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A sociedade portuguesa registou, nos últimos trinta anos, uma das mais profundas alterações na sua estrutura social, sem equivalente na sua História. Ao transformar-se, como já foi aqui dito, de um País de emigrantes num País de imigrantes desencadeou o aparecimento de novas realidades sociais e culturais, para as quais nem sempre demonstrou a capacidade de compreensão e aceitação.
Quer em meio rural, mas de forma mais vincada e evidente em ambiente urbano deparamos com essa nova realidade de uma sociedade cultural e socialmente mais diversificada, mais pluralista, numa palavra, mais complexa.
É neste contexto que o conceito de minoria étnica passou a fazer parte do discurso comum, porém nem sempre da forma que entendemos mais adequada e mais rigorosa. Se é certo que a diversidade étnica projecta, na maior parte dos casos, a diversidade das identidades culturais de cada um dos grupos, não menos certo será o facto de o conceito só ser aplicado aos grupos que são vítimas da pobreza, da «guetização» e da exclusão social. Já alguém se lembrou de chamar «minoria étnica» à comunidade inglesa residente no Porto? 0 mesmo se poderá perguntar relativamente à crescente comunidade chinesa ou à comunidade brasileira.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, penso que vale a pena entendermo-nos sobre isto: subjacente aos dois projectos agora em discussão, está a tentativa meritória, mas não menos discutível, de encontrar políticas e medidas que permitam combater os crescentes fenómenos de exclusão social, de insucesso e abandono escolares, de dificuldade de integração no mercado de trabalho, da compatibilização de práticas e valores sociais, enfim, de enquistamento em bolsas de pobreza em que o acesso aos mais elementares benefícios públicos está, à partida, limitado.
Sem querer negar os contornos culturais destes fenómenos, nomeadamente aqueles que sustentam práticas de auto-exclusão, estamos perante um problema de contornos marcadamente sociais e não necessariamente culturais.
Por isso mesmo, trata-se de um problema que tanto afecta as reconhecidas minorias étnicas como os grupos sociais que, pertencendo às maiorias, nem por isso deixam de ser vítimas dos mesmos problemas.
É neste contexto que entendemos deverá ser feita a discussão destes dois projectos e, a partir dele, colocar a opção entre dois tipos de política social: deveremos fomentar o desenvolvimento de políticas específicas para grupos específicos, ou, pelo contrário, estruturar essas políticas em função dos problemas, independentemente dos grupos beneficiários, sejam ou não etnicamente identificáveis?
A esquerda - e pelos vistos também a direita multicultural - adopta o multiculturalismo «politicamente correcto» e prefere claramente a primeira opção. O Partido Social Democrata, ao assentar todo o seu ideário político nos princípios do personalismo e do humanismo universalizante, prefere decididamente a segunda.
A esquerda multicultural é adepta do recurso sistemático aos princípios da discriminação positiva. O Partido Social Democrata defende esses princípios a título excepcional e transitório, para situações devidamente justificadas. A institucionalização das práticas de discriminação positiva sem critério e sem limite conduz à injustiça social e, como tem sido correntemente provado por investigadores das políticas sociais, ao efeito perverso de essas políticas acabarem por reproduzir a exclusão social e sustentar os fenómenos de «guetização» social.
Podemos agora perceber como, por detrás de uma boa intenção, como é a do estabelecimento do estatuto legal da carreira de mediador cultural ou sociocultural, poderá estar a negação dessa mesma intenção.

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