35 | I Série - Número: 102 | 6 de Julho de 2007
Proclamou, então, o Sr. Primeiro-Ministro, desta mesma tribuna: «Todos sabemos que a revisão de um PDM pode arrastar-se, penosamente, por mais de uma década e que um plano de urbanização ou um simples plano de pormenor podem demorar uma boa meia dúzia de anos. (…) É por isso que temos de mudar.» Postas as coisas nestes termos, qualquer destinatário, menos atento e desprevenido, poderia, sem dúvida, descobrir-se subitamente fascinado pelo desassombro e determinação falaciosamente subjacentes a esta iniciativa do Governo. Mas tal, todavia, não traduz a verdadeira realidade dos factos, como facilmente o passamos a demonstrar.
Com efeito, o que o Governo realmente fez mais não foi do que dar cumprimento a uma norma transitória da lei de bases (Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto), mais precisamente o n.º 2 do artigo 32.º, que determina que, uma vez aprovado o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT) e os novos planos regionais de ordenamento do território (PROT), «a ratificação de planos municipais pelo Governo só terá lugar nos casos em que seja suscitada, no âmbito do procedimento de elaboração e aprovação dos planos, a desconformidade com as disposições legais e regulamentares vigentes ou com instrumentos de gestão territorial eficazes.» Portanto, à boa maneira da propaganda e da demagogia, que já constitui um apanágio tão peculiar deste Governo socialista, o que o Sr. Primeiro-Ministro veio anunciar, com pompa e circunstância, em 27 de Abril passado, a esta Câmara mais não foi — imagine-se!… — do que o mero cumprimento de uma determinação legal com data de 1998… É caso para se afirmar que o Sr. Primeiro-Ministro leva, quiçá, um pouco longe demais a máxima latina audaces fortuna juvat, ou seja, a sorte protege os audazes!?… Veremos agora se o aceso protagonismo do Sr. Primeiro-Ministro lhe é suficiente para conseguir fazer aprovar o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território e todos os PROT, de modo a compatibilizar a iniciativa política com as determinações legais!?… Quanto ao mais, a proposta de lei n.º 151/X apenas cura de alguns ajustamentos administrativos, sendo, contudo, nosso propósito — enquanto manifestação da nossa boa fé política — alertar o Governo, no que toca à alteração ao artigo 33.º da lei de bases, para o facto de também os planos de ordenamento dos parques arqueológicos deverem integrar, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 131/2002, de 11 de Maio, a categoria legal de planos especiais de ordenamento do território.
Já sobre a proposta de lei n.º 149/X, que procede à reforma do regime jurídico da urbanização e edificação, reconhecemos e assinalamos como positivo o esforço do Governo no sentido de tentar simplificar procedimentos e encurtar prazos, para além de procurar aplicar, de forma recorrente, princípios de economia dos actos e do «aproveitamento do possível».
Analisamos esta iniciativa política do Governo da forma que se segue: os dois grandes eixos desta proposta de lei assentam, por um lado, na simplificação de procedimentos administrativos e, por outro, na tentativa de alcançar uma maior responsabilização dos técnicos e dos donos ou promotores das obras intervenientes naqueles procedimentos.
No campo da simplificação de procedimentos, verifica-se: uma desgraduação dos institutos jurídicos de controlo apriorístico das iniciativas dos particulares; um incremento das situações de deferimento tácito das pretensões dos particulares; sempre que possível, o encurtamento de prazos; uma aplicação mais aprofundada do princípio do «aproveitamento do possível» nos procedimentos e nos actos administrativos e materiais; a introdução do recurso à informática e à Internet nas relações entre a Administração e os particulares; a introdução de novos actores nos procedimentos, tendencialmente potenciadores de uma centralização de imputações e de actuações; e, finalmente, o novo carácter meramente facultativo da consulta pública, agora apenas aplicável a licenciamentos de operações de loteamento com significativa relevância urbanística.
Embora, numa apreciação global, nos seja simpático o elenco dos princípios sufragados pelo Governo nesta sua iniciativa, manifestamos, contudo, algumas reservas, que se prendem, sobretudo, com a eficaz salvaguarda dos valores ambientais, urbanísticos e paisagísticos por via de um afrouxamento do controlo apriorístico em algumas operações urbanísticas, designadamente: com alguns casos de deferimentos tácitos, por poderem originar danos no interesse público de difícil reparação; com o potencial afastamento total dos processos de consulta pública enquanto garantes do exercício pelos cidadãos de um direito constitucional e legalmente garantido; finalmente, com o reforço de meios humanos, sua qualificação, bem como meios materiais e financeiros indispensáveis para pôr em prática as medidas agora preconizadas nesta iniciativa do Governo.
Suscitam-nos também, por outro lado, sérias reservas as soluções encontradas pelo Governo para o pretendido reforço da responsabilização dos técnicos e dos donos ou promotores das obras intervenientes nas operações visadas, as quais se nos afiguram manifestamente insuficientes para uma eficaz salvaguarda dos interesses públicos em presença.
De qualquer forma, por se nos afigurar, numa apreciação global, positivo e necessário o sentido em que corre esta reforma do regime jurídico da urbanização e edificação, reservamo-nos para, em sede de especialidade, dar o nosso contributo, apresentando algumas soluções concretas que, do nosso ponto de vista, se configuram como indispensáveis para a consagração de uma solução responsável e equilibrada, tanto