I SÉRIE — NÚMERO 4
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corresponder trabalho gratuito como contrapartida de direitos sociais, padronizar-se-ia a pobreza, apagar-se-ia
a natureza humana de individualidade e irrepetibilidade e estigmatizar-se-ia de forma aviltante.
Aplausos do PS.
Um programa de emergência social, para além de acudir, deve servir para libertar.
Aplausos do PS.
A solidariedade assente em direitos, com deveres correlativos, não se confunde com a caridade. Esta
agradece-se, a outra reivindica-se no respeito pela equidade e pelas forças, designadamente financeiras,
dessa mesma solidariedade intergeracional.
Aplausos do PS.
Pessoas privadas de direitos são pessoas sem valor e, como tal, sem dignidade, na perspectiva kantiana.
No que à saúde se refere, importa frisar que as medidas previstas na tróica em parte alguma alteram a
arquitectura do sistema.
Vemos a afirmação dos valores da universalidade e da gratuitidade tendencial como muito positiva, mas
receamos que a omissão relativamente à generalidade e à igualdade façam resvalar para a tentação de um
pacote básico que, até hoje, nunca nenhum país conseguiu definir, a não ser pela negativa, ou seja, não o que
deve lá estar mas, antes, o que não deve lá estar, âmbito no qual é muito mais fácil chegar a um consenso.
Positiva é a recondução da livre escolha aos cuidados primários do sector público, uma vez que a
indiscriminada livre escolha é insustentável financeiramente e agrava as desigualdades em saúde, que são
contrárias à afirmação da dignidade.
Já quanto à gestão privada de sistemas e equipamentos de saúde, como se afirma em recente relatório do
King’s Fund, «em parte alguma do mundo existe evidência de sucesso do mercado competitivo no sector
público da saúde».
O Sr. António Filipe (PCP): — Agora é que o PS percebeu isso!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Devia ter dito isso ao Sócrates!
A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — A nosso ver, a eficiente e eficaz gestão de recursos deve
obedecer a uma política de saúde coerente, que tenha como horizonte a melhoria dos respectivos indicadores,
corrija desigualdades e respeite a dignidade humana.
A racionalização equitativa dos recursos não se confunde com racionamento e antes deve promover a
qualidade dos cuidados, a sua proximidade compatível com a hierarquia da especialização, a saúde em todas
as políticas e a pedagogia permanente de que a adequada e rigorosa gestão dos recursos em saúde, pela sua
escassez, conjugada com a defesa que faz do primeiro de todos os bens — o direito à vida —, assumem
natureza ética. E, neste domínio, a evidência demonstra bem que o crescimento económico é sempre
concomitante com a melhoria dos indicadores de saúde, pelo que este objectivo não deve ser abandonado.
Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: Teremos oportunidade de
proceder ao escrutínio próximo da actuação do Governo nesta Câmara — maioria absoluta, apoio
presidencial, apoio do PS na execução do Memorando, maioria de direita nos países europeus e quatro anos
para provar.
Comprometemo-nos a fiscalizar apertadamente a acção do Governo e a realizar oposição, indispensável e
virtuosa em democracia, e fá-lo-emos, parafraseando a Sr.ª Presidente, com orgulho e responsabilidade.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.