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I SÉRIE — NÚMERO 41

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Os Deputados do PCP, Carla Cruz — João Oliveira.

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Relativa ao projeto de lei n.º 322/XIII (2.ª):

O que deve ser uma verdadeira reforma da floresta portuguesa? Esta é a questão que se atravessa sempre

que o Parlamento ou a sociedade debatem temas ligados aos impactos resultantes dos incêndios florestais.

Infelizmente, tem faltado um ponto sério, elementar, que se pode chamar de visão global do problema.

As questões da nossa floresta devem merecer uma leitura integrada que comece pelo território. O que

poderemos fazer nele, como podemos melhorar as suas aptidões, como deveremos fazer conviver atividades,

que papel deveremos reservar ao «homem» no seu uso. Este trabalho, balizado pelos planos regionais e

municipais de ordenamento, limitou-se, nos últimos 30 anos, ao «urbano», à exploração de cada metro na visão

de mau crescimento, na infeliz consagração da cidade desregulada.

A segunda leitura ou preocupação deve ser com a titularidade. O País é anacrónico na divisão e agregação

da propriedade, é passional na relação entre vizinhos, é excêntrico na relação do que é público e do que é

privado, é feudal na visão comunitária de uma parte do torrão. Esta realidade faz com que seja impossível

concretizar unidades produtivas economicamente mais valorizadas, seja impraticável consagrar uma outra forma

de competir nos mercados pela dimensão das propriedades e, ainda, se confirme impeditiva de um sistema

fiscal rústico moderno e não beneficiador do absentismo.

Uma outra dimensão é a que importa consagrar nas regiões do País a norte do Tejo. Quem se atém a uma

incorporação mínima da realidade histórica portuguesa sabe do que se fala, das tipologias de povoamento, dos

agregados e das defesas da urbe, das garantias de bens para troca e da realidade de subsistência dos povos.

É por isso que a floresta, como energia, como recurso alimentar, como «cama» para o gado, como reserva para

uma infelicidade ou recurso de casamento dos filhos, sempre foi para partir e repartir, usando o indeviso à

exaustão.

Território, propriedade, e agora o que ali existe de cultura. Espécies nobres ou menos nobres, mais ancestrais

ou mais recentes no seu uso, o que importa é sabermos que país podemos suportar para que a floresta se

agregue às cadeias de valor. Se no montado, fruto de velhas circunstâncias e novas realidades, a floresta

portuguesa precisa de mais investigação, de melhoria da produtividade e de melhor uso de tecnologia, se na

fileira da cortiça a realidade se deve afirmar numa consagração do interprofissional e na valorização do esforço

de qualificação das empresas de transformação, já o mesmo se não pode considerar no terço do País onde o

pinheiro bravo se apresenta. A realidade industrial, a calamitosa situação sanitária, a insuficiente estruturação

dos recursos técnicos, a modesta organização profissional, a curva descendente das exportações, fazem desta

fileira o caso sério da floresta portuguesa.

As duas identificações anteriores promovem a concentração do pensamento na fileira do eucalipto, o nosso

e único mal que surge perante teólogos silvícolas recalcitrados. Não, o eucalipto só é uma ameaça porque o

discurso político, empresarial e associativo é cocho, não toca no ponto central — não há reforma da floresta se

não houver rendabilidade na atividade florestal. Não há resultado e, por isso, não há «circo».

Neste Portugal, país que se assume como potência na «pasta e no papel», em que a indústria remunera mal,

tendo em conta a realidade dos preços nos mercados internacionais, em que se verificam poucas leituras sobre

o benefício da certificação e nenhumas sobre os impactos dos povoamentos e da sua gestão, só os montados

e o eucalipto não matam a floresta, só eles concedem que não tenhamos mais incultos, mais território

abandonado.

Sendo um problema económico, como aqui quase se demonstra, que soluções se encontram nas diversas

propostas de reforma que vão nascendo? Muito poucas!

Conviria que tivéssemos em conta que a «cocaína» dos fundos europeus de natureza agrária nos vai levar

ao cadafalso. Que Portugal deixou de ter uma visão dinâmica do agroindustrial para se restringir ao guiché

bruxelense dos dinheiros da PAC. E, mais, assistimos à negação da ambição pela criação de novas gerações

de procuradores do risco que se assumam amantes de um mundo aberto e cosmopolita mas não opositores às

realidades específicas do mais antigo elemento do universo — a agricultura, a floresta e a pecuária.

A floresta é território, é propriedade, é ocupação, é gestão, é investigação, é parte de cadeias vastas de