I SÉRIE — NÚMERO 88
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Não se pretende conhecer o conteúdo das comunicações, mas, sim e somente, os dados circunstanciais das
comunicações.
Contudo, a questão essencial, e é preciso falar nela, a dar solução, é a que remete para o artigo 34.º da
Constituição da República Portuguesa, ou seja, é a de apurar se a atividade do serviço de informações se pode
integrar no âmbito de um processo criminal.
Por aqui, chegamos à discussão do equilíbrio entre segurança e liberdade, já que a Constituição, no n.º 1 do
artigo 27.º, lhes dá o mesmo predomínio: «Todos têm direito à liberdade e à segurança».
Para esta permanente tensão a Constituição oferece, como elemento diferenciador, o princípio da
proporcionalidade, que, por sua vez, se desdobra na necessidade de prossecução de um fim legítimo, de
adequação a esse fim e da sua necessidade ou exigibilidade.
Nesse sentido, deve ter-se em conta que os serviços de informações têm um papel decisivo de salvaguarda
da segurança interna e de acompanhamento e deteção das ameaças no domínio da espionagem e do terrorismo
e, ainda, Sr.as e Srs. Deputados, da prevenção dos atos que, pela sua natureza, possam pôr em risco o Estado
democrático constitucionalmente consagrado.
Podendo, assim, concluir-se pela existência de uma relação de complementaridade entre a atividade da
produção de informações e a atividade que se leva a cabo no âmbito do processo penal.
Por isso, nestas novas iniciativas legislativas, vemos o acesso aos metadados pelo serviço de informações
restringidos à espionagem e ao terrorismo, com níveis exigentes de intervenção do Ministério Público e dos
tribunais e, ainda, com uma especial vertente de fiscalização, designadamente através da Comissão Nacional
de Proteção de Dados.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os tempos mudam e, mudando, exigem de nós novas atitudes e
novas respostas. É isso que agora aqui estamos a fazer, certos da necessidade destas soluções e certos de
que a Constituição tem dentro dela a vida capaz de dar novas respostas às necessidades dos novos tempos.
Aplausos do PSD e de Deputados do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra a Sr.ª Ministra da
Administração Interna, Constança Urbano de Sousa.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresenta
esta proposta de lei com o propósito de dotar os serviços de informações da República com uma ferramenta
que hoje é absolutamente essencial ao exercício da produção de informações necessárias à garantia da
segurança interna e também à salvaguarda dos interesses vitais do Estado, assegurando igualmente o respeito
pelos direitos fundamentais.
Hoje, colocam-se ameaças ao Estado de direito democrático, como o terrorismo, que, pela sua abrangência
e impacto, são especialmente corrosivas dos pilares dos Estados e do bem-estar da sociedade.
Por isso, é absolutamente necessário dotar os serviços de informações dos instrumentos necessários para
que possam cumprir com eficácia a sua missão, à semelhança dos outros serviços de informações do espaço
europeu com que colaboram.
É entendimento do Governo que esta proposta de lei, que estabelece um regime muito especial e muito
restritivo de acesso a dados de base e a dados de tráfego, de comunicações por parte do SIRP (Sistema de
Informações da República Portuguesa), é conforme à Constituição, no seu todo, e respeita os seus limites
constitucionais.
Em primeiro lugar, trata-se apenas do acesso a dados de base e de localização que permitem obter a
identidade e a localização de determinadas pessoas, bem como o acesso aos dados de tráfego, desde que seja
essencial para a prevenção de atos de terrorismo ou de espionagem. Não se trata, em caso algum, nunca, do
acesso ao conteúdo das comunicações. Ou seja, trata-se tão-só de saber se determinada pessoa, que é suspeita
de envolvimento numa organização terrorista, contactou com A ou com B, mas nunca de saber o que disse a A
ou a B, ou seja, nunca se trata do acesso ao conteúdo da comunicação em si ou da correspondência.
Em segundo lugar, esta proposta de lei procura ir ao encontro da jurisprudência do Tribunal Constitucional e
de uma interpretação atualista da Constituição da República Portuguesa como um todo, respeitando os
princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade que devem sempre presidir a qualquer