I SÉRIE — NÚMERO 101
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Ora, antes de mais, parece-me que o Estado está a dar um mau exemplo, isto é, o Estado está a pedir aos
privados para fazerem aquilo que o próprio Estado se recusa a fazer e, pior do que isso, uma empresa que tenha
o azar de ter dívidas ao Estado, mesmo que tenha créditos perante o Estado, vai sempre ficar numa situação
de insolvência, levando até, nesse sentido também, os outros devedores a não fazerem esse regime de
conversão dos créditos em capital.
Por isso mesmo, a primeira pergunta que lhe faço, Sr. Secretário de Estado, é porquê. Como sabe, isso não
existe noutros regimes. Por exemplo, não existe no regime do Código Contributivo da Segurança Social.
Mas, Sr. Secretário de Estado, faço-lhe ainda uma segunda pergunta muito relevante, que tem exatamente
a ver com a situação destas empresas que têm dívidas ao Estado mas que também têm créditos por parte do
Estado. O crédito mal parado, isto é, os pagamentos em atraso do Estado têm vindo a subir, neste momento
são cerca de 1000 milhões de euros e subiram 46% na administração central face ao final de 2015.
O Governo tinha anunciado, no primeiro trimestre de 2013, que iria permitir a compensação de créditos entre
uma empresa que tem uma dívida ao Estado, à Segurança Social ou à AT (Autoridade Tributária) e compensar
com os créditos que tem. Portanto, pergunto-lhe onde é que está essa medida, que seria uma medida muito
importante para as empresas.
A segunda ideia boa que este regime tem é facilitar o regime extrajudicial de insolvências, que, aliás, é uma
ideia boa que não é original. Já no passado se fizeram regimes muito relevantes, como o SIREVE (Sistema de
Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial) e o PER (Processo Especial de Revitalização) e, nesse sentido,
houve melhorias muito importantes. Por exemplo, obrigar os credores públicos, Estado, Segurança Social e
Autoridade Tributária, a dialogarem e a terem uma posição comum antes das assembleias é algo muito relevante
e, no caso do SIREVE, não nos esquecemos que a percentagem de sucesso do SIREVE é de 85%. Portanto,
as empresas que vão a este regime conseguem, efetivamente, passar de uma situação de pré-insolvência para
uma situação de viabilidade e isso é positivo.
Certamente que este regime precisa de melhorias. É normal que, nomeadamente, quando se faz uma
avaliação destes regimes, se possa melhorar. No caso do SIREVE até entendemos que o baixo recurso ao
SIREVE tem a ver com o facto de as empresas recorrerem mais rapidamente ao PER do que ao próprio SIREVE,
mas quero dizer-lhe que tenho preocupação com algumas das medidas que estão aqui previstas.
Por exemplo, ter como limite mínimo de passivo 15%, que, neste momento é um terço, quando a isto se
soma a possibilidade de, em permanência, a empresa estar neste regime, podendo renová-lo quase
automaticamente, pode levar a situações de abuso, nomeadamente prejudicando outros credores que são
também eles empresas e, nesse sentido, distorcer, até, as regras do mercado e de uma livre e sã concorrência.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Pergunto se o Governo está disponível para mudar este aspeto dos
15% e guardarei para uma intervenção final outras considerações sobre os restantes diplomas.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulino Ascenção.
O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, é evidente que há um problema
de endividamento das empresas portuguesas, das PME em particular, e um problema de descapitalização.
Em boa medida, essa situação resulta da crise e da resposta errada que lhe foi dada com as políticas de
empobrecimento da troica e do Governo das direitas.
Resulta desta constatação que a melhor solução para este problema será reforçar as políticas que foram
ensaiadas por este Governo de crescimento, devolução dos rendimentos, devolução do enorme aumento de
impostos que foi prosseguido pelo anterior Governo e a aposta no investimento público, que tanta falta faz para
consolidar este caminho e sustentar o crescimento futuro da economia.
Mas há também um fator estrutural do endividamento que é inerente ao modelo capitalista, com a sua
obsessão por resultados imediatos, pela maximização do lucro e a preferência por distribuir lucros, que significa
descapitalizar em vez de reinvestir.