24 DE JUNHO DE 2017
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O papel específico de homens e mulheres, em complementaridade, contribui para um crescimento saudável
e harmónico da personalidade ou de qualquer organização.
Entendo que a afirmação dessa complementaridade é desejável e justifica a assunção de políticas públicas
que contribuam para remover obstáculos à sua afirmação.
De um modo geral, não oferece contestação o facto de o Estado poder desenvolver e impor medidas no setor
público.
Pelo contrário, a possibilidade de o poder político impor ao setor privado políticas que determinem
imperativamente o seu modo de organização é suscetível de levantar reservas.
A empresa é, antes de mais, uma célula base da economia de mercado e representa a expressão do
dinamismo privado e da capacidade empreendedora dos seus promotores.
Não obstante, acompanho a Doutrina Social da Igreja quando afirma que aempresa cumpre também uma
«função social, criando oportunidades de encontro, de colaboração, de valorização das capacidades das
pessoas envolvidas».
Está, pois, em causa o direito de reserva de autorregulação do setor privado e a ponderação da imposição
de condicionantes que se justifiquem em face da importância do que está em causa.
Uma vez que as medidas em questão, para além de visarem o setor público, se circunscrevem a sociedades
abertas — empresas com capitalização pública ou em bolsa —, entendi aprovar a proposta em questão,
assumindo o seu carácter excecional e temporário.
Importa precisar que a imposição de qualquer uma das medidas neste âmbito deve visar a remoção de
obstáculos para que as empresas sejam plenamente o que devem ser — se realizem mais plenamente — e não
a imposição de qualquer artificialidade.
É porque entendo que a complementaridade do contributo específico de homens e mulheres corresponde à
natureza das coisas que compreendo que, a título excecional e transitório, possam ser impostas algumas normas
que encorajem um caminho que, a ser verdadeiro, acabará por se impor naturalmente. As políticas públicas
visam aqui contribuir para que as organizações tenham maior eficiência e as medidas agora implementadas
devem ser afastadas sempre que possam ser um entrave à afirmação e ao aprofundamento dessa eficiência.
Acrescento, porém e ainda, duas notas finais sobre o teor das propostas:
— o diploma legal aprovado está longe de ser perfeito e há muitos pontos que merecem a minha discordância.
Desde logo, desconsidera-se totalmente que a maternidade continua a ocupar um lugar central nos obstáculos
que as mulheres têm em ocupar lugares de chefia. Vários dados evidenciam que é às mães que é mais difícil
subir na carreira e decorre da maternidade e não de serem mulheres a maior parte da resistência das
organizações em reconhecer o mérito das suas carreiras. Sem uma promoção efetiva do papel social da
maternidade não estaremos verdadeiramente a pensar o futuro e estranhamente essa dimensão é totalmente
ausente deste diploma;
— finalmente, não se compreende a total incoerência da maioria que aplaudiu entusiasticamente a aprovação
desta lei, de quem acredita firmemente na importância do contributo específico das mulheres e na
complementaridade entre o masculino e o feminino nas organizações, mas dispensa-a na filiação de crianças e
no papel que tal complementaridade tem na formação da personalidade. Será que as crianças são menos do
que o conselho de administração de uma empresa?
O Deputado do CDS-PP, Filipe Anacoreta Correia.
——
A proposta de lei sobre o designado «regime de representação equilibrada entre mulheres e homens nos
órgãos de administração e de fiscalização das empresas do setor público empresarial e das empresas cotadas
em bolsa», com as propostas apresentadas por PS, BE e CDS, teve o voto contra do PCP em votação final
global.
Seja em relação à Administração Pública ou às empresas do setor privado, estas propostas são parte
integrante de uma estratégia de iludir as reais causas das desigualdades entre homens e mulheres. Aliás, é
particularmente significativo o acordo e a simpatia do patronato e da elite financeira sobre esta matéria.