I SÉRIE — NÚMERO 90
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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, declaro aberta
a sessão.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade que abram as galerias ao público, por favor.
Srs. Deputados, o debate de hoje consta da apreciação conjunta, na generalidade, dos projetos de lei n.os
418/XIII (2.ª) — Regula o acesso à morte medicamente assistida (PAN), 773/XIII (3.ª) — Define e regula as
condições em que a antecipação da morte, por decisão da própria pessoa com lesão definitiva ou doença
incurável e fatal e que se encontra em sofrimento duradouro e insuportável, não é punível (BE), 832/XIII (3.ª) —
Procede à 47.ª alteração ao Código Penal e regula as condições especiais para a prática de eutanásia não
punível (PS) e 838/XIII (3.ª) — Define o regime e as condições em que a morte medicamente assistida não é
punível (Os Verdes), diplomas que serão votados no final do debate.
Para apresentar a iniciativa do PAN, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.
O Sr. AndréSilva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A sessão plenária de hoje é o culminar
de um debate que demorou mais de dois anos, que foi intenso e muito participado por todos os setores políticos,
científicos e profissionais do nosso País.
Foi lançada uma ampla discussão pelo movimento cívico Direito a Morrer com Dignidade, a quem
congratulamos pela mobilização da sociedade portuguesa para consagrar na lei a despenalização da morte
assistida. A palavra de reconhecimento que dirigimos a este movimento deve-se à qualidade, seriedade e
elevação da discussão feita.
Agora é tempo de os Deputados assumirem as suas responsabilidades. Quem hoje defende que a discussão
continua por fazer apenas está a esconder o seu verdadeiro objetivo, que é o de impedir que deixe de ser punível
com pena de prisão o ato de ajudar a morrer um doente terminal envolvido no maior sofrimento.
Impedir a antecipação voluntária da morte a pedido em contextos muito especiais é impedir um ato de
altruísmo. Ser-se contra a despenalização da eutanásia é continuar a defender que um ato de bondade seja
considerado criminoso e punível com pena de prisão.
Se encaramos como normal e natural o prolongamento das nossas vidas, visto que a ciência assim o permite,
por que é que não encaramos como igualmente normal e natural que nos perguntemos em que condições
aceitamos prolongar ou não as nossas vidas?
O debate sobre a morte assistida também é um debate sobre os direitos humanos de quem está no fim da
linha, sobre o processo da última etapa da nossa vida, em relação à qual temos o direito a decidir, ou seja, se
será com sofrimento agónico, atroz e intolerável ou, pelo contrário, se será de forma digna, respeitosa e livre.
Definir sofrimento intolerável não é difícil e não é verdade que todo o sofrimento seja tratável, como insistem
aqueles que defendem que os cuidados paliativos são a única solução e a resposta para todos os casos.
O sofrimento é uma experiência pessoal e intransmissível. Muito mais do que uma dor ou outro sintoma físico
ou psicológico, o sofrimento indizível é uma dependência, uma indignidade, uma ausência de ser, uma falta de
sentido, e é agoniante sofrer porque se sofre, sofrer porque se é obrigado a sofrer, sofrer por se saber que
depois do sofrimento só há sofrer.
O sofrimento é multifatorial, com componentes físicas, mentais e emocionais, que, quando associado a
doença ou lesão fatal ou definitiva e incurável, é reconhecível pelos profissionais de saúde e familiares.
A legalização e o pedido de morte assistida em contexto de doença preveem, assim, um conjunto de rigorosos
critérios clínicos indissociáveis a respeitar.
E porque vivemos numa sociedade democrática e num Estado de direito, o doente não pode querer que o
seu pedido seja aceite sem critério e a sociedade não pode aceitar sem reservas todos os pedidos.
O pedido de morte assistida só pode ser feito por um adulto informado e esclarecido sobre a sua situação,
livre de quaisquer coações e capaz de perceber que outras alternativas existem, ou não, para debelar a sua
doença ou lesão, assim como as respostas disponíveis para minimizar esse sofrimento.
A decisão da insuportabilidade do sofrimento será sempre da própria pessoa, se a esta decisão corresponder,
evidentemente, uma verdadeira vontade livre, consciente, informada e reiterada perante uma situação