I SÉRIE — NÚMERO 14
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dos doentes face aos estudantes dos hospitais universitários? E faz sentido, conforme defende o PS, que «a
prestação de cuidados e tratamentos de saúde ou de serviços de diagnóstico por estudantes de Medicina, nos
estabelecimentos em que decorrer a sua formação, é equiparada à assegurada por médicos, para efeitos de
acesso aos sistemas de informação e às plataformas nos quais são registados os dados de saúde dos
doentes?
Será ético que, conforme defende o Bloco de Esquerda, os investigadores pertencentes a laboratórios e
centros de investigação pertencentes ao perímetro legal e administrativo das instituições de ensino superior
públicas possam, também, aceder a estes dados?
Estas e muitas outras questões estão, no entender do CDS, sem resposta com estes dois projetos de lei,
que nos levantam as maiores reservas. Se, eventualmente, estas iniciativas baixarem à discussão em sede de
especialidade, terão de ser realizadas várias audições e pedidos diversos pareceres.
Repetimos que o CDS é sensível aos argumentos apresentados. No entanto, a formulação destas duas
iniciativas levanta-nos muitas reservas.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do PSD. Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa.
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O objetivo das iniciativas legislativas em discussão é simples de enunciar. Trata-se de permitir que os estudantes de Medicina acedam
a dados de saúde e a informação clínica dos doentes nos estabelecimentos onde decorra a sua formação, sob
adequada supervisão técnica, acesso, esse, que, legalmente, lhes está vedado.
Esta alteração legislativa, que visa, portanto, acautelar o interesse da formação dos estudantes, parece
simples e adequada, não fosse dar-se o caso de, aparentemente, atentar contra a vontade do doente,
enquanto titular dos seus dados.
Não somos nós que o dizemos, Sr.as e Srs. Deputados. É a CNPD (Comissão Nacional de Proteção de
Dados) e a Ordem dos Advogados que o afirmam, perentoriamente, nos pareceres juntos ao processo
legislativo.
A CNPD não tem qualquer dúvida em considerar a iniciativa do Partido Socialista um retrocesso na
proteção dos dados pessoais dos doentes, criticando, inclusive, a ficção criada e a duvidosa equiparação do
acesso dos estudantes a um ato médico de prestação de cuidados e de diagnóstico.
Também a Ordem dos Advogados considera que as iniciativas não são conformes ao direito da União
Europeia e que o RGPD (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados) não prevê o acesso, por estudantes
de Medicina, a sistemas de informação e a plataformas nos quais são registados dados de saúde dos utentes,
para fins de estudo e ensino, enquanto exceção autónoma ao princípio geral da proibição de tratamento de
dados.
Assim sendo, Sr.as e Srs. Deputados, vemo-nos confrontados com dois interesses aparentemente
contraditórios. Ou seja, por um lado, o interesse do acesso ao processo clínico, pelos estudantes de Medicina,
e, por outro lado, o da proteção dos dados sensíveis e pessoais de saúde dos doentes, cuja conciliação não
parece ter sido encontrada pelas soluções legislativas em discussão.
Sr.as e Srs. Deputados, percebemos a intenção das presentes iniciativas, percebemos o objetivo
prosseguido e somos sensíveis ao problema, mas as soluções preconizadas, objetivamente, não são
suficientes para assegurar o necessário equilíbrio dos interesses em confronto e afastar as reservas e dúvidas
que impendem sobre a sua adequabilidade.
Estas iniciativas não são suficientes, porque põem em causa a garantia do respeito pela autonomia da
vontade dos doentes e o controlo dos seus dados. Não são suficientes, porque não têm em consideração as
conclusões do grupo de trabalho de especialistas criado entre a CNPD, o Conselho de Escolas Médicas
Portuguesas e o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, nem o sistema já desenhado por
estes, que integra um perfil de acesso dos estudantes de Medicina.